A Atlântida Imperial

(por Al Harron e Deuce Richardson)


Os khemitas migraram de Mu, num período muito antigo, para o Continente Sem Nome. Lá, eles se instalaram e prosperaram. Finalmente, alguns saíram para “Kaa-u” (o futuro Caribe). Lewis Spencer era muito inflexível sobre esta região ter sido parte da esfera cultural atlante (à qual ele chamava de “Antillia”). Nesse meio tempo, uma facção de khemitas – possíveis exilados – se estabeleceu na costa sudeste da Ásia. Lá poderia muito bem já ter colônias muvianas dispersas ao redor. Em algum momento, Mu afundou. Isto foi bem antes do Grande Cataclismo (e de Kull). Parece que, o que poucos remanescentes haviam deixado do reino muviano foi tomado pelos bárbaros lemurianos do arquipélago ao norte (embora os homens dos Mares do Sul ainda fossem chamados “homens de Mu”). Aparentemente, havia um pouco de sangue muviano na casa real lemuriana, porque Ishtar era branca (Churchward disse que a “raça governante” de Mu era branca). De qualquer forma, a Lemúria começa colonizando toda a costa norte do Continente Sem Nome. Isto parece ter sido após a era de Kull. Os antillianos (os “homens de Kaa-u”) resistem aos lemurianos (possivelmente com ajuda picta), mas as cidades continentais khemitas caem. A subjugação dos khemitas continentais produz uma onda de refugiados dentro das ilhas de Kaa-u. Várias tentativas de retomar o continente falham. As ilhas agora estão completamente cheias de guerreiros fortalecidos. Surge um líder. Ele fala da Atlântida.

Os homens de Kaa-u têm suprido os Sete Impérios e a Valúsia com arqueiros mercenários, durante séculos (a raça khemita parece ter uma predisposição genética para o arco-e-flecha). Eles souberam da Atlântida, a qual fora erguida para um estado elevado de barbarismo desde a época de Kull. A Atlântida Meridional, a parte mais rica, havia estabelecido relações cordiais com Farsun. Nova riqueza exacerbou tensões tribais. Um pequeno rei exilado (mais do que um pouco louco) havia fugido para Kaa-u, tendo escutado que lá só havia mercenários, desejando lutarem por pilhagem e um pouco mais. Ele encontra um chefe de batalha, chamado Ka-nor, desejando retornar novamente (com a filha do pequeno rei incluída por uma boa medida). Ka-nor sabe que ele não tem a quantidade de pessoas que gostaria para pôr o assalto em ação. Ele percebe que toda uma tribo picta havia sido exilada pelo culto a Xultha (“Gullah”, na língua picta). O chefe picto (e seu sacerdote de Gullah) se baba um pouco, ao ser informado da pilhagem e sacrifícios que os aguardam na odiada Atlântida, se eles simplesmente seguirem o estandarte (e ordens) de Ka-nor. O sacerdote de Gullah também sabe de adoradores atlantes de Xultha, os quais estão dispersos e que poderiam ser úteis na invasão.

O plano é atacar em duas frentes ao mesmo tempo, mas primeiro é necessário um cálculo do ataque-surpresa em massa. O pequeno rei Dem-rud, e uma pequena frota de incursores, devem primeiro atacar a costa do extremo noroeste de seu (quase totalmente litorâneo) reino. Isto desviará toda a atenção, tanto quanto possível, do verdadeiro ponto de ataque. Dem-rud e sua frota retornam. Os pictos são mandados para a costa noroeste do reino de Dem-rud. Eles atacam, ocupando uma cidade costeira e seu posto (com ajuda interna).  Enquanto o rei atual acelera tropas para enfrentar os pictos, Ka-nor desembarca uma força ao sul. Har-al, o rei atual, é um general hábil e um veterano enfrentador de pictos. Ele entra em cena mais rápido que o esperado. Alguns navios pictos são queimados, e a força ocupante é pega numa armadilha, até que os pictos posteriores (velhos amigos piratas do chefe; eles eram sua garantia) chegam depois para o bando. O chefe e seus guerreiros conseguem escapar com os reforços pictos. Logo, Har-al ouve sobre o desembarque de Ka-nor, que está consolidando sua cabeça-de-ponte no sul. Há rumores de que ele possui uma arma antiga, de grande poder.

Har-al força a marcha para o sul. Ele sabe que rumores sobre o “talismã” estão debilitando o moral de seu exército. Ele decide por um ataque imediato. Os batalhões de Ka-nor marcham contra ele. O “talismã” (e os arqueiros) provoca destruição, mas os guerreiros atlantes resistem firmemente. Logo, Har-al contra-ataca. Ka-nor (um dos poucos combatentes montados) perde seu cavalo para berserkers atlantes (ou “atlantes enlouquecidos” – Nota do Tradutor), e Har-al se dirige para a matança. Uma chuva de flechas negras... e Har-al cai com uma flecha picta no olho. Os Homens das Ilhas do Sol Poente retornaram. O chefe picto e seus aliados piratas haviam desembarcado mais para oeste e marchado sobre a terra, ajudado pelos atlantes adoradores de Xultha. A intervenção deles e a queda de Har-al transformam a batalha em tumulto. Os pictos ficam loucos por sangue. Sacrifícios a Xultha/Gullah são feitos em meio ao sangue constantemente derramado. Ka-nor, levemente ferido, reagrupa suas forças, toma atlantes como reféns e se retira para o forte de madeira que seus homens haviam erguido em seu primeiro desembarque. O chefe picto exige uma indenização para salvar a vida de Ka-nor. Ele afirma que seu povo precisa de um novo lar, e que a Atlântida é tão boa quanto qualquer um. Ka-nor se empenha para ajudar o chefe a retomar a cidade do noroeste e o campo ao redor. O chefe e sua tribo dominarão aquela terra, e qualquer terra além das fronteiras do reino de Ka-nor à qual possam conquistar. Eles próprios governarão, mas devem fornecer tropas, caso convocados. Os pictos concordam. Dem-rud, ouvindo tudo, fica pálido. Ka-nor ordena que ele seja preso, e chama por um sacerdote atlante de Valka. Ainda em sua armadura manchada de sangue, Ka-nor se casa com a filha de Dem-rud, A-vah.

Ka-nor consolida impiedosamente o poder. Ele usa a “ameaça picta” (e seu casamento com A-vah), para forçar os remanescentes da aristocracia do pequeno reino a coroá-lo rei. Ele também manda saques como presentes aos reinos a leste. Uma nova esquadra chega de Kaa-u. Usando isto, ele ajuda os pictos a tomarem seu novo “lar” (o norte ainda resistia ao seu novo e “legítimo” rei). O chefe picto já havia começado a chamar mais exilados pictos e aventureiros “filhos mais novos” para ajudar a expandir seu território. Usando de suborno, feitiçaria (e a “quinta coluna” de adoradores de Xultha), Ka-nor consegue evitar que seus (sempre rebeldes) inimigos se aliem contra ele. Ele também encoraja seus vassalos a aprenderem o estilo picto de combate montado (a cavalaria, que nunca foi uma forte tradição em Kaa-u). Na época da morte de Ka-nor, sua máquina de guerra possuía soldados altamente treinados e endurecidos na guerra, em toda disciplina militar: arqueiros, infantaria, marinha de guerra, cavalaria e engenheiros de guerra (e feiticeiros). Ele deixou para o filho um reino, que alcançara mais que o dobro do tamanho desde o primeiro ano da conquista inicial.

Os pictos não ficaram inativos. Foram bem menos inovadores e tiveram que recorrer ao total extermínio em suas conquistas, mas eles lentamente empurraram as fronteiras de seu “principado” para norte e leste. Nesse meio tempo, os “antillianos” estavam se fortalecendo. Eles conseguiram fomentar discórdia de um lado a outro do continente insular (nunca algo difícil de fazer entre atlantes ou seus descendentes). Eles haviam conseguido transformar a “Atlântida meridional” num eixo maior de comércio (escravidão, produtos de feitiçaria, mercenários e produtos do Novo Continente). Antes que muitos atlantes étnicos percebessem, os “antillianos” controlavam metade do continente. Neste ponto, a situação política ficou mais-ou-menos estável. Surgiram líderes entre os “atlantes livres”. Muitos não viram esperança verdadeira de tomarem de volta as terras (de outras tribos) que perderam. Houveram aqueles que, relembrando a história “antilliana”, decidiram tirar uma página do livro de seus inimigos. Commoria, sempre um estado “dama de honra”, convidou mercenários do Norte da Atlântida. Dentro de poucas gerações, os atlantes eram a “casta de guerreiros governantes” na Commoria. Esta infusão de vigor bárbaro permitiu à Commoria começar a se expandir às custas de seus vizinhos. Logo, nobres descendentes de atlantes estavam enfrentando “feoderati” picto-valusianos (e arqueiros “antillianos”). O antigo feudo continuou (como o seria por milênios).

Enquanto isso, o “Império da Atlântida” (como os descendentes de Ka-nor gostavam de chamar seus domínios) estava se expandindo para toda parte possível. O “Lorde Vestido na Escuridão”, Príncipe Id-Warrad, havia expandido o domínio “atlante” para dentro das Ilhas Antilhas (Mogar e Bal-Sagoth foram notáveis postos). Só sobrou para o Rei Amarikh, seu reinado nas Ilhas inatacável, exceto pelo pequeno problema dos ilhéus rebeldes (“Nenhum rei governará estas ilhas, exceto aquele que tenha ascendência khemita de ambos os lados por cem gerações”), para pôr sua “bola” em jogo dentro das cortes sagradas de Kaa-u. Amarikh invadiu e obteve uma vitória quase miraculosa. A nobreza de Kaa-u foi quase exterminada. Amarikh se casou com a filha do rei de Bal-Sagoth. Através de casamentos e intrigas, o Império Atlante desfrutou, por um tempo, do controle direto da antiga capital farsuniana de Tartessos.

O Império Atlante nunca foi fundado somente através da conquista. O comércio era usado para procurar pontos fracos, assim como lucros. As tropas do Império Atlante sempre se mantinham afiadas, ao enfrentarem “rebeldes nativos” ao Norte. Por fim, o comércio com seus primos nos “domínios Khari” revelou uma fonte de trabalho escravo disponível nas ilhas ao sudeste do continente thuriano. Estas ilhas foram usadas para assentar a colônia ultramarina de Negari. O maior obstáculo eram os maciços e ferozes hominídeos “Zemba”, cuja civilização dominava a parte mais baixa do “Continente Meridional”. Até mesmo o Império Atlante decidiu não desafiar os Alados da costa ocidental. Contudo, entrepostos “atlantes” existiam em todos os continentes habitáveis (a Austrália era simplesmente um vasto arquipélago na Era Thuriana).

Os atlantes étnicos continuaram lutando uma batalha perdida contra um inimigo de grandes recursos – sobrenaturais e mundanos. Muitos, chamados “Gansos Selvagens” por seus parentes obstinados, já haviam fugido para o continente ou invadindo-o. A Commoria havia sido inundada pela invasão e se tornado, simplesmente, uma colônia atlante.

Enquanto isso, os pictos atlantes haviam se tornado incômodos demais para o gosto de seus lordes “atlantes”. Invejosos de seus direitos, os pictos “atlantes” nunca se uniram de verdade Império adentro. O Imperador atlante Sheh-mas (que se orgulhava de ter um pouco de sangue picto) decretou uma “União das Coroas”. Os pictos se revoltaram, foram massacrados e, depois disso, resolveram abandonar a “Terra com Cetro”. Contudo, isto não foi antes de um xamã picto pronunciar uma maldição eterna sobre todo o continente insular. Os refugiados encontraram um lar no sudoeste de Thule, onde foram fixados como um “pára-choque” entre atlantes (de qualquer crença) do oeste e leste, e valusianos (incluindo seus antigos parentes) do sul.

Os khemitas, como raça, eram predispostos tanto à feitiçaria quanto à guerra (talvez esta seja a razão para sua saída de Mu). À medida que os séculos passavam, os imperadores da “Atlântida” buscavam acrescentar ou corrigir qualquer defeito dentro de suas forças armadas, através de pactos com os “Grandes Velhos Sem Nome”. Nós sabemos que os “reis da Atlântida” lutaram com “falsas blasfêmias” que emergiam dos mares mais profundos. Em nenhum lugar, nos relatos do tempo, Poseidôn é mencionado como relacionado à Atlântida. Aparentemente, esta falta de veneração levou Poseidôn lentamente a inundar a Atlântida (e a Lemúria, também). Muitos atlantes étnicos fugiram para o continente. Contudo, houveram atlantes, muitos dos quais haviam nascido sob o jugo da “Atlântida Imperial”, os quais se recusaram a deixar sua terra. Estes poucos fizeram um pacto com Poseidôn (“Valka/Nodens”?), e expulsaram os “filhos de Kaa-u” de suas praias. Estes foram o povo (de pele clara e cabelos negros) que nomeou sua terra, aquela remanescente meridional da Atlântida, de “Poseidonis”. Mais tarde, eles voltaram a adorar Tolometh. Enquanto isso, de volta à “velha província” de “Antilia”, as antigas maneiras ancestrais continuaram (de acordo com Clark Ashton Smith e Spence).



Tradução: Fernando Neeser de Aragão.


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