O Labirinto






 (por Fernando Neeser de Aragão)


Anoitece no sudeste da Britúnia. Um viajante solitário alcança e atravessa os portões de uma cidade-estado pouco antes do escurecer. Recém-chegado de Zamora, ele havia andado por trilhas tortuosas e evitado estradas, a fim de escapar às autoridades que o perseguiam desde a Cidade dos Ladrões.

Agora, em busca de dinheiro para comer, beber e dormir, o forasteiro – um homem alto, musculoso, de pele morena e olhos azuis – escala as paredes de um templo à noite, até chegar a um nicho sombrio, onde aguarda até a lua se erguer no céu. Saindo do nicho, o jovem ladrão adentra uma sala e furtivamente leva um colar de ouro ali esquecido temporariamente.

Descendo por onde veio, o cimério ganha as ruas noturnas da cidade de Aratala, onde se encontra. Ele planejou tudo com precisão. Invadiu o local e fugiu durante a troca de guarda, sem deixar testemunhas.

Súbito, antes de dobrar uma das esquinas, ele ouve rápidos passos furtivos e uma respiração ofegante – ambos cada vez mais próximos –, e, espiando, vê uma bela e esguia mulher loira, correndo com os lindos olhos azuis arregalados de medo.

Quando ela se aproxima, o cimério automaticamente a reconhece e, no instante seguinte em que ela passa pelo bárbaro ali escondido, ele a agarra e derruba pela alça do vestido.

- Célia!

- Conan?! – ela exclama, agora ainda mais apavorada do que já estava.

- Cadela mentirosa e traiçoeira! – ruge Conan, com um brilho assassino nos olhos. – Me dê um bom motivo para não acabar com você agora mesmo!

Desesperada, Célia se levanta e aponta para um grupo de guardas a correr em sua direção. Impulsivamente, o cimério desembainha sua espada e, para surpresa daqueles soldados britunianos, investe contra eles. Todas as suas técnicas de luta civilizadas são inúteis contra aquele lutador nato, cuja forma de lutar, embora já diversificada por alguns anos na civilização, é tão instintiva e natural quanto a de um felino.

O último daqueles guardas, no entanto, consegue acertar uma forte bordunada na nuca do cimério, fazendo-o cair. No instante em que o brituniano está prestes usar sua espada para rachar o crânio do bárbaro, o guarda remanescente vê uma lâmina emergir do próprio peito, ao som das costelas se partindo, seus olhos arregalados num misto de incredulidade e agonia no rosto, sabendo que só irá morrer dali a alguns minutos, afogado no próprio sangue.

Recuperado da bordunada, Conan se ergue e vê um homem de desgrenhada cabeleira castanho-clara, como a juba de um leão; olhos cinzas como aço, e um físico tão ágil e musculoso quanto o do cimério. Um sorriso se abre por entre as barbas castanho-claras do mercenário desertor:

- Ora, ora, cimério – diz o recém-chegado –; pelo visto, continua tão bom na espada quanto naquele dia, no Marreta, quando você matou o kothiano no escuro.

- Por Crom, eu me lembro de você... – sorri o cimério. – Você estava na companhia de uma prostituta brituniana, em Zamora. E, pelo visto, continua bom em pegar meretrizes loiras da Britúnia – gargalha o bárbaro, ao ver o gunderlandês segurando Célia pelo pulso, enquanto esta tenta se soltar.

- Por favor, Conan! – implora a jovem loira. – Não me deixe com este leão imundo! Perdoe aquele roubo que lhe fiz na Nemédia!

- Olha a língua, rameira... – diz o gunderlandês, disfarçando seu bom-humor com uma aparente raiva.

- Deixe-a comigo... qual é mesmo o seu nome?

- Acteon – ele responde, sorrindo e jogando Célia nos braços de Conan. – Vamos nos esconder, antes que outros guardas apareçam.

- Quanto a outro motivo para não me matar – sorri Célia, enquanto o cimério corre com ela nos braços –, é o fato de você ter sido poupado em Numália, graças à minha interferência.

* * *

Caiu a noite sobre a cidade de Aratala, onde palácios de marfim e torres de mármore roxo da aristocracia contrastam com as espeluncas e bordéis dos bairros paupérrimos. Numa dessas espeluncas, no Labirinto – um bairro formado por ruelas sombrias, pátios fechados e trilhas enganadoras, permeadas pelo mau cheiro e sons abafados –, Conan, Célia e Acteon haviam se alojado (este último, no térreo, e Conan e Célia no primeiro andar), pagando-a com o dinheiro roubado dos soldados mortos. O colar de ouro será vendido mais tarde a um receptador

No quarto superior, onde o jovem bárbaro e a brituniana estão alojados, a loira se encontra ajoelhada diante de Conan – o qual está sentado na beirada da cama –, numa atitude quase submissa, como se disposta a tudo para reconquistar a confiança daquele homem agigantado. Célia poderia se passar facilmente por uma escrava ou suplicante, se não fosse o brilho de desejo nos olhos dela, ao retirar a tanga do cimério e lhe abocanhar o falo pela glande, para em seguida descer a língua até os testículos do bárbaro, sem deixar de encarar, com um sorriso libidinoso no rosto, os vulcânicos olhos azuis do desnudo jovem moreno e musculoso.

Tomado de desejo, Conan ergue Célia do chão, tomando-a nos braços, deitando-a sobre o leito, tirando-lhe o vestido e enchendo-lhe o rosto, boca, pescoço e seios com beijos ardentes e ferozes, deixando a brituniana excitada. Em seguida, o cimério lhe suga o clitóris e penetra fortemente a vagina úmida, levando-a ao êxtase do prazer, ao mesmo tempo em que ele próprio também tem um orgasmo intenso e vibrante.

Após um breve descanso, Célia fica de quatro para o bárbaro na cama e sorri para ele. Conan adentra novamente a vagina da loira. Esta, ao pressentir um novo orgasmo do cimério, vira-se de frente para ele e o masturba, fazendo o bárbaro lhe ejacular no rosto inteiro, deixando Célia manchada de sêmen desde a testa até o queixo. Sorrindo novamente, ela beija a glande do cimério e lhe diz “Obrigada!”, com os lindos lábios manchados de branco.

* * *

Após passarem alguns dias espreitando uma moradia, Conan e Acteon esperaram o proprietário e seus acompanhantes partirem para um banquete no palácio. Os dois ladrões achavam que a propriedade estaria vazia ou protegida por poucos guardas, mas cometeram um ledo engano. Há uma quantidade significativa deles, mas, antes que o grosso da guarda os alcance, o cimério e o gunderlandês fogem, cada um com uma bolsa cheia de ouro e jóias, e deixando como saldo um soldado com o coração perfurado por Acteon e outro, com o crânio rachado por Conan até o pescoço. Saltando da janela do templo, a dupla de ladrões ganha a rua chuvosa e se dirige ao esconderijo.

Com a luz da vela ainda acesa, e já quase pronta para dormir, Célia se sobressalta por um momento, mas sorri logo depois, ao ver Conan e Acteon adentrarem seu quarto, molhados pela chuva.

- Espero que isto lhe faça sorrir mais ainda – diz Conan, indo à frente do gunderlandês e entregando uma jóia à amante brituniana.

- Por Mitra... – sorri a loira. – É linda! – E, abraçando o corpo musculoso de Conan: – E você, é claro, não é tão feio assim...

Após dar um beijo rápido e voraz nos belos lábios da ex-prostituta brituniana, o cimério lança o colar dourado para Acteon e pede para que o gunderlandês o leve para Clessius, o gordo e bem-alimentado sacerdote de Anu – e também receptador.

- Eu lhe ajudarei a contar as moedas... amanhã pela manhã – sorri Conan, fechando a porta do quarto, enquanto seu amigo vai até o local solicitado, também com um sorriso no rosto.

* * *

No Templo de Mitra, próximo ao Labirinto, uma ágil adaga trabalha sobre uma grande jóia, a qual forma o rosto de uma estátua de mármore, até ser libertada da imagem por uma forte e furtiva mão bronzeada.

- Por Crom, Acteon! – diz Conan – Esta jóia vale o resgate de um rei!

- É bela, mas vamos logo embora! O ar aqui está repugnante.

Sorrindo, o cimério pega um colar de ouro que se encontrava no pescoço da estátua e o guarda no bolso.

- Não se preocupe com o cheiro sujo deste templo, Acteon. Já estamos de saída.

Súbito, inúmeros guardas, armados de lanças e espadas, aparecem no templo. Conan abre o rosto do primeiro e Acteon perfura o olho do segundo mais próximo. Girando novamente sua espada, o cimério abre o pescoço de mais um e o ventre de outro guarda.

- Vamos separar os guardas. Corra, Conan! – grita Acteon, esmurrando a face de um guarda e abrindo o crânio de outro. O cimério chuta o peito de dois guardas que barravam a janela e foge, saltando por ela. Ele se esconde e fica algum tempo aguardando os gritos da luta cessarem, mas, ao cair o silêncio, não vê nenhum sinal do gunderlandês fugindo. Pouco tempo depois, ele avista três guardas saírem do Templo de Mitra, carregando uma forma alta, forte e desmaiada, enquanto o capitão deles segue à frente, ladeado por vários outros soldados.

- Se não encontrarmos aquele maldito cimério – Conan ouve o líder deles sussurrar –, deixaremos o gunderlandês na prisão, a pão e água, até ele nos contar o paradeiro do bárbaro.

Irado e frustrado, Conan retorna ao seu esconderijo, misturando-se às sombras da noite.

* * *

Ele ouve um tumulto, vindo das ruas, mas não ousa deixar seu esconderijo – um pouco longe demais do Covil do Rato –, só se aventurando a sair durante as noites – especialmente agora, que ele está sendo tão procurado quanto seu amigo da Gunderlândia havia sido, antes deste ser levado à prisão. O cimério pretende, ao cair da noite, se esgueirar pelas ruas daquela cidade até o local onde Acteon havia sido preso, a fim de soltá-lo. Meia hora depois, contudo, Célia adentra o esconderijo de Conan e Acteon, e lhe informa que o gunderlandês havia sido enforcado há poucos minutos – mas não sem oferecer, segundo testemunhas que estavam presentes na praça do mercado antes que Célia se deparasse com o cadáver do amigo de Conan, uma terrível resistência, o que faz o cimério entender instantaneamente o motivo do tumulto que havia escutado.

De acordo com o relato da jovem loira, só conseguiram arrastá-lo à forca, porque uma tremenda bordunada na cabeça de Acteon o havia deixado semi-consciente (realmente, uma cabeça gunderlandesa é quase tão dura quanto a de um cimério!), pois o gunderlandês, mesmo com as mãos acorrentadas para trás, chutava testículos britunianos, além de dar cabeçadas nas barrigas daqueles que tentavam levá-lo ao cadafalso.

- Quem teria sido o bastardo que mandou aqueles malditos guardas capturarem e enforcarem meu amigo? – pergunta Conan, se lembrando dos soldados que haviam levado Acteon, sem que ele nada pudesse fazer pelo amigo, exceto fugir para formular um meio de libertá-lo.

- Clessius, sacerdote de Anu – responde Célia, em voz baixa. – Quando me deparei, sem poder fazer mais nada, com o cadáver enforcado do nosso amigo, ouvi sussurros, vindos de alguns velhacos na multidão, de que ele estava lá por ter se envolvido com Clessius, e sobre o gordo ter sido o mandante da captura e execução.

Conan se inflama de ódio, ao saber da traição daquele sacerdote gordo, o qual era também receptador dele e do gunderlandês há meses. O bárbaro fica pensativo por alguns instantes, e então diz bruscamente:

- Aguarde-me aqui à noite, pois haverá um débito a ser pago.

- Certo, cimério – responde Célia. – Agora, sairei para fazer mais algumas compras, e então...

- Então, partiremos daqui disfarçados, daqui a alguns dias, depois que acabar um certo rebuliço que causarei, e quando os portões da cidade estiverem abertos. – o bárbaro responde, com tom de decisão.

- Sim, Conan. – responde a loira após um breve silêncio.

* * *

À noite, se esgueirando por entre as ruas além do Labirinto, sobre as quais se erguem os palácios de marfim e torres de mármore roxo, o cimério chega aos arredores do bairro das favelas, onde se ergue o Templo de Anu. Evitando alguns guardas e matando discretamente aqueles aos quais não pode evitar, Conan finalmente chega à janela do andar superior do templo. Após atravessar corredores iluminados por tochas, o bárbaro encontra o traiçoeiro Clessius, com sua forma gorda prostrada diante da escultura gigantesca de uma cabeça de touro, para a qual o sacerdote ora.

- Levante-se, receptador traiçoeiro dos infernos! – rosna Conan. – Levante-se e me encare, se você for homem!

Clessius se volta bruscamente e, à luz do incenso que queima diante da imagem de Anu, abre um sorriso afetado para o cimério:

- Ora, ora, Conan da Ciméria... a que devo a honra desta visita? – ele pergunta dissimuladamente.

- Deixe de ser cínico, sacerdote dos infernos! Foi por sua causa que enforcaram Acteon! Agora, puxe sua adaga, se quiser morrer como um homem!

O assustado Clessius mal tem tempo de brandir sua faca, pois no momento seguinte, a espada ensangüentada do cimério traça um arco no ar. Num instante, está tudo acabado. Enquanto Conan apresenta apenas um leve arranhão no ombro musculoso, o corpo obeso do sacerdote traidor está caído para um lado e sua cabeça ensangüentada para o outro. Se aquele devoto de Anu jogasse só do lado dos bandidos, seus lucros seriam menores, mas sua vida certamente seria bem mais longa.

Cuspindo na cabeça decepada de Clessius, Conan rapidamente se curva e pega a adaga que havia caído daquela mão sem forças; ele arranca, com a adaga, o molho de chaves que se encontra no cinto daquele sacerdote. Uma rápida olhada ao redor lhe mostra que o vasto salão está vazio, e ninguém havia presenciado o ato. Roubando dois garrafões de vinho de uma adega ali dentro, a qual ele destrancara com as chaves do falecido Clessius, o cimério corre velozmente dali e salta, da janela, para os tetos de outras construções daquela cidade, em direção ao Labirinto. Ninguém o viu sair do Templo de Anu e saltar velozmente, de teto em teto, com os garrafões nas mãos e um sorriso de satisfação nos lábios. Conan retorna ao seu esconderijo, no qual há outras garrafas menores da bebida predileta do bárbaro. Durante as noites seguintes, enquanto aguarda passar o tumulto causado por sua vingança, o cimério comemora sua vingança, se divertindo com Célia e bebendo até cair.



Epílogo: Traído por Célia, Conan é jogado na prisão. O astuto príncipe Murilo o ajuda a escapar e, em troca, obtém do Cimério a promessa de matar seu inimigo Nabonidus, o Sacerdote Vermelho. As circunstâncias forçam-no a cumprir sua missão, após uma batalha contra um homem-macaco de mente semi-humana. Em seguida, o bárbaro vai embora de Aratala, mas não antes de atirar a traiçoeira Célia em uma fossa sanitária e dar uma boa gargalhada diante da situação (Inimigos em Casa/ http://cronicasdacimeria.blogspot.com/2010/01/inimigos-em-casa.html).





Agradecimento especial: Aos grandes amigos e howardmaníacos Ricardo Tavares Medeiros, de Brasília – DF, e Deuce Richardson, dos EUA.



A seguir: De Volta à Ciméria.



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