Os Canibais de Zamboula

Por Robert E. Howard,
Originalmente publicado em novembro/ 1935



1. Soa um tambor

- O perigo esconde-se na casa de Aram Baksh!

A voz do que falava tremia de ansiedade, e seus dedos magros, de unhas negras, cravaram-se no braço musculoso de Conan quando gritou sua advertência. Tratava-se de um homem magro, bronzeado pelo sol, com uma enorme barba negra. Suas roupas esfarrapadas indicavam que era nômade. Parecia menor e mais delgado, em comparação ao gigantesco cimério de sobrancelhas negras, enorme peito e fortes braços e pernas. Encontravam-se numa esquina da feira de Forjadores de Espadas e, a seu lado, passava uma multidão de gente, falando diversos idiomas e dialetos. Era uma massa heterogênea, exótica, alegre e efervescente.

Conan afastou os olhos de uma garota de Ghanara, de olhar provocante e lábios vermelhos, cuja saia curta deixava descoberta sua coxa marrom, cada vez que dava um passo. Logo olhou seu aborrecido companheiro e franziu a testa.

- Que quer dizer com isso de perigo? – perguntou o cimério.

O homem do deserto olhou furtivamente por cima do ombro, antes de responder, e baixou o tom de sua voz.

- Não o sei exatamente. Mas os homens do deserto têm dormido na casa de Aram Baksh e nunca mais se ouviu falar neles. Ninguém sabe o que lhes aconteceu. Ele jurou que eles levantam-se e seguem seus caminhos... É verdade que nenhum habitante da cidade jamais desapareceu de sua casa. Mas o certo é que ninguém voltou a ver esses viajantes, e as pessoas dizem que suas mercadorias e seu equipamento foram vistos depois, nas tendas do mercado. Se Aram não os vendeu depois de matar seus proprietários, como chegaram até ali?

- Eu não tenho nada disso. – respondeu o cimério, tocando o cabo da enorme espada que levava pendurada no quadril – Até tive que vender meu cavalo.

- Mas não são apenas os estrangeiros ricos que desapareceram pelas noites da casa de Aram Baksh! – acrescentou o zuagir – Não, ali dormiram homens pobres do deserto e também desapareceram. Uma vez, um chefe zuagir, cujo filho havia desaparecido desse modo, queixou-se diante do sátrapa Jungir Khan, o qual ordenou que a casa fosse examinada por seus soldados.

- E encontraram um sótão cheio de cadáveres? – perguntou Conan ironicamente.

- Não! Não encontraram nada! E o chefe foi expulso da cidade, com ameaças e maldições! Mas...

O homem estremeceu, chegou mais perto de Conan e acrescentou:

- Toparam com algo mais! No limite do deserto, além das casas, há um oásis com palmeiras e nele há uma fossa. E dentro dessa fossa encontraram ossos humanos, chamuscados e escurecidos. Não uma, mas muitas vezes!

- E isso prova o quê? – perguntou Conan com um grunhido.

- Que Aram Baksh é um demônio! Nesta maldita cidade que os stígios construíram e mais tarde os hirkanianos governaram, onde gente branca, marrom e negra se mistura constantemente, produzindo híbridos de toda classe, cor e condição, não há ninguém capaz de distinguir quem é um homem e quem é um diabo disfarçado. Aram Baksh é um demônio em forma de homem! À noite, assume sua verdadeira forma e leva seus hóspedes até o deserto, onde se reúne em conclave com outros diabos da área.

- Por que mata sempre estrangeiros? – perguntou Conan, com tom cético.

- O povo da cidade não toleraria que assassinassem seus concidadãos, mas não lhe importa que matem os estrangeiros que caem em suas mãos. Conan, você é do Ocidente e não conhece os segredos desta terra antiga. Mas desde a criação do mundo, os demônios do deserto têm adorado a Yog, Senhor dos Espaços Vazios, através do fogo... um fogo que devora vítimas humanas. Tenha cuidado! – continuou dizendo o homem – Você morou durante muitas luas nas tendas dos zuagires e é nosso irmão! Não vá à casa de Aram Baksh!

- Vai-te daqui! – disse Conan, repentinamente – Por ali, vem um pelotão de guardas da cidade. Se te vêem, lembrarão que alguém roubou um cavalo do estábulo do sátrapa.

O zuagir abriu a boca e afastou-se rapidamente. Conseguiu se esconder entre uma coluna de pedra e uma barraca da feira, detendo-se um momento para acrescentar:

- Tenha cuidado, irmão! Há demônios na casa de Aram Baksh!

E, em seguida desapareceu correndo por uma estreita ruela lateral.

Conan ajustou o largo cinto que sustentava sua espada e olhou com calma o grupo de guardas que o observava inquisitivamente à medida que passavam a seu lado. Os guardas olhavam-no com curiosidade e desconfiança, porque se destacava, por sua estatura, do resto da multidão que abarrotava as ruas sinuosas de Zamboula. Seus olhos azuis e suas estranhas feições diferenciavam-no dos orientais. A enorme espada que levava pendurada ao cinto também indicava uma diferença.

Os guardas não se detiveram a seu lado; continuaram avançando entre a multidão que lhes abria caminho. Eram pelishtianos atarracados, de nariz aquilino e barba muito negra que caía sobre o peito coberto com cota-de-malha... Se tratavam de mercenários contratados pelos governantes turanianos, e todo o povo os odiava.

Conan olhou em direção ao sol, que começava a esconder-se atrás das casas de tetos planos na parte ocidental da feira. Ajustou mais uma vez o cinto de sua espada e dirigiu-se à taberna de Aram Baksh.

Com passadas de montanhês, avançou pelas ruas agitadas e multicoloridas, onde as túnicas esfarrapadas dos mendigos misturavam-se às luxuosas khalats debrumadas de arminho e os vestidos de seda, adornados com pérolas, das ricas cortesãs. Se via gigantescos escravos negros, vagabundos de barba negra das cidades shemitas; nômades cobertos de farrapos empoeirados, vindos dos desertos vizinhos; comerciantes e aventureiros de todas as terras do Oriente.

A população nativa também era heterogênea. Há séculos haviam chegado os exércitos da Stygia, e erigiram um império no deserto oriental. Zamboula era então uma pequena cidade de comerciantes, circundada por um oásis e habitada pelos descendentes dos nômades. Os stígios transformaram-na numa cidade e povoaram-na com sua própria gente e com escravos shemitas e kushitas. As incessantes caravanas que atravessavam o deserto de leste a oeste, e vice-versa, trouxeram riquezas e contribuíram para a mistura das raças. Então, chegaram os conquistadores turanianos, vindos do Oriente, para reduzir as fronteiras da Stygia, e, desde há quase uma geração, Zamboula havia se transformado no posto fronteiriço mais avançado de Turan, e estava governada por um sátrapa turaniano.

A autêntica babel de línguas que ali se falava ressoava nos ouvidos do cimério, à medida que atravessava as ruas agitadas de Zamboula, nas quais, de vez em quando, aparecia um grupo de cavaleiros destemidos. Se tratava dos ágeis e esbeltos guerreiros de Turan, com rostos escuros de falcão e espadas curvas de aço reluzente. O povo saía correndo ao ouvir os cascos de seus cavalos, que conduziam como se fossem os amos e senhores de Zamboula. Mas os altos e taciturnos stígios miravam-nos, furiosos, das sombras, onde recordavam suas antigas glórias. À população importava muito pouco se o rei que dirigia seus destinos vivia na escura Khemi ou na brilhante Aghrapur. Jungir Khan governava Zamboula e o povo sussurrava que Nafertari, a querida do sátrapa, governava por sua vez a Jungir Khan. Mas o povo vivia sua vida comercializando, disputando, jogando, bebendo e amando como haviam feito durante séculos, desde que suas torres e minaretes haviam se erguido sobre as areias do Kharamun.

Os postes de bronze, com dragões esculpidos, já tinham sido acesos antes que Conan chegasse à casa de Aram Baksh. Sua taberna era a última casa habitada da rua. Um extenso jardim cheio de palmeiras, rodeado por um muro, separava-a das casas que haviam a seu redor. Em direção ao oeste da taberna, havia outro pequeno bosque de palmeiras, no exato local em que a rua transformava-se em estrada e adentrava o deserto. No outro lado da taberna havia uma fileira de cabanas desertas, cobertas pela sombra de algumas palmeiras, que só estavam habitadas por morcegos e chacais. À medida que Conan avançava pelo caminho, perguntou-se por que os numerosos mendigos de Zamboula não haviam ocupado aquelas casas vazias, mesmo que só fosse para dormir. As luzes brilhavam às suas costas. Ali não haviam postes de tipo algum, exceto o que pendia na entrada da taberna. Não se via mais que a luz das estrelas e a fina poeira do caminho, e ouvia-se o sussurro das palmeiras, causado pela brisa do deserto.

A porta da taberna não levava à estrada, mas a uma estreita ruela situada entre a taberna e o jardim cheio de palmeiras. Conan puxou com força a grossa corda, que pendia do sino que havia na entrada, e logo bateu à porta de madeira, golpeando com o punho de sua espada. A porta se entreabriu um pouco e um rosto negro espreitou por uma estreita fresta.

- Abre, condenado! – berrou Conan – Sou um hóspede. Paguei um quarto a Aram e vou desfrutar dele, por Crom!

O negro alongou um pouco o pescoço, pra ver se havia alguém atrás de Conan. A seguir, abriu completamente a porta, sem fazer o menor comentário, e voltou para fechá-la atrás do cimério, e depois disso correu um pesado ferrolho. O muro era bastante alto. Mas havia muitos ladrões em Zamboula, e uma casa situada no limite com o deserto tinha que defender-se contra os ataques noturnos dos nômades. Conan atravessou um jardim, no qual as flores brancas balançavam à luz das estrelas; a seguir, entrou na sala onde um stígio, com a cabeça raspada ao estilo dos estudantes, encontrava-se ao lado da mesa, com os olhos fechados, filosofando sobre mistérios insondáveis, enquanto mais além, em uma esquina, haviam alguns indivíduos de aspecto sinistro jogando dados.

Aram Baksh adiantou-se, caminhando suavemente; era um homem corpulento, com uma barba negra que lhe cobria o peito, tinha o nariz proeminente e uns olhos negros e pequenos que jamais estavam quietos.

- Quer comer? – perguntou – Ou beber?

- Comi um pedaço de carne e outro de pão no suk. – respondeu Conan, com um grunhido – Traga-me uma jarra de vinho de Ghazan. Tenho dinheiro suficiente para pagá-la.

Depois de dizer isto, arremessou uma moeda de cobre sobre a mesa manchada de vinho.

- Não tem ganhado nas cartas?

- Como podia ganhar se tinha umas poucas moedas de prata para começar? Te paguei a estalagem esta manhã, porque estava quase certo que perderia. Queria estar seguro de ter uma cama onde dormir esta noite. Tenho notado que em Zamboula ninguém dorme nas ruas. Até os mendigos buscam um esconderijo e se trancam antes que escureça. A cidade deve estar cheia de ladrões sedentos de sangue.

Conan bebeu o vinho de um gole só, e logo seguiu Aram para fora da sala. Os jogadores de dados, que estavam atrás dele, interromperam a partida para olhá-lo com curiosidade. Não disseram nada, mas o stígio soltou uma gargalhada cínica e zombeteira. Os outros baixaram o olhar, tratando de evitar os olhos de seus colegas. As artes que o stígio estudava não lhe permitiam compreender os sentimentos de um ser humano normal.

Conan seguiu Aram por um corredor iluminado por lâmpadas de cobre, e não lhe agradou nada verificar que seu anfitrião caminhava de forma realmente estranha e sem fazer o menor ruído. Os pés de Aram estavam calçados com sapatos macios e o vestíbulo estava coberto de tapetes turanianos, mas naquela figura havia algo evidentemente desagradável e suspeito.

No final do sinuoso corredor, Aram deteve-se diante de uma porta na qual havia uma pesada barra de ferro, apoiada sobre uns fortes suportes de metal. O taberneiro levantou a barra e fez o cimério adentrar um quarto de aspecto agradável. Conan se deu conta, em seguida, de que as janelas eram pequenas e tinham grades de ferro forjado com desenhos artísticos. Havia tapetes no chão, um teto de estilo oriental e cadeiras de madeira talhada. Era um quarto muito mais cômodo e agradável que o que Conan conseguira pelo mesmo preço no centro da cidade... o que havia lhe agradado muito quando, essa mesma manhã, descobrira o quão escasso estava seu bolso em conseqüência das farras. Chegara em Zamboula, vindo do deserto, fazia apenas uma semana.

Aram já havia acendido uma lâmpada de bronze, e indicou a Conan as duas portas que haviam no quarto. Ambas possuíam fortes ferrolhos de ferro.

- Esta noite pode dormir tranqüilo e seguro, cimério. – disse Aram, pestanejando do umbral.

Conan grunhiu algo ininteligível e arremessou sua espada sobre o leito.

- Seus ferrolhos e suas barras de ferro serão fortes... – disse bruscamente – Mas eu durmo sempre com o aço a meu lado.

Aram não respondeu. Permaneceu de pé, imóvel, acariciando a barba e contemplando a perigosa arma. Logo, retirou-se em silêncio e fechou a porta atrás de si. Conan fechou a tranca, cruzou o quarto, abriu a porta do fundo e olhou para fora. O quarto estava situado numa ala da casa, da qual se via o caminho que havia a oeste da cidade. A porta dava num pequeno pátio rodeado por um muro. Este não tinha aberturas, mas a parede que ladeava o caminho era baixa e não havia fechaduras na porta de entrada.

Conan permaneceu na porta um momento. O brilho da lâmpada refletia-lhe nas costas. Observou o caminho que se perdia entre as palmeiras. As folhas sussurravam sob a brisa suave. Mais além estava o deserto. Na parte alta da rua, em direção contrária, havia luzes, e os ruídos da cidade chegavam debilmente a seus ouvidos. Mas ali só se ouvia o murmúrio das palmeiras, se via a poeira da estrada e as cabanas desertas de tetos baixos, sobre os quais refletia-se a azulada palidez do céu. Em algum lugar, situado além dos pequenos bosques de palmeiras, começou a soar um tambor.

O cimério recordou as advertências dos zuagires; agora, lhe pareciam menos fantasiosas do que lhe pareceram nas ruas abarrotadas de gente e de luzes. Voltou a se perguntar que significado poderiam ter aquelas cabanas vazias. Por que os mendigos as evitavam? Voltou a entrar no quarto, fechou a porta e passou o trinco.

A luz começou a tremeluzir. Conan a examinou e praguejou entre dentes quando se deu conta de que o azeite da lâmpada tinha quase terminado. Quis chamar Aram, mas encolheu os ombros e apagou a luz com um forte sopro. Estendeu-se comodamente sobre o leito na escuridão suave, com uma das mãos apoiada instintivamente no cabo da espada. Olhando preguiçosamente as estrelas através das janelas gradeadas e ouvindo o murmúrio da brisa no jardim de palmeiras, submergiu num sono profundo, escutando vaga e inconscientemente o rufar do tambor no deserto..., o suave atabaque de um tambor tocado suave e ritmicamente por uma mão negra.


2. Os fantasmas noturnos

Foi o sigiloso abrir de uma porta que despertou o cimério. Conan não costumava despertar como os homens civilizados: aturdidos, drogados e estúpidos. Ele acordou instantaneamente, com a mente clara e reconhecendo o som que havia interrompido seu sono. Permaneceu imóvel e tenso na escuridão, e viu como se abria lentamente a porta exterior. À luz das estrelas, viu uma enorme silhueta negra, de ombros largos e cabeça disforme, destacada contra a débil luz do exterior.

Conan sentiu um calafrio. Havia passado o trinco da porta. Como era possível que se abrisse, senão através de poderes sobrenaturais? E como era possível que um ser humano tivesse uma cabeça semelhante? Lembrou das histórias que havia ouvido, nas tendas dos zuagires, sobre demônios e fantasmas. Estava encharcado de suor. Nesse momento, o monstro deslizou, sem fazer ruído, para o interior do quarto, agachando-se e arrastando os pés. Um odor familiar chegou até o cimério, o que não o tranqüilizou em absoluto, dado que as lendas zuagires diziam que os demônios cheiravam dessa forma.

Sem fazer o menor ruído, Conan encolheu suas longas pernas sob o corpo. Tinha a espada na mão direita e atacou violenta e repentinamente como um tigre, em plena escuridão. Nem sequer um demônio teria sido capaz de evitar seu golpe rápido e feroz. Sua espada cravou-se em carne e osso, e algo caiu pesadamente ao chão, proferindo um estranho grito. Conan se agachou na escuridão, sustentando na mão a espada manchada de sangue. Fosse demônio, animal ou ser humano, a coisa jazia morta ao chão. Cheirou a morte como só os seres selvagens e primitivos são capazes de cheirar. Logo, olhou pela porta entreaberta, em direção ao pátio iluminado pela luz das estrelas. A porta da entrada estava aberta, mas o pátio estava vazio.



Conan fechou a porta, mas não pôs a tranca. Tateando na escuridão, encontrou a lâmpada e acendeu-a. Sobrava azeite suficiente para queimar por mais um ou dois minutos. Depois inclinou-se sobre o corpo que jazia no chão em meio a uma poça de sangue.

Era um negro gigantesco, completamente nu, exceto por uma pequena tanga. Numa das mãos ainda segurava um grosso porrete. O cabelo encrespado do individuo estava cheio de espinhos, de pequenos ramos e de barro. Era essa cabeleira de bárbaro que dava à sua cabeça um aspecto monstruoso à luz das estrelas. Com essa pista para resolver o enigma, Conan abriu os grossos lábios vermelhos do homem e grunhiu ao contemplar uns dentes afiados.

Agora, ele entendia o mistério dos forasteiros desaparecidos da casa de Aram Baksh, assim como o significado do tambor que soava além das palmeiras e o mistério da fossa cheia de ossos chamuscados..., aquela fossa onde se assava uma estranha carne, enquanto as feras negras sentavam-se a seu redor para saciar sua fome monstruosa. O homem que estava estendido ao chão era um escravo canibal de Darfar.

Havia muitos homens como esse na cidade. O canibalismo não era abertamente tolerado em Zamboula. Mas agora, Conan entendia por que o povo se trancava em suas casas à noite e por que até os mendigos evitavam as cabanas semidestruídas e se negavam a dormir nas ruas. O cimério grunhiu repugnado, ao imaginar esses enormes selvagens negros perambulando à noite pelas ruas, em busca de presas humanas... e homens que, como Aram Baksh, lhe abriam as portas. O estalajadeiro não era um demônio. Era algo muito pior. Os escravos de Darfar eram ladrões conhecidos. Não havia dúvida de que parte de seus saques desonestos ia parar nas mãos de Aram Baksh. E, em troca, ele lhes vendia carne humana. Conan voltou a apagar a luz, aproximou-se da porta e a abriu. Logo, passou a mão pelos enfeites que haviam na parte exterior. Um deles era móvel e punha em funcionamento o ferrolho interior. O quarto era uma arapuca para caçar seres humanos como se fossem coelhos. Mas desta vez, ao invés de um coelho, haviam pegado um velho tigre, com dentes de sabre.

Conan aproximou-se da outra porta, levantou o trinco e fez pressão sobre ele. Não se movia, mas lembrou que havia um ferrolho do outro lado. Aram não corria riscos com suas vítimas, nem com os homens com os quais lidava. O cimério pôs na cintura o cinto da espada, saiu ao pátio e cerrou a porta. Não tinha intenção de demorar mais seu acerto de contas com Aram Baksh. Se perguntou quantos pobres-diabos haviam sido assassinados enquanto dormiam, arrancados daquele quarto e logo levados ao caminho que atravessava o jardim de palmeiras, até chegarem à fossa.

Se deteve no pátio. Continuava ouvindo o atabaque do tambor e, de repente, viu um resplendor avermelhado através das palmeiras. O canibalismo era algo mais que um apetite perverso para os negros de Darfar. Era parte integral de seu terrível culto bestial. Os abutres negros já estavam reunidos em conclave. Mas fosse qual fosse a carne que enchesse seus estômagos, não seria a sua.

Para chegar até onde estava Aram Baksh, teria que subir por um dos muros que separavam o pátio do resto da casa. Os muros eram altos, provavelmente construídos para defender-se dos canibais. Mas Conan não era um negro criado nos pântanos. Sua infância havia transcorrido nas montanhas acidentadas de sua terra natal. Encontrava-se ao pé do muro mais próximo, quando ouviu um grito assustador sob as árvores.

Conan ficou imóvel, escondido junto à porta de entrada e contemplando o caminho que havia diante dele. O som vinha das sombras, onde se encontravam as cabanas, do outro lado da rua. Ouviu um som abafado, como se alguém tentasse gritar inutilmente sob a pressão de uma mão sobre sua boca. Um grupo de silhuetas surgiu das sombras, que haviam além das cabanas, e começou a avançar pelo caminho. Eram três negros enormes, que carregavam um corpo delgado que se debatia entre seus braços. Conan distinguiu a brancura de uns membros retorcendo-se sob a luz das estrelas, quando o prisioneiro, fazendo um terrível esforço, libertou-se da pressão brutal das mãos de seus captores e começou a correr pela estrada, em direção às cabanas. Se tratava de uma bela mulher branca, completamente nua. Os negros correram atrás dela e, quando entraram nas sombras, ouviu-se outro grito terrível de angústia, de agonia e de horror.

Conan, vermelho de raiva pelo macabro espetáculo, saltou à frente e atravessou correndo a estrada.

Nem a vítima nem seus seqüestradores se deram conta de sua presença, até que chamou-lhes a atenção o suave ruído de seus passos sobre a poeira do caminho. Mas, neste momento, Conan já havia se lançado sobre eles com a fúria de um vendaval. Dois dos negros viraram-se para enfrentá-lo, erguendo seus poderosos porretes. Mas os negros falharam ao calcular a velocidade de Conan. Um deles caiu por terra, com as entranhas de fora, antes que pudesse fazer nada. Logo, girando com a rapidez de um felino, Conan evitou o golpe de outro porrete e atacou com a rapidez de um raio. A cabeça do negro voou pelos ares, seu corpo deu uns passos cambaleantes, enquanto levantava desesperadamente as mãos, e finalmente caiu ao solo.

O outro canibal recuou, emitindo um grito abafado, enquanto soltava sua vítima. A mulher tropeçou e caiu ao chão. O negro correu, tomado pelo pânico, em direção à cidade. Conan correu atrás dele. O medo dava asas aos pés do negro, mas antes que chegasse à cabana situada a leste, o homem sentiu a morte em suas costas e gritou como um boi degolado.

- Cão negro do inferno! – gritou Conan, afundando a espada entre seus ombros escuros, com tanta fúria que metade da lâmina lhe saiu pelo peito.

O sujeito caiu para a frente, com um grito abafado. Logo, Conan apoiou ambos os pés no solo e tirou a espada do corpo do negro.

A brisa balançava as folhas das árvores. Conan sacudiu a cabeça, como um leão que agita sua juba, e grunhiu. Mas não surgiram novas sombras entre as árvores. Diante das cabanas, se via a estrada iluminada pelas estrelas, completamente vazia. Girou rapidamente sobre os calcanhares, ao ouvir um ruído de passos às suas costas. Mas se tratava tão-somente da mulher, que correu até ele, rodeou-lhe o pescoço com ambas as mãos e pôs-se a chorar desesperadamente pelo que acabava de acontecer, e aliviada por ter escapado de uma morte certa.

- Calma, garota. – disse Conan – Tudo já passou. Como foi que lhe pegaram?

A jovem soluçou e murmurou algo ininteligível. Em seguida, ele esqueceu Aram Baksh e observou a garota à luz das estrelas. Era clara, embora de pele morena; tratava-se, evidentemente, de uma das tantas misturas de raças que ocorriam em Zamboula. Era alta, esbelta e delicada. Por outro lado, estava numa posição perfeita para ser observada. A admiração refletiu-se nos olhos duros do cimério, quando olhou seus esplêndidos seios e suas pernas bem torneadas, que ainda tremiam por causa do medo e do esforço físico. Conan envolveu sua cintura com um braço e disse, tentando acalmá-la:

- Pare de tremer, garota. Você está a salvo.

O contato com o braço de Conan pareceu tranqüilizar a jovem. Jogou para trás seus espessos e sedosos cabelos negros, e deu uma olhada temerosa por cima do ombro, enquanto se apertava mais ao cimério, como que buscando proteção e segurança.

- Me pegaram na rua. – murmurou com voz trêmula – Os negros... estavam esperando, escondidos sob uma arcada escura..., esses macacos asquerosos! Set tenha piedade de mim! Creio que sonharei com isso pro resto da vida!

- E o que estava fazendo na rua a esta hora da noite? – perguntou Conan, fascinado pela sedosa pele que sentia sob seus dedos acariciadores.

Mais uma vez, a garota jogou para trás seus cabelos, com um nervoso movimento da cabeça, e olhou Conan nos olhos. Não parecia se dar conta de suas carícias.

- Foi meu amante. – disse – Por culpa de meu amante, tive que sair correndo à rua. Ele ficou louco e tentou me matar. Quando fugia dele, caí nos braços desses animais.

- Uma beleza como a sua pode enlouquecer qualquer homem. – disse Conan, acariciando seus cabelos sedosos.

A garota sacudiu a cabeça, como se despertasse de um sonho. Já não tremia e sua voz era mais firme.

- Foi a maldição de um sacerdote... de Totrasmek, o grande sacerdote de Hanuman, que me desejava para ele..., cão maldito!

- Não precisa insultá-lo por isso. – disse Conan com um sorriso – A velha hiena tem gosto melhor do que eu supunha.

A garota ignorou a gentileza. Estava recuperando a serenidade.

- Meu amante é... é um jovem soldado turaniano. Para vingar-se de mim, Totrasmek lhe deu uma droga que o deixou louco. Desembainhou sua espada e, em meio à sua loucura, tentou me matar, mas fugi para a rua. Os negros me pegaram e me trouxeram a este... que foi isso?

Conan virou-se rapidamente. Sem fazer o menor ruído, como uma sombra, arrastou a jovem para trás da cabana mais próxima, e esconderam-se debaixo de uma palmeira. Permaneceram imóveis e tensos, enquanto o murmúrio de vozes que ambos haviam ouvido ia ficando cada vez mais audível. Um grupo de negros, uns nove ou dez, avançavam pelo caminho, vindos da cidade. A jovem apertou o braço de Conan e este sentiu que a mulher tremia horrorizada.

Naqueles momentos, ouviram-se claramente as vozes dos negros.

- Nossos irmãos já estão reunidos junto à fossa. – disse um – Não tivemos sorte. Espero que eles a tenham tido por nós.

- Aram nos prometeu um homem. – sussurrou outro, enquanto Conan prometia outra coisa a Aram.

- Aram sempre cumpre sua palavra. – grunhiu outro negro – Temos conseguido muitos homens em sua taberna. Mas lhe pagamos bem. Eu mesmo lhe entreguei dez fardos de seda que roubei de meu amo. Por Set, que era uma boa seda!

Os negros passaram rapidamente, levantando a poeira com seus pés descalços. Logo, suas vozes se perderam à distância.

- Nos têm vindo, apesar dos cadáveres que estão atrás dessas cabanas. – murmurou Conan – Se olham o quarto de Aram Baksh, encontrarão outro morto. Vamos sair daqui.

- Sim, vamos o quanto antes! – suplicou a garota, que voltou a ficar nervosa – Meu amante estará vagando sozinho pelas ruas. Os negros poderiam pegá-lo.

- Costume maldito! – exclamou Conan, caminhando com a garota em direção à cidade, e deixando pra trás as cabanas e as palmeiras – Por que os cidadãos não se desfazem destes cães negros?

- São escravos valiosos. – sussurrou a jovem – São muitos e teme-se que eles se rebelem, se for negada a carne que desejam. O povo de Zamboula sabe que vagam à noite pelas ruas e todo mundo cuida-se muito bem de trancar as portas, salvo quando sucede algo imprevisto, como em meu caso. Os negros atacam a toda presa possível, mas costumam preferir os estrangeiros. O povo de Zamboula não se preocupa com os forasteiros que vêm de passagem por aqui.

A garota fez uma pausa e acrescentou:

- Há homens, como esse Aram Baksh, que vendem estrangeiros aos negros. Não se atreveriam a fazer tal coisa com nossos cidadãos.

Conan cuspiu enojado e, imediatamente, conduziu sua acompanhante à estrada que se transformava em rua. De ambos os lados, haviam casas escuras e silenciosas. Esconder-se nas sombras não combinava com seu caráter.

- Aonde quer ir? – perguntou o cimério. A jovem não parecia opor resistência ao fato de Conan levá-la abraçada pela cintura.

- À minha casa, despertar meus criados. – respondeu – Para que procurem meu amante. Não quero que a cidade..., os sacerdotes... nem ninguém... saibam que ele enlouqueceu. É... é um oficial com um futuro promissor. Talvez, se conseguirmos achá-lo, possamos curá-lo de sua loucura.

- Se conseguirmos? – perguntou Conan – O que te faz achar que estou disposto a passar a noite, procurando um louco pelas ruas?

A garota fitou-lhe os olhos e entendeu perfeitamente o brilho de seu olhar. Qualquer mulher teria compreendido que o cimério a seguiria aonde quer que fosse... pelo menos por enquanto. Mas sendo mulher, ocultou seus pensamentos a respeito.

- Por favor. – suplicou com lágrimas nos olhos – Não tenho ninguém a quem pedir ajuda... tu tens sido bom...

- Está bem! – grunhiu Conan – Está bem! Como se chama esse jovem?

- Alafdhal. Eu me chamo Zabibi e sou bailarina. Dancei muitas vezes para o sátrapa Jungir Khan e sua querida Nafertari, e diante de todos os nobres e senhoras da corte. Totrasmek me desejava e, já que o recusei, ele me transformou na ferramenta inocente de sua vingança contra Alafdhal. Pedi a Totrasmek uma poção de amor, sem suspeitar até onde podia chegar seu ódio e sua astúcia. Me deu uma droga, para que eu a colocasse no vinho, e me jurou que, quando Alafdhal a bebesse, me amaria mais que nunca e satisfaria todos os meus desejos. Então, misturei a droga com o vinho de meu amante. Mas, quando ele o bebeu, ficou louco e logo ocorreu o que lhe contei. Esse cão do Totrasmek... maldita víbora mestiça!

A jovem apertou o braço de Conan e ambos se deteram em seguida. Haviam chegado ao distrito das barracas, que estava deserto e às escuras, pois era muito tarde. Estavam passando diante de uma pequena ruela, na qual havia um homem de pé, imóvel e silencioso. Tinha a cabeça inclinada, mas Conan percebeu o estranho brilho de seus olhos, que fitavam-no sem piscar. O cimério estremeceu, não por medo da espada que o homem sustentava à mão, mas devido à sua misteriosa postura e a seu silêncio. Estava claro que se tratava de um louco. Conan afastou a garota e desembainhou a espada.

- Não o mate! – suplicou a jovem – Em nome de Set, não o mate! Você é forte... e poderá subjugá-lo!

- Veremos. – murmurou o cimério, com a espada na mão direita e fechando o punho da esquerda.

Deu um passo até a ruela... e nesse momento, com uma terrível gargalhada, o turaniano o atacou. Ao aproximar-se, o oficial ergueu a espada, e ficou na ponta dos pés para atacar com todas as forças. Ao deter o golpe, a espada de Conan arrancou faíscas do aço inimigo, e, um segundo depois, o louco estava estendido ao chão, inconsciente, devido a um formidável soco que Conan acabava de lhe dar com a mão esquerda.

A garota correu até ele.

- Oh, não está... não está...!

Conan se agachou com um rápido movimento e virou de lado o corpo do homem. Em seguida, examinou-o com as mãos.

- Não está ferido gravemente. – disse Conan – Sangra pelo nariz, mas isso aconteceria a qualquer um, depois de levar um golpe assim na mandíbula. Recobrará os sentidos em seguida, e é até possível que recupere a razão. Enquanto isso, lhe amarrarei os pulsos com o cinto da espada... assim. E agora, onde quer que eu o leve?

- Espere!

A jovem ajoelhou-se junto ao corpo imóvel, tomou as mãos atadas do homem e examinou-as minuciosamente; logo, movendo a cabeça com atitude desiludida, pôs-se de pé. Aproximou-se do gigantesco cimério e apoiou as mãos delgadas no seu enorme peito. Os olhos da jovem brilhavam como azeviches à luz das estrelas, quando ela o fitou.

- Você é um homem de verdade! – disse – Ajude-me! Totrasmek deve morrer. Mate-o por mim!

- E meter meu pescoço numa forca turaniana? – perguntou Conan bruscamente.

- Não!

Os delgados braços da garota, duros como aço, envolveram o pescoço musculoso do cimério. Logo, o corpo quente da jovem latejou, comprimindo-se contra o dele. Em seguida acrescentou:

- Os hirkanianos não amam Totrasmek. Os sacerdotes de Set o temem. É um mestiço, que governa graças ao medo e à superstição. Eu rendo culto a Set e os turanianos adoram a Erlik, mas Totrasmek realiza sacrifícios diante de Hanuman, o maldito. Os nobres turanianos temem sua magia negra e o poder que exerce sobre a população mestiça, e por isso o odeiam. Inclusive Jungir Khan, e sua querida Nafertari, o temem e o odeiam ao mesmo tempo. Se ele aparecer à noite, morto no templo, ninguém buscaria seu assassino.

- E sua magia negra? – perguntou Conan.

- Você é um guerreiro. – respondeu a garota – Arriscar sua vida é parte de sua profissão.

- Por um preço. – admitiu Conan.

- Haverá um preço! – respondeu a jovem, respirando fundo e pondo-se nas pontas dos pés para olhá-lo fixamente nos olhos.

A proximidade daquele corpo ardente e vibrante fez as veias de Conan pegarem fogo. O perfume de seu hálito lhe subiu à cabeça. Mas quando seus braços envolveram-lhe o corpo esbelto, a jovem libertou-se deles com um movimento rápido e disse:

- Espere! Primeiro ajude-me nesta questão.

- Diga-me qual será o preço. – sugeriu Conan, falando com certa dificuldade.

- Recolha meu amante.

Conan obedeceu, e colocou o corpo inerte do homem sobre o ombro. Nesse momento, sentia que poderia derrubar o palácio de Jungir Khan com a mesma facilidade. A garota murmurou algumas palavras ternas ao ouvido do homem inconsciente. Não havia nenhuma hipocrisia em sua atitude. Evidentemente, amava muito Alafdhal. Fosse qual fosse o trato que fizera com Conan, não influiria em nada nas suas relações com Alafdhal. Nestas coisas, as mulheres são mais práticas que os homens.

- Siga-me!

A jovem apressou o passo pela rua e o cimério caminhou atrás dela, sem sentir o menor incômodo pela carga que levava sobre o ombro. Olhou cautelosamente a seu redor, mas não viu nada suspeito. Sem dúvida, os homens de Darfar estavam reunidos juntos à fossa. A garota dobrou uma rua estreita e logo bateu a uma porta em forma de arco.

Quase em seguida, um criado abriu a placa de madeira e mostrou sua negra cabeça. A jovem murmurou algo em voz baixa. Soaram os ferrolhos e abriu-se a porta. Um gigantesco negro destacou-se contra a débil luz de uma lâmpada de cobre. Uma rápida olhada bastou a Conan, para comprovar que não se tratava de um homem de Darfar. Tinha os dentes tortos e a cabeça quase raspada. Seguramente, procedia de Wadai.

Zabibi disse algo e Conan depositou o corpo do homem nos braços do negro que, seguidamente, colocou-o num divã de veludo. O oficial não dava sinais de recobrar os sentidos. O golpe que recebera teria derrubado um boi. Zabibi inclinou-se sobre ele, retorcendo as mãos. Logo ergueu-se e fez um sinal ao cimério.

A porta se fechou suavemente e os ferrolhos voltaram a se ouvir. Uma vez na rua, Zabibi tomou a mão de Conan. A sua tremia um pouco.

- Não me falará? – perguntou.

Conan negou em silêncio, movendo a cabeça.

- Então, siga-me até o santuário de Hanuman e que os deuses tenham piedade de nós.

Avançaram pela rua em silêncio, como dois fantasmas. Talvez naqueles momentos, a garota estivesse pensando em seu amante, que se encontrava estendido sem consciência no divã, sob as lâmpadas de cobre; ou talvez tremesse de medo pelo que lhes esperava no demoníaco templo de Hanuman. O bárbaro pensava na mulher que caminhava agilmente a seu lado. O perfume de seus cabelos chegava até ele e a brisa sensual de sua presença enchia-lhe o cérebro, sem deixar espaço para outros pensamentos.

Em certo momento, ouviram um ruído de passos e esconderam-se sob as sombras de uma escura arcada, até que viram passar um grupo de guardas pelishtianos. Eram uns quinze. Marchavam em formação cerrada, com lanças na mão, enquanto os homens que avançavam na retaguarda levavam escudos de latão às costas para protegerem-se de navalhadas à traição. A terrível ameaça dos canibais negros chegava a ser perigosa até para homens armados.

Enquanto o grupo de guardas se perdeu de vista ao final da rua, Conan e a garota saíram de seu esconderijo e apressaram o passo. Pouco depois, viram o edifício quadrado e de teto baixo que erguia-se próximo a eles.

O templo de Hanuman encontrava-se em meio a uma grande praça, deserto e silencioso sob as estrelas. Um muro de mármore cercava o santuário, que tinha uma abertura em frente ao portal. Essa abertura não tinha portas, ou qualquer tipo de barreiras.

- Por que os negros não buscam suas presas aqui? – perguntou Conan – Não há nada que lhes impeça entrar no templo.

Sentiu que a garota tremia de medo quando apoiou-se nele.

- Temem Totrasmek, assim como todos os habitantes de Zamboula, inclusive Jungir Khan e Nafertari. Venha! Vamos agir rapidamente, antes que desapareça a pouca coragem que me resta!

O medo da garota era evidente, mas ainda assim não hesitava. Conan desembainhou a espada e atravessou o umbral do templo na frente da jovem. O cimério conhecia muito bem os terríveis hábitos dos sacerdotes orientais e estava certo de que um invasor do templo de Hanuman poderia encontrar-se com qualquer tipo de horror. Também sabia que existia a possibilidade de, tanto ele quanto a garota, jamais saírem vivos do templo, mas Conan havia arriscado sua vida demasiadas vezes pra pensar nisso.

Entraram num pátio com chão de mármore, que brilhava com uma luz branca sob as estrelas. Um breve trecho de largos degraus levava à porta principal, circundada por enormes colunas. As grandes portas de bronze estavam abertas, como haviam ficado durante séculos. Mas, no interior, não haviam fiéis nem se queimava incenso. Durante o dia, chegavam homens e mulheres, que deixavam suas oferendas ao pé do negro altar, diante do deus-macaco. À noite, o povo evitava o templo, como a lebre evitava o rastro de uma serpente.

O interior do santuário estava fracamente iluminado por umas estranhas lâmpadas que davam certa sensação de irrealidade. Próximo à parede do fundo, atrás do negro altar de pedra, estava o deus, sentado com o olhar sempre fixo na porta aberta, através da qual haviam entrado, durante séculos, as vítimas arrastadas por correntes. Havia um pequeno canal, que ia da soleira até o próprio altar e, quando os pés de Conan pisaram-no, o cimério afastou-se rapidamente, como se houvesse pisado numa serpente. Esse sulco havia sido feito pelos milhares de pés humanos, que morreram gritando sobre esse sinistro altar.

Ali estava Hanuman, mirando com olhos malignos e bestiais, através de sua máscara talhada. Não estava sentado como um macaco, mas com as pernas cruzadas, feito um homem, ainda que com o mesmo aspecto de símio. Estava esculpido em mármore negro, mas seus olhos eram rubis que brilhavam com um resplendor vermelho e libidinoso; pareciam brasas infernais. Suas mãos enormes estavam apoiadas sobre seu colo, com as palmas para cima, e tinha os dedos separados como garras. No exagero de seus atributos e no aspecto de sátiro que tinha, refletia-se o abominável cinismo do culto degenerado que o deificava.

A jovem se movia ao redor da imagem, em direção à parede traseira, e quando um de seus quadris roçou um dos joelhos de mármore do macaco, saltou para trás, como se houvesse tocado num réptil. Havia um espaço de um metro entre as costas largas do ídolo e a parede de mármore, com friso folheado a ouro. A cada lado do ídolo havia uma porta de marfim sob um arco dourado.

- Estas portas levam a um corredor em forma de ferradura. – disse a jovem apressadamente – Estive uma vez no interior do templo..., uma só vez!

A jovem tremeu e seu corpo se contraiu diante da lembrança horrível e obscena. Logo acrescentou:

- O corredor tem forma de ferradura, e cada um de seus extremos vai dar neste quarto. Os aposentos de Totrasmek se encontram na curva do corredor. Mas há uma porta secreta nesta parede, que leva diretamente a um aposento interior.

A jovem começou a passar suas mãos pela superfície lisa, onde não se via uma só fenda ou abertura. Conan estava a seu lado, com a espada na mão, olhando cuidadosamente ao seu redor. O silêncio, o vazio que havia no santuário e o que imaginava haver atrás do muro, o faziam sentir-se como uma fera selvagem numa armadilha.

- Ah!

Finalmente, a garota encontrou uma mola oculta. Em seguida, se abriu uma brecha quadrada no muro.

- Set! – gritou a jovem.

Mesmo quando Conan saltou sobre ela, não pôde fazer nada. Nesse momento, uma enorme mão disforme agarrou a jovem pelos cabelos e, em um décimo de segundo, todo seu corpo desapareceu pela abertura que havia no muro. Conan só pôde tocar-lhe uma de suas pernas nuas. Do outro lado da parede, ouviu-se o ruído abafado de luta, logo um grito e depois uma risada que lhe gelou o sangue nas veias.


3. As mãos negras apertam

Ao mesmo tempo em que proferia uma maldição, o cimério golpeou a parede com todas as suas forças, valendo-se do cabo de sua espada. O mármore se fez em pedaços. Mas a porta secreta não cedeu e a razão lhe disse que, sem dúvida, haviam posto uma barra do outro lado. Virou-se e correu para uma das portas de marfim.

Levantou a espada para rachar as placas, mas antes empurrou a porta instintivamente com a mão esquerda. Abriu-a com facilidade e viu, diante de si, um longo corredor que delineava uma curva sob a luz de umas lâmpadas, muito semelhantes às que iluminavam o altar. Um pesado ferrolho de ouro segurava firmemente a porta. Conan tocou-a ligeiramente com as pontas dos dedos. O levíssimo calor do metal só podia ser detectado por um homem com as capacidades de um lobo. Aquele ferrolho havia sido tocado... e assim sendo... há alguns segundos. O assunto estava tendo, cada vez mais, o aspecto de uma verdadeira cilada. Deveria ter suspeitado que Totrasmek sabia quando alguém entrava no templo.

Entrar no corredor havia sido meter-se, sem motivo, na arapuca armada pelo sacerdote. Mas Conan não vacilou. Em algum lugar daquele santuário debilmente iluminado, encontrava-se cativa Zabibi e, pelo que ele sabia sobre os sacerdotes de Hamunán, estava certo de que a garota precisava de sua ajuda. O cimério entrou no corredor, avançando como uma pantera, preparado para atacar à direita e à esquerda.

À sua esquerda havia mais portas de marfim, e tentou abri-las. Estavam todas fechadas. Depois de avançar uns metros, o corredor traçava uma curva para a esquerda. Havia uma porta que conduzia a esta curva, e que cedeu sob sua mão.

Viu um enorme cômodo, um pouco mais iluminado que o corredor. Suas paredes eram feitas de mármore branco, o chão era de marfim e o teto era de prata talhada. Viu divãs de seda, banquetas de marfim com incrustações de ouro para apoiar os pés e uma mesa redonda, feita de um material similar ao metal. Sobre um dos divãs, reclinava-se um homem que olhava em direção à porta. O individuo pôs-se a rir quando seus olhos encontraram-se com os de Conan.

O homem estava nu, exceto pela tanga e pelas sandálias, que usava amarradas às pernas. Era de pele morena, curtos cabelos negros e olhos inquietos da mesma cor; seu rosto era largo e de aspecto arrogante. Era enorme em circunferência e largura; e, ao menor movimento, inchavam-se todos os seus músculos. Suas mãos eram as maiores que Conan tinha visto em toda sua vida. A segurança que lhe conferia sua força titânica notava-se em todos seus gestos e movimentos.

- Por que não entra bárbaro? – perguntou o homem, em tom de zombaria e com um exagerado gesto de convite.

Os olhos de Conan ardiam com ferocidade, mas entrou cautelosamente na sala, com a espada na mão.

- Quem diabos é você? – perguntou o cimério com um grunhido.

- Sou Baal-Pteor. – respondeu o homem – Uma vez, há muito tempo e em outras terras, me chamava de outra maneira. Mas este é um bom nome, e qualquer mulher do templo poderia explicar-lhe por que Totrasmek me chama assim.

- Assim como você é o cão dele. – exclamou Conan – Bem, pois maldita seja sua pele marrom, Baal-Pteor. Onde está a mulher que você agarrou através da parede?

- Meu amo a está hospedando! – riu Baal-Pteor – Escute!

Do outro lado da porta situada em frente à que Conan acabava de atravessar, ouviu-se o grito de uma mulher, débil e apagado pela distância.

- Maldita seja sua alma!

Conan deu um passo em direção à porta e logo girou sobre seus calcanhares. Baal-Pteor estava rindo dele, mas naquela risada havia uma ameaça velada que arrepiou os pêlos do cimério e o inundou de uma sede vermelha de vingança.

Avançou em direção a Baal-Pteor, apertando tanto a espada em sua mão direita, que tinha os nós dos dedos brancos pelo esforço. Com um movimento rápido, Baal-Pteor lançou-lhe algo... Era uma espécie de esfera de cristal que brilhava intensamente sob a estranha luz das lâmpadas.

Conan evitou-a instintivamente, mas a esfera se deteve no ar, a pouca distância de seu rosto, como por encanto. Não caiu ao chão. Ficou como que suspensa por fios invisíveis, a um metro de altura. Ao observá-la, atônito, a esfera começou a girar em velocidade crescente. E, ao fazê-lo, aumentou de tamanho e se transformou numa nebulosa que enchia a sala. A esfera o envolveu. Transformou a mobília, as paredes e o sorridente rosto de Baal-Pteor numa mancha. Conan se sentia perdido em meio ao azulado turbilhão cegante. Um vento terrível sacudiu Conan e quase o fez perder o equilíbrio, arrastando-o até o vórtice do redemoinho que girava freneticamente diante dele.

Conan recuou cambaleando, enquanto lançava um grito abafado, e esbarrou-se na sólida parede que havia às suas costas. Ao contato com a parede, a ilusão se desvaneceu subitamente. A gigantesca esfera desapareceu. Conan estava de pé na sala, de baixo teto prateado, com os pés rodeados por uma bruma cinza, e viu Baal-Pteor estendido no divã, rindo às gargalhadas.

- Filho de uma cadela! – gritou Conan, avançando sobre ele.

Mas a bruma se elevou, fazendo desaparecer a gigantesca figura morena. Cego pela nuvem espessa que o rodeava, Conan experimentou uma estranha sensação... e, logo depois, a sala, a bruma e o homem do divã desapareceram. Encontrava-se só, entre os altos juncos de um mangue, de onde o atacava um búfalo com a cabeça baixa. O cimério saltou de lado, para evitar os chifres em forma de sabre do furioso animal, e afundou a espada atrás de uma de suas patas dianteiras, atravessando-lhe as costelas e o coração. Então não foi o búfalo moribundo o que viu no pântano, mas Baal-Pteor. Praguejando em voz alta, Conan cortou-lhe a cabeça de um só talho. Então, a cabeça pulou do solo e suas afiadas presas bestiais dirigiram-se à sua garganta. Conan estava certo de que nem sua tremenda força física poderia impedir esse ataque mortal. Então, se ouviu um rugido espantoso e, mais uma vez, encontrou-se na sala com Baal-Pteor, que tinha a cabeça firmemente apoiada sobre seus ombros. Estendido no divã, o gigante riu silenciosamente dele.

- Hipnose! – grunhiu Conan, escondendo-se e apoiando firmemente seus pés no chão de mármore. Seus olhos lançavam faíscas. Esse cão negro estava zombando dele! Mas aquela estupidez, esse truque de brumas e de sombras não podia causar-lhe dano algum! Não precisaria mais que saltar e atacar, e o assassino se tornaria cadáver em poucos segundos. Desta vez não se deixaria enganar pelas sombras da ilusão..., todavia, mais uma vez foi enganado.

Conan ouviu um grunhido aterrador às suas costas, girou sobre os calcanhares e atacou, com a velocidade do pensamento, uma pantera que se agachava sobre a mesa de metal, disposta a saltar sobre ele. Ao golpeá-la, a aparição desvaneceu-se e a lâmina de sua espada chocou, com um ruído surdo, contra a duríssima superfície metálica. Logo notou algo anormal. A lâmina ficou grudada à mesa! Puxou-a com todas as forças, mas a arma não cedia. Aquilo não era bruxaria. A mesa era um gigantesco ímã. Agarrou mais uma vez o cabo de sua espada com ambas as mãos e, nesse exato momento, ouviu uma voz às suas costas. Deu meia volta e encontrou-se, frente a frente, com o homem moreno que acabava de levantar-se do divã.

Baal-Pteor era ligeiramente mais alto que Conan e muito mais corpulento. Nesses momentos erguia-se diante dele como uma massa de músculos. Seus poderosos braços eram exageradamente longos. Suas mãos grandes abriam-se e fechavam-se convulsivamente. Conan soltou a empunhadura da espada grudada à mesa e ficou em silêncio, para observar seu inimigo através das pálpebras entreabertas.

- Sua cabeça, cimério! – disse Baal-Pteor, provocativamente – Arrancarei-a com as mãos, como se fosse a de um frango! É assim que os filhos de Kosala oferecem seus sacrifícios a Yajur. Bárbaro, você está diante de um estrangulador de Yota-Pong. Fui eleito pelos sacerdotes de Yajur quando era criança e logo, durante minha adolescência e juventude, me treinaram na arte de matar com as mãos... porque é assim que se fazem os verdadeiros sacrifícios. Yajur ama o sangue e não desperdiçamos nem uma só gota das veias das vítimas. Quando eu era menino, me entregavam bebês para treinar-me; ao chegar à adolescência, estrangulei garotas e, na juventude, o fazia com mulheres e anciãos. Enquanto não alcancei plena maturidade como homem, não me entregaram um homem forte para sacrificar no altar de Yota-Pong. Durante anos, ofereci sacrifícios a Yajur. Centenas de pescoços estiveram entre estes dedos... – O gigantesco homem agitou ambas as mãos diante dos olhos furiosos de Conan. Logo acrescentou: – O motivo pelo qual fugi de Yota-Pong, para me tornar criado de Totrasmek não é assunto seu. Daqui a pouco, toda a sua curiosidade terá acabado para sempre. Os sacerdotes de Kosala, os estranguladores de Yajur, são muito mais fortes do que um ser humano possa imaginar. E eu era mais forte que todos eles. Quebrarei seu pescoço com minhas mãos, bárbaro!

Num abrir e fechar de olhos, suas enormes mãos se fecharam sobre o pescoço de Conan, feito cobras. O cimério não fez o menor esforço para desviá-las, mas suas mãos também agarraram o pescoço do kosalano. Baal-Pteor abriu, pasmo, seus olhos negros, quando sentiu entre suas mãos os poderosos músculos que protegiam a garganta do bárbaro. Este soltou um grunhido e exerceu toda sua força sobre-humana. Seus formidáveis músculos ressaltaram-se como cordas em seus braços. Quando Conan apertou os dedos ao redor de sua garganta, o gigante abriu a boca para respirar. Por um segundo, os dois homens permaneceram imóveis como estátuas. Seus rostos eram duas máscaras tensas e, nas têmporas, se avolumavam suas veias azuladas. Conan sorriu, grunhindo e deixando à mostra sua branca dentadura. Os olhos de Baal-Pteor estavam arregalados, com uma expressão de terrível surpresa e medo. Ambos os homens continuaram imóveis durante um momento, com exceção das contrações dos músculos de seus braços e pernas. Ali se desenrolava uma incrível luta de forças..., forças capazes de arrancar árvores inteiras e de esmagar crânios de bois.



Pela boca entreaberta de Baal-Pteor, o ar assobiou. Seu rosto estava ficando azul, e o temor se refletiu em seus olhos. Os músculos de seus enormes braços estavam a ponto de explodir, mas o pescoço taurino do cimério não cedia. Sob os dedos desesperados do gigante, os músculos do pescoço de Conan eram como cordas de ferro. No entanto, a carne de Baal-Pteor cedia sob os dedos de ferro do cimério, que afundavam mais e mais nos músculos da garganta do outro, até esmagá-los contra a jugular.

A imobilidade estatuária dos homens deu lugar a um movimento súbito e veloz, quando o kosalano começou a retorcer-se e tentou lançar-se para trás. Soltou a garganta de Conan e levou ambas as mãos à sua, tentando afastar aqueles dedos inexoráveis.

Com uma investida repentina, o cimério foi dobrando-o para trás, até que as costas do gigante golpearam a mesa. Conan continuou dobrando o homem mais e mais, até que sua coluna vertebral esteve a ponto de quebrar-se.

A suave risada de Conan foi implacável como o ruído metálico de duas espadas.

- Imbecil! – exclamou o cimério – Parece-me que nunca tinha visto um homem ocidental. Acaso se acreditava forte, porque era capaz de retorcer os pescoços de homens civilizados, pobres diabos com músculos feito cordas podres? Droga! Tente quebrar o pescoço de um touro selvagem da Ciméria, antes de considerar-se forte. É o que fiz antes de me tornar homem... Assim!

Com um movimento selvagem, Conan retorceu a cabeça de Baal-Pteor até que seu rosto ficou mirando o ombro e suas vértebras estalaram como um galho partido.

Conan lançou o corpo inerte ao chão. Logo empunhou a espada com ambas as mãos, apoiando firmemente os pés. Seu peito largo estava manchado de sangue, por causa dos ferimentos que as unhas do gigante lhe haviam feito no pescoço. Tinha os cabelos molhados e o suor lhe encharcava o rosto. Apesar de ter rido da força de Baal-Pteor, estivera a ponto de perder a disputa contra ele. Mas, sem parar pra recuperar o fôlego, deu um forte puxão e arrancou a espada do ímã ao qual estava grudada.

Em seguida abriu a porta, atrás da qual havia soado o grito. Encontrou-se num corredor longo e reto, no qual se viam várias portas de marfim. A outra extremidade estava coberta por uma cortina de veludo e, do outro lado, se ouvia uma música diabólica que Conan não havia ouvido nem sequer em seus piores pesadelos. Aquela estranha música lhe arrepiou os pêlos.

Também se ouviram ofegos e soluços histéricos de mulher, misturados com a música. Conan agarrou firmemente sua espada e saiu correndo pelo corredor.


4. Dance, garota, dance!


Quando Zabibi atravessou a abertura que havia aparecido na parede atrás do ídolo, seu primeiro pensamento, confuso e incoerente, foi o de que sua hora tinha chegado. Fechou os olhos instintivamente e esperou o golpe. Mas, ao invés disso, se sentiu arremessada com muito poucas cerimônias sobre o duro e polido chão de mármore, machucando os quadris e joelhos. Ao abrir os olhos, olhou temerosa ao seu redor, enquanto ouvia um impacto abafado do outro lado. Viu um gigante de pele escura e tanga, e, no extremo oposto da sala, um homem sentado num divã, de costas para uma cortina de veludo. Era um sujeito gordo, de mãos brancas e cheias, e olhos de víbora. A garota estremeceu, porque esse homem era Totrasmek, o sacerdote de Hanuman, que durante anos havia estendido suas redes de poder por toda a cidade de Zamboula.

- O bárbaro tem intenções de entrar pela parede. – disse Totrasmek, com ironia – Mas o ferrolho se sustentará.

A garota viu que alguém havia passado a pesada tranca de ouro da porta secreta, que se via perfeitamente desse lado da parede. Tanto o ferrolho quanto seus suportes resistiriam ao ataque de um elefante.

- Abra-lhe uma das portas, Baal-Pteor. – ordenou Totrasmek – Mate-o na sala quadrada, do outro lado do corredor.

O kosalano saudou respeitosamente e deixou a moradia, pela porta que havia na parede lateral da sala. Zabibi se pôs em pé e olhou temerosa o sacerdote, cujos olhos percorriam com avidez seu esplêndido corpo, ao que a garota se mostrou completamente indiferente. Uma dançarina de Zamboula estava habituada à nudez, mas a crueldade que havia nos olhos do sacerdote fê-la estremecer.

- Mais uma vez, vem ao meu retiro, minha formosa. – disse com cinismo – É uma honra inesperada pra mim. Você parecia ter desfrutado tão pouco da sua visita anterior, que eu não esperava que a repetisse. No entanto, fiz tudo o que pude para lhe proporcionar uma experiência interessante.

Era impossível que uma bailarina se ruborizasse, mas nos seus olhos arregalados havia um brilho de cólera misturado com medo.

- Porco! – exclamou – Sabe muito bem que não vim aqui por amor a você.

- Não. – respondeu Totrasmek rindo – Vieste como uma tonta à noite, acompanhada por um bárbaro estúpido, para cortar-me a garganta. Por que deseja minha morte?

- Sabe muito bem por quê! – gritou a jovem, dando-se conta de que era inútil dissimular.

- Está pensando em seu amante. – disse o sacerdote, sorrindo – O fato de querer matar-me indica que a droga que te dei surtiu efeito. Mas, não foi você que a pediu para mim? Não lhe enviei o que me pediu, sem levar nada em consideração, meu amor?

- Lhe pedi uma droga que o fizesse dormir por algumas horas. – respondeu a jovem com amargura – E você..., você enviou com seu criado uma droga que o deixou louco! Fui uma tonta ao confiar em você. Eu tinha que haver me dado conta das falsas que eram as declarações de amizade, com as quais você disfarçava seu ódio e desprezo.

- Para que queria que seu amante dormisse? – ele perguntou – Para roubar-lhe a única coisa que ele jamais lhe daria: o anel com a jóia que os homens chamam a Estrela de Khorala..., a estrela roubada da rainha de Ophir, que pagaria um quarto cheio de ouro para recuperá-la. Ele não queria lhe dar, porque sabe que a jóia tem poderes mágicos que, devidamente controlados, podem escravizar o coração de qualquer ser humano do sexo oposto. Queria roubá-la, por medo de que os magos dele descobrissem a chave dessa magia e ele se esquecesse de você, tentando conquistar todas as rainhas do mundo. Você venderia-a à rainha de Ophir, que conhece todo seu poder, e o utilizará para escravizar-me, como fez antes de roubarem-na.

- E pra que você a queria? – perguntou a moça.

- Porque conheço seus poderes. Assim aumentaria a força das minhas habilidades.

- Bom. Pois você já a tem!

- Eu tenho a Estrela de Khorala? Não, engana-se.

- Por que mente? – respondeu a mulher com amargura – Ele a levava no dedo, quando tive que sair correndo pela rua. E quando o reencontrei, já não a tinha. Seu criado devia estar vigiando a casa e arrebatou-a enquanto eu fugia. Pro diabo com ela! Só desejo recuperar meu amante são e salvo. Você já tem o anel. Tem castigado a nós dois. Por que não lhe devolve a razão? Pode fazê-lo?

- Posso. – respondeu o sacerdote laconicamente, desfrutando do sofrimento da jovem.

Tirou um pequeno frasco de sua túnica e acrescentou:

- Este frasco contém o suco do lótus dourado. Se seu amante o beber, ficará curado no ato. Sim, terei piedade dele. Os dois me enganaram, não uma, mas muitas vezes. Ele sempre se opôs a meus desejos. Mas, mesmo assim, me apiedarei. Venha e tome o frasco de minha mão.

A garota olhou Totrasmek, tremendo de ansiedade para pegar o frasco, mas temendo que se tratasse de uma brincadeira cruel. Avançou timidamente com uma mão estendida e o sacerdote pôs-se a rir impiedosamente, afastando o frasco de seu alcance. A jovem entreabriu os lábios para amaldiçoá-lo, mas seu instinto impeliu-a a erguer os olhos. Do teto dourado caíram quatro vasos de jade. A jovem tentou esquivá-los, mas espatifaram-se a seu redor. A garota gritou desesperadamente. De cada fragmento de jarro quebrado surgia a cabeça de uma cobra, e uma delas tocou-lhe a perna nua. O rápido movimento que fez para evitar a picada mortal obrigou-a a pôr-se ao alcance de outra serpente, da qual também teve que fugir com a rapidez de um raio.

Estava metida numa armadilha mortal. As quatro serpentes se balançavam e tocavam seus pés, tornozelos, panturrilhas, joelhos, coxas, quadris, qualquer parte de seu voluptuoso corpo que estivesse perto delas. A jovem não podia saltar, nem passar entre elas, para colocar-se a salvo. Só podia dar voltas e saltar em todas as direções, retorcendo seu corpo para evitar que a mordessem, e cada vez que se evitava uma serpente, punha-se ao alcance de outra, de modo que tinha de continuar movendo-se à velocidade da luz. Essas cabeças significavam uma ameaça mortal. Só uma dançarina de Zamboula conseguiria sobreviver naquele quadrilátero mortal.

Zabibi se transformou num turbilhão assombroso de rápidos movimentos. As cabeças falhavam por centímetros. De algum lugar oculto, chegava uma estranha música que se misturava com o terrível silvo das serpentes, que era como um maligno vento noturno, soprando através da vasilha oca de uma caveira. Apesar da rapidez de seus movimentos, a jovem percebeu claramente que os odiosos animais não atacavam sem propósito. Obedeciam à estranha e sinistra melodia que soava à distância. Atacavam com um ritmo espantoso e, pela força, os movimentos da garota tinham que adaptar-se ao ritmo dos animais. Seus frenéticos movimentos faziam parecer normais as danças mais obscenas de Zamora. Doente de asco, vergonha e horror, Zabibi ouviu a risada implacável de seu carrasco.

- A Dança das Cobras, minha amada! – disse Totrasmek, rindo – Assim bailavam as virgens diante do altar de Hanuman, há séculos..., mas nunca com a mesma beleza e suavidade que você. Dance, garota, dance! Durante mais quanto tempo conseguirá evitar as presas do Povo Venenoso? Minutos? Horas? No final, se cansará. Seus pés rápidos e seguros vacilarão; suas pernas lhe falharão; seus quadris girarão mais lentamente. Então, os dentes das cobras começarão a afundar em sua carne ebúrnea...

Atrás dele, a cortina se agitou como se movida por uma forte lufada de vento, e Totrasmek gritou. Seus olhos se abriram, arregalados, e suas mãos agarraram febrilmente o pedaço de aço que sobressaiu repentinamente de seu peito.

A música parou. A garota cambaleou em meio à sua dança, gritando ante a ameaça das terríveis presas... e então, viu no solo apenas quatro colunas de fumaça azulada, inofensivas, e Totrasmek caiu de bruços sobre o divã.



Conan saiu de trás da cortina, limpando a lâmina de sua espada. Tinha visto a garota dançar desesperadamente, através das grossas cortinas, entre as quatro inofensivas espirais de fumaça, mas se deu conta de que ela via outra coisa. Conan sabia que havia matado Totrasmek.

Zabibi caiu ao chão cambaleando, e quando Conan caminhou até ela, a jovem, ao tentar colocar-se de pé, voltou a cambalear porque suas pernas não lhe obedeciam, devido ao cansaço.

- O frasco! – exclamou – O frasco!

Totrasmek ainda segurava o pequeno frasco numa das mãos. A jovem o arrancou desesperadamente de seus dedos crispados e logo começou a vasculhar as roupas do cadáver.

- Que diabos está procurando? – perguntou Conan.

- Um anel..., o que ele roubou de Alafdhal. Deve ter sido tirado enquanto meu amante caminhava pelas ruas, vítima da loucura. Pelos demônios de Set!

Imediatamente, Zabibi se convenceu de que o anel não se achava escondido entre as roupas de Totrasmek. Procurou por toda a sala, rasgou a tapeçaria do divã e as cortinas, e entornou vários vasos. Logo se deteve um momento e afastou uma mecha que lhe tapava os olhos.

- Esqueci de Baal-Pteor! – exclamou a jovem.

- Está no inferno, com o pescoço quebrado. – afirmou Conan.

A garota se alegrou diante da notícia, mas um segundo depois praguejou expressivamente e acrescentou:

- Não podemos ficar aqui. Falta pouco para que amanheça. Os sacerdotes menores costumam visitar o templo a qualquer hora da noite e, se nos descobrem aqui com este cadáver, o povo nos fará em pedaços. Os turanianos não conseguiriam salvar-nos.

Zabibi levantou o trinco da porta secreta e, um momento mais tarde, se encontravam na rua apressando o passo, para se afastarem o mais rápido possível do antigo templo de Hanuman.

Numa silenciosa ruela situada a curta distância, Conan se deteve e encostou uma mão sobre o ombro nu de sua acompanhante.

- Lembre que havia um preço...

- Não o havia esquecido! – respondeu a garota, afastando-se do cimério – Mas primeiro temos que... encontrar Alafdhal!

Pouco depois, o escravo negro os fez passar pela porta traseira do edifício. O jovem turaniano se encontrava estendido, com os braços e pernas amarrados com grossas cordas. Tinha os olhos abertos, mas pareciam os de um lunático. Seus lábios estavam cobertos de espuma. Zabibi se estremeceu.

Use a força para abrir-lhe a boca! – disse a jovem. Os dedos de ferro de Conan obedeceram à ordem. Zabibi esvaziou o frasco na garganta do louco. O efeito foi mágico. Imediatamente, se tranqüilizou. O estranho fulgor de seus olhos desapareceu. Olhou a jovem, atordoado, mas era evidente que a reconhecia. Logo caiu num sono normal.

- Quando despertar, estará curado. – murmurou a jovem, fazendo um sinal ao escravo negro.

Este último se curvou e entregou à garota uma pequena bolsa de couro. Logo, colocou-lhe a capa de seda sobre os ombros. As maneiras da garota mudaram sutilmente, quando fez um gesto a Conan para que o seguisse pra fora da casa.

Numa arcada que levava à rua, a garota virou-se para Conan e disse inesperadamente:

- Devo dizer-lhe a verdade. Não sou Zabibi. Sou Nafertari. E ele não é Alafdhal, um pobre capitão da guarda. É Jungir Khan, o sátrapa de Zamboula.

Conan não fez nenhum comentário. Não moveu um só músculo de seu escuro rosto cicatrizado.

A mulher continuou:

- Lhe menti, porque não me atreveria a contar a verdade a ninguém. Estávamos sós, quando Jungir Khan ficou louco. Só eu sabia. Se fosse espalhada a notícia de que o sátrapa de Zamboula enlouquecera, certamente teria havido uma revolta, tal qual havia planejado Totrasmek, que desejava nossa destruição.

Houve um silêncio, e a jovem acrescentou:

- Agora vê por que é completamente impossível que eu lhe dê a recompensa que esperava. A querida do sátrapa não é..., não pode ser para ti. Mas terás uma recompensa. Aqui está uma bolsa de ouro.

Logo depois, lhe entregou a bolsa que havia recebido das mãos do escravo.

- Agora vá e, quando o sol nascer, venha ao palácio. Farei com que Jungir Khan lhe nomeie capitão de sua guarda. Mas, secretamente, obedecerás minhas ordens. Sua primeira missão será vagar com um pelotão de homens até o templo de Hanuman, aparentemente para buscar pistas do assassino do sacerdote, mas na verdade para procurar a Estrela de Khorala. Deve estar escondida em algum lugar. Quando encontrá-la, traga-a para mim. Agora, pode ir.

Conan assentiu com um movimento da cabeça e logo se afastou. A jovem, ao ver que ele ia embora balançando os ombros largos, se sentiu um tanto estranhada ao não perceber no homem nenhum sinal de que se sentisse contrariado ou enganado.

Quando o cimério dobrou a esquina, olhou para trás e logo mudou de direção, apressando o passo. Pouco depois, se encontrava no distrito da cidade onde estava armado o Mercado de Cavalos. Bateu numa porta até que um rosto barbudo apareceu numa janela, para perguntar o que queria.

- Um cavalo. – disse Conan – O mais rápido que tiver.

- Não abro a porta a ninguém a esta hora da noite. – disse, com um grunhido, o mercador de cavalos. Conan fez soar algumas moedas.

- Filho de uma cadela! – exclamou – Não vê que sou branco e estou só? Abra, antes que eu arrombe sua porta!

Pouco depois, Conan cavalgava um corcel baio em direção à casa de Aram Baksh.

Adentrou a pequena ruela que havia entre a taberna e as palmeiras, mas não se deteve na porta. Continuou avançando para a esquina nordeste do muro, logo girou e avançou ao longo do leste, até que finalmente se deteve a alguns passos do ângulo nordeste. Não havia árvores perto da parede, mas alguns arbustos baixos. Amarrou o cavalo a um destes, e estava a ponto de subir novamente à sela, quando ouviu um murmúrio de vozes além do ângulo que o muro fazia.

Depois de retirar o pé do estribo, se aproximou da esquina e olhou a seu redor. Havia três homens avançando pela estrada, em direção ao pequeno bosque de palmeiras e, a julgar pelo modo de caminharem, adivinhou que fossem negros. Pararam diante da presença de Conan e aproximaram-se uns dos outros, quando este avançou em direção a eles com a espada na mão. Os olhos dos homens brilhavam à luz das estrelas. Em seus rostos de ébano refletia-se uma ânsia brutal, mas sabiam que seus três porretes de madeira não podiam competir com a espada do gigantesco branco. Conan também o sabia.

- Aonde vão? – perguntou.

- Avisar a nossos irmãos que apaguem o fogo que arde do outro lado das palmeiras. – foi sua áspera resposta – Aram Baksh nos prometeu um homem, porém mentiu. Encontramos um de nossos irmãos mortos, no quarto-armadilha. Esta noite estamos famintos.

- Não creio. – respondeu Conan com um sorriso – Aram Baksh lhes entregará um homem. Vêem esta porta?

Apontou para uma pequena porta de ferro, localizada no centro da parede. Logo, acrescentou:

- Esperem aí. Aram Baksh lhes entregará um homem.

Recuando cautelosamente até ficar fora do alcance de um possível golpe de porrete, Conan deu meia-volta e dobrou pelo ângulo noroeste do muro. Ao chegar junto a seu cavalo, se deteve um momento para assegurar-se de que os negros não o seguiam, e logo após subiu à sela, permanecendo imóvel e tranqüilizando o animal com umas palavras pronunciadas em voz baixa. Estendeu suas mãos até alcançar a beirada do muro e, com um salto ligeiro, se encontrou do outro lado da parede. Uma vez ali, estudou o terreno. A taberna estava construída no ângulo sudoeste, e o resto do terreno estava ocupado por hortos e jardins. Não viu ninguém pelos arredores. A taberna estava escura e silenciosa. Conan sabia que todas as portas e janelas estavam fechadas e trancadas por dentro.

Também sabia que Aram Baksh dormia num quarto que dava num caminho rodeado por ciprestes, e que conduzia à porta do muro oeste. Deslizou como uma sombra entre as árvores e, logo depois, bateu suavemente na porta do quarto.

- Quem é? – perguntou uma voz sonolenta, vinda de dentro.

- Aram Baksh! – gritou Conan – Os negros estão pulando o muro!

A porta se abriu quase imediatamente. Na soleira, apareceu o taberneiro, que vestia apenas uma camisa e segurava uma adaga na mão. Descobriu a cabeça e viu Conan.

- Que história é esta...? Você!

Os dedos poderosos de Conan apertaram-lhe a garganta e abafaram seu grito. Os dois homens caíram juntos ao chão e o cimério lhe arrebatou a adaga em um décimo de segundo. A lâmina brilhou sob a luz das estrelas e logo o sangue jorrou. Aram Baksh abriu a boca num horrendo gorjeio, antes de vomitar um jato escarlate. Conan o levantou e a adaga voltou a brilhar. Grande parte da enrolada barba do homem caiu ao chão.

Agarrando a garganta de seu cativo (porque um homem sempre pode gritar incoerentemente até com a língua cortada), Conan o tirou do quarto escuro e o arrastou pelo caminho de ciprestes até a porta do muro exterior. Levantou o trinco com uma mão e abriu a porta. Do outro lado, viu as três silhuetas negras que esperavam como abutres. Conan lançou o estalajadeiro em seus braços ansiosos.

Da garganta de Aram Baksh surgiu um grito espantoso, mas não teve resposta alguma da silenciosa taberna. O povo estava acostumado a ouvir gritos próximos aos muros. Aram Baksh lutou como um selvagem, olhando freneticamente o cimério. Mas não havia piedade em seus olhos. Conan pensava na quantidade de seres humanos – homens, mulheres e crianças – que haviam perdido a vida pela ganância daquele homem.

Cheios de alegria, os negros arrastaram-no pela estrada, zombando de seus lamentos incoerentes. Como podiam saber que aquele corpo seminu, coberto de sangue e com a barba raspada, que pronunciava balbucios ininteligíveis, era Aram Baksh? Os ruídos da luta chegaram até Conan, que estava de pé junto à porta, mesmo depois que os homens desapareceram entre as palmeiras.

Depois de fechar a porta atrás de si, Conan voltou pra onde estava seu cavalo, montou nele e se dirigiu para o oeste, em direção ao deserto, dando um extenso desvio para evitar o sinistro bosque de palmeiras. Enquanto cavalgava, tirou de sua bolsa um anel no qual brilhava uma jóia, que lançava maravilhosas faíscas à luz das estrelas. Sustentou-a no alto, para admirá-la de todos os ângulos. A compacta bolsa de moedas de ouro tilintava à medida que o cavalo avançava, como uma promessa de futuras e maiores riquezas.

“Me pergunto o que ela diria, se soubesse que, desde o primeiro momento em que a vi, me dei conta de que era Nafertari, e ele Jungir Khan”, pensou Conan.

Também conhecia a existência da Estrela de Khorala. “Haverá uma bela cena, se ela suspeitar em algum momento que tirei o anel de Jungir Khan, enquanto o amarrava com o cinto de sua espada. Mas jamais me pegarão”.

Olhou para trás. Entre as palmeiras, se via o resplendor vermelho de uma fogueira. Ouviu-se um canto que vibrava com um júbilo selvagem na noite. Outro som se misturou com este. Eram gritos incoerentes, dos quais não se entendia uma só palavra. Aquele barulho seguiu Conan, até que finalmente se afastou sob as estrelas que empalideciam.


FIM



Tradução: Fernando Neeser de Aragão.

Fontes: http://gutenberg.net.au/ebooks06/0600791h.html e http://www.vb-tech.co.za/ebooks/Howard%20Robert%20E%20-%20Conan%2003%20-%20The%20Conquering%20Sword%20of%20Conan%20-%20FF.txt
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