(por “Von Kalmbach”)
Quando a lua cheia se ergueu no céu estrelado
E os ventos rugiram loucamente pelo vale estreito,
Vi o brilho no olho de uma estranha jovem
E fugi do covil do lobo selvagem.
O JOVEM
VIAJANTE olhava apreensivamente ao redor, enquanto atravessava, a passos
largos, a floresta densa. Ele não era covarde, mas a escura trilha sinuosa,
através das árvores muito juntas, o enervava. No alto, os galhos entrelaçados
oscilavam, eclipsando o luar, e as folhas sussurravam e farfalhavam como mil
fantasmas num conclave.
O viajante
saiu da floresta para uma selvagem charneca varrida pelo vento. A lua se erguia
alta e cheia no céu da meia-noite, delineando tudo com esplendor espectral. De
um lado a outro da charneca coberta de grama, havia manchas de tojo (*)
e urze, e seu cheiro se erguia até seu cérebro como um licor inebriante, após a
escuridão grave da floresta. O olhar do viajante se estreitou no contorno
arredondado de uma grande colina à distância, a qual se erguia até um topo
plano, sobre o qual havia um grande círculo de dólmenes sombrios. Uma pequena
fogueira palpitava no centro daquele círculo, e o viajante murmurou uma praga
perplexa. Quem mais estaria pelo campo à noite, neste local selvagem?
O viajante
correu em direção à colina. Suas longas passadas cobriam a distância, enquanto
ele atravessava a charneca com a graça de uma pantera. Seu manto, tanga e botas
de pele, e a espada larga e o punhal em seu cinto largo, eram os de um homem do
Norte, parecendo impróprios para a estrutura poderosa daquele jovem guerreiro
de cabelos negros. Ele era um selvagem, seus olhos azuis ferozes de exultação e
esforço.
O viajante
reduziu a velocidade para uma caminhada cautelosa, ao se aproximar da base da
coluna. Seu peito musculoso subia e descia, mas a longa corrida não parecia ter
esgotado seu vasto reservatório de vitalidade a nenhum grau perceptível. Ele
pôs uma grande mão cicatrizada sobre o cabo da espada, e galgou cuidadosamente
até o topo da colina.
No centro do
círculo silencioso de dólmenes, uma pequena fogueira de acampamento palpitava
num buraco raso, cercado de pedras. A luz da fogueira lambia sinistramente as
superfícies, entalhadas de runas, dos dólmenes, os quais agora se pareciam, ao
viajante, com gigantes sombrios reunidos para uma festa. Uma pequena
construção, com teto de meia-água e oferecendo alguma proteção contra os
elementos, havia sido feita entre dois dos dólmenes e, embora o acampamento
parecesse ter sido abandonado recentemente, o viajante sentia que seu ocupante
ainda estava próximo. Enquanto este pensamento lhe cruzava a mente, o viajante
ouviu um movimento e olhou para cima, para ver alguém sair da escuridão até a
luz do fogo.
Era uma mulher
que apareceu ali, com a luz da fogueira dançando em seu belo rosto, e nos selvagens
olhos azuis e indóceis. Ela tinha cabelos negros, como os do viajante –
aparentemente nascida da mesma raça. Caminhou sem medo até ele, e os olhos dele
perambularam com feroz apreciação sobre os seios fartos, a estreita cintura
flexível e os largos quadris sob sua túnica simples, de cor castanho-clara. Ela
não fez qualquer tentativa de puxar sobre si o longo manto, que lhe pendia dos
ombros, aparentemente tão esquecida do vento frio que lhe agitava as roupas
quanto estava do olhar ardente do viajante. Parecia ser, como ele, um rebento
das terras selvagens.
- O que lhe
traz ao acampamento de Morwen, ó forasteiro? Você está vestido como os lobos do
norte, embora claramente não seja aesir nem vanir.
- Meu nome é
Conan, um cimério – afirmou o jovem –, e vim do norte. Marchei com o Jarl
Hjorl, e derramamos ondas de sangue vermelho sobre a neve, onde as espadas e os
machados dos aesires reluziram e trovejaram, despedaçando os escudos dos
vanires.
- Nenhum
capricho do destino lhe trouxe até minha casa. – Ela se moveu para perto dele e
sorriu, enquanto percorria as mãos no peito e pesados braços dele; ela
percorreu com os dedos as cicatrizes de batalha que lhe cruzavam a estrutura
férrea. – Você é forjado com aço e sangue, nas chamas da guerra. Já cantei
minha canção nos ventos por alguém como você, e a Deusa ouviu meu apelo. Ela
enviou um parceiro adequado para Morwen.
Conan
estreitou os olhos para sua presunção, mas o aspecto e cheiro dela eram como um
fogo em suas veias, e ele prontamente assentiu quando ela deslizou para dentro
de seu abraço. Ele a beijou ferozmente e sorveu dos beijos selvagens dela. Ela
pôs uma das mãos dele sobre o seio, e a outra deslizou para dentro da túnica e
ao redor da cintura flexível dela, para lhe acariciar as costas e puxá-la até ele.
- Crom! – O
cimério praguejou e empurrou a mulher. Ela girou com graça ágil, encarando-o do
outro lado da fogueira com um sorriso lupino nos lábios.
- O que há? –
ela perguntou zombeteiramente. – Você é um homem entre homens, mas mesmo assim
não é homem suficiente para uma mulher do Tuatha de Cernunos?
Conan lançou
uma praga furiosa, diante do nome da prole pagã, e então recuou da luz da
fogueira.
- Se eu não
posso provar do seu amor – falou Morwen calmamente, do outro lado das chamas,
com um brilho feroz nos olhos –, então eu posso, pelo menos, provar da sua
carne!
Então o jovem
Conan girou e correu. A risada de Morwen soou atrás dele.
O sangue
pulsava selvagemente no cérebro de Conan, enquanto ele descia correndo a colina
e atravessava a charneca ao luar. Os temores supersticiosos de seu povo lhe
enchiam a mente com imagens assustadoras dos Filhos de Cernunos. Seu medo não
era infundado.
Conan parou e
olhou rapidamente para trás, para ver uma enorme forma negra sair furtivamente
de entre os dólmenes e galopar colina abaixo. Então, ele virou e correu através
da charneca.
O cimério
sabia que, apesar de toda a sua própria velocidade, a criatura infernal estaria
sobre ele, antes que ele alcançasse o abrigo das árvores. Enquanto corria,
olhava ao redor, em busca de um lugar para oferecer resistência. Ele viu uma
baixa elevação coroada por pedra calcária, e suas botas encontraram apoio na
pedra. Ele deu a volta, e viu o enorme lobo negro, tão grande quanto um
jumento, correndo veloz e perto dele. Suas mandíbulas estavam escancaradas, e
seus olhos inflamados com selvageria sobrenatural, enquanto saltava
silenciosamente.
A espada de
Conan girou num arco gélido, impulsionada por cada desesperado grama de
músculos de aço. A cabeça volumosa do lobo rodopiou no ar, numa espiral de sangue,
e seu corpo enorme se espatifou contra ele, derrubando-o com seu peso. Por um
longo instante, Conan jazeu ali, com todo o fôlego arrancado de si. Então, ele
ergueu a carcaça sem cabeça sobre ele com uma praga, e se levantou encharcado
de sangue, mal capaz de acreditar que ainda vivia.
Ele encarou a
cabeça decepada, quando esta brilhou fracamente ao luar. Era a cabeça de Morwen
que agora jazia lá na grama, seus olhos sem visão voltados para o céu noturno.
Aos seus pés, jazia o corpo decapitado dela, agora inconfundivelmente o de uma
mulher, exceto pelo fato de que, ao longo de sua espinha, da nuca até a parte
inferior das costas, havia uma longa e grossa faixa de pêlos, como a pele de um
lobo.
Então, os
pêlos se arrepiaram na parte posterior do pescoço de Conan, quando ele
testemunhou uma visão sombria. Pois a bela cabeça de Morwen se torceu no chão,
suas pálpebras se agitaram e seus olhos mortos brilharam para ele com uma chama
sobrenatural.
- Nenhum homem
consegue matar uma Filha de Cernunos à luz da lua prateada – ela disse. – Oh,
Conan, fique comigo e seja meu amante! Tais prazeres serão nossos. Vamos dançar
juntos com os seres chifrudos em seus arvoredos secretos.
Então, Conan
correu novamente através daquela charneca espectral, para longe do medonho
dólmen na colina. Atrás dele, a gargalhada infernal de Morwen se erguia assombrosamente
para dentro do céu estrelado.
FIM
Tradução: Fernando Neeser de Aragão.