(por Fernando Neeser de
Aragão)
Sentado sob a sombra de uma enorme árvore no
sopé de uma colina que margeia a estrada, Conan contempla os palácios de mármore, em meio a bosques verdejantes, sob
cujas sombras homens armados e em armaduras douradas, que reluzem nas poucas brechas
de sol que as copas das árvores deixam escapar, se exibem sobre seus corcéis no
que parece um ensaio de parada militar, enquanto donzelas de longas e onduladas
madeixas douradas, que escorrem como fios de ouro até as cinturas, em seus vestidos
coloridos, observam também sob as sombras – jovens mulheres, pensa Conan,
cujos delicados pés nunca roçaram arbustos rasteiros, e cujas finas mãos jamais
conheceram a primitiva tarefa de acender uma fogueira e nela assar a carne de
uma caça recém-abatida.
Atravessando estradas alvas, as quais levam ao caminho principal da
Estrada dos Reis, o cimério – que precisou vender até as roupas, a fim de ter
dinheiro para comer e beber – chega a Numália – a segunda maior cidade da
Nemédia –, cuja via principal, o Caminho Palian, é um prolongamento da Estrada
que dá acesso à cidade.
Conan não consegue entender porque o homem civilizado vive em cidades
com aquelas sarjetas fétidas abominadas pelos selvagens, onde nem a tempestade
pode penetrar, já que muros e baluartes a mantêm do lado de fora. Isso sem
falar no total descaso das pessoas dali em relação aos famintos – o que não
difere muito do que o cimério vira na Hiperbórea. Na Ciméria, às vezes, há
fome; mas as pessoas têm fome apenas quando não há absolutamente nenhuma
comida. Mas ali, há pessoas fartas de gula, enquanto outras passam fome. Em
alguns locais da cidade, homens caem e morrem de fome, encostados nas paredes
de lojas e armazéns abarrotados de comida.
Seus semelhantes passam por cima do corpo sem interromper sua
conversa, e continuam cuidando de seus assuntos. Na Ciméria, nenhum de seus
irmãos permitiria isso, pois não há homem na tribo que não conheça o outro e
que não sinta ao menos empatia por seu semelhante.
Então, um suave e agradável som de música interrompe os devaneios
daquele cimério.
Sons de flautas e alaúdes reverberam por toda uma taberna próxima,
enquanto as prostitutas do local, perfumadas com óleo de jasmim, dançam para os
fregueses. Mas o cimério também gosta das mulheres suadas de tabernas mais
baratas. Além de estarem à altura de seu ouro relativamente escasso, têm o odor
natural que tanto excita àquele bárbaro, o qual, nos últimos meses, possuíra uma
aldeã aesir e algumas britunianas, ambas de revoltos cabelos loiros – além, é
claro, de sua conterrânea, a morena Eanbotha, na Ciméria. Nenhuma delas jamais
usara perfume, e se banhavam somente após a relação sexual. Outro dos poucos
elementos da “civilização” que cativa o musculoso adolescente é o vinho, por
ser mais doce que a cerveja – embora Conan também não dispense esta última.
O sol já havia se posto, quando subitamente o adolescente cimério
avista, não muito longe dali, uma jovem de loiros cabelos cacheados sendo
desnudada, espancada e interrogada por meia dúzia de guardas. Nascido numa
terra onde tanto homens quanto mulheres são guerreiros, Conan odeia os fracos e
considera aquela loira tão covarde quanto os próprios guardas – bem como os
lojistas aos quais o bárbaro vira serem torturados por outros guardas, na
cidade nemédia mais próxima.
Mas, atraído pela beleza daquela jovem esbelta, de cachos dourados e
cheirando a óleo de jasmim, Conan derruba aqueles guardas um a um, com socos em
suas nucas e ventres, fazendo-os caírem inconscientes ou mortos ao chão. Os olhos
azuis da garota transbordam de alívio, quando esta sorri para ele e lhe beija
os finos lábios fortes em gratidão.
- Qual o seu nome? – ofega a jovem, falando o Nemédio com sotaque
brituniano.
- Sou Conan, um cimério. Por que esses homens estavam lhe batendo?
- Por Mitra, Conan... Eles queriam que eu os amasse gratuitamente...
- Você é uma prostituta, então? – o jovem pergunta, com um brilho de interesse
nos vulcânicos olhos azuis, e sem ter conseguido ouvir, em meio à confusão de
sons daquela cidade, o que os guardas perguntavam a ela.
- Sim, o meu nome é Célia; sou da Britúnia e estou ao seu dispor... em
troca de ouro – ela sorri, piscando o olho.
Com um sorriso largo, o musculoso jovem moreno ergue a bela loira nos
braços e a carrega para a luxuosa taverna pela qual passara rapidamente.
* * *
A beldade de seios médios e olhos azuis não havia cobrado dinheiro
algum adiantado pela relação sexual, mas engana o bárbaro com vinho drogado –
fazendo-o dormir, roubando-o durante o sono e não fazendo a parte dela na
negociação com o cimério.
Quando Conan acorda, já está a vários quarteirões dali, em outro local
da cidade, onde o deixaram para que não se vingasse da jovem prostituta – a
qual implorara para que não matassem o bárbaro inconsciente. Frustrado, meio
zonzo, com a cabeça dolorida e sem lembrar o caminho para a luxuosa taberna
onde esteve – e, claro, sem uma só moeda consigo –, o cimério desiste de se
vingar. Ele está faminto e com sede, e precisa de dinheiro.
Assim, alguns minutos depois, o bárbaro adolescente se esconde num beco
escuro, ao avistar um homem gordo e bem-vestido passar pela ruela adjacente.
Quando o corpulento nobre, de coloridas roupas de seda, passa ali perto, o
cimério o faz desmaiar com um murro na cabeça. Levando todo o ouro do homem,
Conan vai à taberna mais próxima – um estabelecimento mais modesto, e por isso
mais confiável que o anterior. Sem que o cimério saiba, ele está sendo
observado por uma pequena figura esguia.
Lá, enquanto come pão e carne, e bebe cerveja, o bárbaro é abordado por
uma bela e jovem prostituta suada, de cabelos castanhos, rosto sorridente e
grandes seios firmes. Excitado pelo odor forte e seios fartos que ela tem, ele
decide levá-la para um dos quartos locais.
- Mas com uma condição... – diz Conan, com um desconfiado sorriso de
lobo – Só pago depois de ir para a cama com você... e nada de beber antes
disso!
Enquanto isso, a mesma figura, de corpo magro e baixa estatura, que
avistara o cimério no beco, adentra a taberna. É um homem de cabelos e olhos
escuros, pele alva como cera e roupas luxuosas de seda e cetim.
***
Na penumbra do quarto, com a jovem já despida e montada em seu falo
ereto, o despido bárbaro das colinas se excita ao ver o balanço daqueles
volumosos seios alvos e os suga sofregamente durante a relação sexual. Ao
fazê-lo, Conan percebe que o cheiro de suor está ainda mais forte nas
mal-raspadas axilas da prostituta; e, mais excitado ainda, ele as lambe e suga,
espetando a própria língua nos curtos pêlos dos sovacos da jovem e engolindo o
suor salgado dela, ao mesmo tempo em que atinge o orgasmo. No momento seguinte,
a garota – cujas aréolas róseas estão sendo novamente sugadas – geme para o
bárbaro que a possui. Possuído como está pelo êxtase de prazer, Conan não sabe
se o clímax dela é tão verdadeiro quanto o dele próprio, ou se é fingido como o
da maioria das prostitutas. Mas este detalhe pouco o incomoda. Ela fez a sua
parte no trato e, minutos após o orgasmo, o jovem bárbaro faz a parte dele,
pagando à prostituta o ouro prometido.
***
- O jovem amigo se importa, caso eu lhe pague alguns copos de vinho,
com o pouco dinheiro que me sobra? – pergunta o jovem nobre, após Conan ter
saído do quarto, e se dirigindo à mesa diante da qual o cimério bebe.
Desconfiado, o bárbaro olha, de cima a baixo, o rapaz franzino que
apareceu subitamente ali. Com feições delicadas, baixa estatura, e cabelos e
olhos pretos, aquele jovem lembra um picto. Mas sua pele branca, roupas de seda
e corpo magro nada têm a ver com os ferozes habitantes das selvas a oeste da terra
natal de Conan. Estranhando a presença de um homem com aquelas roupas suntuosas
num recinto tão modesto, o bárbaro indaga, falando o Nemédio, com um sotaque
indefinível para o jovem magro:
- Quem é você e o que deseja?
- Meu nome é Aztrias Petanius, e fiquei bastante admirado com a maneira
como roubaste aquele rico mercador, algumas ruas atrás. Foste de uma sutileza
digna de Taurus, o Príncipe dos Ladrões...
Conan se sobressalta.
- Você é parente ou amigo daquele nobre? Se for, pode chamar quantos
homens quiser contra mim, que eu acabo com todos eles e ainda lhe arrebento o
crânio! – responde ríspida e perigosamente o cimério.
Aztrias cobre a boca, para disfarçar um sorriso:
- Não tenho nenhuma amizade ou parentesco com aquele imbecil, meu caro
forasteiro. O meu problema é o seguinte: preciso de alguém para roubar algo
para mim. Preciso de uma taça de diamantes zamorianos, para pagar as dívidas
que possuo. Irei lhe recompensar regiamente.
Conan abaixa a caneca de vinho – paga por Aztrias – e olha fixamente
para o jovem nobre.
- Como irá me recompensar, se está endividado? – pergunta o cimério.
- Sou sobrinho do governador desta cidade. Falarei sigilosamente com
meu tio, depois que você fizer sua parte. Antes que pergunte, o dinheiro que
meu tio possui não é suficiente para as minhas dívidas, mas creio que o será
para lhe recompensar. Ou, se preferir, lhe dou uma parte dos diamantes como
recompensa. Mas... qual é mesmo seu nome?
- Sou Conan, um cimério – ele responde pela segunda vez naquela noite.
Aztrias faz uma breve pausa, levemente pensativo:
- Você então é daquela terra ao norte da Aquilônia e Reino da
Fronteira... Pois bem, Conan... – prossegue Aztrias, tirando do bolso um papel
dobrado e estirando-o sobre uma parte seca da mesa – O objeto fica no Templo de
Kallian Publico, cuja planta está neste mapa, e é neste aposento que você irá
procurá-lo...
Epílogo: Mas, ao ser encontrado junto ao cadáver de Kallian, Conan é injustamente
acusado de tê-lo assassinado. Ao invés de inocentá-lo, Aztrias afirma, diante
das autoridades presentes, não conhecer Conan, e é morto pelo cimério. Após a
guarda nemédia fugir do templo, aterrorizada pelo que possa ter matado o dono
do local, Conan se depara com o assassino de Kallian e o mata – e,
aterrorizado, o bárbaro foge logo depois disso... pois o verdadeiro matador de
Kallian Publico era uma serpente com cabeça humana (O Deus na Tigela/ http://cronicasdacimeria.blogspot.com/2009/06/o-deus-na-tigela.html).
A seguir: O Poço de Skelos.