(por Fernando Neeser de
Aragão)
Introdução:
O Rei Yezdigerd ordena a um de
seus comandantes, Jehungir Agha, que arranque aquele espinho bárbaro de suas
costas de uma vez por todas. Jehungir atrai Conan – agora um líder kozak – até
a ilha de Xapur, para um encontro com a escrava chamada Octávia. Mas os planos
dão errado. Chegando antecipadamente, Conan fica surpreso ao descobrir que a
antiga fortaleza-palácio de Dagon da ilha tenha sido restaurada por magia, e
que agora é presidida por Khosatral Khel, um ser monstruoso feito de ferro
vivo. Ele derrota a coisa-deus quando ele consegue a lâmina de um sacerdote
yuetshi que derrotou Khosatral Khel eras atrás – e aproveita para matar
Jehungir Agha. Conan, apaixonado por Octávia, jura queimar a cidade turaniana
de Khawarizm para que se torne a tocha que iluminará o caminho dela até sua
tenda (As Muitas Faces da Morte – site http://cronicasdacimeria.blogspot.com/2006/06/as-muitas-faces-da-morte-devil-in-iron.html
/ O Demônio de Ferro – Conan O Cimério Vol. 2, Ed Conrad).
1) Gostislav
de Zaporoska
“Ó, Fortuna! És como a lua mutável.
Ora aumenta, ora diminui a vida detestável.
Ora escurece, ora clareia a mente por
brincadeira,
Miséria e poder – ela os funde como gelo!”
(Autor
desconhecido)
O dia amanhece nas estepes a oeste de Turan...
- Saia daí, Gostislav! – grita um general, líder de um destacamento de
dez turanianos. – Abra a porta dessa choupana, em nome do Rei Yezdigerd de
Turan!
- O que querem de mim? – Gostislav responde, enquanto sai armado de sua
cabana, cercada por aquela desolação de estepes, e agora por algo ainda mais
desolador que a própria vegetação local.
- Queremos Conan, o cimério, o maior líder dos kozakis.
- Se eu informasse, ele me mataria – responde o zaporoskano aos homens
de elmos dourados e malhas de aço. – E, mesmo que ele não me matasse, eu jamais
trairia um amigo meu aos vermes de Turan!
A resposta dos turanianos é uma flechada certeira na testa de
Gostislav. Em seguida, o general, de nome Bashak, manda atear fogo na cabana do
aldeão morto e procurarem pela esposa e filho do zaporoskano.
Filho de um renegado hiperbóreo – do qual herdara o nome – com uma camponesa
turaniana, o recém-assassinado Gostislav estava acostumado à pobreza desde o
berço; e, nas épocas de penúria – quando a colheita ia mal e não havia nenhum
animal para comerem –, ele e sua família eram sustentados apenas pelos
mantimentos e dinheiro que Conan lhe fornecia periodicamente.
- Quero ver se Conan lhe ressuscita, Gostislav! – gargalha Bashak.
Súbito, uma flecha atinge a testa de um dos turanianos. Os soldados de
elmos dourados olham ao redor e se vêem cercados por centenas de homens – a cavalo
como eles, e igualmente vestidos com roupas de seda, mas usando turbantes sem
elmos sobre suas cabeças e calçando botas de couro com acabamento dourado, além
de adagas embainhadas em marfim nos seus quadris esquerdos, ao lado das bainhas
de couro onde ficam suas espadas curvas.
- Não ressuscitarei meu leal amigo, pois não sou feiticeiro; mas nenhum
de vocês verá novamente a luz do dia! – grita furiosamente o agigantado líder
deles, na língua turaniana, com um sotaque único e inconfundível. Os turanianos
lançam suas flechas, mas só conseguem matar meia dúzia daqueles cavaleiros. A
saraivada é devolvida, matando cinco dos nove turanianos restantes. Bashak
consegue fugir, mais por sorte que por habilidade, e os três soldados restantes
são mortos por Conan e outros dois kozakis, que saltam de suas selas,
derrubando os turanianos de seus cavalos antes que estes possam desembainhar
suas cimitarras, engalfinhando-se com eles no chão e cortando-lhes as gargantas
com facadas ou golpes de espada.
Erguendo-se sobre os cadáveres morenos, de malhas de aço e roupas de
seda, Conan ordena que a maldita bandeira real do Lobo Branco de Turan, assim
como os corpos daqueles que a carregaram até lá, seja lançada ao próprio fogo
que os turanianos atearam na casa do leal Gostislav.
- Vamos encontrar a viúva e filho do nosso amigo, e dar a eles um novo
lar, em algum lugar do Zaporoska. – E, voltando-se sorridente para uma bela
jovem alta e loira, de olhos cinzas, na garupa de seu cavalo: – Agora, vamos
cumprir a promessa que fiz para Octávia da Nemédia! Transformaremos Khawarizm
numa tocha, para iluminar nosso caminho até minha tenda!!
Na verdade, o cimério e a nemédia já haviam passado uma noite de amor
numa tenda improvisada, no longo caminho entre Xapur e o acampamento de guerra
kozak. Após alcançarem o acampamento – oculto numa selva pantanosa, emaranhada
de juncos, a qual constitui as terras baixas do Rio Zaporoska –, Conan havia
convocado metade dos seus kozakis para cumprir sua promessa à ex-nobre e
ex-escrava loira.
2) Khawarizm!
“Nebulosa e velada; a mim também contagias.
E agora, por brincadeira,
Entrego o dorso nu à sua celeridade...”
(Autor
desconhecido)
A infeliz viúva de Gostislav e seu filho órfão já haviam sido
encontrados, e uma nova casa lhes fora dada, numa aldeia às margens do
Zaporoska; e a relutante Octávia fora levada, também em segurança, para o
acampamento dos kozakis de Conan.
Seguindo para o sul, o hetman
cimério e seus homens alcançam, em menos de uma semana, a fronteira de Turan,
onde fica Khawarizm. Os kozakis, que atacam e matam impiedosamente os soldados
turanianos nas muralhas, precisam de comida. Os defensores turanianos dos muros
da cidade – poderosos arqueiros, com elmos pontudos e capas de pele de tigre –
vão sendo afogados pelo peso dos números do Povo Livre, em quantidade muito
maior. Assim, embora matando muitos kozakis com flechadas, os turanianos morrem
às centenas, caindo com setas cravadas em suas testas, olhos e pescoços.
Junto com as flechas, os saqueadores das estepes trazem a notícia da
morte de Jehungir Agha, para pavor da nobreza e do velho conselheiro Ghaznavi,
o qual se esconde assustado dentro do palácio. Quando não há mais guardas para
defenderem as muralhas de Khawarizm, dois kozakis que ali se infiltraram, dias
antes, disfarçados de mercadores, cortam as gargantas dos dois guardas
restantes daquele muro, no lado de dentro do portão, e pegam-lhes as chaves.
Agora, ninguém mais é capaz de deter o avanço dos salteadores das estepes. À
frente deles, Conan repete a ordem:
- Poupem as mulheres e crianças!
O povo oprimido da cidade se rejubila ao ouvir aquela ordem e, sem mais
temerem os kozakis, eles atacam os soldados por trás com armas improvisadas. Os
guardas restantes do palácio abandonam a própria moradia do falecido Jehungir
Agha, para deterem o avanço daquela maré de cavaleiros, mas são engolidos pela
superioridade numérica e habilidade guerreira dos homens sob o comando do único
hetman cimério daquelas estepes.
Agora que acabaram as flechas kozakis, Conan investe na vanguarda, talhando
dois cavaleiros turanianos num só golpe de sua cimitarra. O primeiro cai com um
corte profundo e fatal no peito encouraçado, e o segundo com a garganta aberta.
Um moribundo arqueiro turaniano ainda consegue se apoiar num dos cotovelos e,
antes de morrer definitivamente, acertar uma flecha certeira na barriga do
corcel de Conan. Enquanto a montaria cai, moribunda e relinchando de dor, o
cimério aterrissa como um enorme felino, e, ao ver outro turaniano investir a
cavalo em sua direção, agarra as rédeas da montaria do mesmo e, com sua força
estupenda, derruba cavalo e cavaleiro sobre o chão. Antes que o montador
consiga tirar a perna de baixo do cavalo, seu crânio é rachado, com elmo e
tudo, por um giro sangrento da cimitarra do hetman
cimério, o qual derrama sangue e miolos sobre o chão.
Outro turaniano investe contra um dos kozakis – o líder dos arqueiros,
chamado Kitrus –, tentando lhe decepar a cabeça, mas o saqueador se esquiva e,
ao se levantar, enfia sua espada entre o pescoço e o queixo do soldado
citadino.
Enquanto isso, Conan da Ciméria cruza espadas com o general das tropas
palacianas – um dos últimos turanianos a oferecer resistência aos kozakis. Num
redemoinho de lâminas, as cimitarras se unem e separam, circulando em arcos
brilhantes capazes de confundir a visão de quem tente segui-las com o olhar. Em
pouco tempo, quem leva vantagem é o cimério, golpeando seguidamente o elmo, a
espada e a armadura do turaniano. Instantes depois, o general é levado ao chão
pelo ritmo implacável da cimitarra do líder kozak, o qual golpeia de forma
ininterrupta como um ferreiro com seu martelo, até finalmente afundar a espada
na armadura e coração do general turaniano.
Ao perceber que a lâmina de sua já bastante usada cimitarra se quebrou
dentro do cadáver do general, Conan pega o sabre do turaniano morto e olha ao
redor. O único sinal de guardas turanianos ali é no mercado de escravos, onde
mulheres de vários países e nações – Britúnia, Stygia, Zamora, Kush e Shem –
são vendidas por três pequenas moedas de prata cada uma.
- Libertem as escravas! – brada o líder cimério – E levem somente as
que quiserem ir com vocês! Poupem quem estiver desarmado, e só matem quem
tentar nos matar! – ele acrescenta, incitando, logo depois, o povo pobre e
oprimido da cidade a continuar se rebelando contra a quase derrotada nobreza.
Pouco depois, tanto o povo quanto os kozakis começam a se apoderar da comida,
abandonada pelos comerciantes desguarnecidos, ao mesmo tempo em que algumas das
escravas libertadas correm, sorridentes, até os braços de alguns saqueadores a
pé, ou pulam sobre as garupas dos cavalos de outros homens do Povo Livre.
Para evitar abusos e covardias, Conan da Ciméria só havia permitido a
entrada de 60 dos seus 10 mil kozakis na cidade. A maioria ficou do lado de
fora, demolindo os muros de Khawarizm e permitindo a fuga de gente desarmada.
Mas, embora a maioria do exército de Conan lute para se apoderar dos
estábulos e armazéns, havia alguns, nas fileiras kozakis, que haviam decidido
se aproveitar da incursão para satisfazerem apetites mais baixos.
Desse modo, dois kozakis a cavalo perseguem uma mulher velada a pé, num
beco não muito distante. Ela tropeça e cai; os dois cavaleiros desmontam e
agarram a turaniana. Esta se debate, com o rosto avermelhado de vergonha, quando
um deles lhe arranca o véu.
- Rosto lindo, o desta vagabunda! – diz um deles, com um sorriso
malicioso.
O rosto avermelhado da mulher fica arroxeado por uma vergonha ainda
maior, quando o outro kozak lhe arranca a parte superior do vestido, desnudando
os seios morenos da bela plebéia. Ela é deitada à força no chão, pelo kozak que
a agarrara.
- Segure-a! Ela se debate igual a um peixe...
No momento seguinte, contudo, uma grande mão bronzeada agarra o
pretenso estuprador pela parte posterior da gola e o lança, de ponta-cabeça,
contra uma parede de barro, deixando-o inconsciente.
- Seus cães zaporoskanos! – grita o homem que o derrubou – Ela é uma
camponesa, e não uma meretriz hiperbórea.
O outro kozak sorri sem jeito, ao reconhecer seu líder Conan, mas este
também o nocauteia, arrancando-lhe alguns dentes num jato de sangue que lhe sai
da boca, devido a um poderoso murro no queixo.
O cimério sai do beco, arrastando os dois quase-violadores até a praça
central, onde seus homens o aguardam.
- Zitlos! – brada o líder – Acorrente estes homens e deixe-os sem
comida por alguns dias. Vejamos se alguns dias com a barriga roncando tiram a
idéia de estupro das mentes deles.
- Sim, chefe! – responde o coríntio – Não há mais guardas aqui.
Khawarizm é nossa. – ele acrescenta, enquanto vai cumprindo as ordens de Conan.
- Ótimo! Agora, vamos embora daqui. – e, elevando a voz para a
população pobre que os ajudou a tomarem a cidade: – Sigam-me os que forem
inimigos do infame Rei Yezdigerd!
No momento seguinte, outros kozakis arrastam até Conan membros
assustados da nobreza – dentre eles, o conselheiro Ghaznavi.
- O que faremos com esses janotas, chefe? – pergunta um zamoriano.
- Deixem-nos viver, para contarem ao Rei Yezdigerd o que os kozakis de
Conan fizeram aqui. – responde o cimério, com um sorriso largo no rosto
cicatrizado, e com os dedos penteando para trás os cabelos negros.
Assim – com uma quantidade maior de seguidores e mulheres do que quando
chegaram – os salteadores das estepes partem de Khawarizm sob o comando do
agigantado hetman, deixando para trás
uma cidade com muralhas destruídas, nobreza arruinada e assustada, e palácio e
jardins reais pegando fogo, como se fossem uma tocha gigantesca.
* * *
Uma semana se passou desde o ataque a Khawarizm. É festa no acampamento
kozak, ao qual os membros daquele bando do Povo Livre finalmente retornam.
Gargalhadas e canções picantes ecoam pelo local. Durante o dia, as ex-escravas
usaram os cereais roubados de Khawarizm para fazerem pães. Os homens, por sua
vez – liderados por Conan –, caçaram e mataram um bode. Um boi inteiro está assando
numa fogueira, enquanto o bode acaba de ser cozido, com condimentos turanianos
e água salgada, e servido em pequenos pedaços para cada um, como aperitivo,
junto com a cerveja – um copo para cada kozak.
Em seguida, a carne de um boi é destrinchada, e todos comem e bebem à
vontade. Enquanto isso, na tenda do hetman,
Conan e Octávia – que já haviam comido e bebido antes de todos os kozakis –
começam a se despir. O cimério e a nemédia já estão seminus quando se beijam. Saber
que, por baixo dos largos calções de seda do hetman não há mais nada além de pele, deixa a ex-nobre excitada; e
ela já percebera, na sua primeira noite com Conan, que ele era bem mais
carinhoso que o canalha turaniano chamado Jehungir Agha – e muitíssimo mais do
que o animalesco Jelal Khan, de cujo castelo a nemédia fugira para a ilha de
Xapur, vários dias antes. A loira pega a forte mão calejada do bárbaro e a
pressiona contra o próprio rosto. Ao mesmo tempo, a outra mão do cimério apalpa
um dos firmes seios fartos da nemédia.
Com sua borrascosa paixão bárbara, Conan beija selvagemente os olhos,
boca, bochechas, pescoço e seios de Octávia, fazendo-a novamente arquejar e
gemer de prazer e desejo. Sentindo o desejo urgente em suas entranhas, e já
vendo o cimério totalmente nu, a loira nemédia tira sua única peça restante de
roupa – um longo véu a lhe cobrir a dourada mata pubiana –, puxa Conan em sua
direção e sente o peso do musculoso hetman
sobre o dela. Sorrindo de prazer, e cada vez mais excitada com a penetração e o
vaivém das genitálias, Octávia pressiona sua cabeça loira lateralmente contra a
dele, inspira o cheiro selvagem dos ainda curtos cabelos negros do homem que a
possui e novamente percebe como a excitação toma conta de ambos, cada vez mais,
até que, num momento que mais parece uma eternidade, os dois explodem de
prazer, quando o desejo alcança o ápice em suas genitálias palpitantes, corpos
suados e almas possuídas pelo orgasmo.
O cimério e a nemédia já estão na metade da sua segunda relação sexual,
quando os kozakis que têm companheiras finalmente se recolhem às suas tendas
com elas, enquanto os membros solitários do Povo Livre continuam gargalhando,
comendo, bebendo e revezando turnos de vigia pelo acampamento.
3) Massacre
nas Estepes
“A sorte na saúde e na virtude
Agora me é contrária.
Ela dá, ela tira,
Sempre me mantendo escravizado.
Nesta hora, sem demora,
Tange a corda vibrante;
Porque a sorte abate o forte.
Chorai todos comigo”.
(Autor desconhecido)
Mais uma semana se passou. Após aquela noite de amor com Conan, Octávia
se tornou uma das mulheres prediletas do serralho do cimério, juntamente com
Simza de Zamora e Alba, da Britúnia.
O dia amanhece nas estepes às margens do Zaporoska. No alto de uma
inclinação não muito íngreme, Conan e seus saqueadores avistam uma caravana
turaniana passando lá embaixo. A um comando do hetman, os kozakis descem a inclinação, prontos para atacarem
aquela caravana. Ao se aproximarem, contudo, são recebidos por uma saraivada de
flechas. No momento seguinte, os toldos dos vagões se abrem, revelando soldados
turanianos, ao mesmo tempo em que outros guerreiros de Turan avançam por trás,
cercando os cavaleiros, os quais haviam percebido estarem numa armadilha ao receberem
a chuva de setas.
À outra ordem do líder cimério, as flechadas são devolvidas às
centenas. Um coríntio abre, num único golpe, a garganta de um dos turanianos,
somente para ter o próprio pescoço perfurado por uma flecha.
De longe, o cimério vislumbra o Rei Yezdigerd, ordenando a seus
próprios generais que avancem contra o já encurralado Povo Livre. Embora o
cimério nunca tivesse visto o rei de Turan pessoalmente, as descrições, feitas
a ele por kozakis, zuagires e zamboulanos, eram exatamente iguais ao que ele
avista agora.
- Uma emboscada! – diz Conan. – Kitrus, assuma o comando dos arqueiros!
Zitlos, me acompanhe! Por Crom, mostraremos a estes bastardos hirkanianos como
o Povo Livre das estepes luta!! – o cimério acrescenta, impelindo sua montaria
à frente de seus comandados, e partindo, até o pescoço, o crânio de um dos
turanianos.
Flechas voam de ambos os lados, e tanto kozakis quanto turanianos
morrem às dezenas nos primeiros minutos da batalha. Mesmo em meio ao som de
gritos, golpes e relinchos, e mesmo talhando crânios, cabeças e membros
turanianos, o hetman cimério percebe
a pequena inferioridade numérica dos turanianos.
O shemita Esrom estoca o coração de um turaniano a pé, ao mesmo tempo
em que o líder kothiano dos arqueiros ordena que atirem mais intensamente na
cavalaria de Turan.
- Podemos derrotar estes porcos hirkanianos, se continuarmos atacando
constantemente! – ele diz.
Contudo, o som de outra trombeta, tocada pelo general Bashak, a mando
de Yezdigerd, traz outra legião de turanianos até os kozakis.
Avistando o rei de Turan, no alto de uma aresta, ao lado de Bashak,
Conan grita, enfurecido:
- Yezdigerd, seu cão covarde! Enfrente-me, se você for homem!
O rei de Turan se limita a sorrir e a tirar duas cabeças decepadas de
dentro de um saco de couro, o qual ele traz ao lado da sela. Ambas rolam pela
inclinação até as patas do corcel do líder kozak. Surpreso e chocado, Conan
reconhece as cabeças, cobertas de sangue seco, de Tshilaba de Zamora, esposa de
Gostislav, e de Beznikas, filho do humilde casal. Os olhos de ambos estão
arregalados, e as feições contorcidas em expressões de dor e medo. A surpresa e
o choque dão logo lugar à indignação. No momento seguinte, a voz do General
Bashak de Aghrapur se faz ouvir:
- O moleque e a rameira se recusaram a nos dar a localização do
acampamento kozak. Mas, quando ameacei matar o guri, a maldita zamoriana nos
contou tudo o que sabia. Ela nos revelou muita coisa, antes de morrer. E, como
palavra dada a kozak é palha ao vento, acabamos com o fedelho, depois de
mandarmos a mãe dele ao inferno... – diz o general, com um sorriso diabólico e
nada agradável de se ver.
Em seguida, Yezdigerd parte dali, deixando seu general no comando. Mais
furioso ainda, devido à covardia e crueldade praticadas contra Tshilaba e Beznikas,
o hetman cimério abre um caminho
sangrento por entre seus antagonistas, com giros precisos e mortíferos. Mesmo
que Conan tivesse apenas metade da força e agilidade que possui, seria
impossível errar um alvo naquela aglomeração de turanianos montados. De qualquer
forma, o cimério se vê numa situação não muito diferente de quando, membro dos
Companheiros Livres, anos antes, havia tido os próprios camaradas mortos por
forças turanianas três vezes maiores no Rio Ilbars, quilômetros a norte dali.
O coríntio Zitlos recebe uma flechada na testa, mas é instantaneamente
vingado pelo cimério, que acerta uma flecha precisa no pescoço do arqueiro
montado que o matou.
Esrom e Kitrus se vêem costas a costas, cercados naquela estepe por turanianos
armados até os dentes. Abrindo barrigas e talhando peitos e gargantas, o
shemita e o kothiano lutam como demônios até serem crivados por lanças e
flechas em seus pescoços, barrigas e costas.
Enquanto isso, ao se aproximar do Rio Zaporoska, a montaria de Conan é
mortalmente atingida por uma seta no pescoço, e o cimério cai na margem daquele
rio. Sua coxa recebe outra flechada, o que não o impede de talhar outros com
sua cimitarra, ao mesmo tempo em que se esquiva de setas turanianas.
Um dos últimos kozakis é morto covardemente com um golpe de lança nas
costas. O zamoriano ao lado dele decepa, com uma praga, a cabeça do traiçoeiro
turaniano; mas, no momento seguinte, cai morto com uma dúzia de flechas no
peito.
Ao mesmo tempo, após talhar, num único giro, o tronco encouraçado de
mais três turanianos, Conan é derrubado sem sentidos por um golpe de maça na
cabeça, e dado como morto ao cair numa parte rasa do Zaporoska.
* * *
Horas depois, o hetman
cimério é despertado por uma dúzia de companheiros sobreviventes, os quais
alertam seu líder da aproximação de batedores enviados por Yezdigerd. Quando os
turanianos põem seus cavalos para trotarem em direção aos kozakis remanescentes,
estes os recebem com flechadas no pescoço, testa, barriga e peito, derrubando-os
dos cavalos e manchando de vermelho o emblema do Lobo Branco de Turan em seus
torsos encouraçados.
Após matar os batedores, com a ajuda de seus homens restantes, Conan
avista, com seus olhos de águia, Octávia da Nemédia sendo perseguida pelo
general turaniano Bashak. Mesmo de longe, o líder cimério pode ver o medo nos
olhos cinzas da última sobrevivente de seu harém, a qual, fugindo a pé, é facilmente
alcançada por Bashak – o qual, por sua vez, apesar da armadura de
cota-de-malha, é mais veloz que a nemédia, e a agarra pelos longos cachos
dourados, derrubando-a ao chão.
- Suíno de Aghrapur!! – brada uma voz atrás do general.
O turaniano gira abruptamente, largando Octávia e desembainhando o
sabre ao ouvir o grito feroz, e se depara com um homem alto e musculoso, cujas
roupas de seda estão esfarrapadas e cujos olhos azuis ardem de fúria, com todo
o fogo do inferno brilhando neles.
Bashak investe duas vezes contra o cimério, mas este detém tanto a
estocada quanto o giro da espada do turaniano. Como contragolpe, Conan o
desarma com um único giro de seu sabre e lhe atinge um golpe entre o pescoço e
ombro esquerdo, abrindo-lhe cota-de-malha, clavícula, vísceras e costelas até o
osso do quadril, numa explosão de sangue e faíscas. No golpe seguinte, o hetman parte o general ao meio, na altura
da cintura, num jato vermelho de intestinos, fazendo o tronco ensangüentado do
turaniano morto cair para um lado, e as pernas para o outro.
Ainda soluçando de medo – porém aliviada e intacta –, Octávia abraça
Conan e beija-lhe os lábios, agradecida.
- Oh, Conan! – ofega a loira nemédia, enxugando as lágrimas. – Esses
cães localizaram e invadiram o acampamento... Mataram todos os homens em
batalha... esfolaram e queimaram vivas as mulheres, crianças e velhos... Só eu
sobrevivi entre as mulheres... Escapei por pouco daqueles vermes adoradores de
Tarim, que violentaram e mataram as ex-escravas e as mulheres do seu harém...
O casal se beija novamente e, no momento seguinte, os kozakis restantes
aparecem e, sorridentes, se reúnem ao redor do casal – evitando soltar um brado
de vitória, para não chamarem a atenção de outros possíveis batedores.
Ainda há outros bandos menores de kozakis nas estepes, e o cimério
gostaria de poder enviar Octávia de volta à casa de onde ela fora raptada, na
Nemédia; mas o acesso para o norte e oeste está bloqueado por patrulhas
turanianas. Assim, montando em um dos cavalos turanianos ali presentes – vez
que a maioria dos cavalos kozakis havia sido morta naquela batalha perdida –,
Conan põe Octávia na garupa de seu corcel, sorri para seus companheiros, também
montados, e os lidera para o sul, rumo à região montanhosa de Cherkessia, a
qual o cimério visitara há muitos anos, e onde o ex-líder kozak espera poder
reencontrar velhos amigos.
4) De Volta a Cherkessia
- Turanianos! – exclama Conan, no alto de uma elevação com seus
kozakis, reconhecendo 500 cherkess acuados por 600 turanianos lá embaixo.
O vale, onde se desenrola uma batalha desigual, é um beco sem saída.
Ele se estreita numa garganta de muralhas altas, abrindo-se mais adiante num
bojo arredondado, totalmente margeado por muralhas imponentes, impossíveis de
escalar. As estepes turanianas, bem como as cabanas dos yuethis, ao sul do
Zaporoska, há muito ficaram para trás, e agora o cimério e seus kozakis
remanescentes retornam a um país montanhoso, há muito tempo visitado pelo líder
bárbaro de olhos azuis.
Os cavaleiros – homens e mulheres – de gorro de pele estão sendo
forçados a entrar naquela garganta, e eles recuam, relutantes, sob uma chuva de
flechas e o brandir de espadas. Quando
os turanianos de elmos dourados os empurrassem para dentro do bojo, poderiam
matar os cherkess quando quisessem. Percebendo isso, e – assim como seus
kozakis – sem flechas para disparar do alto, Conan dá ordens para que um de
seus comandados esconda Octávia numa reentrância, e a proteja com a própria
vida, enquanto, à frente de onze dos sobreviventes de seu bando das estepes a
oeste de Vilayet, o cimério desce uma encosta até atingir a entrada da longa
garganta onde a luta troveja, lâminas rangem e se chocam, cavalos empinam e
batem os cascos, e plumas de elmos se balançam entre turbantes tingidos de
escarlate.
Ao chegar lá, Conan uiva e, soltando as rédeas do próprio cavalo,
agarra as rédeas trabalhadas a ouro de um adorador de Tarim, e, esquivando-se
de um golpe de cimitarra, atravessa, com o próprio sabre, as tripas daquele
primeiro turaniano a investir contra ele. No instante seguinte, ele grita
ordens para seus kozakis. Os cherkessianos olham surpresos para Conan por um
momento; mas, quando vêem os estragos que o aço do cimério e seus comandados
fazem entre seus inimigos, ganham novo ânimo. Naquele inferno, de lâminas que
golpeiam e sangue jorrando, não há tempo para fazer perguntas nem respondê-las.
Os turanianos, com seus elmos espiralados e cotas-de-malhas trabalhadas
a ouro, enxameiam ao redor da entrada da garganta, batendo e golpeando; e o
estreito desfiladeiro está cheio e apinhado de cavalos, homens e mulheres, os
guerreiros apertados peito contra peito, apunhalando-se com lâminas curtas,
dando golpes mortais quando há espaço para se puxar uma lâmina. Turanianos caem
de suas selas, com os ventres abertos por giros sangrentos de espadas
cherkessianas, dos kozakis e do cimério.
Quando alguém cai, não se levanta mais sob as pisadas e redemoinhos dos
cascos. Peso e força bruta contam muito naquela hora, e os kozakis, sob a
liderança do cimério, fazem, cada um, o trabalho de dez. Aquilo desarticula os
esquadrões turanianos, os despedaça, divide e deixa dilacerados, espalhando
seus fragmentos por todo o vale; há um redemoinho confuso e caótico de luta,
cavaleiros se virando e batendo, sozinhos e em grupo. E então, o líder
daqueles turanianos cai, com uma lança cherkess enfiada na garganta, e os
cavaleiros, com seus elmos pontudos, se dispersam e tentam fugir, perseguidos e
encurralados pelos impiedosos cherkessianos e seus inesperados aliados kozakis.
Lá naquele desfiladeiro, onde turanianos são cercados pelos ex-acuados
cherkess e seus aliados kozakis, é um turbilhão de lâminas – iatagãs turanianos,
shasqas cherkessianas e cimitarras
kozakis –, onde aço corta e estoca, e sangue jorra; onde braços musculosos
aplicam golpes diretos que rasgam a carne trêmula, e guerreiros caem para serem
pisoteados por cascos de cavalos à medida que a batalha prossegue por cima
deles. São poucos os guerreiros de Turan que conseguem retornar vivos a Khorusun.
Os 11 kozakis que lutaram ao lado de Conan, naquele desfiladeiro, sangraram
até a morte, mas mais da metade dos 600 invasores foram abatidos, lacerados e
cortados, indo jazer em poças escarlates. Então, os vencedores limpam o sangue
e suor de seus olhos e se entreolham. Conan, um kozak e centenas de cherkessianos
ainda estão de pé.
De repente,
uma das cherkessianas reconhece Conan – apesar deste estar agora com cabelos
curtos e ainda mais musculoso que há mais de uma década atrás –, sorri para ele
e o abraça, dando-lhe um beijo de boas-vindas. É a bela Zuliy, a quem o bárbaro ocidental conhecera mais de dez anos antes,
naquelas montanhas. Logo depois, após vestir a fina malha de um turaniano
morto, o cimério vai buscar Octávia, a qual, por não saber lutar, fora deixada
escondida em segurança, numa fenda. É uma bela garota alta, cujos
cabelos amarelos, olhos claros e pele alva identificam-na como um membro de
sangue puro de sua raça. Tem a constituição larga, com seios grandes e quadris
largos, e ombros mais largos que a maioria. Há, na nemédia, uma vitalidade que
transcende a própria beleza. Seus olhos cinzas lampejam, e seus quadris largos
indicam vigor físico.
De físico
semelhante, é a cherkessiana que acabara de beijar Conan, embora a montanhesa
seja morena e tenha lábios carnudos. As feições dos cherkessianos são similares
às dos afghulis e vendhyanos, mas intermediárias: não tão endurecidas quanto as
dos montanheses do Ghulistão, nem tão suaves quanto as dos habitantes de
Vendhya. E suas mulheres, como sempre, são donas de uma beleza excepcional.
- Quer dizer,
então, que os malditos turanianos estão atacando em massa os cherkessianos? –
comenta o cimério.
- Você não
sabe de nada, Conan! – diz Beroqwe, pai
de Zuliy. – Esses cães imperiais estão atacando nossos velhos inimigos afghulis
e, segundo boatos, até mesmo o distante reino de Vendhya!
Após uma noite de amor com Zuliy e Octávia,
Conan decide ir para a cidade hirkaniana de Khorusun, mas a nemédia prefere
ficar com os cherkessianos, que, devido à sua ancestralidade hiboriana, são
mais do sangue da loira que os turanianos e outros povos vizinhos; e Octávia (animada
pelo fato de as mulheres terem poder tão grande quanto os homens) resolve se
casar com Beroqwe – agora viúvo –, enquanto Zuliy se casa com o último kozak
remanescente.
FIM
Nota: Os versos, usados como epígrafes
no início dos 3 primeiros capítulos deste conto,
foram extraídos de poemas, escritos em Latim e Alemão, no final do século 13
por monges proscritos, na região da Baviera, na Alemanha. Em 1937, o compositor
Carl Orff (1895-1982) transformou todas estas poesias na famosa ópera “Carmina
Burana”. Os trechos utilizados nesta aventura pertencem à música “O Fortuna”, a
mais famosa da citada ópera.
A Seguir: O Povo do Círculo Negro – por Robert E. Howard.