em 07/10/2004
Tradução: Fernando Bertacchini
JENNIFER CONTINO: Você já trabalhou com muitos personagens diferentes. Por que resolveu adicionar Conan a essa lista? O que mais gosta no personagem?
KURT BUSIEK: O que eu gosto em Conan? Pra começar, gosto do fato de que ele não é um herói. É um aventureiro, que luta em benefício próprio e por tudo que puder lucrar com isso. Não que Conan seja destituído de um código moral, mas ele não sai por aí fantasiado e combatendo o mal diriamente. Ele é humano, mundano e egoísta, com desejos bem compreensíveis. Conan quer dinheiro, sexo, bebidas e não quer que ninguém o perturbe. Taí algo bem diferente dos super-heróis convencionais, o que torna Conan um personagem extremamente divertido de se escrever.
Além disso, me agrada que ele não se limite a vagar de um local pra outro. Mesmo que não saiba qual é seu rumo, os leitores sabem que ele tem um destino. Sabem que suas histórias não se resumem a simples aventuras, mas da biografia de um bárbaro que um dia se tornará um rei, o soberano da mais poderosa nação de seu mundo. Esse senso de direção, a certeza de que essas aventuras têm um propósito, de que cada uma delas é um passo rumo a um grande destino, conferem maior importância e dramaticidade à saga de Conan. Tudo nela é importante. Tudo leva a algum lugar. Por meio de todas aquelas bebedeiras, noites de sexo e batalhas, nós aos poucos unhamos a educação de um rei.
Além disso, ele é um grande personagem. Teimoso, intempestivo, violento e temperamental. Instintivamente, porém, Conan compreende as verdades do mundo bem melhor que todos os homens "civilizados" que encontra em seus caminhos. Ele não é sofisticado - o que, na visão de Howard, também significa que ele não é corruptível. Howard sentia que o estado natural da humanidade era o barbarismo, e Conan é o epítome disso. Um ser imaculado pela decadência da "civilização".
JC: Dos profissionais que já escreveram as aventuras de Conan no passado, quem são seus favoritos? Na sua opinião, quais foram os principais destaques de cada um deles?
KB: Acho que, embora alguns caras tenham realizado um bom trabalho aqui e ali, o único roteirista que efetivamente capturou o "espírito" do personagem foi Roy Thomas. O Conan de Roy era incrível. Desde o primeiro número, em 1970, até seu retorno aos títulos do cimério nos anos 90. Na verdade, quando Mike Richardson me contou que a Dark Horse havia adquirido os direitos de produção de Conan, minha primeira pergunta foi: "E você ainda não contratou o Roy?".
Quanto aos artistas, todo mundo aclama Barry Smith e John Buscema, e não sou exceção. Porém, também adorei o Bárbaro de Gil Kane. Cada desenhista adotava uma abordagem diferente. O Conan de Smith era um indivíduo mais ágil, num mundo estilo barroco. O de Buscema, um gigante rude num ambiente sujo e realista. E o de Kane foi um guerreiro alto e esguio em cenários exóticos. Mas todos eram ótimos. Sem desmerecer Frank Brunner, Neal Adams e outros que fizeram um grande trabalho em histórias esporádicas, Smith, Buscema e Kane são minha trinca de ouro.
JC: Como será o seu Conan? Algum dos eventos da cronologia Marvel terá relevância no seu trabalho?
KB: Estamos recomeçando tudo, voltando às origens do personagem. A diretriz que recebi da Dark Horse foi a de que vamos assumir como nossa base as histórias originais de Robert E. Howard e nada mais - e já estou encantado. Por melhor que tenha sido, tanto nos livros quanto nos quadrinhos, o trabalho de vários autores, tudo reverte aos textos de Howard e tudo que realmente importa é a obra dele. Por mais que eu adore o que Roy, Barry, John e Gil fizeram, não pretendemos incorporar o material Marvel (embora eu espere que a Dark Horse republique tudo em coletâneas encadernadas, como faz com os quadrinhos de Guerra Nas Estrelas produzidos pela Marvel). Nosso projeto é reiniciar toda a saga do Gigante de Bronze, desde que ele deixa a Ciméria para se aventurar em terras desconhecidas, sempre em busca de riquezas e aventura. Nós vamos adaptar as histórias de Howard e preencher lacunas com as nossas próprias concepções, tentando assim construir uma nova saga de Conan a partir de raízes sólidas. Pode chamar de Ultimate Conan (em alusão à inovadora linha Ultimate Marvel, conhecida como Marvel Millennium no Brasil). Seria um termo adequado em muitos aspectos.
Portanto, vamos lançar, bem no coração corrupto dos reinos hiborianos, um bárbaro jovem, ingênuo e mortal até a alma. E então o veremos abrir seu próprio caminho até o topo com unhas e dentes. Com certeza, vai ser muito divertido.
JC: Quais são suas metas para o Conan?
KB: Contar histórias emocionantes, fazer jus ao personagem e me divertir muito explorando e expandindo a obra de Robert E. Howard. Produzir um gibi arrasador, que empolgue os fãs antigos e mostre a uma nova geração de leitores o que há de tão legal num brutamontes irado, temperamental e sempre armado com uma espada.
Kurt Busiek é roteirista de histórias em quadrinhos desde 1982. Já escreveu as aventuras do Homem de Ferro, Thunderbolts, Power Company, Mickey Mouse, Liga da Justiça e Vingadores. Seus trabalhos mais aclamados são a minissérie Marvels, ilustrada pelo sensacional artista Alex Ross, e a multipremiada Astro City.