Introdução:
O conto a seguir se passa um ano após os eventos de “O Estrangeiro Negro”, de Robert E. Howard, e pouco tempo antes da aventura “Pregos Vermelhos”, do mesmo autor – e cujo primeiro rascunho também será publicado neste site. No rascunho acima citado, há um trecho onde Conan diz a Valéria: “A esquadra real zíngara afundou meu último navio diante da costa de Toragis... queimei a cidade de Valadelad, mas eles me pegaram antes que eu conseguisse alcançar as Barachas. Fui o único homem a bordo que escapou com vida. Por isto, me juntei aos Companheiros Livres de Zarallo”. Ou seja, “Pregos Vermelhos” se passa logo após o fim da segunda fase baracha do Cimério – a qual, por sua vez, havia começado logo depois de “O Estrangeiro Negro”.
Nesta aventura que segue, tentei desenvolver a frase dita por Conan à ex-pirata aquiloniana. Sobre os personagens que contracenam com o Bárbaro neste conto, quase todos foram criações minhas – à exceção do taverneiro Pythios. Já os mencionados em “flashbacks” são, em sua maioria, criações de Howard e de outros autores – com exceção dos bucaneiros Kassio, Manolo, Roberio e Katerno, os quais também contracenam com Conan e sua tripulação pirata.
Quase toda a descrição de Porto Tortage, no início do texto, foi extraída e adaptada de um trecho da versão original de “Conan das Ilhas”, de L. Sprague DeCamp e Lin Carter, bem como o Canto Marinho das Ilhas Barachas. Também busquei incluir mais alguns detalhes sobre o navio Mão Vermelha nesta aventura. Para encerrar, meus agradecimentos especiais ao amigo e conanmaníaco Osvaldo Magalhães, por suas preciosas dicas, que me ajudaram a desenvolver melhor o conto – e espero que os leitores possam apreciá-lo com o mesmo prazer que tive em escrevê-lo.
Valadelad
(por Fernando Neeser de Aragão)
1) Atlaia de Shadizar
O porto de Tortage se ergue desafiante contra as estrelas. Assentado numa espécie de taça de rochas e escarpados, o porto pirata é uma brasa de luzes, e uma caixa de ressonância de canções e gritos. De fato, a Irmandade Vermelha se localiza em Tortage. Grandes barcaças e esbeltas caravelas balançam-se, amarradas aos cais de pedra ou de madeira, ou ancoradas no meio do porto.
Ao amanhecer, os montes de Tortage são uma barreira dramática e quase intransponível com seus picos como dentes de uma serra gigante. A visão da cordilheira é suficiente para empolgar o mais experimentado viajante.
Naquela região, a terra é ricamente habitada, marcada por leitos de rios e lagos de sal. A cordilheira é uma cortina de rocha estéril no verão, estendendo-se em direção ao céu. Se a planície embaixo é quase totalmente fértil, estas montanhas são um deserto. A rocha marrom, cinza e amarela não é tocada nem mesmo pelo menor traço de vegetação, pois sua altura protege as montanhas, deste lado, da chuva que vem do Mar do Oeste para a parte leste da cordilheira.
Mas, naquele momento, é noite e, na cidade em si, todas as tabernas, pousadas e bordéis da cidade estão abarrotados de clientes, pois a metade dos piratas se concentra em Tortage, com suas bolsas cheias de ouro e pedras preciosas, e o espírito desejoso de diversão fácil. Os letreiros dos estabelecimentos, adornados com caveiras, tochas e sabres cruzados, dragões, cabeças coroadas e outros símbolos, oscilam ao sabor da brisa marinha. As ondas lambem os pés dos escarpados que se erguem em direção às estrelas, junto à pequena cidade. A mesma e suave brisa adentra as tortuosas ruelas, pavimentadas com blocos de granito e ladeadas por casas baixas, de teto plano, fachadas caiadas e janelas gradeadas. As palmeiras se destacam contra o firmamento.
Durante mais de cem anos, a pequena vila, na baía cercada de escarpados, tem sido a capital de um império pirata, que assola as águas situadas entre Kush e as Terras Pictas. Ali não impera outra lei, exceto a rude e simples da Irmandade. Fora disso, reinam apenas o sabre, a adaga, o punho e a destreza do lutador. Naquela noite, a cidade pirata é uma algazarra: por toda a parte se ouvem gritos de júbilo e canções picantes. As brigas estouram nas ruas pelos motivos mais ínfimos, e em torno dos adversários, juntam-se grupos de alegres curiosos, dispostos a matar e morrer por um intercâmbio trivial de palavras, por um empurrão ou pelos favores de uma moça de lábios vermelhos e quadris ondulantes.
Aparentando indiferença a tudo isso, o perfumado líder cimério do navio Mão Vermelha sai de sua casa e se dirige a uma certa taberna, a qual esteve freqüentando no último mês. A cada semana, aquele agigantado pirata, de longos cabelos negros, pele morena, olhos azuis e curtas vestes de seda a lhe cobrirem o corpo musculoso, sempre encontra uma ou duas mulheres dispostas a passarem as noites com ele – algumas recém-chegadas a Tortage, e outras, velhas conhecidas. Ele tem cicatrizes de fogo, lança e espada pelos braços, pernas, tronco e rosto. O homem tem quase dois metros de altura e o peito tão imenso que as costuras da camisa de seda estariam rompidas, se esta não fosse folgada. Entre a camisa e o calção, aquele bárbaro usa um largo cinto de couro, do qual pende uma espada de lâmina larga. E, embora ele esteja com os bolsos ainda abarrotados com o ouro de meses de saques a navios e cidades – desde os de Zingara até os da Stygia –, ninguém ousa roubá-lo, devido às suas qualidades de luta, que o tornam perigoso demais para ser furtado ou assaltado – sem contar que sua esgrima e história já fazem dele uma lenda viva.
Ainda assim, para alguns piratas que não o conhecem ou que não o tenham visto alguma vez, tudo o que seus companheiros contaram sobre ele não era nada diante da aparição do homem em carne e osso. Ele tem 36 anos, e ainda assim, seu vigor é o de alguém que ainda não tinha completado vinte. O cimério é extremamente alto, e seus ombros são mais fortes e largos do que os de qualquer remador da ilha.
O porte do líder baracho é de uma grandeza que transcende o gênero. Parece uma entidade. Até mesmo o aspecto belicoso, por mais que predomine de modo impressionante, não passa de um subproduto dessa qualidade mais elevada. Como uma chama é pura e não pode ser tornada impura, assim é aquele bárbaro. Como um leão não conhece o medo e jamais será corrompido pelo medo, assim é aquele cimério.
Mas aquele estabelecimento, apesar de agitado, é alegre. O filho do dono, que ajuda o pai todos os dias, é agora um jovem adulto, tão alto e forte quanto o genitor. Juntos, são capazes de pôr fim a qualquer uma das poucas brigas que ocorram naquele local.
Daquela confraria pirata, fazem parte foras-da-lei de diversas nações, mas a maioria é de origem argoseana.
- Olá, Pythios! – grita o bárbaro ao seu velho amigo, dono do estabelecimento desde a primeira vez em que o cimério liderou barachos, anos antes – Um jarro de vinho argoseano!
O alto e musculoso taberneiro, de fartos bigodes negros e cabeça raspada, sorri para o bárbaro e lhe enche um jarro, ao mesmo tempo em que o líder do Mão Vermelha tilinta moedas de ouro sobre o balcão. Ambos se cumprimentam, enquanto o cimério pede um grande pedaço de carne assada, que ainda fumega, enchendo as narinas do bárbaro e fazendo-lhe a boca salivar. Segundo Pythios lhe contara há meses, Valéria havia passado por Porto Tortage, pouco tempo antes do cimério voltar às Barachas. A loira ainda estava no mesmo navio que Ortho Vermelho, mas este agora era primeiro-imediato de um messântio. Dizia-se que, apesar de argoseano, Ortho tinha sangue vanir nas veias, o que explicava, não apenas a enorme força daquele ruivo, mas também o seu aspecto físico – bem como a aparência de outras pessoas ruivas não-vanires que o cimério conhecera ao longo da vida, como Rudabeh e Helliana, de Zamora, e Rufia de Ophir.
Canções picantes e gargalhadas enchem o local, fazendo o baracho cimério se sentir como nos tempos de adolescente em Zamora, onde gastava o fruto de seus roubos com bebedeiras e mulheres. Há um ano, vinte baladas celebravam as proezas daquele pirata bárbaro, o qual, na sua primeira fase baracha, havia navegado até Khitai e uma terra desconhecida ao sul daquela nação oriental; além de ter visitado Zabhela, Shumballa e Keshatta, para meses depois viajar até Vanaheim e, finalmente, descer a Costa Picta, onde ficou a par de diversos outros costumes e lendas de um dos inimigos hereditários dos cimérios. Agora, a quantidade de baladas é ainda maior, graças aos numerosos saques que enriqueceram o Mão Vermelha. Valéria dos cachos dourados, por sua vez, tem quase a mesma quantidade de canções e baladas sobre suas próprias façanhas.
E, naquele momento em Tortage, quando o cimério termina de jantar, ele nota que, há vários dias, vinha sendo observado por uma determinada mulher daquela taberna – que sempre ficava sentada num canto –, cujas feições são ao mesmo tempo negróides e zamorianas. Ele nunca a levara para a cama por estar sendo constantemente assediado por outras beldades locais. O bárbaro também percebe que, apesar de mal vestida, aquela mestiça é linda – e não entende o motivo de ela ter ido para a cama com apenas um homem durante toda aquela semana.
Curioso, ele sorri para a jovem e a chama para um dos quartos do local. Seus olhos azuis fazem a mulher lembrar-se do mar que atravessara apenas uma vez, mas seu brilho, observa ela, é igual ao do aço.
***
Na penumbra do quarto, no momento em que a garota – cujo nome é Atlaia – tira a roupa, o já desnudo cimério entende por que aquela jovem tem tão poucos clientes, ao mesmo tempo em que se vê surpreso com o que ela lhe mostra.
O bárbaro, de nome Conan, se espanta com o comprimento e flacidez daqueles seios – medindo 30 cm de comprimento, menos de 10 de largura, e com os bicos negros na altura do umbigo da mulher –, mas em momento algum chega a sentir nojo. Trata-se de uma flacidez normal e natural, de modo que o espanto é seguido por uma estranha excitação sexual – estranha por ele nunca antes ter visto a nudez de um par de seios como aquele –, à qual segue-se a descoberta, feita pelo baracho, de que seios como aqueles também o atraem.
Certa vez, em Yezud, o cimério havia rejeitado uma prostituta, de nome Mandana, mas isso só se dera pelo fato dela ser muito gorda, o que não era o caso de Atlaia – a jovem mestiça tinha um corpo esguio e curvilíneo. Embora houvesse, para Conan, um limite máximo de compleição física, este não era o caso em termos de tamanho mamário. E, no momento seguinte, um sopro de brisa marinha adentra a janela e faz aquele busto tremular, deixando o bárbaro ainda mais excitado.
Assim, durante os longos minutos seguintes, o cimério beija a garota, excitando-a com sua língua de bárbaro a roçar a da jovem, ao mesmo tempo em que o baracho se excita ao sentir, na própria boca, o volume dos lábios grossos da jovem cor-de-mogno.
Após o beijo, Conan lambe e mordisca o lóbulo da orelha de Atlaia. Esta faz o mesmo na orelha esquerda do cimério, e não se surpreende ao notar que aquele bárbaro não tem a metade superior da mesma. A jovem já viu – e levou para a cama – alguns piratas com orelhas inteiras faltando, assim como olhos, narizes e até membros. A relativamente pequena mutilação daquele cimério não era nada, comparada com a de certos outros barachos. Durante aquele beijo, Atlaia percebe que o bárbaro cheira bem melhor que a maioria dos homens que a possuíram. Embora o cimério nem sempre tomasse banho diariamente – por falta, ora de tempo, ora de água, mas nunca por falta de vontade –, ele se banhava muito mais que a maior parte dos membros da Irmandade Vermelha. E naqueles últimos meses, com sua ainda gorda parte do saque a inúmeros navios e portos, o bárbaro vinha tomando banho todos os dias.
Pouco depois, a língua de Conan desce para o lindo pescoço dela, enquanto as narinas do cimério sentem o odor natural da bela e irresistível mestiça. Erguendo os braços da garota, Conan lambe-lhe os sovacos suados e desce, lentamente, a língua para os longos e trêmulos seios delgados, sugando todos os centímetros quadrados que levam até os negros e pontudos bicos escuros, de auréolas avantajadas.
O forte odor de suor salgado da mestiça – o qual ele também sentia nas mulheres tribais negras, shemitas e aesires que possuíra –, concentrado nas axilas e nas dobras submamárias de Atlaia, lhe era muito mais excitante do que os perfumes artificiais dos óleos de jasmim, usados pela maioria das prostitutas de Tortage. Duas décadas perambulando pela “civilização” não tornaram aquele pirata menos bárbaro que qualquer outro cimério – embora, é claro, Conan se distinguisse dos próprios conterrâneos por causa do código de honra que o impedia de matar mulheres (com única exceção em Gamburu, onde a vida de Chabela correra perigo) e crianças. Assim sendo, o odor natural de uma mulher continuava sendo um grande afrodisíaco para ele.
No momento seguinte, a boca de Atlaia – cujo bico do longo seio direito ainda se encontra na boca do cimério – envolve a ponta do órgão latejante de Conan. A língua da jovem gira-lhe ao redor da glande e lambe-lhe pouco abaixo da uretra, fazendo o bárbaro gemer de prazer, enquanto a mestiça atua mais ativamente com a língua.
A bela garota cor-de-mogno abocanha o falo ereto do cimério até quase se engasgar. Os gemidos de prazer de Conan animam Atlaia a prosseguir cada vez mais, até que ele solta-lhe o bico do seio e, como uma abelha na rosa, lhe explora as pétalas úmidas da vulva. Esta cheira a sabonete – apesar do odor de suor no restante do corpo da jovem – e, enquanto o cimério enfia a língua na vagina acolhedora de Atlaia, sente o mesmo aroma suave no ânus da garota, o qual se encontra colado ao nariz do bárbaro.
Este, logo após sugar a vulva da mulher – que, por alguns momentos, tirou a boca do pênis de Conan, para gemer num quase orgasmo –, começa a lamber o ânus dela; e, um minuto depois, já está introduzindo, várias e várias vezes, a língua quente e úmida no reto da mulher. Esta geme de prazer. Nunca antes algum homem lhe fez isto.
Então, percebendo a necessidade que ela sente nas profundezas – e a própria necessidade –, Conan se ergue e monta nela, introduzindo-lhe o membro dilatado em sua total plenitude. A mestiça geme de prazer, com os olhos cerrados, a boca aberta e o rosto transfigurado em êxtase.
Enquanto o cimério penetra-lhe a vagina por trás, ele vê aqueles longos seios escuros balançarem novamente – tão soltos quanto os cabelos de Atlaia, quase tão longos quanto os mesmos e bem mais moles que a negra cabeleira cacheada da prostituta. Excitado com o balanço ondulante daqueles longos e sedosos pêndulos escuros que são os seios da garota, o bárbaro torna a sugar-lhe as mamas suadas durante as penetrações, erguendo-as acima das laterais das costas da jovem e lambendo sofregamente as auréolas e bicos negros.
No auge do desejo, ele retira o falo da vagina de Atlaia e, ciente que aquele reto é tão limpo quanto a vulva, encosta o membro viril no ânus da garota. Percebendo o que o cimério deseja – e excitada pelos carinhos do líder baracho –, a mestiça olha rapidamente para trás, enquanto balança afirmativamente a cabeça. Então, misturando a própria saliva com a secreção vaginal de Atlaia, Conan a lubrifica no orifício anal. Enquanto massageia freneticamente a vulva da filha de negra com zamoriano para mantê-la excitada, Conan introduz bem devagar o pênis no ânus da garota de pele escura. Embora mais apertado que a vagina da jovem, aquele reto é menos coeso que o de uma virgem – não havia dúvida de que Atlaia já praticara sodomia com outros homens.
Percebendo que a garota está cada vez mais excitada com a fricção manual em sua vulva, o cimério introduz um dedo na vagina da jovem, arrancando-lhe um gemido de prazer, ao mesmo tempo em que começa a acelerar as penetrações anais de seu falo em Atlaia. Ela geme cada vez mais alto, abandonando-se ao êxtase do desejo e do prazer. Estes se tornam cada vez mais fortes, levando-a a um orgasmo tão intenso, que faz a jovem desfalecer, de cabeça baixa, sentindo-se a própria encarnação do prazer por cerca de um minuto. Naquele minuto, nada mais existe para a mestiça, exceto o roçar e adentrar dos dedos do cimério em sua vulva, o vaivém do falo do baracho em seu ânus, o intenso e vibrante prazer da carne, os próprios suspiros aliados aos gemidos de Conan, e a parca luz do quarto se atenuando ainda mais devido ao êxtase do desejo, o qual agora esmaece um pouco, devido ao intenso e vibrante orgasmo que acabara de ter.
Aproveitando-se deste momento, satisfeita com o que Conan lhe fez e ainda levada pelo desejo, Atlaia vira-se de frente para o bárbaro ajoelhado que a possuíra e, apoiada no cotovelo esquerdo, masturba o baracho com a bela mão direita. Enlouquecido de desejo, o cimério ejacula abundantemente no rosto de Atlaia, manchando-lhe de branco a testa, olhos, nariz, bochechas, boca e queixo.
Qualquer homem comum já estaria com o apetite sexual satisfeito, após fazer tudo o que Conan fizera com Atlaia. Contudo, a visão daquele belo rosto escuro, pingando sêmen pelo queixo, mantém o bárbaro excitado. Desse modo, após apenas um minuto de descanso, o cimério vira para cima o corpo e rosto daquela mulher que se debruçava nos próprios cotovelos, e toma-lhe ambos os seios – o direito com a mão e o esquerdo com a boca. Enquanto suga sofregamente a grande auréola pontuda do esquerdo, o baracho se recorda de algo que Mahu fizera para mantê-lo excitado em Negari, e leva o seio direito de Atlaia aos lábios da própria dona.
Ela abre a boca carnuda e lambuzada de sêmen, e começa a lamber o bico cor-de-ébano do próprio seio, sentindo na boca o sabor salgado do próprio suor da auréola, misturado ao forte sabor alcalino do esperma que lhe manchava os lábios grossos e agora lhe adentra a boca. Perguntada pelo cimério se era capaz de abrir os olhos negros, ela simplesmente o faz, encarando sensualmente os vulcânicos olhos azuis de Conan, enquanto sorri para ele. Aquele cliente lhe fora carinhoso e a levara ao orgasmo... Ela não se importava, portanto, com o fato dos próprios olhos arderem em contato com o sêmen do líder baracho.
Excitado em ver os olhos negros daquela jovem se inundarem de esperma, o cimério volta a penetrá-la, sem largar nem por um segundo o seio que ele tomara com a própria boca, e cujo bico enrijecido roça a úvula do bárbaro, atiçando ainda mais a libido daquele pirata.
Nos minutos seguintes, nada mais existe para o bárbaro, exceto o rosto manchado de branco de Atlaia, o balanço daqueles longos seios – um na boca da moça, e o outro na dele –; os gemidos de desejo da jovem, que morde cada vez mais o próprio seio em êxtase de prazer; os próprios gemidos roucos, de uma libido cada vez maior e mais intensa, o vaivém cada vez mais intenso das genitálias e o novo orgasmo, cada vez mais inevitável... E finalmente, um segundo e intenso clímax de prazer e desejo. Nunca tendo sido tão bem tratada por um homem na cama, a mestiça larga o seio que estava na própria boca e grita de prazer, enquanto, por um segundo, arranha as costas nuas de Conan.
***
O pai de Atlaia era, segundo esta, um aventureiro zamoriano que, viajando pela costa de Zimbabo após uma breve estadia no Iranistão, foi parar na costa do reino negro de Atlaia – vizinho a Zimbabo –, onde avistou uma bela negra sendo perseguida por homens estranhos e de aspecto bestial – mestiços de homens com homens-macacos –, os quais pretendiam violentar a garota atlaiana e matá-la. Num ato de bravura e temeridade, o zamoriano investiu contra eles de espada em punho, seguido de uns poucos marujos que decidiram ajudá-lo. Após uma breve luta, os selvagens peludos estavam mortos, a garota salva e o zamoriano apaixonado pela mulher a quem salvara.
No caminho de volta para a Shadizar natal do aventureiro, a jovem negra aprendeu a falar a língua de Zamora e engravidou do ex-navegador – agora um comerciante em Shadizar. Foi naquela cidade zamoriana, milhares de quilômetros a leste de Tortage, que nasceu a jovem que agora acaba de limpar o sêmen no rosto – o qual, após vários minutos em contato com o ar na segunda relação sexual, já havia ficado ralo e incolor.
Ao nascer, ela recebeu o mesmo nome do país onde a mãe nascera; e, ao crescer, herdou os seios compridos da genitora.
- E como foi que você se tornou prostituta aqui, tão longe de casa? – pergunta Conan, já antevendo um possível relato trágico.
Os olhos de Atlaia se umedecem:
- Os negócios de meu pai começaram a ir mal. Ele passou a se embriagar, e a bater em mim e na minha mãe. Ela já se sentia sufocada por não poder andar nua, como fazia em sua terra natal, além de se sentir deslocada em meio a tanta gente desconhecida. Última sobrevivente de sua tribo, o amor que minha mãe sentia por mim era a única coisa que a prendia àquela cidade... já que a brutalidade de meu pai fez desaparecer todo o sentimento que ela tinha por ele. Até que, certa noite, cansada dos maus-tratos do meu pai, ela resolveu fugir comigo... – os olhos da jovem começam a pingar lágrimas – Mas meu pai descobriu nosso plano. Ele ia espancá-la até a morte, mas minha mãe puxou uma adaga que trazia escondida entre as vestes e cravou-a profundamente na barriga dele. Mesmo morrendo, meu pai a estrangulou... – Atlaia soluça – Tentei soltar-lhe as mãos do pescoço dela, mas apesar de moribundo, ele era muito forte e usou as últimas forças para matá-la. Mesmo morto, ele continuou com os dedos cravados na garganta de minha mãe. – ela prossegue, quase aos prantos.
“Adolescente, com o dinheiro já esgotado e sem ter para onde ir, comecei a me prostituir... primeiro em Shadizar, depois na Coríntia, Ophir, Zingara... até que uma cafetina argoseana me trouxe para cá”.
Aquelas palavras tocam fundo o rijo coração do cimério, embora o baracho já tivesse ouvido inúmeras histórias parecidas. Ele é bárbaro, mas não é cruel nem insensível. Uma das provas disso era seu rude cavalheirismo com as ex-escravas que possuíra, como Natala da Britúnia e Muriela da Coríntia, dentre outras – às quais o bárbaro tratava melhor do que quando estas tinham donos “civilizados”.
2) Rumo a Valadelad
Pelas águas azuis do Mar do Oeste, desliza, na direção norte, uma nau de madeira com acabamento de latão, cujo mastro ostenta uma bandeira, com uma caveira escarlate desenhada sobre um fundo negro.
Naqueles doze meses, a nau – que tinha apenas seis homens e nenhum remo quando fora buscar Conan, Belesa e Tina – ganhou cem piratas a mais e foi equipada, pelo próprio cimério, com 40 remos de cada lado, tornando o Mão Vermelha um dos mais velozes navios das Ilhas Barachas – comparável ao ex-navio zíngaro Tigresa, no qual navegara há mais de uma década com Bêlit. Contudo, aquela nau argoseana não era tão longa quanto o navio zíngaro que o cimério queimara, há dez anos no rio Zarkheba. Assim, Conan transformou o Mão Vermelha numa embarcação birreme, ou seja, com duas fileiras para remadores em cada lado – vinte no convés e mais vinte logo abaixo –, de modo a dar espaço para que oitenta dos mais de 100 barachos dali pudessem remar ao mesmo tempo. Cada remador, quando assume seu posto, firma os pés nas vigas de madeira e, assentando a parte de dentro de seu remo de três metros e meio de comprimento dentro da embarcação, apoiada na viga mestra, com o cabo atado em seu tolete, de modo que a pá se estende por cinco ou seis palmos para além do nível da água, apóia ali o seu próprio peito e empurra junto com os outros, ao toque do tambor, que do convés regula os movimentos dos remadores. Uma escadaria, que desce do convés, faz com que a percussão fique tão audível pelos remadores de baixo quanto pelos de cima.
Esta era a primeira vez que Conan fazia algo do tipo com um navio seu. Na sua primeira fase baracha, anos atrás, ele havia liderado quatro navios em apenas seis meses de pirataria – o que não lhe dera tempo para equipar devidamente nenhuma das embarcações. Desta vez, ele era dono de uma única nau há um ano.
No porão de vante de uma galé, onde a viga do talha-mar assenta sobre a baliza principal da sobrequilha, fica um depósito apertado, usado para guardar as velas. No interior da proa ficam as latrinas. Mais atrás, fica o alojamento da tripulação e os barris de água. No meio do navio – ainda na parte interna do casco –, ficam estocadas as armas e a comida. Os mantimentos consistem em carne bovina e suína salgada, assim como feijão e ervilha seca – e, é claro, bolacha dura, feita de pão amassado. Atrás dos mantimentos, são amontoados barris de vinho – que se conservam melhor do que a água em viagens longas.
E, num compartimento intermediário – acima das latrinas, armas, água, comida e vinho, e logo abaixo do convés –, se localiza o enorme tesouro, acumulado no Mão Vermelha ao longo dos doze meses de saques que se seguiram ao retorno de Tina e Lady Belesa a Zingara, desembarcadas por Conan e donas de um saco de valiosos rubis que lhes fora dado pelo próprio cimério – na ocasião, um ex-batedor da fronteira picta. Ladeando o tesouro, fica a fileira inferior de remos.
No alto da popa, se localiza a cabine ocupada por Conan.
Cercado de água por todos os lados, um bom capitão precisa usar a cabeça o tempo todo. Dormir com um olho aberto, passar o dia alerta, ter mente rápida e muita presença de espírito. É posto para quem tem um entendimento imediato das coisas navais.
Manter a ordem num navio cheio de bandidos é muito difícil – por isso existem as leis piratas da Irmandade Vermelha. E ai de quem quebrar o trato! Porque, como dependem uns dos outros, a traição é o pior crime entre os piratas. Quem engana o seu companheiro é abandonado numa ilha deserta apenas com um barril de água e uma espada.
Entre os barachos existem punições piores: ficar sem comida ou levar cem chibatadas com o gato-de-nove-rabos – um pedaço de pau com nove nós de corda amarrados na ponta. Mais dura, e quase sempre mortal, é a de ser amarrado a uma corda e arrastado roçando dentro da água por baixo do casco do navio, de uma ponta a outra.
Mas o líder baracho Conan da Ciméria não é muito chegado a execuções e torturas. Para faltas graves, ele usa o exílio como punição – ou simplesmente um duelo de espadas com ele próprio, até a morte. O exílio era freqüente nos casos de roubo, e por isso, os remadores da fila inferior sabem controlar sua ganância. Num navio pirata, cada um tem direito a partes iguais do saque; e, sob a liderança de Conan, nem mesmo o capitão tem direito a mais do que os outros. Este é um dos motivos que o tornam mais admirado por seus comandados do que o falecido Strom.
Embora Conan seja, às vezes, quase tão impaciente quanto o loiro de Messantia que outrora chefiou esta nau, aquele cimério é um estrategista mais brilhante e um homem muito mais honrado. Este bárbaro da Ciméria, além de não admitir matança de mulheres e crianças, também não permite estupros por parte de seus comandados. Se algum de seus piratas quiser se satisfazer sexualmente, que faça como seu líder: use o dinheiro que possui, para pagar uma prostituta!
Os barachos do Mão Vermelha são quase todos argoseanos de pele clara, cabelos loiros ou castanhos, e corpos musculosos e atarracados. Aqui e ali, se vê um zíngaro ou um shemita – ambos de cabelos e olhos negros, e pele bem morena. Contudo, os povos da parte norte e leste de Argos têm, respectivamente, miscigenação com gente de Zingara e Shem, de modo que alguns daqueles barachos argoseanos também têm pele morena, com cabelos ou olhos negros.
Destes, o que mais chama a atenção é o jovem primeiro-imediato Sabino, de Vênzia. Embora baixinho e de olhos azuis, aquele musculoso argoseano tem pele morena e longos cabelos negros. Parecia uma versão atarracada do próprio Conan. Entre gargalhadas, o líder cimério respondia aos seus leais piratas, sem precisar mentir, que não tinha ido para a cama com nenhuma argoseana, nos nove meses anteriores ao nascimento de Sabino.
Mas naquele momento ninguém ri. Todos os seus ocupantes usam armaduras leves e elmos, pois sabem que têm uma missão sangrenta pela frente. Conan é o único que ainda não vestiu a armadura, nem pôs o capacete. Usando seu folgado calção de seda que lhe alcança a metade das coxas bronzeadas e musculosas (e suspenso pelo largo cinto de couro), bem como a camisa de seda, de gola baixa e larga – e com mangas também largas –, ele sai de sua cabine, após comer uma fruta. Enquanto se dirige ao parapeito, ele pensa na noite anterior, passada com Atlaia, na qual a mestiça lhe pedira dinheiro somente para um banho completo e uma refeição.
O comovido cimério, contudo, deu à linda prostituta uma quantia equivalente a mais da metade da própria fortuna pessoal – dinheiro suficiente para Atlaia abrir o próprio bordel e ser dona do mesmo. O bárbaro sabia que, se envelhecesse na prostituição, a mestiça ficaria sem cliente algum, e dependente da mendicância. E, como Conan havia dito um ano atrás a Belesa, ele sabe o que é ser pobre numa terra hiboriana.
Na manhã seguinte, o bárbaro, como sempre, tirou a membrana – entre o caule e a casca – de certa árvore e lhe bebeu o chá (um recurso aprendido na sua adolescência entre os aesires, para prevenir e tratar doenças venéreas). Pouco depois do desjejum, Conan foi informado de que os capitães zíngaros responsáveis pelo afundamento do Esbanjador, há 4 anos na costa de Shem, estavam escondidos na cidade costeira de Valadelad, em Zingara. Imediatamente, o líder cimério zarpou, com todos os seus barachos, a bordo do Mão Vermelha, numa missão de vingança.
Naquele momento, enquanto observa o horizonte azul que separa Tortage de Zingara, Conan relembra quando, há quatro verões, ele e Sigurd haviam feito um ataque-surpresa à cidade de Khemi. Enquanto seguiam na direção norte, para negociar o saque com o Rei Ferdrugo, quatro navios zíngaros abordaram o Esbanjador nos recifes das costas de Shem. Invejosos dos corsos bem-sucedidos do bucaneiro cimério e do ex-baracho vanir, os capitães Kassio, Manolo, Roberio e Katerno atacaram e mataram toda a numericamente inferior tripulação do navio de Conan. Somente ele e Sigurd haviam escapado vivos, nadando até o litoral da cidade de Kyros.
Agora, o ódio queima novamente o peito do bárbaro, enquanto este relembra as mortes de Zeltran e Riego, em duelo contra o gordo, porém ágil, Kassio. Fora graças a Riego que o cimério havia conseguido retomar a carreira de bucaneiro, com navio próprio e a serviço de Zingara. Ex-vigia do navio de Zaporavo, Riego aproveitara o desembarque de Sancha – ex-companheira de Conan – em Kordava, para, com a autorização do cimério, procurar o rei Ferdrugo e fazê-lo relevar o fato de Conan ter atacado o navio do jovem zíngaro Da Varza – o que não foi difícil, vez que Da Varza e Sancha deviam suas vidas ao bárbaro. Riego não só conseguira fazer o rei de Zingara perdoar o então bucaneiro, como, meses depois, quando Conan voltou a Kordava sem uma moeda no bolso, o vigia havia feito com que Ferdrugo arranjasse um novo navio para o bárbaro recém-chegado das cidades de Tombalku e Shar.
Não tendo esquecido os favores que o cimério fizera a Sancha e a Da Varza – e sem caber em si de felicidade por Conan ter acabado, meses antes em Kordava, com uma absurda “inquisição” que o velho rei não conseguia deter –, Ferdrugo oferecera ao bárbaro um novo navio e tripulação. Feliz com tal presente, Conan batizara a nova embarcação com o mesmo nome da que ele tomara do falecido Zaporavo.
Agora, o musculoso peito peludo do cimério arde em anseio de vingança, não só pela embarcação perdida, mas principalmente pelas vidas de muitos bucaneiros e barachos, que ele e Sigurd outrora lideraram a serviço de Ferdrugo.
3) Vingança em Zingara!
É meia-noite, quando Conan e seus barachos adentram sorrateiramente a cidade de Valadelad. Embora os barachos sejam famosos por seus furiosos ataques frontais, os piratas do Mão Vermelha – o qual se encontra ancorado a uns dez metros dos navios dos quatro infames bucaneiros escondidos na cidade – aprenderam, com Conan, a serem sutis quando necessário. O jovem Sabino – encarregado de dar cabo de Katerno – se dirige ao esconderijo do mesmo, enquanto o cimério vai ao covil de Kassio e os demais, aos de Roberio e Manolo. A essa hora, há pouquíssimas luzes nas casas de Valadelad. Aquela cidade, embora seja maior que uma aldeia, não tem o mesmo esplendor de Kordava, a capital de Zingara. A maioria das construções de Valadelad consiste em casas de um único pavimento e teto baixo. O único local que se destaca dos demais é o palácio real da cidade – o qual se divide em três a quatro andares –, onde se concentra a guarda da cidade costeira, e de onde saem os soldados e oficiais da patrulha noturna.
Sabino avista, na penumbra, uma sentinela – um típico bucaneiro, vestido em aço polido e seda, com uma faixa amarrada na cabeça cor-de-oliva – na porta do esconderijo do capitão zíngaro. Se esgueirando ao redor da casa – cuja modéstia serve para disfarçar o fato de haver lá dentro um bucaneiro a serviço de Ferdrugo, – o argoseano agarra uma pedra e a arremessa poucos metros à frente da sentinela. Alerta, o guarda sai do posto e, ao dobrar para o lado da casa de onde viera a pedra, recebe uma adaga, lançada pelo pirata, a qual se crava em seu pescoço.
Pegando as chaves do zíngaro morto, o primeiro-imediato vai testando silenciosamente uma por uma, até conseguir abrir a porta do covil. Com um assobio idêntico ao de uma ave noturna local, ele chama mais três companheiros barachos do Mão Vermelha. Deparando-se com um grupo de guardas sonolentos na ante-sala, os argoseanos partem para o ataque. Um deles talha, num golpe ascendente, o rosto de um zíngaro, que cai para trás em agonia mortal. Outro argoseano abre um enorme corte nas barrigas de outros dois soldados, derramando sangue e tripas pelo chão.
Um terceiro baracho afunda seu machado no ombro de outro guarda, cuja espada erguida cai de seus dedos inertes ao chão. Uma faca, enfiada entre o pescoço e o queixo do mesmo soldado, silencia qualquer grito de agonia que este pudesse soltar. O segundo argoseano, que havia talhado os ventres dos dois zíngaros, agora abre um corte descendente, no peito e cota-de-malha de mais um guarda. Se nenhum dos zíngaros estivesse sonolento – ao contrário dos argoseanos alertas –, haveria pelo menos um entrecruzar de espadas.
Enquanto isso, um quarto baracho empunha sua longa espada, como um pêndulo mortal, contra quatro zíngaros de rosto aquilino que o atacam, matando todos, enquanto um quinto guarda tenta fugir porta afora. Este é morto por um punhal, arremessado contra a parte posterior de seu pescoço. Ao mesmo tempo, o terceiro pirata, que usara seu machado, consegue desarmar dois zíngaros e abrir-lhes os peitos encouraçados no momento seguinte. Então, saindo de seu quarto, Katerno aparece, sonolento e de espada na mão, para se deparar com doze zíngaros mortos e quatro argoseanos sedentos de sangue...
Naquele exato momento, no esconderijo de Kassio, Conan da Ciméria – que, por uma questão de honra, preferira matar sozinho o assassino do vigia e do auxiliar do Esbanjador – sobe o teto da casa e, ao ver a sentinela montando guarda na porta da frente, aproveita (como seus amigos fizeram na casa de Katerno) que a patrulha zíngara já havia passado por lá e, agarrando por cima a cabeça e queixo do guarda, quebra-lhe o pescoço numa única torção. Saltando do teto ao chão, como um enorme e silencioso felino, o cimério toma-lhe as chaves e adentra o covil.
Na ante-sala, também há guardas, mas são apenas seis – ao contrário dos 12 que haviam dentro da casa de Katerno. O gordo certamente tem uma grande auto-confiança na própria agilidade e habilidade espadachim. O próprio Conan vira, sem poder fazer nada, como Kassio matara Zeltran, há quatro anos a bordo do Esbanjador. O cimério – então um bucaneiro – só não arriscou a própria vida tentando vingar a Zeltran e Riego naquele dia, porque havia dezenas de bucaneiros rivais entre ele e o gordo zíngaro, e porque Sigurd, apontando-lhe este pormenor, puxara o indignado e relutante Conan para um mergulho nas águas, onde escaparam vivos, nadando até a praia.
Aquelas lembranças queimam como fogo na mente do líder cimério. Apesar disso, Conan prefere agir cautelosamente, deixando o entrechocar de espadas para quando encontrar o infame Kassio.
Assim, o primeiro soldado zíngaro a investir contra Conan tem o maxilar agarrado pela mão do cimério, que, suspendendo-o, esmaga-lhe o crânio contra a parede. O segundo investe contra o líder do Mão Vermelha, mas o bárbaro desembainha velozmente a espada, decepando-lhe o antebraço e furando-lhe o ventre até a espada se sobressair pelas costas do homem e atravessar sua espinha. Ele desaba no chão, cuspindo seu sangue zíngaro.
Ao ver o terceiro, Conan tira a capa, jogando-a para a esquerda, na direção do homem, tapando seu rosto. Arremetendo-se, torce o pulso do homem, inclinando a ponta de sua espada rumo a seu rosto.
Impulso.
A arma atravessa o olho direito do homem e o sangue esguicha no mesmo instante, sujando o chão.
Conan se vira para um pequeno candelabro dependurado, segura-o como se fosse uma espada e apara o golpe de espada de outro inimigo. Em seguida, o bárbaro bate a base do candelabro no ombro de seu inimigo, inverte o ataque, e atira a outra extremidade na mão que segurava a espada. O cimério pula para trás e bate nos órgãos genitais de seu atacante com a base do candelabro. O homem fraqueja e a espada cai no chão.
Ele a agarra rápido e crava-a embaixo do queixo de seu inimigo, atravessando a língua, o céu da boca e o cérebro, com a ponta esfacelando o osso do crânio. Continua segurando a espada, sentindo o sangue morno escorrer pela lâmina e sobre seus dedos.
O bárbaro mantém o homem de pé por alguns instantes, sentindo-o tremer, no espasmo da morte. Depois o solta. Ele cai de costas, como um boi abatido.
O quinto, achando que o cimério ficou com a espada presa, lança-se em direção a Conan, brandindo a espada, mas é morto por uma faca que o bárbaro lhe arremessa na testa. O sexto tenta matar Conan pelas costas, mas, rápido como um felino, o líder baracho se vira e, com um murro, quebra-lhe o ombro direito contra a parede, fazendo-lhe a espada cair da mão inerte. Com a esquerda, o zíngaro tenta esfaquear Conan, mas tem várias costelas quebradas por um soco que o cimério lhe acerta no peito. Outro murro do bárbaro atinge o arfante guarda na têmpora, rachando-lhe o crânio e matando-o com uma hemorragia interna.
No momento seguinte, quando o cimério tira sua espada ensangüentada de um dos cadáveres zíngaros, uma voz familiar chama-lhe a atenção:
- Em nome de Mitra, que diabos está aconte... Você!
Trata-se de um homem moreno, gordo e de estatura mediana. Sua pele cor de oliva é tipicamente zíngara. Embora a barba branca e as rugas lhe denunciem os sessenta anos de idade, o zíngaro de olhos negros tem a mesma agilidade surpreendente do não menos gordo Taurus – o falecido ladrão, a quem o cimério conhecera há quase duas décadas na Torre do Elefante.
Um brilho de ira mortal surge nos olhos azuis de Conan:
- Kassio, seu cão zíngaro dos infernos... – rosna o bárbaro – Finalmente nos reencontramos! Agora é só eu e você!!
Apesar de surpreso, Kassio se encontra totalmente blindado em sua armadura de cota-de-malha – a qual ele vestiu enquanto ouvia, de seu quarto, os sons abafados da matança na ante-sala. Mas o mesmo pode ser dito de seu antagonista cimério, o qual brande a espada contra o zíngaro, num perigoso círculo decepante. Este se esquiva, e Conan faz o mesmo quando Kassio contra-ataca. Ágeis como tigres, o baracho e o bucaneiro conseguem evitar rapidamente os ataques seguintes um do outro. Mas o cimério, tomado pelo ódio e desejo de vingança, se aproxima demais de Kassio e, mais preocupado em matar do que em se defender, recebe um murro na face – do qual mal sente o impacto – e volta a atacar, desta vez cruzando espadas com o inescrupuloso zíngaro. O soco só serviu para atiçar ainda mais a fúria de Conan, agora despreocupado com o fato do entrechocar de espadas estar visivelmente audível. Esquivando-se de um golpe dirigido ao seu pescoço, Kassio abre um talho de um centímetro de profundidade na musculosa coxa do cimério, enfurecendo-o mais ainda.
Quando servira ao rei Ferdrugo de Zingara, anos antes, o baracho – na época, um bucaneiro como Kassio – havia aprimorado ainda mais sua já invejada esgrima com o espadachim Valério. Contudo, o mesmo pode ser dito de Kassio, que também teve Valério como um de seus muitos mestres na arte de lutar. Logo, o bucaneiro aproveita a própria e menos elevada estatura para chutar as gônadas do enorme baracho, o qual se curva de dor. No instante seguinte, Kassio atinge o torneado ventre de Conan com outro chute, fazendo o mesmo com o poderoso maxilar do cimério – embora o bucaneiro tenha a sensação de estar chutando as duras e inexpugnáveis paredes do palácio real de Valadelad.
Erguendo a espada para decapitar seu prostrado antagonista, o zíngaro de barba branca é surpreendido por um golpe lateral que lhe abre armadura, pele e gordura do enorme ventre, num grande jato vermelho. Soltando um gemido de dor e surpresa, ele vê o cimério se erguendo com todo o fogo do inferno naqueles faiscantes olhos azuis, e pensa que o esperto bárbaro havia fingido o tempo todo estar indefeso sob seus golpes. Na verdade, Conan os sentira, mas seu poder de recuperação é assustador – principalmente quando o bárbaro se encontra possesso de ódio.
Mas, mesmo com os intestinos escorrendo pelo corte em sua enorme barriga, Kassio ainda brande sua espada contra o líder cimério. Este se esquiva, descendo a lâmina entre o pescoço e ombro esquerdo do zíngaro, cortando novamente malha metálica e carne, ao mesmo tempo em que lhe quebra a clavícula. O bucaneiro grita de dor. Conan, com o ódio maior que a cautela, rosna:
- Este é por Riego!...
Logo depois, o bárbaro crava-lhe a espada no coração:
- Por Zeltran!...
E, agarrando o moribundo capitão bucaneiro pela barba grisalha, Conan decepa-lhe o pescoço gordo, acrescentando:
- E por todos os tripulantes mortos do Esbanjador!
A seguir, com seu ódio atenuado pela vingança recém-consumada, o bárbaro pega de volta o punhal que arremessara na testa de um dos zíngaros, e o embainha na cintura. O cimério reconhece a maestria daquele homem com a espada, e, se Kassio fosse um inimigo honrado, Conan ficaria admirado. Mas a honra não fazia parte do caráter daquele zíngaro sem princípios. Assim, enquanto guarda a cabeça do bucaneiro num saco de couro em seu cinto, o líder baracho cospe, em puro desprezo, sobre o corpo decapitado de Kassio, de cujo pescoço decepado ainda jorra sangue.
O cimério está acabando de saquear o covil de Kassio, quando se depara com quatro guardas noturnos que tentam lhe barrar a saída. Extremamente habilidoso no manejo da espada, Conan se livra dos guardas sem sequer largar o saco de couro onde guardou a cabeça e riquezas do gordo bucaneiro morto – o primeiro cai com a garganta aberta; o segundo, estripado; o terceiro, com capacete e crânio partidos, e o quarto, com a cabeça decepada.
A seguir, com aço e pederneira, o líder baracho incendeia as cortinas e tapetes do local, fazendo o fogo se alastrar pelos móveis, chão, paredes e teto da casa de Kassio, cujo cadáver sem cabeça é cremado pelas flamas insaciáveis que começam a consumir aquele covil.
***
A madrugada de Valadelad se vê iluminada pelas chamas vorazes que devoram os quatro esconderijos, enquanto Conan corre numa velocidade que nenhum de seus piratas, montados em cavalos roubados de soldados zíngaros, conseguiria alcançar a pé – afinal, botas de marinheiro não são feitas para grandes corridas, e a vida de um pirata não treina ninguém para correr. Logo, um guarda noturno local ergue sua alabarda contra o bárbaro, tentando barrar-lhe o caminho, mas tem o capacete e crânio abertos por um só golpe da espada do cimério, num jato de faíscas, sangue e miolos.
Flechas sibilam em direção ao líder baracho, mas nenhuma delas o atinge. Aquele pirata cimério é capaz de se esquivar de flechas atiradas por hirkanianos – que são os melhores do mundo. Portanto, evitar flechas zíngaras é quase uma brincadeira de criança para aquele ágil tigre humano da Ciméria. Outros dois guardas que tentam barrar Conan, também terminam decepados. Um deles tem a cabeça arrancada num veloz golpe da espada do cimério, enquanto o outro é menos desafortunado, perdendo um dos braços num jato vermelho sobre a leve armadura que usa.
O fogo ateado aos esconderijos – ambos em pontos eqüidistantes da cidade – começa a se espalhar para as pequenas casas próximas, cujos modestos moradores as abandonam para não morrerem. O cimério, por não ter tido a intenção de queimar residências de pessoas inocentes, lamenta o ocorrido em seu íntimo – embora, por outro lado, sinta alívio em saber que as mesmas famílias, apesar de perderem suas casas, não perderam suas vidas.
Logo, Conan se junta a Sabino, ao segundo-imediato – o jovem Lucius de Messantia; um rapaz loiro, atarracado e de olhos verdes, o qual dera cabo de Manolo e também traz a cabeça deste na mão – e aos demais companheiros barachos, com os quais invadiu a cidade. Ambos estão a pé, como o bárbaro. Os poucos barachos a cavalo portam tochas, com as quais se dirigem a todo galope até o porto, onde estão ancorados os navios dos recém-falecidos bucaneiros. As mesmas tochas que foram usadas para incendiar os esconderijos são atiradas às velas dos navios de Kassio, Manolo, Roberio e Katerno. Em poucos minutos, o fogo nas velas se espalha até as embarcações dos bucaneiros mortos e a uma parte do cais. Quando os zíngaros interrompem a perseguição a Conan e seus barachos, para apagarem o fogo no porto da cidade, metade do mesmo já está destruída, enquanto os quatro navios incendiados, por sua vez, já estão além de qualquer ajuda.
Arqueiros barachos ajudam a dar cobertura à fuga do Mão Vermelha. Embora atirem bem, os arqueiros de Zingara não se comparam aos piratas das Ilhas Barachas. Mal-refeitos do elemento-surpresa, metade dos arqueiros zíngaros tem seus corpos crivados por flechas argoseanas, enquanto os barachos – melhores atiradores que os zíngaros – não sofrem uma única baixa. O mais desafortunado daqueles piratas leva uma flechada no ombro esquerdo, mas consegue fugir cambaleando – e fora de perigo – até a nau. Quando os zíngaros finalmente chegam com reforços a cavalo, os barachos estão disparando flechas certeiras e mortíferas da amurada do navio, cuja sinistra bandeira é iluminada pelo fogo nos navios e porto, pouco antes de desaparecer na noite, rumo ao sul.
4) Perseguição em alto-mar
- Eram barachos, capitão! – gagueja um jovem soldado zíngaro ao capitão de um dos cinco navios de uma esquadra real zíngara, a qual chegara a Valadelad poucas horas após o ataque e incêndio à cidade – Eram do navio Mão Vermelha, de Conan... o mesmo que pertencia a Strom, antes do loiro desaparecer nos mares do norte! Além destes quatro navios, incendiaram algumas casas, mataram guardas da patrulha noturna e levaram as cabeças dos capitães dos navios!
- Você tem certeza disso, rapaz?
- Ele está correto. – confirma um superior do soldado, um zíngaro magro e alto, de bigode grisalho – O navio no qual partiram era argoseano, e tinha o desenho de uma caveira vermelha, na bandeira do mastro principal. Era noite, mas o fogo dos quatro navios no porto a iluminou, na hora que seguiram.
- Para onde eles foram? – pergunta o capitão mais velho de um dos cinco navios reais que ali desembarcaram, menos de uma hora antes, quando o sol ainda não aparecera sobre o céu já claro.
- Para o sul. – responde o soldado, cujas palavras são confirmadas por um aceno do superior deste.
- Não descansaremos enquanto não afundarmos o Mão Vermelha! – promete Bredo de Jerida.
Bredo é um jovem capitão, de longos cabelos negros penteados para trás. Por trás de sua aparência juvenil – tem apenas 25 anos –, se esconde a determinação oriunda da experiência; e suas boas-maneiras contrastam com os vigorosos músculos sob as brilhantes sedas e cota-de-malha que o vestem. Pondo o capacete – de feitio semelhante ao de um conquador, como todos os capacetes zíngaros –, Bredo dá as costas ao porto carbonizado de Valadelad e se dirige ao navio que comanda. Não há mais nada a ser dito. A palavra foi dada, e o jovem falava pelos capitães dos outros quatro navios zíngaros.
E a esquadra, com as bandeiras douradas da realeza zíngara em seus mastros, desaparece rapidamente na direção que lhes fora indicada.
***
O Mão Vermelha, com as velas estufadas ao vento, se dirige para o sul, contornando as Ilhas Barachas, em direção a Argos, a fim de seus tripulantes, dentre outras coisas, trocarem o produto do saque a Valadelad por novas flechas – cuja quantidade a bordo diminuiu significativamente na noite anterior. O alegre canto das gaivotas, o sol morno e brilhante, e o agradável aroma da brisa marinha a soprar-lhes nos rostos dão um sabor ainda mais doce à vingança ocorrida em Valadelad. Nos mastros da nau, se encontram as cabeças dos quatro capitães zíngaros, mortos em seus próprios esconderijos por aqueles bravos piratas, de origem predominantemente argoseana. Sem contar que o ataque à cidade foi tão inesperado, que nenhum integrante da nau baracha chegou a ser morto durante a vingança.
Despidos de suas armaduras, com seus leves ferimentos devidamente enfaixados e com suas coloridas roupas piratas de seda à mostra, os barachos comem e bebem em comemoração à vingança em Valadelad. A bebida, contudo, é sempre consumida moderadamente quando estão a bordo de um navio. Beber até caírem, só mesmo em Tortage.
Agora, a embarcação segue seu caminho para Argos, a fim de comercializar o espólio do saque aos capitães, seus lacaios e todos os soldados que foram mortos durante o ataque-surpresa àquela cidade zíngara. Cantos de alegria; a lembrança não-comentada aos barachos do ataque a Khemi, feito por um certo pirata cimério há muitos anos – no qual navios também haviam sido queimados num porto –, e muita comilança infestam aquela nau durante o resto do dia e boa parte da noite. É meia-noite, quando a maioria se recolhe para dormir, enquanto Conan destaca um dos barachos para ficar de vigia durante a madrugada.
Os dias se passam, enquanto o Mão Vermelha se aproxima cada vez mais de Argos. O consumo de bebidas alcoólicas, e as alegres lutas e comilanças a bordo, continuam, embora as bebidas sejam consumidas moderadamente. O cimério não quer que seus piratas se embriaguem e sejam pegos desprevenidos por algum navio rival – como aconteceu, anos atrás, a bordo do Cacatua.
É noite quando o Mão Vermelha alcança águas bastante familiares a Conan e seus barachos. Eles sabem que, dentro de apenas um dia de navegação para leste, estarão no porto de Messantia, para negociarem o espólio dos zíngaros mortos em Valadelad. Embora soubesse que sua cabeça estava a prêmio pelos portos argoseanos – devido à sua época de líder dos corsários negros e bucaneiro –, o cimério conhecia alguns guardas subornáveis no porto da capital de Argos, os quais o ajudariam a negociar o saque por debaixo do pano, com um mercador de nome Publio. De repente, o vigia na gávea exclama:
- Um navio no horizonte leste, capitão! Um navio zíngaro... – ele gira para a esquerda, e vê outros com bandeiras douradas – E mais quatro, vindos do norte!! São da esquadra real de Zingara!!
- Maldição! – rosna Conan – Temos que fugir para o sul. Não somos páreos para cinco navios. Aos remos, cães! – ele grita – Vamos despistar os malditos!
Conan é o primeiro a se dirigir aos bancos dos remos de cima, seguido por Lucius, Sabino e mais 37 piratas. Os demais 40 seguem para os remos de baixo, enquanto os 26 restantes cuidam do convés, ao mesmo tempo em que ficam de olho nos navios que vêm do norte. Enquanto os 80 remos estão sendo manuseados, Conan não permite que ninguém toque o tambor – pois, caso o navio suma da vista dos zíngaros, o barulho os denunciaria aos bucaneiros.
Contudo, as embarcações da realeza – também com 80 remos cada uma –, são tão velozes quanto o Mão Vermelha. Assim, passam-se dois crepúsculos e auroras de perseguição. Quando os navios bucaneiros param de remar, o cimério retira metade dos remadores dos bancos – os mais cansados – para descansarem. O próprio Conan alterna turnos de vigília e sono com Sabino, Lucius e o vigia.
Porém, os implacáveis bucaneiros de Zingara nunca perdem o Mão Vermelha de vista, de modo que a perseguição aos barachos continua.
- Por Mitra, capitão Conan! – exclama o segundo-imediato Lucius de Messantia – Há dois dias que estes zíngaros vêm nos perseguindo! Aqueles demônios não desistem nunca?!
- Já naveguei ao lado de cães como estes... – responde o cimério, enquanto rema com seus barachos – São indiferentes a toda a dor e cansaço que não sejam imediatamente fatais. – admite o bárbaro, num misto de admiração e ódio – Mesmo assim, vamos ver se eles agüentam nos perseguir até a Stygia... – Conan acrescenta, com um sorriso sinistro. Seu plano seguinte a este era, obviamente, voltar às Barachas. Embora os lucros nas ilhas piratas sejam mais magros que em Argos, esta é a única solução no momento.
***
A perseguição durou vários dias, e ainda persiste em plena proximidade da costa shemita, onde os bucaneiros começam a ganhar terreno. Conan e sua tripulação já haviam deduzido que o Mão Vermelha não é o único navio bem abastecido de comida e água, mas também os zíngaros a lhes perseguirem. Sem dúvida alguma, aqueles navios eram recém-chegados de Kordava, de onde a maioria dos bucaneiros zíngaros partia.
O cimério e seus barachos tentam virar para leste, a fim de alcançarem a costa, onde, em terra firme, teriam chance um pouco melhor contra aqueles cães de Zingara. Todavia, um deles é mais rápido e barra o Mão Vermelha, de modo a este não poder seguir para tal direção. Habilmente, o leme da nau baracha é manejado para que esta se volte para o sul. Contudo, outra embarcação daquela esquadra fica em frente ao navio pirata.
Então, Conan e seus lobos-do-mar – dispostos a não morrerem sem luta e encurralados pelos cinco navios, que lhes barram o caminho para qualquer direção – resolvem enfrentar os zíngaros (cuja resistência o cimério subestimara) num combate desigual. O cimério é o primeiro a sair dos bancos dos remadores e ir para a cobertura do navio.
Também cansados de remar e fugir, os oitenta barachos nos bancos saem, a mando de Conan, de seus postos e se juntam aos 26 que pisam o convés com seu líder. Equipando-se com seus elmos e armaduras, os mais de cem piratas do Mão Vermelha sorriem diante da morte e entoam seu canto marinho:
“As ondas negras se quebram sobre a negra e úmida margem,
Num trovão de espuma devastadora...
Mas, que nos importa se rugem os deuses da tormenta
E açoitam o cristal e arranham a porta,
Se nós navegamos ao romper do dia?”.
Não temiam morrer diante de um inimigo ao qual fossem igualmente capazes de matar, independente de estarem ou não em vantagem. E aquela canção sempre lhes insuflava coragem para lutarem. Mas os zíngaros não partem logo para o ataque. Um deles se dirige aos piratas.
- Fomos informados do vosso ataque a Valadelad, barachos. Mas, se vocês se renderem, suas vidas serão poupadas e vocês serão julgados pelo tribunal de Kordava! – diz um dos capitães zíngaros, o velho Zirno de Yorkin – Sei que você não será condenado à forca, cimério, graças à amizade que nós sabemos existir entre o rei Ferdrugo e você. Basta se aliar a nós, ao invés de liderar estes ratos das Barachas.
Indignado com a proposta, Conan – que jamais abandona alguém que lhe confia a vida – xinga o velho Zirno, dizendo-lhe explicitamente onde enfiar tal idéia. Ao mesmo tempo, o cimério dá ordens para que as cabeças dos bucaneiros mortos sejam lançadas ao mar, para que não sejam enterradas pelos zíngaros que se aproximam velozmente.
Após uma breve troca de flechas entre barachos e bucaneiros, ganchos de abordagem são lançados por três dos navios zíngaros ao mesmo tempo. Quando os barachos do Mão Vermelha começam a cortá-los, flechas são disparadas a bombordo e estibordo do navio de Conan, matando os piratas nas amuradas da embarcação cercada. Embora atirem melhor que os zíngaros, os barachos estão em minoria e haviam esgotado todas as últimas flechas de seus longos arcos, nos momentos que antecederam o lançamento dos ganchos. Quando os argoseanos se dão conta, zíngaros de brincos dourados e lenços na cabeça já pisam a cobertura do Mão Vermelha e inicia-se o entrechocar de espadas entre barachos e bucaneiros.
Sem tempo para se organizarem em uma falange, após a troca de flechas, os barachos – devidamente blindados após a longa perseguição – enchem suas mãos de aço, agarrando firmemente os cabos das espadas e lanças, e se preparam para morrerem matando. Conan já havia posto seu capacete, e gritava suas ordens aos argoseanos. O cimério é o primeiro a atacar, abrindo o elmo e cabeça de um atacante zíngaro, num espirro de fagulhas e miolos sobre o convés.
Seu segundo-imediato, Lucius, abre a couraça de outros bucaneiros, com extrema agilidade e força, assim como o primeiro-imediato Sabino – embora nenhum dos dois se iguale ao líder cimério como lutadores.
Apanhando a lança de um argoseano morto, Conan a enfia no olho do mais jovem capitão zíngaro, de modo que a ponta se sobressai pela nuca, empurrando-lhe o capacete. Estava acabada a vida do capitão Bredo. O guerreiro mais próximo avança, para vingá-lo, mas antes que possa descer sua espada em Conan, a lâmina do cimério arranca-lhe o capacete e escalpo, num derramar de sangue e miolos sobre a cobertura do navio.
Alguns dos argoseanos têm suas espadas quebradas pelas dos bucaneiros, mas usam seus próprios escudos para despedaçarem os crânios de alguns zíngaros, antes que flechas e lanças de Zingara, atiradas em seus troncos e crânios, os abatam. Se estivessem em maior número, os argoseanos do Mão Vermelha seriam capazes de se igualar aos zíngaros, e até sobrepujá-los. Mas a maré está contra os barachos de Conan.
Mesmo assim, eles lutam como tigres argoseanos acuados por centenas de lobos zíngaros, que mais parecem uma torrente humana, derramada pelos cinco navios que cercam o Mão Vermelha. Lucius de Messantia abre o lado do rosto de um bucaneiro, arrancando-lhe um dos olhos com o sabre que empunha; e, com o punhal na mão esquerda, abre a jugular do mesmo zíngaro.
Se era para morrerem, Conan e seus piratas arrastariam o maior número possível de almas inimigas com eles. E o cimério nunca foi de esperar o ataque de ninguém – pelo contrário, é ele quem sempre leva o combate para onde quer que precise lutar. A mesma indiferença à morte e aos ferimentos não-fatais, típica dos bucaneiros zíngaros que cercam os barachos, se aplica também ao líder bárbaro do Mão Vermelha.
Sorrindo como um tigre, Conan afasta os pés, plantados firmemente no convés, e gira sua enorme espada, girando igualmente o corpo e impulsionando os golpes com a plena força de suas costas, ombros e poderosos braços, rasgando o ventre nu de um bucaneiro que temerariamente abrira caminho por entre os colegas blindados. Lanças voam, e espadas dançam e se chocam no convés do acuado navio baracho. Enquanto isso, com os olhos cada vez mais encobertos por uma névoa vermelha, Sabino brande seu sabre com uma fúria descontrolada, abrindo ventres e decepando cabeças. Embora baixinho como a maioria dos argoseanos, o primeiro-imediato do Mão Vermelha é quase tão forte quanto Conan e luta quase tão bem quanto seu líder. No momento seguinte, o primeiro-imediato abre com a lâmina o braço direito de um dos zíngaros que o atacam, cruza para atingir o esquerdo do bucaneiro e então volta pela barriga num golpe estripador, ao mesmo tempo em que sua perna tira os pés do oponente dele por precaução. É o famoso Fluxo de Espada, aprendido por Conan há 15 anos em Aghrapur com o mestre espadachim Sennan, e ensinado pelo cimério ao jovem Sabino.
O líder baracho sorri, orgulhoso. Se algum dia for pai – de algum filho que possa criar, diferente da criança que fizera na princesa Zosara há 15 invernos (da qual o Khan Kujula, marido de Zosara, até hoje pensa ser pai) –, ele espera ter um filho como Sabino. Naquele momento, contudo, futuro e utopia parecem sinônimos – pois para cada bucaneiro morto, morre também um baracho, mantendo a enorme desigualdade numérica entre zíngaros e argoseanos.
Mas, para onde quer que Conan vá, a batalha sempre pende a favor dos barachos que lidera. A velocidade natural dos músculos poderosos do cimério é suficiente para deixar seus rivais confusos, de modo que nem o próprio Conan sabe quantos zíngaros já mandou para a outra vida. Ágil, corpo flexível, sempre saltando, estocando e girando a espada, o líder bárbaro é o mais perigoso, atrevido e inatingível de todos os barachos. Contudo, o cimério não pode estar, ao mesmo tempo, em todos os lugares daquela batalha desigual.
Em meio à loucura da batalha naval, o bárbaro avista o bucaneiro Ratzus – um argoseano, outrora um alto sacerdote de Mitra em Messantia, que fora expulso de sua ordem por pregar o uso de chineladas contra mulheres e filhos indóceis (uma prática aplicada somente em escravos dos shemitas e kushitas). O ódio queima o peito de Conan, ao lembrar também que aquele ex-sacerdote havia sido, após a expulsão, um baracho que logo passou para o lado dos bucaneiros zíngaros – além de ter participado do afundamento do Esbanjador, anos atrás.
Entre o praguejar dos espadachins e ao entrechocar de espadas entre o argoseano de cabelos grisalhos e o cimério de cabelos negros, Ratzus sorri, dizendo a Conan que seu sangue jamais será derramado por nenhum “verme da Ciméria”. Com um sorriso sinistro, o líder baracho usa de toda a força para desarmar o renegado de Argos – que, apesar de lutar um pouco melhor que Conan, não tem metade da força e agilidade do bárbaro – e estrangulá-lo com a mão esquerda, quebrando-lhe o pescoço num estalo seco.
- Seu pedido é uma ordem, “santidade”... – rosna Conan, com ar de ironia, ao cadáver que desaba-lhe aos pés – Nenhuma gota de seu sangue foi derramada.
Pouco depois, após decepar o braço esquerdo de um zíngaro que o atacava, Sabino se esquiva do ataque de outro bucaneiro que investe às suas costas – um zíngaro seminu, com jóias nos brincos e no cabo da espada, e piche nas calças de seda – e crava-lhe o sabre no coração. Contudo, antes que o argoseano de olhos azuis possa arrancar a lâmina do musculoso peito de seu atacante, o velho capitão Zirno de Yorkin decepa por trás, de um só golpe, a cabeça do primeiro-imediato do Mão Vermelha.
Ao ver Sabino – um de seus mais leais piratas – ser decapitado por trás enquanto lutava, Conan se descontrola de ódio e puxa seu punhal, fazendo um estrago ainda maior por entre os bucaneiros que o cercam, derramando sangue, miolos e tripas zíngaras, além de arrebentar ossos, abrir peitos, decepar cabeças, mãos e membros, e cortar corpos de zíngaros ao meio. Toda a cota-de-malha do cimério – a revestir-lhe a camisa e o calção de seda – está tão ensangüentada quanto sua própria espada e adaga.
Então, Conan finalmente alcança Zirno de Yorkin – o covarde matador de seu imediato – e, furioso, detém um golpe de espada do velho zíngaro de bigode grisalho e acerta-lhe um chute nos testículos, esmigalhando-os e rachando a bacia do magro e inescrupuloso capitão. Quando este se curva de dor, o cimério decepa-lhe a cabeça num só golpe. Estava vingada a morte do bravo Sabino de Vênzia.
O líder baracho das colinas cimérias, embora lutando sem esperanças, exulta e ri a cada rosto aberto, crânio partido e intestinos derramados por sua lâmina rubra de sangue zíngaro. O simples fato de poder morrer lutando, distribuindo o máximo de dor e morte antes de cair, já era suficiente para alegrar Conan. Mas ele, por sempre ter sido uma pessoa que encara a morte iminente lutando pela própria sobrevivência, encontra sua chance numa das amuradas inclinadas pelo afundamento do navio, ao mesmo tempo em que, do outro lado do moribundo Mão Vermelha, o último companheiro baracho de Argos – o segundo-imediato Lucius de Messantia – morre esfaqueando o pescoço do zíngaro que lhe dera o golpe fatal.
A batalha foi breve e impiedosa. Vendo o Mão Vermelha afundar sob seus pés, e todos os seus piratas e amigos mortos, Conan enfia seu punhal certeiro na testa do zíngaro mais próximo, para logo depois embainhá-lo e pular da amurada do navio moribundo para o mar.
Alguns arqueiros zíngaros correm para a amurada de seus navios, mirando o local onde o cimério havia mergulhado, e atiram suas flechas. Após cessarem os disparos, eles aguardam uns dois minutos. Mas nenhum cadáver flutua no local dos disparos, ou em qualquer lugar que eles possam ver – a não ser, é claro, os corpos dos argoseanos que o bárbaro liderava.
O Mão Vermelha é saqueado logo antes de ser totalmente afundado. Emergindo a uma distância segura, Conan da Ciméria nada até a costa. Os zíngaros haviam dado o cimério como morto, achando que ele afundara devido à cota-de-malha. Ele, no entanto, havia tirado a mesma após mergulhar.
Cambaleando e ofegante, Conan chega até a praia. Diante da presença de vários zigurates, se erguendo acima dos muros da cidade que avulta diante dele – tornando-a semelhante a uma gigantesca coroa –, e apesar da exaustão que lhe invade a mente e corpo, o cimério imagina estar, provavelmente, diante da cidade shemita de Toragis, não muito distante de Asgalun – capital da província ocidental de Pelishtia – e de muitas outras com arquitetura quase idêntica àquela.
Quando ele e Sigurd sobreviveram ao afundamento do Esbanjador, o cimério e o ruivo haviam nadado até Kyros, no litoral sul daquele mesmo país, pouco antes do vanir seguir para Argos – onde barachos e ex-barachos eram bem-vindos –, e Conan para Koth e Zamora, onde teve seu último encontro com Harpagus, e de lá para o leste e sul de Shem, de onde alcançou Keshan e sua capital, para depois se aventurar em Alkmeenon e Punt.
Tudo isso passa fugazmente pelo cérebro de Conan da Ciméria. Pouco antes de desmaiar na praia, Conan percebe como certas histórias se repetem: por duas vezes, ele foi kozaki; por duas vezes, baracho, e por duas vezes, um navio seu foi afundado por zíngaros. Na primeira vez, seu consolo foi ver que Sigurd havia sobrevivido; e, desta vez, a certeza de que a bela, sensual e irresistível Atlaia saíra de uma profissão que não a agradava – exceto, é claro, pelos carinhos de um punhado de ex-clientes, dos quais o cimério fez parte.
Horas após desmaiar naquela praia, o ex-baracho acordaria e adentraria Toragis, onde se juntaria aos Companheiros Livres de Zarallo. Com eles, Conan viajaria até a cidade stígia de Sukhmet, na fronteira de Darfar, onde – pela primeira vez cansado da companhia de mulheres negras – se reencontraria com a ex-baracha Valéria, da Irmandade Vermelha. Mas isto... é uma outra história.
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