(por Fernando Neeser de Aragão)
“Ele viajou para Khitai, Hirkânia e para
regiões menos conhecidas ao norte desta última e ao sul da primeira. Ele até
visitou um continente sem nome, no hemisfério oeste, e vagueou entre as ilhas
adjacentes”
(Carta de
Robert E. Howard a P. S. Miller).
1) Guina da
Britúnia
O sol acaba de
se pôr em Tarantia, a capital do mais próspero e poderoso reino do Ocidente. As
ameias dos imponentes muros do palácio real destacam-se contra o negro céu
estrelado. A lua brilha sobre a esplendorosa capital da Aquilônia, e sobre os
exuberantes jardins floridos do palácio real. Pelas ameias dos muros passeiam
os guardas, armados de alabardas e espadas, enquanto a ponte levadiça está
baixa, permitindo a passagem de diversos nobres, damas e cavaleiros,
luxuosamente vestidos com sedas, veludos, cetins, linhos, algodões e malhas, e
bem-recebidos pelos maiores anfitriões da festa que iria começar: o general Prospero,
de Poitain – com o leopardo escarlate de sua província bordado em sua casaca –,
o Rei Conan da Aquilônia e a rainha, a bela Zenóbia, lindamente enfeitada com
um longo vestido de cetim e um manto de seda, além de uma belíssima e rica coroa
de ouro realçando-lhe a escura, bela e lustrosa cabeleira cacheada. Apenas as condessas
Lissa, Valéria e Albiona conseguem se igualar à rainha em beleza.
A Condessa
gazali Lissa, dos olhos violetas como os de seus co-ancestrais pré-thurianos, dez quilos mais pesada que na época em que
conhecera seu atual marido e o busto com o dobro do volume de 29 anos atrás,
quando fugira de Gazal e Tombalku, continua tão bela e com o peso tão bem
distribuído quanto na ocasião em que ela e o loiro conde aquiloniano, que a
abraça, aventuraram-se no deserto ao lado do bárbaro que hoje se senta no trono
real de Tarantia.
E a Condessa
Valéria – agora com 46 anos, e o busto volumoso um pouco maior que há 20 anos –
também continua tão bela quanto na época de pirata da Irmandade Vermelha, sendo
agora dona de uma beleza quase tão madura quanto a de Lissa e levando sua
espada pendurada ao cinto, mesmo em ocasiões pacíficas como aquela. Por ter sua
propriedade próxima, tanto da do Conde Amalric e Condessa Lissa, quanto da
Bossônia, ela não pôde estar presente nas batalhas do Rio Tybor – onde Conan
matou o Rei Strabonus e Prospero matou o Rei Amalrus – e das Montanhas
Goralianas – na qual Xaltotun fora morto e o cimério recuperou seu trono –, por
estar ocupada, ajudando os bossonianos a matar pictos que se aproveitavam da
pequena redução da quantidade de hiborianos na Fronteira Oeste, durante aquelas
guerras e batalhas, para tentarem invadi-la. Embora sabendo que Conan tem seu
harém e rainha, ela permite que o rei cimério, de vez em quando, a visite em
sua casa, onde ambos têm relações sexuais secreta e esporadicamente.
O rei, por sua
vez, é um homem alto, de ombros poderosos e peito profundo, com um sólido
pescoço musculoso e ombros densamente musculosos. Ele veste seda e veludo, com
os leões reais da Aquilônia bordados a ouro sobre a rica jaqueta, e a coroa da
Aquilônia lhe brilhando em sua agora grisalha cabeleira de corte reto; mas a
grande espada ao seu lado lhe parece mais natural que suas vestimentas reais.
Sua testa é baixa e larga, e seus olhos de um azul vulcânico que arde como se
com algum fogo interno, inexistente nos olhos de qualquer civilizado. Seu rosto
moreno, cicatrizado e quase sinistro é o de um guerreiro, e sua roupa de veludo
não consegue esconder as linhas firmes e perigosas de seus membros.
Aqueles olhos, que parecem mirar
desde abismos insondáveis, haviam contemplado cenas jamais imaginadas pelos
nobres do palácio; tinham visto, não só campos de batalha com corpos mutilados,
mas também tombadilhos encharcados de sangue, execuções atrozes e sacrifícios
em altares de deuses exóticos. Suas mãos poderosas haviam empunhado espadas
ocidentais, a shasqa cherkessiana, cimitarras zuagires e kozakis, a faca
zhaibar, o iatagã turaniano e machados aesires – tudo isso com a mesma destreza
e potência devastadoras, diante de homens de todas as raças e até contra
criaturas inumanas, vindas de domínios desconhecidos e tenebrosos –, até
finalmente subir, com mãos ensangüentadas, ao trono aquiloniano. O verniz de
civilização lhe cobre a alma de bárbaro com uma capa muito fina.
E, naquelas
duas turbulentas décadas de reinado, Conan da Ciméria, além de aumentar o poder
e a prosperidade da Aquilônia, enfrentara várias conspirações e guerras, derrotando
grandes inimigos, como o proscrito Ascalante, os reis Amalrus de Ophir e Strabonus
de Koth, além dos feiticeiros Tsotha-Lanti de Zamora e Xaltotun de Acheron. Após
derrotar, há 16 anos, a conspiração nemédia contra seu reino, o bárbaro
casou-se com Zenóbia e nela gerou dois filhos: seu primogênito e herdeiro
Brion, de 15 anos, e Flavia, de 14.
O rei cimério nunca perdeu a atração sexual por Zenóbia – agora com 20
bem-distribuídos quilos a mais do que há 16 anos –, mas foi a personalidade da
nemédia o que o atraiu à primeira vista. Conan havia ficado realmente
impressionado com a mistura de ingenuidade e conhecimento, demonstrados por sua
rainha, quando esta – na época, uma escrava de harém do Rei Tarascus – o
libertara da prisão, em Belverus. A personalidade da Rainha Zenóbia havia
conquistado de forma definitiva o amor do Rei Conan. Sem contar que, apesar de
sempre ter tido preferência por mulheres esguias, ele também se sentia atraído
por mulheres do corpo voluptuoso de Octávia da Nemédia, Valéria da Irmandade
Vermelha e agora, por Zenóbia e algumas das mulheres de seu harém – as quais,
assim como a rainha da Aquilônia, também engordaram e ficaram flácidas. À
medida que sua esposa e parte de suas concubinas foram mudando de aspecto, o gosto
de Conan foi se tornando tão diversificado quanto a aparência física delas.
E, de vez em quando, o olhar do rei também se perde em direção à parede
mais distante do salão, onde é exibida uma esplêndida coleção de armas:
espadas, lanças, achas de combate, maças e azagaias. Embora o soberano esteja
satisfeito em ver seu povo adotivo em paz, lhe é impossível dominar o impulso
de sua natureza bárbara, a qual lhe faz lembrar o fluir do sangue e o quebrar
de armaduras, ou de ossos de um inimigo sob o fio de sua pesada espada. Aonde quer que vá, tanto a um alegre banquete como
aquele, quanto a uma agradável biblioteca ou ao perfumado harém real, aquele
bárbaro sombrio da Ciméria leva consigo a perigosa e ameaçadora atmosfera do
campo de batalha. O mesmo ocorre com a ex-pirata Valéria ali presente. Mas
aquela ocasião é mais propícia para empreendimentos pacíficos
Naquela tarde, o cimério havia recusado uma aliança com a Hiperbórea,
proposta por embaixadores daquele país, enviados pelo Rei Tomar Vladinov, neto
de Belbog Vladinov – o qual governava os hiperbóreos quando, com cerca de 16
anos, Conan havia sido aprisionado naquele país gelado ao norte, juntamente com
vários amigos aesires – seus primeiros aliados e amigos não-cimérios –, e
somente ele escapou vivo. Seu ódio pelos hiperbóreos é tão grande, que o
bárbaro – apesar de já ter liderado mercenários daquele país sob o comando de
Yasmela – não admitia qualquer aliança ou amizade com o reino deles.
Naquele momento, Zenóbia pede permissão para ir aos seus aposentos,
descansar um pouco e retocar a maquiagem. Pouco depois que sua rainha se
retira, Conan ouve subitamente estranhos sons abafados, vindos de seu harém,
desembainha bruscamente a espada e sai do salão de festas, seguido por Prospero
e Pallantides.
Chegando ao seu serralho, ele ouve os gritos de horror de suas
concubinas e, na fração de segundo seguinte, o cimério entende o motivo. Ele vê
uma cena de pesadelo e horror: uma de suas concubinas, Guina da Britúnia, caída
ao chão, quase irreconhecível, com suas vestes sumárias rasgadas. O rosto alvo
dela está agora escurecido, os lindos olhos azuis arregalados e a língua
esticada para fora da boca aberta.
Ao lado do cadáver da mulher, uma enorme serpente
emplumada está prestes a atacá-lo. Conan toma a frente, disposto a vingar sua
concubina. Sem emitir um grunhido, enquanto é
envolvido pelos anéis gigantes, o rei Conan apenas saca seu punhal – pois sua
espada, à qual o cimério deixa cair ao chão, seria inútil a tão curta distância
– e começa a perfurar aquela enorme serpente emplumada. Mas a faca parece
incapaz de atravessar aquelas camadas de penas espessas, e repetidas cutiladas
não surtem o menor efeito – e seus dois amigos ali presentes temem interferir,
e atingirem acidentalmente o monarca. Contudo, sem perder o autocontrole, Conan
percebe que as penas escasseiam perto da cabeça do monstro e, num único golpe
de seu punhal, decepa a cabeça da criatura num jato de sangue.
Ainda arfando, ele vê
uma espécie de urna metálica, não muito diferente da que vira em Numália, na
sua adolescência. Antes mesmo que suas concubinas lhe expliquem a situação, o
rei entende que aquela tigela havia sido inadvertidamente aberta pela bela
loira quarentona, agora horrivelmente morta. Mas o que diabos aquela embalagem
fazia ali? Então, o rei bárbaro olha para dentro da urna, e lê seu conteúdo,
entalhado no fundo do objeto. A linguagem, embora lhe seja pouco familiar, não
difere muito da stígia:
“Por causa do amor que o remetente Khyan-Apopi, de Mogar, deixa ao Rei
Conan da Aquilônia. Encontre-me em Yamal, caso esteja vivo”.
Uma onda de ódio mortal
toma conta do cimério. Ele automaticamente reconhece aquele nome como o do
filho de Khari-Apopi, um sacerdote a quem conhecera em seus tempos de baracho,
há 25 anos, na ilha distante de Mogar – sem contar que ele havia visto, nos
pilares do portão do palácio daquela ilha, esculturas idênticas à criatura à
qual acabou de matar. Antes que possa recuperar totalmente o fôlego, Conan ouve
outro som abafado, de luta, desta vez vindo dos seus aposentos, e corre até lá,
pouco depois de mandar Prospero e Pallantides jogarem fora aquela coisa morta.
Enquanto isso, nos
aposentos reais, uma furtiva mão marrom se fecha sobre a boca de Zenóbia e
puxa-lhe a cabeça para trás, enquanto a outra leva o punhal até sua traquéia.
Ela ergue ambas as mãos e agarra a lâmina com todas as suas forças, afastando-a
da garganta. A rainha o ouve praguejar. Os dedos dela estão escorregadios de
sangue, mas não largam o punhal. A mão sobre sua boca se aperta mais,
tirando-lhe o ar. Zenóbia torce a cabeça para o lado, e consegue pôr um pouco
da carne do homem entre os dentes. Ela morde-lhe a palma da mão com força. O
homem grunhe de dor. A rainha da Aquilônia faz mais força, lhe rasga a pele, e
subitamente ele a larga. O gosto do sangue do homem lhe enche a boca. Ela
inspira uma golfada de ar e grita, a plenos pulmões, o nome de seu marido, ao
mesmo tempo em que reconhece aquele homem escuro, alto e magro, como o mesmo
que trouxera uma estranha urna.
Ele gira e corre até a
porta, tentando fugir dos aposentos reais, mas é detido na entrada por uma
estocada fatal no coração. O homem só tem tempo de soltar um breve grito de
dor, antes de cair morto. Sorrindo de alívio, a Rainha Zenóbia reconhece a figura
alta e musculosa do jovem filho Brion – o qual, exceto pelos olhos verdes, é a
imagem viva do pai, o Rei Conan, quando este último era adolescente. Logo atrás
dele, aparece o cimério, que há 20 anos governa a Aquilônia. Os olhos de Conan
faíscam, ao reconhecerem o pretenso assassino da rainha como um mogar – sem
dúvida, um lacaio de Khyan-Apopi, que trouxera aquela maldita urna metálica.
Brion examina a mãe, perguntando-lhe se ela está bem, enquanto, com a ajuda do
pai, amarra um pedaço de pano nos dedos de sua genitora.
* * *
Mais tarde, após cremarem
solenemente o corpo de Guina em praça pública (ela não tinha parentes vivos que
pudessem lhe reivindicar o cadáver, e o cimério preferia usar aquele funeral
aesir a enterrar seus entes queridos), Conan está reunido com o General Pallantides
e o cavaleiro Prospero. Zenóbia, Brion e Flavia apenas observam a reunião,
preocupados com o amado marido e pai.
- Enviaremos um pelotão
com Vossa Majestade, para pegarmos aquele bruxo assassino – diz Pallantides.
- Não – responde o Rei
Conan, batendo o poderoso punho na mesa. – Um grande grupo atrai atenções
indesejadas. Quero que aquele cão mogar pense que eu morri, e não saiba que
estarei em seu encalço. Irei sozinho e disfarçado, evitando a Estrada dos Reis
– o cimério acrescenta, sabendo que ninguém daquele reino é tão furtivo quanto
ele.
“Prospero ficará como
regente, e desta vez meus dois herdeiros Brion e Flavia cuidarão de Zenóbia,
durante minha ausência. Juro que voltarei com a cabeça de Khyan-Apopi. Se eu
não retornar dentro de dois anos, Brion usará minha coroa e governará a Aquilônia
com a ajuda de vocês dois, de Zenóbia e do Conde Amalric”.
E, abraçando os dois
filhos e beijando a esposa, o grisalho cimério se afasta da sala adjacente à do
trono e, de lá, troca de roupa e sela um cavalo, com o qual galopa para longe
do palácio e de Tarantia.
2) Rumo a Leste
Os campos
prósperos e férteis da Aquilônia ficaram para trás, bem como o reino de Koth –
onde o feiticeiro Pelias governa há quase 20 anos, através de um rei-fantoche
–, os prados e desertos de Shem e as montanhas de Cherkessia. Disfarçado de
mercenário, o Rei Conan da Aquilônia continua cavalgando – como o faz há dois
meses – com armadura e roupas desgastadas, que o impedem de ser reconhecido e o
fazem passar por qualquer reino, sem ser interrogado. As cicatrizes em todo o
seu corpo – especialmente as mais destacadas, como as que o bárbaro ganhou em
Khauran, nas mãos, e uma cicatriz em cada coxa nua (uma adquirida em Yaralet e
a outra na Cidadela Escarlate, dentro de Khorshemish) – ajudam no seu disfarce.
Agora que suas provisões acabaram, o velho cimério se alimenta dos animais que
caça pelo caminho, bem como das frutas que colhe pelos poucos bosques e
florestas que encontra.
Neste momento,
Conan se encontra nas amplas e inóspitas estepes hirkanianas, onde ele não tem
certeza se o seu disfarce servirá para alguma coisa. Faixas escarlates se estendem
pelo horizonte ocidental, enquanto no sul, o sol agora invisível tinge de vermelho
as neves dos picos recém-transpostos. A seguir, sem nenhum aviso, vem o ataque.
Flechas sibilam em direção ao cimério, mas sua extrema agilidade o faz se
esquivar e usar o escudo – que estava, até poucos minutos atrás, pendurado na
sela de seu cavalo – como proteção. Pelo território onde se encontra, e pelas
flechas que voam na vã tentativa de atingi-lo, Conan sabe que está sendo
atacado por hirkanianos. Aquela área, muitos quilômetros a nordeste de
Khorusun, está bem distante dos domínios de Turan e do seu infame monarca, o
velho Rei Yezdigerd; e forasteiros não são bem-vindos naquele território
independente.
Súbito, uma
horda de guerreiros altos, esguios e morenos, de olhos amendoados e vestidos em
pele, aço, seda e ouro, investe contra o cimério. Sua lâmina de aço aquiloniano
colide com o iatagã do cavaleiro mais próximo, com uma força tão impressionante
que esta se quebra perto do cabo. Com um esgar de tigre, Conan rasga o ventre encouraçado
do guerreiro, e este cai uivando sobre a estepe, onde agoniza e morre com os
intestinos à mostra.
O cimério
vira-se em sua sela para aparar, com o escudo, outro golpe de espada. Ao
desviar a lâmina do inimigo, ele enfia a ponta da espada bem no rosto
moreno-amarelado, de olhos puxados, que grunhia para ele, perfurando-lhe o
cérebro. Agora, os atacantes investem com toda a fúria. Arcos zunem, lanças
voam, e espadas dançam e se chocam. Com sua larga lâmina de aço azulado, Conan
arranca das selas mais três dos atacantes.
Depois disso,
Conan fica ocupado demais para notar qualquer coisa, além dos inimigos que
rosnam ao seu redor. Embora sexagenário, o cimério se move como um tigre real
entre lobos das estepes. Os cavalos escoiceiam, recuam, relincham e avançam; Conan
e os hirkanianos talham, praguejam e berram. Corpos de descendentes mestiços
dos lemurianos jazem na estepe remexida e pisada.
Com os olhos
encobertos por uma névoa vermelha de violência, o cimério brande sua espada com
fúria berserk, tecendo ao seu redor
uma teia vermelha de morte. Mais de dez inimigos encouraçados agora jazem
mortos, derrubados de seus cavalos, com as entranhas de fora ou com a cabeça
decepada. Enquanto luta, o idoso rei da Aquilônia lança o selvagem grito de
guerra de seu povo, enquanto os cantos de velhos heróis lhe ecoam nos ouvidos.
Há tempos sem guerrear, o bárbaro do ocidente se sente rejuvenescido por aquele
combate. Mas ele logo descobre que precisa de todo o seu fôlego para a batalha,
pois esta se torna cada vez mais intensa.
Dali a pouco,
o desgastado escudo de aço de Conan é quebrado ao meio pelos inúmeros golpes de
sabres do mesmo metal, e ele o joga fora. Uma flecha atinge a garupa de seu
cavalo. O animal abaixa a cabeça e estanca, dando coices e fazendo Conan voar
por cima de sua cabeça. Em seguida, a montaria dispara e desaparece. Abalado e
arranhado, o cimério consegue se levantar e continua lutando a pé. Os iatagãs
dos inimigos arrancam seu manto surrado e abrem rasgos em sua cota-de-malha,
rompendo a camisa que ele usa por baixo, até deixar Conan sangrando de uma dezena
de ferimentos superficiais.
Embora
continue a lutar – com os dentes cerrados num sorriso feroz, os olhos brilhando
num azul vulcânico, e o rosto convulsionado de fúria e emoldurado por uma cabeleira
grisalha de corte reto –, o cimério agora está sem sua montaria, o que lhe tira
certa vantagem que ele tinha, mesmo enfrentando tantos rivais. Assim, após derrubar
mais três hirkanianos de suas selas com golpes mortais, Conan vai sendo, aos
poucos, subjugado pela superioridade numérica, até ter seus braços e pernas
seguros por diversos inimigos, que haviam desmontado.
Quando tudo
indica que o cimério perecerá sob os sabres hirkanianos, uma voz troveja,
detendo-os:
- Parem! – É
um homem tão alto quanto aqueles guerreiros, porém mais musculoso e usando o
chapéu de um líder hirkaniano. – Não vêem que este forasteiro não é de Turan?
Quem é você, homem de olhos azuis, e o que faz nestas terras?
- Sou Conan,
um cimério. Estou a caminho das terras nevadas de Yamal, ao norte, atrás de um
bruxo maldito que matou uma de minhas concubinas. Se for preciso, seguirei o
desgraçado até Mogar! – ele ruge de ódio, ao se lembrar da morte de Guina da Britúnia.
O chefe
hirkaniano sorri:
- Acaso o nome
do infeliz é Khyan-Apopi? Ele andou aprontando por aqui também, antes de rumar para
leste. Meu nome é Iesugei, e seja bem-vindo à tribo dos Mangkus, Conan! Eu e
meus homens estávamos planejando uma viagem para norte e leste, atrás daquele
maldito. – E, erguendo a voz: – Cães! Soltem este homem do oeste e enterrem
nossos mortos! Mas – prossegue ele, voltando a atenção para o cimério – eu
tinha receio de deixar pouca gente aqui, para defender nossas mulheres e
crianças de ataques de outras tribos hirkanianas.
Enquanto conversam, Conan e Iesugei caminham até a tenda do líder, e
param na entrada da mesma. Como todas as tendas dos povos das estepes da
Hirkânia, ela possui estrutura de madeira, e tetos ligeiramente abobadados. Cobertas por feltro ou lã, geralmente
brancos, todas as estruturas são de fácil montagem, fornecendo boa proteção contra
o calor e o frio.
- Bom, você
poderia unir duas ou mais tribos hirkanianas sob seu comando, e irmos com
alguns homens até Yamal – sugere o cimério.
- Há! – ri o
líder tribal. – O poder de Turan está muito longe daqui, o que desfavorece a
união tribal entre nosso povo. E mais: meus homens só aceitarão que você lidere
parte deles, caso derrote o maior de nossos guerreiros – Iesugei acrescenta,
sorrindo para o velho cimério.
- Feito! –
responde Conan, devolvendo o sorriso.
* * *
Logo, o cimério é levado até um cercado, onde é aguardado por um homem
pouco mais alto que ele e mais musculoso, com uma adaga embainhada na cintura.
Ao contrário do homem a quem derrotara relativamente perto de Khorusun, em
outra tribo hirkaniana há décadas, aquele não é um prisioneiro. Então, mal o
cercado é fechado, o gigante investe contra Conan, agarrando-lhe a cintura,
erguendo-o e tentando lhe quebrar as costelas com os braços; mas, batendo os
punhos nos ouvidos do brutamonte hirkaniano, o bárbaro do oeste o atordoa por
um instante, libertando-se do abraço.
Então, o valentão investe novamente contra Conan, mas ainda não saca
nenhuma arma, nem o cimério o faz. Com um soco, Conan faz o homem cuspir vários
dentes quebrados, num jato de sangue. Recuperando-se rapidamente, o antagonista
resolve sacar sua adaga, esfaqueia o ombro de Conan e agarra um dos braços
férreos do rei, tentando quebrá-lo com uma joelhada, mas termina levando outro
murro, desta vez no rosto. Agarrando o valentão pela cintura, Conan lhe quebra
várias costelas num abraço de urso. O homem cai ao chão e recebe vários murros
do velho rei bárbaro na face, nariz e têmporas, ficando em estado de semi-inconsciência.
Conan sabe que um inimigo bom é um inimigo morto e, deste modo, agarra
o grosso pescoço musculoso do hirkaniano que pretendia matá-lo, e o estrangula
até lhe quebrar as vértebras cervicais num estalo seco.
* *
*
Acolhido na enorme tenda de Iesugei, o Rei Conan é aquecido do frio da
noite das estepes – não muito diferente do de sua Ciméria natal – numa lareira,
e apresentado à esposa do líder da coalizão, a qual usa um longo vestido de
fina lã vermelha, com beiradas douradas.
Logo, o idoso
cimério e o líder tribal são servidos com chá e pão. Enquanto o bárbaro come e
conversa com Iesugei, a esposa deste apanha um enorme pedaço de carne de carneiro
crua, que está pendurada na parede. Logo, vem o aroma de carneiro cozido. Após
o jantar, uma tigela de aguardente de leite de égua é bebida por todos, e uma
hora depois, todos adormecem nos três aposentos daquela tenda – um para o
casal, outro para os filhos deste e o terceiro para as visitas.
Anoitece e cai
a madrugada no Palácio Real de Tarantia, muitos quilômetros a oeste de onde o
Rei da Aquilônia se encontra. No harém real, um beijo suave da zamoriana Tshaya
roça o pescoço de Aishe. Esta se inclina na direção do beijo, colocando a mão
no quadril de sua conterrânea. Os dedos marrons delas descem livres e
exploradores. Devido à longa ausência do rei Conan naquele harém, aquela é uma
noite para novos padrões, para se confundirem uma com a outra, coladas pelo
suor daquela noite quente. Os beijos se tornam mais longos, quentes,
concentrados e mudam de direção.
Logo, uma
hirkaniana – a única que Conan manteve no seu serralho –, juntamente com uma
khitanesa de quadris largos, adquirida pelo cimério há dois anos, se juntam às duas zamorianas,
as quais lhes beijam os seios fartos e vice-versa.
Os guardas do
harém não se importam com aquilo – ao contrário, eles admiram discretamente o
enlace –, pois, embora Conan não admita que sua esposa e concubinas tenham
outros parceiros, ele não se importa que duas ou mais mulheres do seu serralho
se satisfaçam uma com a outra quando ele se ausenta por muito tempo.
De qualquer modo,
seu serralho – que tinha 30 mulheres quando o cimério conheceu Zenóbia – teve
seu número drasticamente reduzido para dez (duas de cada região e país – exceto
por uma khitanesa, à qual o cimério trouxera, anos antes, para substituir uma
das hirkanianas, deixando apenas uma mulher da Hirkânia no harém), não apenas
para que o bárbaro pudesse passar mais tempo com sua amada rainha, mas por
questões políticas. Antes da sua decisão de transformar Zenóbia em Rainha da
Aquilônia, o Rei Conan já ouvia vários amigos aquilonianos repetindo que ele
deveria criar uma dinastia estável, com herdeiros para o trono. Uma quantidade
maior de filhos de concubinas poderia piorar as coisas. Assim, sabendo que a
maioria das mulheres de harém poderia causar intrigas, o cimério as casou com
nobres que pudessem cuidar dos filhos delas como se fossem deles, mantendo, com
seu infalível instinto bárbaro, apenas as de sua total confiança em seu
serralho.
Agora, o harém
real da Aquilônia só possui nove mulheres, por conta da recente tragédia, à
qual o bárbaro está indo vingar.
3) De Yamal a Mogar
Na grande
região desolada ao norte da Hirkânia, um cervo perambula pela tundra. Ele faz
uma pausa na beira de um córrego raso onde bebia e ergue a cabeça. A água lhe
pinga do focinho como contas de cristal. O sol lhe brilha no couro
castanho-claro e nas ramificações de sua galhada.
Algum som ou
odor leve perturbou o animal, mas não se repete. Logo ele se inclina para beber
novamente da água gelada, a qual corre em meio a crostas de gelo quebrado.
Em ambos os
lados do córrego, margens inclinadas de terra estão cobertas pela neve
recém-caída de início de outono. Aglomerados de moitas sem folhas crescem bem
próximos, sob os galhos sombrios de pinheiros próximos; e, da floresta além,
nada pode ser ouvido, exceto o pingar incessante da neve que ainda derrete nesta estação ainda não muito gelada. O
inexpressivo céu plúmbeo do pôr-do-sol mal parece clarear os topos das árvores.
Do abrigo da
floresta, uma lança fina é disparada com precisão mortal. E, no final do arco
que faz, a longa haste atinge o animal inesperadamente e lhe penetra fundo no
ombro. A criatura ferida tenta saltar, mas logo cambaleia, tosse sangue e cai.
Por um ou dois momentos, ela jaz de lado, chutando e se debatendo. Então, seus
olhos vitrificam, sua cabeça pende flácida e seus flancos ofegantes ficam
imóveis. Sangue misturado com saliva lhe sai das mandíbulas pendentes, para
manchar a neve virgem com um vermelho brilhante.
Em meio àquela
desolação nevada, dois caçadores se aproximam do animal recém-abatido por eles,
e de um cimério que ali aparece súbita e casualmente, liderando cinco
hirkanianos. Os caçadores que abateram o cervo são homens com a mesma baixa
estatura de seus ancestrais pictos, os olhos rasgados de seus antepassados
lemurianos e a pele morena de ambos, vestidos em pele da cabeça aos pés, como o
velho rei.
- Bom dia,
yamalis! – diz o cimério. – Diga a seu chefe que Conan da Ciméria voltou e quer
falar com ele.
Um deles não
quer saber de dialogar e avança até o cimério de lança em punho. Seu
companheiro tenta detê-lo, mas ele se desvencilha e avança contra Conan. Este,
tão ágil quanto um felino, arrebata a lança do atarracado guerreiro e a enfia
no peito do mesmo.
A lança lhe
penetra o tórax, num estalar de costelas, e o yamali cai para trás, com o rosto
marrom contorcido de dor e o sangue a lhe escorrer pelos cantos da boca.
Imperturbável,
Conan se dirige ao outro yamali, que o encara assustado:
- Onde está o
líder de vocês? Diga a ele que Conan voltou e quer se vingar de Khyan-Apopi.
Diante do
último nome que ouviu, o yamali vivo abre um sorriso de alívio e o conduz imediatamente
à presença de seu chefe.
* *
*
Aquele povo,
que vive na verdadeira beirada do mundo, se constitui de nômades selvagens,
vigorosamente adaptados à terra fria. São um povo espiritual e, embora não
predispostos à guerra, são contudo lutadores perigosos.
Nos últimos
poucos milênios, os yamalis permaneceram selvagens: viajando de trenó e rena,
dormindo em tendas de pele de animal, vivendo da terra e adorando antigos
deuses em forma de animais. Há dois grupos distintos de yamalis: o “Povo da Floresta”,
que foi absorvido pelos lemurianos para se tornarem as tribos hirkanianas; o
“Povo da Tundra”, o grupo que vivia nas regiões geladas ao norte. A religião
deles é baseada no xamanismo e num sistema animista de crenças, os clãs procurando seu Xamã em busca de orientação para onde viajar, de acordo com as
estações do ano e a caça.
Os yamalis não
têm um exército consagrado; mais exatamente, todos os homens em “idade de luta”
se erguem para a ocasião. A pé, lutam como infantaria leve, com lanças e azagaias,
estando acostumados a derrubarem enormes ursos das cavernas com suas armas. Não
tendo cavalos tão ao norte, eles, ao invés disso, montam numa espécie de rena
grande, ancestral da espécie moderna.
Yamal não pode
ser conquistada: de fato, a única referência feita à área nos mapas hiborianos
é a anotação malévola que o próprio cimério fez, em seus primórdios como rei: “Aqui
há dragões!”, na parte norte da Hirkânia daquele mapa. Todavia, alguns mercenários
yamalis podem ser recrutados por qualquer um que queira se aventurar tão longe
ao norte: caçadores yamalis, guerreiros yamalis e chefes yamalis. Os caçadores
yamalis se vestem com peles pesadas, empunhando maldosas lanças farpadas de
arremesso e facas de modelo curioso. Os guerreiros yamalis montam em renas,
usando lanças farpadas na luta corpo-a-corpo e à distância. Os chefes yamalis
são montadores de mamutes e mastodontes, com dois guerreiros empunhando lanças
de arremesso.
Chegando à
tenda do chefe yamali de nome Yamamy e sua esposa Yamana, o cimério é recebido
com um largo sorriso do líder e de sua família, cujas roupas alternam vestimentas
de pele com peças coloridas de pano.
- Bem-vindo de
volta, Conan! – ele responde com um largo sorriso de alegria sob o bigode
negro. – Há quantos anos, velho amigo! Em que posso ajudá-lo?
O rei da
Aquilônia lhe conta brevemente o que aconteceu, e Yamamy – solícito como sempre
ao cimério, desde quando este lutara ao seu lado entre sua fase de líder dos afghulis e mercenário de Almuric – cede-lhe
alguns de seus homens para ajudarem Conan a seguir para leste e, não apenas
vingar a concubina do cimério, como também àqueles poucos yamalis aos quais
Khyan-Apopi matara em seu caminho para o Continente Sem Nome. “Pelo visto”,
conclui Conan, “aquele cão mogar pensa que morri – do contrário, ele estaria me
esperando aqui em Yamal”.
* *
*
Eles desceram
pelas desolações nevadas, onde homens atarracados, que comiam gordura de
baleia, fugiram gritando deles; ao sul e ao leste, através de montanhas gigantescas
e bosques titânicos, solitários, colossais e desolados... e sobre as
abrasadoras areias do deserto
Outro
amanhecer os encontra descendo os pés das colinas numa vasta terra desolada e
inabitada, um ermo árido de areias amarelas. Caminham o dia todo, parando
apenas por um curto espaço de tempo ao meio-dia, para comerem e descansarem,
embora o calor esteja quase insuportável. Os homens, apesar de resistentes,
esmorecem sob o calor. Reina o silêncio, exceto pelo tinido de armaduras e pelo
monótono som de pés humanos pelas areias profundas. Até os mais resistentes dos
yamalis e hikanianos oscilam. Mas Conan se mantém ereto e imóvel, sob o peso de
sua cota-de-malha, parecendo intocado pelo calor e desconforto que atormentam
os outros.
O sol havia se
posto; o breve crepúsculo das planícies brilhou e terminou. Agora as estrelas
brilham – estrelas grandes e frias, indiferentes às pequenas figuras que caminham
lenta e penosamente através da vastidão sem sombras. Os arbustos esparsos, que
sucedem o deserto ao norte, se agacham como feras sem nome, esperando que os
andarilhos tropecem e caiam.
Após aquela
terrível travessia, eles cruzam planícies ilimitadas, até que por fim, vêem novamente
o mar. Atravessando-o num bote, eles finalmente avistam uma ilha, cuja cidade
tem muros brancos e torres azuis-safira entalhadas contra o céu da manhã. Ocultando
a embarcação, eles contornam a ilha a nado, até chegarem a um ponto desguarnecido
da praia oeste dela.
Lá chegando,
eles se escondem e vêem um jovem soldado perambulando por ali com civis, e resmungando
com eles coisas que somente Conan – que lá esteve antes – consegue entender.
Ele se queixa da tirania de Khyan-Apopi, e de não poder fazer nada para acabar
com ele. Todos em Mogar o temem e odeiam, pois, no cérebro insondável do
sacerdote-guerreiro que agora governa aquela ilha, há a astúcia e crueldade de
uma serpente negra.
- Podemos dar
um jeito nisso – responde o velho rei da Aquilônia, saindo dos arbustos onde
ele e seus amigos estavam ocultos. O rapaz desembainha a espada, desconhecendo
aqueles homens, cujas feições lhe são tão estranhas quanto o sotaque do único homem
que falou.
- Calma,
garoto – o cimério acrescenta. – Também odiamos aquele rei-sacerdote. A
propósito, meu nome é Conan, e eu já estive aqui há muitos anos, quando o pai
dele tentou matar a mim e à minha tripulação de barachos.
O rosto marrom
do jovem soldado se abre num sorriso de alívio. Ele ouvira histórias a respeito
de estranhos homens brancos, que haviam invadido aquela ilha, quando ele ainda
não era nascido.
- Mas precisaremos
de alguém que nos guie até o palácio dele, por algum caminho secreto – conclui
o rei bárbaro, piscando um dos olhos azuis.
* *
*
Khyan-Apopi é
um homem grande, escuro e forte, com olhos satânicos e perversos. Ele é tão
rico, que até seus escravos usam colares de ouro. Seu rosto é duro e cruel, e
seus olhos, tão frios e escuros quanto ônix.
Um grande
banquete está sendo servido naquela ocasião solene. Além de milho, uvas, frutas
vermelhas, nozes, melões, vinhos e carnes de aves exóticas, desnudas mulheres
marrons com adornos de ouro – as quais são, ao mesmo tempo, servas e dançarinas
– servem pão, cerveja, vegetais e peixes. Khyan-Apopi acabou de se casar pela
segunda vez, com sua primeira esposa Netikerty sentada ao seu lado. A única de
roupa de Netikerty consiste numa tanga de penas de papagaio, presa à cintura
por uma faixa dourada e incrustada de jóias, bem como um par de sandálias douradas.
Enquanto as
servas e escravas andam nuas, as nobres mogares andam seminuas, como os homens,
sendo que algumas delas chegam a cobrir de jóias o colo, os braços e os
tornozelos. Todas – de nobres a escravas – pintam as unhas e os olhos, e andam
cuidadosamente penteadas.
Soam tambores,
acompanhando algumas das mulheres que dançam para o rei-feiticeiro. Os
guerreiros dele também assistem. Por fim, um deles entra no círculo, agarra uma
dançarina pelo braço, lança-a no chão e copula com ela ali mesmo, como um
garanhão faria com uma égua. Um segundo guerreiro avança, e um terceiro. Logo,
dois homens agarram a mesma mulher. Ouve-se um grito, é visto um empurrão e,
num piscar de olhos, são empunhadas espadas. Começa um dança de morte, e os
guerreiros andam em círculos, dando golpes, saltando um sobre o outro, fazendo
rodopiar as lâminas sobre as cabeças e guinchando insultos a cada entrechocar
de metal. Ninguém faz um gesto para interferir. Khyan-Apopi assiste a tudo com
fria indiferença, e suas esposas com empolgação.
Tudo acaba tão
rápido como começou. As espadas estremecem velozmente uma contra a outra, um
dos homens falha um passo e o outro brande a lâmina num arco horizontal. O aço
atinge a pele acima da cintura do mogar e o abre da espinha ao umbigo,
derramando sangue e entranhas sobre o piso da sala do trono. Em seus
respectivos tronos – um a cada lado do trono do rei –, as duas esposas de Khyan
vibram de alegria. Enquanto o perdedor morre, o vencedor se agarra à mulher
mais próxima – nem sequer àquela por quem lutou – e a possui ali mesmo.
Escravos levam o cadáver para longe da sala do trono, e a dança recomeça.
Enquanto isso, Khyan-Apopi beija suas duas esposas e tem relações sexuais com
elas ali mesmo.
O sol se põe
em Mogar, presentes são dados à bela e grisalha Netikerty, a Khyan e,
principalmente, à nova esposa deste último, a bela jovem Azeneth. Khyan-Apopi
bate palmas. Os tambores, os gritos e a festa chegam a um súbito fim. Khyan se
ergue do trono, com as duas esposas agora de pé ao seu lado. Chega o momento do
rei-feiticeiro se pronunciar.
*
* *
- Isto é
loucura! – diz, mais uma vez, o jovem líder mogar Nemhet, que guia Conan à
fortaleza do bruxo. – Invadir o covil de Khyan-Apopi é como fazer um dragão
dormir, só para roubar seus ovos. Sabia que ele matou o Rei Zotan, só para se
casar com a rainha Netikerty? E que aquela vadia permitiu e tramou tudo com
ele?
- Aquele cão
matou uma de minhas concubinas! – responde Conan, rangendo os dentes aos se
lembrar da bela brituniana de seu harém, estrangulada por uma gigantesca
serpente emplumada, a qual Khyan destinara ao Rei da Aquilônia.
Décadas atrás,
em sua época de baracho, o cimério e os tripulantes do Mão Vermelha haviam fugido dali por uma passagem secreta. Mas a
mesma fora vedada depois, pelo filho de Khari-Apopi. Somente aquele rapaz
conhece um novo caminho secreto.
Neste caminho,
o amigo de Conan é subitamente arrastado para um mar subterrâneo por uma
gigantesca sucuri, cujo tronco é mais grosso que o corpo de um homem. Sem
perder tempo, o grisalho cimério mergulha na água e mata o enorme réptil com
três poderosos golpes de sua espada. De volta à superfície, ambos prosseguem,
até alcançarem outra câmara, na qual encontram vários homens e mulheres
aprisionados em gaiolas gigantes.
- Eles
engrossarão nosso exército – sorri o Rei da Aquilônia, arrebentando os cadeados
com sua espada.
O barulho,
contudo, chama a atenção dos guardas que adentram aquela câmara. O primeiro
deles tem o escudo e intestinos decepados por Conan, numa explosão de sangue e
faíscas. O segundo, brandindo uma maça, se esquiva de um golpe da espada de
Conan e lhe acerta um murro no rosto. O cimério reage, lhe dando uma joelhada
nos testículos e destroçando-lhe o crânio com um giro horizontal da espada.
Entretanto, o cheiro de sangue atrai uma gigantesca serpente emplumada, ainda
maior do que a que estrangulara a concubina do cimério. Após exterminar aquele
exército de homens marrons, imberbes e sem armadura – estrangulando uns e
lançando outros contra as frias paredes de pedra –, ela investe contra Nemhet,
mas um golpe de espada do Rei Conan faz com que ela se volte contra o bárbaro.
Sem perder tempo, ele a mata, partindo-lhe o crânio em dois, antes que ela
possa envolvê-lo em seus anéis esmagadores.
Conan e Nemhet
suspiram aliviados, ao verem que os prisioneiros não foram atacados pela
criatura. Sem perder tempo, os ex-cativos pegam as armas dos soldados mortos e
seguem aquela dupla destemida.
*
* *
- Que o mundo me
contemple, e que o mundo estremeça diante de seu novo mestre! – exclama o
rei-feiticeiro de Mogar.
“E, para meu
filho, o garanhão que cavalgará montado no mundo”, prossegue Khyan-Apopi à sua
atual esposa, “também darei um presente. Darei a ele o trono sobre o qual me
sento. Eu darei a ele os reinos aos quais hei de conquistar, de Khemu,
Bal-Sagoth, Negari e Aquilônia – cujo trono agora está vazio, com seu rei
morto! Eu, Khyan-Apopi, farei isso”, ele prossegue, fazendo suas belas esposas
suspirarem ainda mais de paixão por ele. “Navegaremos pelo mar azul, para
conquistar, saquear e pilhar!”. Os vassalos do rei, feiticeiro e guerreiro de
olhos cruéis começam a aclamá-lo “Matarei todos os homens que me oferecerem
resistência! E estuprarei suas mulheres!! E destruirei suas casas com fogo! E
levarei seus filhos como escravos; sacrificarei os sacerdotes de Valka e Mitra
ao grande deus Golgor-oth! Isto eu juro! Eu, Khyan-Apopi, filho de Khari-Apopi!
Juro diante do altar de Golgor-oth! Lançarei todos os meus inimigos num oceano
de sangue!”.
Enquanto o
bruxo se gaba dos triunfos futuros, uma comitiva de sacerdotes encapuzados
adentra o recinto. O mais alto deles se aproxima de Khyan-Apopi e, inesperadamente,
brande sua espada contra o rei-feiticeiro. Este apara o giro da lâmina do falso
sacerdote e começa a cruzar espadas com ele. Ao mesmo tempo, os verdadeiros
sacerdotes de Golgor-oth fogem ao verem o recinto ser invadido pelos
ex-prisioneiros armados. Durante seu duelo, Khyan não crê em seus próprios
olhos, ao ver a toga de seu antagonista cair e lhe reconhecer os olhos azuis e
feições.
Azeneth, a
esposa grávida do sumo sacerdote de Golgor-oth pega uma lança e perfura o
coração de um dos rebeldes, mas tem suas costas atingidas pelo golpe fatal da
espada de outro ex-cativo e desaba ao chão, afogada no próprio sangue. Enquanto
isso, Netikerty consegue fugir daquele pandemônio e, saindo do palácio até a
praia, pegar um barco para longe dali.
- Morra, assassino
de minha concubina! – rosna o Rei Conan, enfrentando Khyan-Apopi, filho do
falecido Khari-Apopi, a quem o cimério matara em sua época de baracho.
- Morra,
assassino de meu pai, esposa e herdeiro! – responde o bruxo, girando, esquivando-se
e estocando o vazio.
Durante o
aparentemente interminável entrechocar de espadas, o cimério, após colidir
várias vezes sua lâmina com a do feiticeiro marrom, arranca-lhe a orelha direita;
mas Khyan, com seus poderes ampliados por magia, mal parece sentir a dor do corte.
Nenhuma trégua é dada nem pedida durante aquele duelo. Há anos, o grisalho rei
cimério não encontrava um espadachim tão formidável quanto aquele bruxo de pele
escura a brandir duas espadas contra a sua. O duelo é longo e feroz. Há um momento
em que ambos parecem exaustos. As pernas de Conan tremem e sua mente está
turva. Aquele feiticeiro só adquirira tal habilidade através de magia. Num momento
em que Conan está de espadas cruzadas com Khyan, ele mira fundo os diabólicos
olhos negros do bruxo mogar e, mais uma vez, a lembrança da bela brituniana
Guina, morta por culpa daquele homem, faz um véu vermelho de ódio intenso invadir
os olhos do cimério.
Então, num
último impulso de fúria, o velho Conan põe todas as suas forças num golpe, com
o qual se desvencilha das espadas do feiticeiro, e em outro, no qual atravessa
o coração perverso de Khyan, com tal força que a ponta da espada sai por entre
as espáduas do agora morto líder de Mogar.
- Estamos
livres! – foi o primeiro grito a sair dos lábios de um mogar, seguido de um
coro, repetindo a mesma frase, ao verem o cadáver de Khyan-Apopi caído ao chão.
Os mogares
pedem para que Conan seja o rei deles, mas o bárbaro recusa, com um sorriso.
- Já tenho meu
próprio reino, e minha própria rainha e serralho – ele responde, antes de
partir daquela ilha, contentando-se com as provisões e roupas que lhe são
dadas, além de um bom banho, tomado por ele e seus aliados do oeste nos
banheiros daquele palácio recém-libertado da tirania.
* *
*
Remaram durante dias, até chegarem àquela ilha. A ampla praia branca se
inclina suavemente, da água até uma ondulante vastidão de árvores gigantescas.
Parece não haver vegetação rasteira, mas os enormes troncos encontram-se tão
próximos, que nem a visão de Conan consegue penetrar na selva.
Súbito, um dos companheiros de Conan é atingido no ombro por uma lança
de formato similar às mogares. No instante seguinte, uma horda de guerreiros
seminus aparece inesperadamente na praia, saindo dos portões do palácio,
uivando e brandindo suas armas. São todos marrons como os mogares, e têm as
mesmas feições. O primeiro deles está separado de Conan apenas pela distância
de um arremesso de lança, quando a pedra de uma funda mogar desce rodopiando
das alturas e lhe estraçalha o cérebro. Seu companheiro desvia os olhos da
espada do cimério que avança, e morre com a garganta cortada, assobiando ar. Um
terceiro, pouco depois, se sufoca na ponta de uma flecha arremessada pelo único
hirkaniano sobrevivente daquele grupo.
Outro guerreiro de Bal-Sagoth avança, desta vez contra Conan. Aquela
luta é rápida e sangrenta. O homem marrom golpeia terrivelmente em direção à
cabeça do bárbaro, e este apara o golpe e contra-ataca selvagemente. O
bal-sagothiano se esquiva de forma desajeitada e, quando a lâmina do cimério
canta perversamente sobre a cabeça do seu rival, o mesmo tenta lhe retalhar a
barriga. Um rápido salto para trás salva Conan, e este arremete um terrível
golpe descendente, com cada grama de sua força por trás dele. O guerreiro
marrom não tem tempo de apará-lo; ele pega-lhe o gume sibilante com a parte
plana de sua lâmina, a qual se despedaça em lascas cintilantes, e o próximo
golpe do bárbaro lhe abre o crânio.
Em meio àquela horda, o cimério e alguns dos seus companheiros
reconhecem a forma seminua e grisalha da ex-rainha Netikerty de Mogar – a qual
parece ter se tornado agora uma líder (ou talvez nova rainha) daquela outra ilha.
O general Peshef, que chefia o grupo obedecendo apenas a Netikerty, não
é burro; seu grupo já fora atacado antes por khemitas de Mogar. Gritando
ordens, ele se põe de frente para o grupo que avança e busca o guerreiro de
olhos azuis que os guia – e o encontra tarde demais. O bal-sagothiano ergue sua
espada, para se defender de um golpe mortal dirigido à sua cabeça e o vê mudar
de direção no último instante, numa velocidade incrível, para atingir seu
pescoço, cortado em dois num jato de sangue.
Súbito, um grupo de centenas de gigantescas aves bípedes, nativas de
Bal-Sagoth e famosas por devorarem o povo local às centenas, atravessa correndo
a praia, de modo que Conan e seus companheiros correm de volta ao seu barco,
enquanto Netikerty e seus comandados sobreviventes fogem de volta à segurança
do palácio. Logo, o vento atinge a pequena vela, e o bote segue seu caminho
para o mar, em direção a uma ilha desabitada e bem mais segura.
4) Interlúdio:
De Zimbabo a Zambebwei
A ação é
rápida e desesperada: na luz efêmera, um feroz rosto negro brilha diante de
Conan, e sua rápida espada golpeia, rachando-o até o queixo. Na breve e total
escuridão que segue o clarão, um ataque invisível arranca-lhe o capacete da
cabeça e ele revida cegamente o golpe, sentindo a lâmina afundar em carne e
ouvindo um homem uivar. Novamente, os fogos dos céus furiosos explodem,
mostrando ao cimério o círculo de rostos selvagens e a barreira de aço
lampejante que o cerca.
O Rei Conan retornava de sua missão de vingança em Mogar num navio khitanês,
cujo resgate, feito nos sombrios Pântanos dos Mortos, onde somente o cimério
sobreviveu, daria para escrever outra saga. Como todas as embarcações de
Khitai, aquele enorme navio possui nove velas e mede 120 metros de
comprimento. Sua tripulação incluía médicos, astrônomos, intérpretes fluentes
em várias línguas e até farmacologistas – além de uma equipe de manutenção e
até dois oficiais de protocolo –, quando o navio foi atacado por corsários
kushitas, os quais perambulavam por ali.
O vento havia
caído fortemente, mas um mar denso está fluindo, e agita a longa embarcação
como uma lasca num redemoinho de ondas espumantes. Uma esférica lua prateada,
entrevista através de nuvens irregulares, ilumina as grandes ondas agitadas. O cimério
percebe que o navio-cidade está enfraquecido. Ele pode garanti-lo pela forma
como o navio luta contra o mau tempo, avançando com dificuldade pela espuma, submergindo
parcialmente ao erguer dos vagalhões. Bom, a tempestade que rugia nestas águas
meridionais havia sido suficiente para danificar até mesmo uma embarcação sólida
como esta, feita por aqueles khitaneses.
O mesmo
temporal havia pegado o navio khitanês no qual Conan havia sido um passageiro,
desviando-o do seu curso, para bem longe ao sudoeste. Os dias e noites foram um
cego caos uivante, onde a embarcação havia sido arremessada violentamente,
voando como um pássaro ferido diante da tempestade. E, no próprio suplício do
temporal, uma proa com esporão avultara rapidamente sobre a embarcação maior e
mais larga, e os ganchos de abordagem haviam se cravado nela. Sem dúvida, aqueles
kushitas eram lobos e a ânsia de sangue que queimava em seus corações não era
humana. No terror e no rugir da tempestade, haviam saltado uivando no ataque e,
enquanto os céus furiosos lançavam sua inteira fúria sobre eles e cada impacto
das ondas furiosas ameaçava afundar ambos os navios, aqueles lobos do mar
saciaram a fúria deles ao extremo – verdadeiros filhos da selva e do mar, cujas
fúrias mais selvagens encontram eco em seus próprios peitos.
Agora só
restam dois mastros, dos nove que haviam antes da tempestade. Um deles é
agarrado pelo musculoso capitão Zhang-Ho, para que não se solte. Enquanto o khitanês
grita impropérios, pelo fato da tripulação não poder ajudá-lo devido ao ataque
dos kushitas, outra onda gigantesca avança impiedosamente, arrebentando o
costado do enorme navio oriental, desprendendo três cordas do cordame do outro
mastro e rachando-o, de modo que a vela se solta no vento.
- Estamos
mortos! – grita Zhang-Ho, largando a corda do último mastro, desembainhando a
espada e investindo contra aqueles piratas negros, tão distantes de suas terras
quanto os tripulantes de pele amarela. – Mas não morreremos sem matar esses
piratas! – ele acrescenta, ecoando o pensamento do único homem branco ali
presente.
Outro khitanês
firma os pés no convés instável, curvando o peso sobre o remo do leme, mas sua
cabeça é decepada por um dos kushitas e, em seguida, outra onda se ergue das
profundezas do mar, partindo o leme em dois. O capitão Zhang-Ho abandona o cordame para
vingar o conterrâneo morto, mas tem a cabeça e elmo partidos ao meio por outro
corsário, cujas costas são atravessadas pela espada de Conan até a ponta da
lâmina lhe sobressair pelo peito.
Finalmente, Conan acredita poder ouvir um profundo rugido, acima do
embate das ondas. O rugido aumenta, e até mesmo os kushitas de ouvidos menos
agudos escutam-no; o navio salta como um cavalo esporeado, forçando todas as
madeiras. Como por mágica, as nuvens, iluminadas pela aurora, rolam para os
lados, mostrando uma desolação de agitadas águas cinzentas, e uma longa fileira
de ondas, batendo numa praia adiante. Além da loucura espumante da linha de
recifes, avulta terra. O rugido cresce
até proporções ensurdecedoras, enquanto a longa embarcação, pega no rasgão da
maré, precipita-se de ponta-cabeça para sua ruína.
A embarcação
colide com um choque que lhe arrebenta os mastros e estilhaça sua proa como
vidro. Homens caem, como pinos de boliche, do convés inclinado. Por um momento,
se equilibra, estremecendo como uma coisa viva; e então desliza desde a oculta
linha de recifes, e cai, numa cegante nuvem de espuma.
O rei cimério tem sua enorme embarcação destruída durante aquela tempestade
de vários dias. Único sobrevivente do ataque pirata, Conan é cuspido, do navio
moribundo até a areia da praia, e desmaia na costa de Zembabwei – ou Zimbabo –,
onde, ele espera, ninguém se lembra dele como Amra.
* * *
Conan acorda abruptamente como todos os cimérios, e se vê dentro de uma
choupana rústica, mas confortável, limpa e bem-ventilada. Ao lado do leito de
peles onde ele se deita, há uma jarra de argila, cheia de água fresca. Após
bebê-la, o cimério imagina ter sido encontrado por uma tribo zimbaboana.
Examinando o próprio corpo, Conan vê que fora banhado e limpo da água salgada
do mar e das areias da praia. Sejam quem forem seus salvadores, eles alimentaram
e cuidaram muito bem dele, enquanto dormia a caminho da recuperação.
Ele olha em volta, por toda a cabana. Sua espada e o cinto desta última
estão bem próximos ao leito do qual se ergueu e, após amarrar sua arma à
cintura, o cimério vê, com um sorriso de satisfação, que a urna metálica que
trazia desde Mogar – amarrada bem apertada ao seu cinto – se encontra ainda
lacrada, do outro lado da choupana. Caminhando tão silenciosamente em direção a
ela quanto um gato selvagem, ele pára ao ver alguém entrar naquela choupana.
É uma bela e jovem nativa esguia, alta e seminua, de lustrosa pele
cor-de-ébano e corpo esguio contrastando com os lindos e oscilantes seios
longos a lhe alcançarem a cintura. Conan a examina rapidamente, do lindo e
enorme cabelo crespo aos negros mamilos flácidos dentro das aréolas negras, de
diâmetro superior a 10 cm cada uma. O rosto exuberante é o de uma garota de
pouco mais de 18 anos, mas aqueles seios maravilhosos fazem-na aparentar uns
30. Pela longa tanga vermelha, o cimério imagina que a jovem negra alta seja de
Atlaia, mas as feições, mais negróides que as dos atlaianos, a indicam como
sendo uma zimbaboana. Ela também usa uma fina corrente de ouro no pescoço – sem
dúvida, adquirida em esporádicas trocas comerciais com mercadores da capital,
os quais passam muito raramente por lá.
- Oh! – grita a jovem. – Você ainda está fraco demais para ficar de pé.
Deve descansar mais, para recuperar toda a sua força – ela conclui, falando o
dialeto zimbaboano, semelhante ao do povo de Atlaia, ao qual Conan conhecera em
seus tempos de líder dos corsários negros.
- Nada disso, moça. Já estou recuperado – ele responde na mesma língua.
– Onde estou? Aqui é Zimbabo, não? Quanto tempo faz que me encontraram?
- Sim, aqui é Zimbabo, senhor. Eu e minha tribo lhe encontramos ontem,
desmaiado na praia, após um ataque de estranhos piratas...
- Ah, aqueles malditos corsários kushitas! – Conan interrompe por um
instante.
- Sou Olapa, filha de Faraji, e você está na tribo Jelani, da qual ele
é líder. Nós lhe salvamos, porque vimos que você não é atlaiano, nem khitanês,
nem pirata, nem de...
Ela estremece, evitando falar o que ia falar, mas o Rei da Aquilônia
mal a escuta. O único pensamento de Conan é para a bela visão que tem diante
dos olhos. Naqueles últimos meses, longe de sua rainha e harém, Conan não havia
tido relações sexuais com mulher alguma, e ele passa um bom tempo examinando os
contornos cor-de-ébano daquele corpo suado, delgado e seminu, com excitantes e
igualmente delgados seios compridos à mostra. O rosto dela, apesar da cor
negra, fica corado de um momento para outro.
- Então, foram suas lindas mãos que cuidaram de mim, Olapa? – ele
pergunta. – Muito obrigado a você e seu pai. Passarei alguns dias com vocês, e
depois viajarei para o norte – o cimério acrescenta, sentindo aromas saborosos
partindo de um caldeirão borbulhante do lado de fora e sentindo-se súbita e
vorazmente faminto.
*
* *
O estilo de vida
tradicional das tribos de Zimbabo – assim como o das de sua vizinha Atlaia – se
concentra em seu gado, que constitui sua principal fonte de alimento. A classe
social das tribos zimbaboanas é determinada pelo número de vacas pertencentes
às famílias. As casas são construídas em um círculo e, às noites, as vacas são
conduzidas ao centro, protegidas dos animais selvagens.
Os jovens tribais
zimbaboanos são iniciados na maioridade, através de várias cerimônias de
iniciação – sendo a principal delas a circuncisão. Os casamentos são planejados,
marcados por um homem que desenha um “X” vermelho na barriga de uma mulher
grávida solteira. Se ela recusar, será desligada de sua casa. As mulheres podem
se casar uma única vez na vida, enquanto os homens podem ter mais de uma esposa
(se tiverem vacas suficientes para o dote, eles podem ter mais de uma ao mesmo
tempo).
O deus supremo e
criador das crenças dos zimbaboanos se chama Enkai, guardião da chuva, da
fertilidade, do sol e do amor, aquele que deu o gado ao povo de Zimbabo,
segundo suas crenças. Neiterkob é uma divindade menor, mediador entre Enkai e
os homens. Homens e mulheres têm suas orelhas furadas e alargadas, com o uso de
discos.
Os membros daquelas
tribos das savanas vivem em pequenas cabanas, feitas de esterco de vaca e
estacas de acácia. Um grupo de cabanas é construído dentro de uma área fechada
por cercas espinhosas, formando uma aldeia chamada de enkag. Eles permanecem nesta terra enquanto seu gado pasta; quando
as pastagens secam, eles se mudam. As mulheres constroem suas casas, enquanto
os homens cuidam da segurança do assentamento e do gado.
O povo das cidades de
Zimbabo, no entanto, adora Dagon – um deus de origem shemita – e Derketo – de
origem stígia –, o que não afeta em nada a vida e religião dos povos tribais
daquele país. Os zimbaboanos das cidades estão ocupados demais em atacar a
costa de Khorala, a leste, e em lutar contra outros Reinos Negros da vizinhança,
para se preocuparem em invadir tribos, ou querer impor seus deuses a elas.
Alguns anciãos da
tribo, no entanto, reconhecem Conan como Amra e, percebendo o desejo do cimério
pela bela Olapa, enviam mensagens a duas tribos do reino vizinho de Atlaia.
*
* *
O ataque começou de madrugada. Conan, com seu típico sono felino de
cimério, acordou antes que a maioria da tribo despertasse e, desembainhando sua
espada, tentou alertar os jelanis, enquanto saía de sua cabana e partia para o
combate. Mas a traição inesperada dos anciãos pegou os aldeões de surpresa.
Nenhum dos jelanis havia previsto a possibilidade de um ataque de guerreiros de
duas tribos de Atlaia, ao mesmo tempo. Uma longa lança atlaiana voa em direção
ao peito largo de Conan, mas ele se esquiva e devolve o golpe com uma estocada
veloz, a qual transpassa estômago, pulmão e costelas do seu antagonista. Ao
redor do cimério, a tribo zimbaboana de Jelani resiste bravamente àquele ataque
de atalaianos, mas a superioridade numérica destes últimos é imbatível demais
para que os incursores possam ser derrotados.
Em pouco tempo, aquela luta desigual se transforma num massacre.
Paredes de acácia cedem sob o impacto de corpos arremessados. Gritos de agonia
cortam o ar, enquanto lanças mergulham em corpos negros que se contraem,
espalhando sangue; porretes são brandidos e golpeiam as encarapinhadas cabeças
dos zimbaboanos com uma força brutal. Os telhados de sapé das choupanas se
esfumaçam antes de se incendiar. Um novo e estridente brado de angústia se
junta aos gritos, quando vítimas ainda vivas são atiradas de cabeça nas
estruturas em chamas. O
cheiro de carne chamuscada começa e empestear o ar.
Com um grito selvagem, o cimério corta desesperadamente corpos negros a
torto e a direito. Seus inimigos atlaianos recuam, não por covardia, mas como
homens que evitam o ataque de um leão. E, como o temível felino das savanas,
ele luta defendendo Olapa e a família dela como se fizessem parte de seu bando.
Súbito, uma pedra, arremessada por uma funda, atinge a têmpora direita de
Conan, fazendo seu mundo explodir e mergulhar nas trevas da inconsciência. A
última coisa que ele ouve é o desesperado grito agudo de Olapa, sendo arrastada
pelos incursores de Atlaia. Nem mesmo os anciãos que traíram seu próprio povo e
tribo foram poupados pelos impiedosos e igualmente traiçoeiros atlaianos, aos
quais pretendiam vender a jovem.
* * *
Lenta e dolorosamente, Conan recupera a consciência e olha ao seu
redor, vendo a paliçada e as choupanas fumegantes e em ruínas. Vultos
escuros e furtivos se movem em meio ao capim alto, fuçando os cadáveres
amontoados. Ganidos lamuriosos, dorsos encurvados e os focinhos caninos os
denunciam como sendo hienas das savanas. Diante delas, havia um verdadeiro
banquete. Cadáveres de zimbaboanos se alastram por toda a parte. A maioria dos
bois e vacas foi poupada – somente dois bois foram mortos e parte de suas
carnes levadas pelos incursores atlaianos. Ódio e vingança queimam no peito do
cimério, ao ver mortas todas aquelas pessoas que tão bem o acolheram. O único
corpo que ele não achou ali foi o de Olapa, cujos pais jazem em meio a uma poça
de sangue.
Por sorte, nem a espada nem a caixa metálica de Conan haviam sido
levadas pelos incursores. Assim, após distinguir o rastro de pés descalços que
aponta para o sul, o cimério tira alguns pedaços dos bois mortos para se
alimentar ali e na viagem que fará, e segue na direção dos rastros –
especialmente, por reconhecer a marca inconfundível de dois pés femininos entre
eles.
Dias de longas caminhadas e breves noites de sono
haviam se passado. Os poucos leões que lhe ameaçaram no caminho tiveram seus
crânios esfacelados num único golpe da espada do cimério, ou tiveram seus
pescoços transpassados por flechas jelanis. Chegando à fronteira entre Zimbabo
e Atlaia, Conan avista um conjunto de árvores. Aproximando-se com cautela, o
bárbaro branco pára, quando seu olhar percebe uma figura indistinta entre os
troncos sombrios – algo que não faz parte deles. Estranhamente, a figura não
avança nem foge. Uma forma turva de ameaça silenciosa, espreitando-o como se
estivesse à sua espera. Terror penetrante paira sobre aquelas árvores.
O Rei da Aquilônia avança cautelosamente, com sua
lâmina de prontidão. Mais próximo, ele aperta os olhos em busca de algum
movimento ou de algo que o ameace. O velho bárbaro conclui ser aquilo uma
figura humana, mas se sente confuso com tamanha inércia. Logo, o motivo fica
claro: é o cadáver de um homem negro atlaiano de pé, em meio às árvores,
mantido ereto por lanças que lhes transpassam o corpo, pregando-o aos troncos.
Um dos braços do corpo sem vida está estendido à sua
frente, preso a um longo ramo por uma adaga que lhe atravessa o antebraço, com
o dedo indicador do cadáver apontando para o caminho por onde o estranho viera.
O significado é óbvio; aquele sinal mudo e sombrio só pode querer dizer uma
coisa: a morte está de prontidão logo adiante. O cimério o reconhece como um
dos guerreiros que atacaram a tribo Jelani. Levada pelos atlaianos, Olapa foi
vendida por estes últimos ao povo de alguma região sombria ao sul – na verdade,
os incursores de Atlaia tentaram vender a jovem, mas os homens do sul acharam
mais lucrativo levá-la sem pagar, exceto com aço nas entranhas dos atlaianos. Apesar
da seriedade da situação, Conan não consegue evitar um sorriso sardônico.
Agora, após tantos quilômetros de viagem pelas selvas e savanas, esperam
fazê-lo recuar com aquela palhaçada?
Após caminhar mais uns dois quilômetros, atravessando
a primeira selva após a fronteira, o cimério se depara com outra visão macabra,
encoberta por abutres famintos. É outro homem negro, estendido como uma águia,
mãos e pés amarrados a quatro estacas, enfiadas profundamente na terra bastante
socada: um zimbaboano, esfolado e morto, também deixado ali como aviso, para
indicar o que acontecia com qualquer estrangeiro que ousasse transpor aquela
fronteira. Conan o reconhece como um dos homens que defenderam a tribo Jelani.
Próximo a ele, na direção sul, uma quinta estaca
pequena, com a pequena corrente de ouro de Olapa, indica ao cimério o rumo que
ele deve tomar, caso queira salvar a vida de quem salvara a sua. Ele sabe que
aquilo tem todas as características de uma armadilha, mas, além de sua imensa
gratidão a Olapa e aos jelanis mortos, Conan está há mais de duas décadas sem
ir para a cama com uma negra. Assim, o cimério resolve arriscar a própria vida
para salvar aquela linda jovem, e vingar os amigos mortos.
Seguindo o caminho indicado pelo colar de Olapa,
Conan capta, entre as árvores, outro súbito e inominável horror: numa ampla
clareira, há uma estaca; e, naquela estaca, está amarrada uma coisa que outrora
foi um homem. Apesar de seu escalpo de cabelos crespos ter sido arrancado, o
cimério nota que aquele arremedo de vida humana tem feições que não são
zimbaboanas nem atlaianas.
Quando o bárbaro branco se aproxima, a cabeça daquele
pobre homem se move de um lado para outro, salpicando sangue dos tocos sem
orelhas, enquanto um gemido bestial e barulhento é emitido dos grossos lábios
esmagados. Seus horríveis cortes, Conan nota, mais se assemelham aos de enormes
presas e garras do que aos de facas ou lanças. Sem tempo a perder, o cimério o
desamarra e se dirige a ele em Zimbaboano, ao qual o cativo torturado não
entende, e logo em seguida em Atlaiano, ao qual o negro compreende.
- Ouça – diz Conan –, não tenha medo de mim... Não
vou machucá-lo, e nada mais vai lhe ferir também. Onde estamos? Que lugar é
este? Você sabe para onde um grupo de atlaianos levou uma linda jovem
zimbaboana, de nome Olapa?
Através dos dentes quebrados, as palavras saem,
vacilantes e incertas, daquela ruína humana, cujas órbitas vazadas parecem
lutar para ver além de seu vazio.
- Aqui não é Zimbabo nem Atlaia... Aqui é Zambebwei,
terra dos zembas... Cuidado com os zembas. E cuidado com O Zemba! – ele diz,
tossindo sangue. – Foi ele quem me mutilou desse jeito... E ouvi passar um
grupo de atlaianos com uma cativa de Zimbabo. Ela será sacrificada ao Zemba,
por ordem do mesmo sacerdote que criou o culto a Zemba e me amarrou aqui... Cuidado
com os zembas e com O Zemba...
Se ele ia dizer algo mais, Conan nunca saberá, pois
uma torrente de sangue explode dos lábios do homem torturado, tirando a vida
que ainda lhe restava. Em outras circunstâncias, o cimério enterraria aquele
pobre homem, que nunca lhe fizera mal e ainda lhe deu informações preciosas –
muito embora aquele bárbaro do norte não faça a menor idéia do que seja um
“zemba”, ou “O Zemba”. Mas a urgência de vingança e resgate o faz dirigir
rapidamente os passos de novo para o sul, penetrando cada vez mais naquela
região sombria, à qual o nativo morto chamara de Zambebwei; e ele prossegue sua
viagem pelos dias seguintes, alimentando-se dos animais aos quais abate com o
grande arco jelani que leva.
*
* *
Zemba é um
deus do silêncio. Do pôr-do-sol ao nascer do sol, na noite de lua cheia, nenhum
tambor é tocado. Se um cão late, deve ser morto. Se um bebê chora, deve ser
morto. O silêncio fecha as mandíbulas do povo até Zemba rugir. Apenas a voz
dele é erguida na noite da Lua de Zemba.
O cimério
chega à clareira quase antes de percebê-la. A lua pende nos galhos baixos,
vermelha como sangue, alta o bastante para iluminá-la e à multidão de pessoas negras
que se acocoram num vasto semicírculo ao redor dela, encarando a lua. Os olhos
revirados daquela gente brilham como leite nas sombras, e seus rostos são
máscaras grotescas devido ao fanatismo em suas expressões. Nenhuma cabeça se
volta em direção aos arbustos, atrás dos quais ele se agacha.
Com base no pouco
que ouvira em sussurros aterrorizados, de alguns aldeões que encontrou no
caminho, ele tivera uma vaga expectativa de fogueiras queimando, um altar manchado
de sangue, tambores e o canto de adoradores enlouquecidos. Mas aqui não há
fogueiras nem altares. No centro da clareira, há uma pesada estaca amarrada com
ferro, a qual é o tronco afiado de uma árvore de bom tamanho, cravado bem fundo
no chão. E há alguma coisa viva acorrentada àquela estaca – algo que faz Conan
prender o fôlego em horrorizada descrença. Ele já vira um homem-macaco com
mente semi-humana, no sul da Britúnia e gorilas gigantescos no Vilayet – a cuja
raça pertencia o antropóide ao qual o cimério matara em Belverus, há 16 anos –,
mas nada igual àquilo!
Ele está
olhando para o deus de Zambebwei. Seu desgrenhado pêlo cinza é raiado com a luz
da lua ascendente; parece gigantesco, ao se acocorar como um vampiro sobre os
quadris. De pé, sobre suas pernas arqueadas e nodosas, deve ser tão alto quanto
um homem, e bem mais largo e compacto. Mas seus dedos preênseis estão armados
com garras semelhantes às de um tigre – não as grandes unhas cegas do antropóide
natural, mas as cruéis garras, curvas como cimitarras, do grande carnívoro. Seu
rosto é como o de um gorila – testa baixa, narinas largas e sem queixo –; mas,
quando rosna, seu nariz largo e chato se franze como o de um grande felino, e a
boca cavernosa mostra presas em forma de sabre, as presas de uma besta
predadora. Este é Zemba, a criatura sagrada para o povo da terra de Zambebwei –
um macaco carnívoro. E, caída inconsciente diante de Zemba, ninguém menos que a
linda Olapa de Zimbabo!
Conan se
pergunta se sua espada – e até mesmo suas flechas – teria algum efeito na
criatura. Mas alguma coisa está acontecendo na clareira, anunciada pelo
balançar da corrente do animal, quando este estica para a frente sua cabeça de
pesadelo.
Das sombras
das árvores, sai uma fila de homens e mulheres negros, jovens e nus, exceto por
um manto de pele, lançado sobre os ombros de cada um. Eles formam um
semicírculo a uma distância segura do animal, e caem de joelhos, curvando suas
cabeças até o chão diante deles. Este movimento é repetido três vezes. Então,
levantando-se, formam duas filas, homens e mulheres encarando uns aos outros, e
começam a dançar. Mal movem seus pés, mas todas as outras partes de seus corpos
estão em constante movimento calculado e ritmado, retorcendo, girando e se
contorcendo, emoldurando desnudas paixões primitivas, emolduradas numa orgia
sensual de movimento.
Nenhum som sai
dos dançarinos, nem dos devotos acocorados ao redor do círculo de árvores. Mas
o macaco, aparentemente enfurecido pelos movimentos contínuos, ergue sua cabeça
e manda noite adentro um guincho assustador que Conan ouvira dias antes, nas
colinas que formam a fronteira da negra Zambebwei.
Das sombras
profundas, sai o sumo sacerdote, vestindo apenas um manto de plumas brilhantes.
É um shemita – mais especificamente, um daqueles pelishtios capazes de
prolongar suas próprias vidas por centenas de anos. Em sua mão, ele traz um
bastão de ouro que é o cetro dos sumos sacerdotes de Zambebwei – e onde há
outros da raça de Zemba, usados pelos “servos de Bît-Yakîm” (a quem Conan
conhecera em Alkmeenon, décadas atrás) da mesma forma que aqueles humanos o
estão usando. Aquele pelishtio, sabendo que seu conterrâneo Bît-Yakîm fora
capaz de domesticar um dos servos dos servos dele, domesticou um Zemba, dando
origem a um culto sombrio, no qual suas vitimas são raptadas de Atlaia e
Zimbabo.
Nenhum som vocal sai dos devotos, mas o inspirar
sibila através de lábios grossos, e as filas de corpos negros balançam como
juncos ao vento. O enorme macaco se ergue de um pulo, seu rosto uma abjeta
máscara demoníaca; ele uiva com impaciência medonha, rangendo suas grandes
presas, as quais anseiam afundar naquela suave pele de ébano e no sangue quente
sob ela. Ele encapela-se contra sua corrente, e o poste resistente treme.
E
simultaneamente, o velho Conan se move. Seu movimento é mais instintivo que
consciente. Seu grande arco zimbaboano fala, e o grande macaco grita como um homem
golpeado mortalmente e cambaleia, batendo as mãos disformes na cabeça e olho
flechados, nas quais agarra as hastes, quebrando-as, mas sem conseguir
arrancá-las.
Num instante,
a multidão se encolhe congelada, os olhos brancos arregalados e as mandíbulas
pendendo moles. Então, antes que qualquer um possa se mover, o macaco, com o
sangue lhe jorrando da cabeça, agarra a corrente com ambas as mãos e a arrebenta
com um puxão que torce os elos maciços como se fossem papel.
O sumo
sacerdote se encontra diretamente diante da fera enlouquecida, com os pés
paralisados. Zemba, enlouquecido de dor, não está mais sob o controle do velho
shemita; então, ele urra e salta, e o pelishtio cai sob ele, estripado pelas
garras afiadas como navalhas, sua cabeça esmagada como uma pasta vermelha por
um giro da grande pata.
Voraz, o
monstro ataca por entre os devotos, dilacerando com as garras, rasgando,
golpeando e gritando intoleravelmente. Guinchando, uivando e lutando, as
pessoas negras agarram umas às outras em sua fuga louca. Homens e mulheres caem
sob aquelas garras cortantes e são desmembrados por aquelas presas que rangem.
É um sangrento drama primitivo – destruição distribuída às cegas e por toda a
parte. Sangue e miolos inundam a terra; corpos e membros negros, e fragmentos
de corpos se alastram pela clareira enluarada em pilhas medonhas, antes que o
último dos devotos uivantes – outra linda jovem esguia, com longos seios a
balançarem em sua fuga desvairada – encontre refúgio entre as árvores e em sua
tribo distante, nos braços de seu amado marido e filho recém-nascido. Os sons
de sua fuga aos tropeções e em pânico ficam para trás.
Conan saltou
de seu esconderijo quase ao mesmo tempo em que atirara. Despercebido pelos
aterrorizados negros, e ele próprio mal consciente da matança que rugia ao
redor de si, o cimério correu pela clareira até a figura negra que jazia
flacidamente ao lado da estaca amarrada com ferro.
- Olapa! – ele
gritou, erguendo-a do solo.
Languidamente,
ela abriu os olhos turvos. Ele a abraçou e beijou, desatento aos guinchos e
devastação ao redor deles. O reconhecimento cresceu naqueles olhos amáveis.
- Conan! – ela
murmurou incoerentemente. Então, ela gritou e se agarrou a ele, soluçando
histericamente. – Conan! Disseram-me que você estava morto! Eles iam me matar!
Abruptamente, o
cimério ergue o olhar para o rosto ensangüentado de pesadelo e morte, o qual
arreganha os dentes. O grande macaco havia parado de dilacerar suas vítimas
mortas, e agora se move furtivamente em direção ao casal vivo no centro da clareira.
O sangue corre dos ferimentos em seu crânio inclinado e olho vazado, os quais o
haviam enlouquecido.
Percebendo que
Zemba tem uma resistência física maior que a dos macacos gigantes que já matara
– e similar à dos “servos de Bît-Yakîm” –, o cimério se posiciona para enfiar
sua espada no coração da besta. Ele sabe que seu golpe deveria ser único e
fatal, caso queira escapar com vida e salvar sua companheira. Mas, antes que Conan
possa fazê-lo, a criatura o derruba ao chão, aproximando, cada vez mais, suas
longas presas curvas do rosto do bárbaro. Desesperada, a companheira de Conan
enfia uma adaga entre o pescoço e ombro do antropóide, mas é lançada em direção
ao solo fofo da clareira por um giro violento de um dos braços enormes da
coisa. O cimério aproveita e põe toda a força de seu braço e punho esquerdos
num poderoso soco no queixo da criatura. Zemba mal sente o impacto do murro,
mas ergue a cabeça o tempo suficiente para que Conan possa enfiar sua espada,
até o cabo, na garganta peluda do monstro. Aparentemente inabalado, Zemba se
ergue e, com rapidez impressionante, aperta o tronco do cimério com seus
enormes braços peludos e desgrenhados, ameaçando esmagá-lo, antes que o bárbaro
possa usar a força das pernas para lançá-lo para longe.
Súbito, um
estremecimento toma conta da poderosa estrutura do monstro, fazendo-o desabar
ao chão, finalmente. As flechas, a adaga e a espada haviam, afinal, surtido um
efeito retardado na criatura. A bela Olapa abraça Conan convulsivamente, ainda aterrorizada,
porém viva, intacta e aliviada.
O ofegante bárbaro
então perscruta ao redor. Como todos os cimérios, Conan tem a visão muito
aguçada, além de captar sons acima do limiar normal e sentir as vibrações do
que está no chão. Seu olfato e paladar também são apurados. Ele nasceu com alta
acuidade em todos os sentidos, o que, sem dúvida, contribuiu para sua
sobrevivência nos meios mais inóspitos, como aquele, onde um culto recém-criado
já tem adeptos em outros lugares da região.
Assim, ele
percebe que ambos estão fora de perigo naquela clareira, e beija novamente
Olapa, excitando-se com o volume daqueles lindos lábios grossos em sua boca e
com a textura crespa do lindo cabelo volumoso da zimbaboana nas mãos calejadas.
Em seguida, o cimério suga sofregamente os trêmulos e suados seios longos
daquela linda negra, excitando-se tanto com a flacidez e comprimento deles
quanto com o forte cheiro de suor, exalado por aquelas mamas e pelas axilas
peludas de Olapa, às quais Conan também suga vorazmente, engolindo com gosto
todo o suor da moça. Tudo aquilo transforma paulatinamente os ofegos de pavor
da garota em suspiros e gemidos de um prazer cada vez maior.
Pouco
depois, a jovem está tendo um orgasmo intenso e vibrante, ao sentir a língua
áspera e os finos lábios fortes do idoso cimério sob sua crespa mata negra pubiana,
a lhe estimularem o clitóris, até a zimbaboana alcançar o êxtase do prazer.
Depois, apoiada nas mãos e joelhos, Olapa se delicia com aquela mesma língua em
seu ânus, ao qual o bárbaro suga com a mesma sofreguidão e desejo com os quais
lhe sugara os seios e vulva. A libido da jovem cresce a um nível tão elevado,
que ela mal sente a dor da ruptura do hímen, quando Conan finalmente lhe
penetra a vagina por trás, e termina tendo um segundo orgasmo, enquanto o cimério,
sugando as longas mamas de Olapa por trás, se excita mais ainda e tem um
orgasmo tão intenso quanto o dela.
Logo,
enquanto a linda zimbaboana descansa de seu segundo êxtase de prazer, Conan propõe
algo à jovem, e ela assente, abrindo as nádegas para o excitadíssimo cimério.
Ele lhe suga novamente o ânus, desta vez para lubrificá-lo, enfiando a língua
no reto de Olapa, e passando um pouco da própria saliva e da secreção vaginal
da moça no orifício anal dela, para facilitar a penetração. Sabendo que nem
todas as mulheres sentem prazer numa relação anal, o experiente cimério a
masturba ao mesmo tempo em que lhe penetra o ânus, fazendo-a chegar ao orgasmo
pela terceira vez naquela noite. Então, ao pressentir o próprio clímax de
prazer, Conan tira o falo do reto da jovem e o põe na linda boca da zimbaboana,
na qual ejacula abundantemente, até a última gota de seu esperma.
Ela abre a
boca e tenta gargarejar, como Conan lhe havia pedido momentos antes, mas ao ver
que aquilo iria derramar parte do sêmen, o rei bárbaro pede para que ela
simplesmente engula o esperma. Olapa o faz e sorri para o cimério, beijando-lhe
em seguida os testículos suados e a glande. Percebendo que o desempenho sexual
da jovem é tão bom quanto o das mulheres da Britúnia, de Zamora, da Hirkânia,
de Zingara e Poitain, o idoso bárbaro, ao invés de deixá-la em outra tribo de
Zimbabo, resolve, não apenas levá-la para a Aquilônia, mas também incluí-la em
seu harém.
* * *
Após aquela tórrida noite de amor com a linda jovem
de seios compridos, o cimério retoma, sem pressa, seu caminho de volta à
Aquilônia, pois desfruta de dias confortáveis em sua sela, e noites ainda mais
confortáveis com Olapa, sob a lua e estrelas.
Epílogo:
Dois
montadores param seus cavalos, no interminável e árido deserto. Um deles é um
gigante usando roupas de pele de leopardo e um longo turbante branco – o qual
também lhe serve de manto, a protegê-lo do sol inclemente do Deserto Kharamun
–, e armado com uma grande espada reta que lhe pende do cinto. O outro é uma
mulher esbelta, usando roupa similar à do companheiro e com a cabeça coberta,
ao estilo das zamorianas, shemitas e hirkanianas, pelo mesmo pano que, meses
atrás, lhe servia de saia, a fim de também protegê-la daquele sol que chega a
evaporar o suor da pele. Com a mão direita, ela empunha um arco zimbaboano,
cujo uso aprendera rapidamente com o homem ao seu lado. No solo diante deles
jazem duas figuras inertes, em torno das quais crescem poças de sangue
carmesins rapidamente absorvidas pelas areias secas. Usam túnicas brancas, e os
turbantes que os cobrem estão cheios de poeira. Uma poeirada que se erguia para
leste indicava o lugar por onde fugiam loucamente seus cavalos sem montadores.
- Batedores de um bando zuagir, Olapa – diz o gigante de pele bronzeada. – A má sorte os levou a se cruzarem conosco, quando nossos cavalos estão fatigados e ainda temos de percorrer muitas milhas para estarmos a salvo. Também foi azar um deles ter escapado.
- Não percamos
mais tempo – diz a mulher, com voz gutural, fluida e harmoniosa. – Devemos
cavalgar tão longe quanto possível para oeste. Quem sabe? Talvez ainda possamos
escapar.
Conan encolhe
os ombros e faz seu cavalo girar para oeste, após longas semanas de cavalgada
desde Zambebwei, Atlaia e Zimbabo. O curto descanso havia reanimado os animais,
que iniciam o galope para o horizonte ocidental.
- Você não
conhece os zuagires – grunhe Conan. – São como um bando de cães selvagens.
Nunca abandonam sua presa, a menos que um acabe com todo o grupo.
- Talvez seu
contingente principal esteja distante. Temos que chegar ao norte, até o lugar
que você chama de Khauran, antes que nos alcancem.
- Duvido. Os
batedores zuagires não costumam se afastar muito da coluna principal. Aprendi
seus costumes, quando vivi entre eles e os liderei. Depois que fui líder de um
grupo deles, esses malditos lobos shemitas do deserto já não andam mais em
formação frouxa, como antigamente. Eles agora costumam cavalgar em coluna pelos
desertos. Quando se aproximam de sua presa, formam uma linha e, após apressarem
seus cavalos, que são muito resistentes, aceleram as alas e capturam suas
vítimas após cercarem-nas. Maldito azar! Havíamos viajado sem nenhum
inconveniente até agora, e eles vêm nos surpreender justo quando estávamos
prestes a alcançar a liberdade!
Os cavalos
começam a respirar com dificuldade. Conan puxa as rédeas para manter no alto a
cabeça de seu corcel. Logo, volta a puxar as rédeas e, quando o animal pára,
ele protege os olhos com a mão e olha para o leste. Uma grande nuvem de poeira
cobre o horizonte. No meio dela, se destaca de vez em quando algum brilho metálico,
e a terra ressoa com um rumor distante sob os cascos dos cavalos. Conan aperta
os dentes e empunha sua espada, que assobia no ar. Um sorriso belicoso aflora
em seus lábios, e Olapa olha para ele com admiração. “Se este tiver que ser o
último combate”, pensa Conan, “que seja”. Lutaria até envergonhar a mais de um
heróico semideus. Seus olhos azuis brilham com o desejo de batalha, e sua mão
agarra o cabo da espada com tremenda força. A extensa nuvem de poeira se aproxima
cada vez mais. Já conseguem avistar a larga linha de cavaleiros que se estende
à direita e à esquerda. No centro, cavalga um homem com túnica e turbante
brancos, e atrás dele, outros com roupas similares a e as mesmas feições
morenas e aquilinas, e corpos esguios e fortes. Conan procura aguçar sua visão
de águia e resmunga uma terrível praga. Enquanto isso, Olapa já preparou uma flecha
em seu arco.
Os cavaleiros
encontram-se tão próximos, que já se podem ouvir seus prolongados gritos de
guerra. As pontas das lanças já estão baixas, como uma onda reluzente; o solo
se estremece sob os trovejantes cascos dos cavalos. Conan contrai os músculos
e, com ar sombrio, se prepara para lutar com os atacantes.
De repente, os
inimigos diminuem o passo. Alguns cavalos dão meia-volta, e a ordem da linha de
ataque se quebra. Conan se ergue sobre sua sela, para ver se descobre o que
havia causado aquela mudança repentina. O sol brilha ofuscante sobre as armaduras
polidas, os elmos, as lanças afiadas e as espadas de um forte contingente, que
apareceu pelo lado oposto. Num ataque irresistível, uns quatro mil cavaleiros
aquilonianos se lançam contra os zuagires, com sua bandeira flutuando ao vento.
As fileiras
hiborianas se dividem ao alcançarem Conan e Olapa, para deixá-los no meio, e
logo atacam os shemitas com a força cegante de um raio. Inflamado pela ânsia de
batalha, Conan também se lança sobre o inimigo. Sua espada se abate sobre a
cabeça de um musculoso lanceiro zuagir e o derruba da sela, com o turbante
cortado e manchado por sangue e miolos. O rei da Aquilônia abandona rapidamente
seu cavalo, que está exausto, e monta no corcel do lobo do deserto. Logo, avança
diretamente ao núcleo central de seus adversários, abrindo um caminho sangrento
em sua passagem. Depois, Conan acerta um poderoso golpe na lateral de um
arqueiro que lhe apontava quase a queima-roupa, e leva o homem ao solo, como se
fosse um boneco. Logo, se defronta com o chefe das hordas inimigas, trocando
golpes com a ferocidade do lutador nato.
O cimério redobra
a força e rapidez dos ataques de sua brilhante espada. Os movimentos defensivos
do líder tribal shemita finalmente falham, e a lâmina implacável de Conan lhe corta
a malha de aço, a carne e os ossos. O chefe zuagir cai morto ao chão.
Conan faz uma
pausa e olha os arredores. O solo está semeado de cadáveres que usam túnicas
brancas e calças largas. Os aquilonianos sofreram poucas baixas, mas a maior
parte dos cinco mil zuagires jaz sem vida sobre o deserto. As linhas brilhantes
dos cavaleiros ocidentais convergem para os pontos onde a luta ainda continua.
Então, o
restante dos filhos do deserto larga as armas e pede trégua. Uns poucos fogem
para o horizonte, perseguidos pelos vencedores. Conan sorri sombriamente, e olha
ao seu redor, em busca de Olapa. Apenas os extraordinários reflexos do bárbaro
lhe salvam a vida. Uma flecha vem assobiando. Um segundo antes, ele viu, pelo
rabo do olho, o movimento ameaçador de um arqueiro, e por isso se abaixou a
tempo. A pouco mais de seis metros de distância, um último zuagir, o qual não
quis fugir nem se render, coloca outra flecha no arco, com o rosto contraído de
raiva. Ele puxa a corda e, naquele exato momento, duas flechas se cravam nele
ao mesmo tempo – uma no peito, disparada por Olapa, e a outra na parte posterior
do pescoço, lançada pela Condessa Valéria. O homem despenca sobre o solo de
areia. Próxima a Conan, Olapa contempla, de seu cavalo, o resultado de sua
perícia no manejo do arco.
“Nenhum homem
teve uma amante melhor que Valéria, e nenhum rei terá rainha melhor que
Zenóbia, nem concubina melhor que Olapa no harém”, pensa o bárbaro, ao mesmo
tempo em que ergue a zimbaboana do cavalo e a monta sobre sua própria sela.
– Pallantides!
Valéria! – grita o cimério, e ergue-se uma pequena nuvem de poeira quando o
punho de Conan golpeia suavemente os ombros de dois de seus fiéis seguidores. –
Se não chegassem na hora exata, como fizeram, esses cães teriam acabado conosco.
Como chegaram até aqui? Mal posso acreditar!
Pallantides,
alto, musculoso e de olhar vivaz, responde:
- Zelata nos
guiou. Desde que foste embora, há quase um ano, eu a visitei freqüentemente.
Através das artes ocultas, ela predisse o sucesso de tua tarefa, e teu
regresso. Previu que serias atacado aqui, no deserto, e nos colocamos a caminho
para evitá-lo.
- E como vai
nosso reino, Valéria?
- Conan, o
povo anseia por seu regresso. Quando nos afastávamos de Tarantia, eles nos
dirigiam inúmeras bênçãos. Zenóbia, Brion e Flavia estão bem, estamos em paz, e
ninguém tem ousado nos atacar. Por causa dessa paz toda, acompanhei este
exército. As colheitas frutificam, e o país nunca conheceu tanta prosperidade.
Só nos faltava a presença de nosso querido rei, para transbordar a taça de
nossa felicidade e fortuna.
- Muito bem
dito, amiga! – diz Conan, com ar satisfeito. – Mas, quem vem lá? Que me
condenem, se não for Zelata!
De fato, é
ela. Alta, delgada e de cabelos brancos, vem com suas amplas roupagens
ondulando ao vento, e um sorriso nos lábios. Embora 17 anos mais velha do que
no dia em que Conan lhe salvara a vida, a idosa mulher ainda irradia energia e
vitalidade surpreendentes.
- Bem vindo,
Rei Conan – ela diz, cheia de sinceridade. – Transcorreram muitas luas, desde
que nos vimos pela última vez. Livraste o mundo de um monstro insaciável, e,
diante de nós, apresenta-se um futuro promissor.
- E devo lhe
agradecer, Zelata, por ter deixado, mais uma vez, a paz das ravinas para vir me
ajudar.
Dizendo isto,
o cimério abre, com golpe de sua espada, a embalagem metálica que trazia desde
Mogar. Um aroma pungente de ervas e especiarias conservantes se espalha pelo ar
seco do deserto. Somente Olapa de Zimbabo se assusta ao ver as feições congeladas
da cabeça decepada de Khyan-Apopi, a qual o cimério exibe para todos ali presentes.
Mas todos os aquilonianos sorriem de satisfação, ao verem Conan lhes mostrar a
prova de sua vingança.
O velho Rei Conan
dá uma última olhada ao sangrento campo de batalha. Logo, ele esporeia o cavalo
e se dirige para oeste, à frente de seus cavaleiros. Então, diz em voz baixa a Valéria,
que cavalga a seu lado e cuja cota-de-malha ficou arranhada e parcialmente destruída
pelos vários golpes de cimitarras:
- Por Crom,
depois de toda esta conversa fiada, estou com a garganta mais seca que este
maldito Deserto Kharamun. Acaso tem algum odre de vinho em sua sela?
* * *
O sol já havia nascido em Tarantia, capital da terra adotiva e
definitiva de Conan. Naquele momento, nos aposentos reais, pronta para descer
até a sala de audiências onde o povo e os príncipes a esperam, a Rainha Zenóbia
observa a si mesma, no espelho. Embora seus seios alvos – agora cobertos por um
lindo vestido de veludo negro – houvessem, na segunda gravidez, crescido muito
mais que na primeira (além de terem, pela primeira vez, caído), o inesgotável
fogo viril de seu marido cimério, aliado ao fato dele, desde há muito tempo,
gostar tanto de seios flácidos quanto firmes, fez com que a auto-estima da
nemédia não diminuísse nem um pouco. Então, enquanto admira, sobre sua negra
cabeleira escovada, a coroa com pontas e incrustada por esmeraldas e safiras,
que seu rei mandara fazer para ela, Zenóbia, apesar de estar administrando bem
a Aquilônia, sente mais uma vez enormes saudades do marido ausente. Embora o
Rei Conan costumasse tirar três tardes na semana para freqüentar o harém real,
era sempre com sua rainha que ele dormia e tinha a primeira e a última relação
sexual de todos os dias – e isso a deixava muito contente.
Súbito, uma linda menina de 15 anos entra correndo nos aposentos reais,
seu rosto alvo emoldurado por cabelos negros como os do pai e incrustado por
olhos escuros como os da mãe.
- Flavia! – diz a rainha, meio que contagiada por aquele sorriso da
garota. – O que faz aqui, filha?
- Papai voltou, mãe! Meu pai está de volta, junto com a comitiva que
foi buscá-lo.
O sorriso de Zenóbia se alarga, e uma onda de júbilo toma conta da
Rainha da Aquilônia. Ela e a filha se dirigem à janela de treliças próxima ao
espelho, abrem-na e não tarda muito para que vejam uma comitiva, desfilando lá
embaixo, com Valéria, Pallantides e até Zelata montados em cavalos à frente do
destacamento. E, à frente de todos, aclamado por seus súditos, o Rei Conan da Aquilônia!
Ao rever o marido no desfile triunfal pelas ruas de Tarantia, a Rainha Zenóbia
sente uma onda de calor lhe tomar conta do corpo. É como se ela voltasse à
vida, depois de estar morta e fechada num túmulo. Para ela, é como se o sol
aparecesse repentinamente, após uma temporada longa de chuva e céu nublado. Ela
e a filha não agüentam ficar só olhando, e descem correndo pelas escadas do palácio,
para verem de perto o caro e amado marido da primeira e pai da segunda. Ao
chegarem à rua, elas vêem que o Príncipe Brion já havia descido antes delas. Com
o término do desfile, Conan abraça e beija sofregamente sua Zenóbia, enquanto a
cabeça do assassino Khyan-Apopi é exposta no Campo do Traidor e a bela Olapa é
incluída no harém do rei.
Como sempre, Zenóbia sente, no leito real, o poder feroz das mãos,
beijos, carícias e falo de Conan; mas seu marido não a machuca, e nunca a
machucou, ao longo de todos aqueles anos de casamento – nem a ela nem às
mulheres do harém real. Ao contrário, é aquela mistura paradoxal de ferocidade
com delicadeza o que excita a rainha.
Mais uma vez naquela noite, Conan beija os seios fartos de Zenóbia,
passando a língua pela barriga e umbigo da esposa, e descendo-a até os negros
pêlos pubianos da nemédia. Quando surge o alto da fenda da rainha, o rei
cimério ali mergulha a língua, sentindo-lhe o gosto da feminilidade e
procurando o clitóris. Ela solta um grito de prazer quando ele o encontra.
Conan suga mais uma vez o enorme busto alvo da rainha e desce novamente
a língua. Afasta-lhe as pernas, abre suas lindas pétalas róseas e encontra o
nódulo inchado. Ele o beija e trabalha com a língua, enquanto põe os dedos
calejados dentro da vagina da esposa. Ela grita, sentindo ondas quentes de
prazer por todo o corpo. Erguendo-se, Conan encontra a abertura dela com sua
masculinidade inchada e a penetra.
Zenóbia volta a gemer de prazer e desejo, a cada vez que seu marido
entra e sai. E então, Conan ejacula. Com um grito rouco, ele chega a mais um
auge intensamente poderoso e jorra dentro dela. Inundada por ondas de sensações
iguais às dele, a rainha nemédia curva as costas, apertando-se contra ele,
enquanto ele se aperta contra ela. Os dois param por um momento, tremendo em
convulsões, abraçando-se como se tentassem entrar um no outro, tornando-se um
só e então relaxando ofegantes, no quarto orgasmo daquela madrugada.
FIM
Agradecimentos especiais: Aos howardmaníacos e amigos Miguel
Martins (in memorian), de Paris; Deuce Richardson, dos EUA, e Al Harron, da
Escócia.
A Seguir: Reino das Trevas.