Conan, O Bamula

(por Fernando Neeser de Aragão)



1)

Anoitece nas selvas ao sul de Kush. Por entre aquela exuberante e quente selva úmida, vagueia um homem que, apesar de alto e musculoso, não pertence à raça de bravos caçadores e guerreiros negros, que ali nasceram e perambulam. Este homem – quase um gigante em tamanho – tem sua pele moreno-clara bronzeada pelos sóis daquela região equatorial; seus negros e emaranhados cabelos longos são lisos, e seus olhos, azuis. Sua única roupa é um par de calções de seda, seguros por um largo cinto de couro, do qual pende uma longa espada, numa bainha também de couro. Sobre sua pele de bronze, se sobressaem várias cicatrizes, de incontáveis batalhas.

Semanas atrás, ele havia se aventurado, na companhia da pirata aquiloniana Valéria, desde Xuchotl até as pradarias a oeste daquela cidade perdida. Naqueles prados, o cimério errante tinha amigos entre as tribos de pastores negros. Ele e Valéria pretendiam embarcar num navio, antes que os stígios abrissem os portos para a temporada comercial. Na costa de Suba, eles encontraram um navio, mas, ao invés de embarcar com sua companheira loira, o cimério, de nome Conan, preferiu deixar a aquiloniana comandar o navio sozinha. Ambos tinham habilidade para liderar, mas não para dividir o comando de uma embarcação pirata. Não importa o quão ardente tenha sido a pirata da Irmandade Vermelha, ao partilhar prazeres carnais com Conan, no longo caminho entre Xuchotl e a costa: o cimério não a amava como amara Bêlit – a única pirata à qual o bárbaro continuaria obedecendo se ainda fosse viva.

Valéria, por sua vez, sempre sonhara em comandar sua própria nau, e não se incomodou em ter de abandonar o cimério – apesar das boas lembranças que a loira guardava daquele homem bronzeado, que a fizera mulher semanas antes.

Neste momento, Conan da Ciméria está caçando um coelho, naquela selva à qual voltara após deixar a costa e os prados. O cimério só havia bebido água naquela manhã e, ao continuar voltando para o leste durante a tarde, ele nem isso achara. No instante em que está prestes a arremessar o punhal certeiro no animal, uma flecha, à esquerda de Conan, atinge a caça. Alerta, ele desembainha a espada e, no momento seguinte, surge na clareira um negro alto e musculoso, usando um cocar de plumas e uma tanga de pele de leopardo, e com uma reluzente lança de ponta de ferro na mão. O olhar feroz do homem cor de ébano deixa bem claro que ele não está nada interessado em partilhar o animal recém-abatido com aquele forasteiro branco. A atitude do negro confirma isto, quando ele aponta a lança em direção ao peito nu do cimério. Mas este é tão ágil quanto qualquer felino das selvas e savanas locais, e se esquiva da arma, decepando a cabeça do lanceiro num jato de sangue.

Contudo, surgem mais sete guerreiros negros e seminus na clareira, gritando “Yee, yee, yee!”, enquanto avançam em direção a Conan para vingarem o amigo morto. O cimério, achando que possa haver mais aliados daqueles atacantes acompanhando-os para ajudá-los, resolve correr para dentro daquela mata – a qual conhecia, desde que a percorrera em direção a Kush, semanas após a morte de Bêlit, há mais de dez anos.

Conan desce um despenhadeiro, cheio de árvores caídas, cujos troncos estão suficientemente inclinados para o cimério saltar, dos mais altos aos mais baixos, até alcançar a base do precipício em segurança. Ele corre mais uns cem metros, com os gritos dos lanceiros cada vez mais fracos atrás de si. Súbito, Conan se depara com outros trinta lanceiros negros à sua frente. Suas feições, cocares e lanças mostram ao cimério que aqueles 30 homens pertencem ao mesmo povo dos que o perseguiam lá atrás.

Cansado de fugir, Conan faz o que eles menos esperam: ataca furiosamente, abrindo o crânio do mais próximo, do cocar ao pescoço. Outro lanceiro investe pelo lado, somente para ter o queixo e crânio destroçados por um terrível chute do cimério. Com sua larga espada, Conan quebra uma lança aqui, decepa uma cabeça ali, parte um corpo em dois acolá... além de arremessar o punhal na garganta de mais outro. Mas o peso dos números, aliado a duas fortes bordunadas na nuca, fazem o cimério cair sem sentidos.

***

O inconsciente cimério é levado pelos lanceiros, que o amarram numa grossa estaca, fincada no centro da tribo. Ao acordar, Conan percebe que a tribo é cercada por uma paliçada, assim como a distante tribo de Gwawela, nas Terras Pictas, onde ele há dois anos resgatara o amigo aquiloniano Balthus, assassinado horas depois. O cimério conclui que aquela grande aldeia deve pertencer à tribo Bamula, Bakalah ou Jihiji – ou a outra das ferozes tribos guerreiras que ocupam aquela região. O xamã daquela aldeia, um velho esguio, calvo e barbudo – mas de compleição vigorosa e com as linhas do corpo ainda firmes –, começa a entoar cânticos morosos, à medida que dança ao redor daquele estranho forasteiro que, apesar dos cabelos negros e corpo musculoso como os dos nativos, tem a pele bem mais clara que eles, além do nariz e lábios bem mais afilados, olhos azuis e cabelo bem mais liso.

- Quem é você e o que veio fazer por aqui? – pergunta rispidamente o velho tatuado, cuja língua o cimério entende, pela sua semelhança com os dialetos de outros povos negros, vizinhos a este.

- Meu nome é Conan... da Ciméria. Eu procurava água e comida, para viajar para leste... Não precisam me temer! – diz o bárbaro, elevando a voz para toda a tribo ouvir. – Não farei mal algum a vocês!

- Daremos a você mais do que quer, estrangeiro – diz o velho xamã, sorrindo maliciosamente –, se derrotares o Grande Gato – ele acrescenta, pouco antes de se dirigir à sua choupana.

Todos os aldeões de pele negra também se recolhem às suas respectivas cabanas. Exausto, o bárbaro moreno pende a cabeça para a frente, entregando-se ao sono, pouco antes da meia-noite, vigiado somente pelo enorme disco prateado da lua cheia no céu, a qual dá fascinantes matizes ao cenário tropical, de matas e cabanas.


O sol desponta no leste. O bárbaro acorda e é solto pelo xamã, o qual corta-lhe as cordas que amarravam-no à estaca pelo tronco e pulsos. Em seguida, ele recebe, das mãos do musculoso chefe da tribo, a sua própria espada, a qual lhe fora tirada na noite anterior. Homens, mulheres e crianças barulhentos se aglomeram ao seu redor, enquanto Conan segue para outra parte da tribo, pouco antes de chegar à beira do fosso.

Ao ver o animal – cujo odor lhe era velho conhecido –, o cimério, vestido com seu calção e armado com a espada, pula na enorme vala e encara seu adversário. Com os olhos faiscando, o leão salta em direção ao peito do bárbaro. Este esquiva-se numa fração de segundo, esmurrando a face esquerda da fera, a qual cai ao chão. No instante seguinte, o felino se levanta para investir de novo contra o guerreiro, o qual desta vez agarra o pescoço do leão com ambos os braços – que parecem parte de uma hercúlea estátua de bronze –, sufocando-o, até que, após cinco minutos de asfixia, o cimério abrevia-a, finalmente brandindo a sua espada, ao cravá-la profundamente na jugular do animal, fazendo o sangue jorrar como um pequeno chafariz.

Antes de desmaiar – vencido pela fome, sede e cansaço –, o aplaudido cimério sorri vitorioso.


2)

Ao acordar, o cimério está no leito de uma das cabanas da aldeia, sendo cuidado e enfaixado pelo velho xamã e a esposa deste.

- O homem branco está voltando a si – diz o velho à sua esposa.

- Beba isto, bamula – diz a mulher, estendendo uma grande cuia de madeira para o homem que agora se apóia nos cotovelos. Conan nota que seu esfarrapado calção de seda foi substituído por uma tanga de pele de leopardo. Desconfiado, o cimério cheira o conteúdo da vasilha: apenas leite, e mais nada. Tranqüila, e ao mesmo tempo sofregamente, o faminto homem de pele bronzeada engole meio litro em poucos segundos e em rápidos goles. Súbito, ele olha para a mulher do xamã e sorri:

- “Bamula”, hein? Pelo visto, o chefe honrou a palavra dele.

- Sim, forasteiro... digo, Conan – responde a esposa do xamã, oferecendo um pernil assado de boi ao cimério que bebera metade do leite da cuia.

O bárbaro das colinas sorri de novo e olha para o xamã da tribo:

- Então foi isso o que você quis dizer com “Daremos a você mais do que quer”... – ele comenta, percebendo, a partir da mudança de atitude do xamã, o enorme respeito que um bamula tem para com outro – Bem, já estou quase recuperado... Enquanto eu não voltar a viajar, ser um bamula me parecerá uma vida tão boa quanto qualquer outra.

Súbito, um bater de palmas, do lado de fora da cabana, atrai a atenção das três pessoas ali dentro.

- Entre, Yemba! – responde o xamã, logo após olhar para o lado externo da porta.

- Mestre... – diz um belo e jovem negro assustado, a adentrar o local. – Ngomba, o nosso chefe-de-guerra, quer acabar com a vida do homem branco, alegando que nenhuma pessoa de pele pálida merece ser membro dos bamulas... Principalmente o pirata Amra, que há anos atacou as tribos e cidades litorâneas.

- Pois ele fique sabendo que esta é uma casa sagrada, e ninguém entra aqui para matar... – exclama o xamã.

- Ngomba sabe disso, mestre, mas ele acabou de matar traiçoeiramente uma mulher que tentou impedi-lo e... – começa a dizer Yemba.

- Chega! – diz o cimério, acabando de comer a carne que lhe foi dada, erguendo-se e apanhando a espada que ficara ao lado do leito. – Vou lutar contra aquele cão assassino covarde do lado de fora.

- Cuidado, homem branco... – adverte o xamã. – Ngomba é traiçoeiro.

- Eu vi, pelo relato de Yemba. E sei que a maioria dos líderes que conheço é traiçoeira – responde Conan, saindo da cabana, de espada em punho. Pouco antes disso, Yemba sussurra algo no ouvido do cimério.


Ao sair da choupana, ele avista o líder da tribo Bamula. Ngomba é um dos poucos bamulas cuja altura supera – ainda que em poucos centímetros – a de Conan. O líder negro é tão musculoso quanto o cimério e demonstra ter a mesma vitalidade deste. Armado com uma lança na mão direita, um escudo na esquerda e usando na cabeça o mesmo cocar de plumas dos demais bamulas, Ngomba grita bravatas o tempo todo, em desafio ao recém-chegado. Os demais bamulas, por sua vez, guardam o silêncio, preferindo aguardar o desenrolar dos acontecimentos, para então poderem se manifestar.

- Aqui estou – responde Conan, caminhando a passos largos em direção a Ngomba. – Vai querer me matar sozinho, ou vai se proteger atrás de outros homens? Ou você só seria homem suficiente para matar uma mulher indefesa?

Enfurecido com a zombaria desafiadora, Ngomba larga a lança e escudo, e empunha, no lugar destes, uma maça e um punhal (o que, para ele, continua sendo vantajoso contra quem usa apenas uma espada), e não hesita em responder:

- Será homem a homem, bastardo sem cor! – ele grita, ao mesmo tempo em que brande seu porrete contra Conan. Este se esquiva e, ao mesmo tempo, arremete lateralmente a espada contra o chefe bamula, o qual apara o golpe de Conan, usando a adaga. Uma bela finta, pensa o cimério.

No instante seguinte, Ngomba tenta atingir o peito do forasteiro, mas este apara o golpe, segurando a espada com ambas as mãos, ao mesmo tempo em que em que arremete o pé nos testículos de Ngomba. Sabendo que o líder dos bamulas é traiçoeiro, Conan da Ciméria não o seria menos naquelas circunstâncias. Contudo, o poder de recuperação do gigante bamula é tão grande quanto o do cimério, e o líder tribal se levanta ao mesmo tempo em que lança areia nos olhos de Conan e atinge-lhe o ventre com uma das pontas metálicas do porrete, num golpe horizontal que, se fosse uns 5 cm mais profundo, o cimério morreria com as tripas à mostra.

Assim, no instante seguinte, Conan atinge a face direita de Ngomba com um potente soco da mão direita, quase ao mesmo tempo em que o negro abre parte do músculo peitoral do cimério com a adaga. Ambos estão quase exaustos, quando o chefe bamula ergue o porrete contra o forasteiro. Este se abaixa, esquivando-se, ao mesmo tempo em que abre o ventre de Ngomba, fazendo-o cair quase morto, com os intestinos de fora.

Erguendo-se ofegante sobre o cadáver do líder dos bamulas, Conan é automaticamente amparado por um homem magro – o qual assistira à luta mais de perto. No momento seguinte, contudo, Conan atravessa mais de meio metro de aço azulado de sua larga espada no ventre do que lhe oferecera apoio. Quando este cai morto, todos os bamulas vêem a faca caindo da mão direita do defunto esguio.

- Estão vendo, bamulas? Estes homens queriam matar alguém que vocês mesmos aceitaram como membro da tribo! Por isso os matei! Quem errou? – grita Conan.

- Ngomba e o conselheiro dele! – respondem os negros, num exaltado coro irregular.

- Pois que o novo conselheiro de vocês seja o jovem Yemba! Foi ele quem me avisou da traição do conselheiro anterior!

- Sim! – responde toda a multidão ao mesmo tempo. – E que Conan seja o novo chefe dos bamulas!

- Sim! Viva Conan, chefe-de-guerra dos bamulas!!! – gritam, em total alegria, todos os homens e mulheres da tribo; inclusive o leal Yemba.

O cimério sorri. Não era a liderança de mercenários hiborianos, saqueadores kozakis, bandoleiros zuagires e afghulis; piratas negros, barachos ou zíngaros; nem sequer o de co-rei em Tombalku, como ele fora alguns anos antes. Mas ser líder de guerreiros era sempre uma alegria para Conan. O xamã se prontifica a lavar e cuidar dos novos arranhões que o forasteiro branco sofrera, ao mesmo tempo em que, sorrindo amigavelmente, o jovem conselheiro Yemba põe o cocar de Ngomba na cabeça do cimério.

***

À medida que o sol se põe, o velho xamã dos bamulas começa a entoar cânticos, os quais, o líder cimério percebe, enaltecem os heróis do passado daquela tribo e suas futuras glórias. Quando a escuridão aumenta, os nativos acendem uma fogueira e, após jantarem, retiram seus cocares, tangas e saias, ficando completamente nus – homens e mulheres –, para em seguida dançarem ao redor do fogo.

Semanas antes, nas proximidades de Xuchotl, Conan havia dito a Valéria que não gostava de mulheres negras. Mas o verdadeiro motivo daquela frase era o fato de que o cimério estava, naquela ocasião, cortejando uma pirata loira...

Desse modo, dentre os inúmeros e desnudos corpos suados de ébano, a brilharem ao redor daquela fogueira, aquele primeiro chefe branco dos Bamulas distingue duas mulheres esguias e de corpos flexíveis: uma delas com seios médios, mas quadris fartos, firmes e arredondados; e a outra, com seios longos a lhe alcançarem a cintura, a tremularem como a fogueira acesa e com enormes aréolas, de mais de 10 cm de diâmetro cada uma.

Excitado ao ver as duas beldades – diferentes uma da outra, mas igualmente lindas e irresistíveis –, e sabedor do fato de que são solteiras, Conan, à medida que janta, sentado em seu trono de marfim, espera a dança acabar, para logo depois levar as duas belas e sorridentes mulheres suadas à sua cabana e leito, onde passa a noite tendo relações sexuais com ambas.


3)

Nas densas florestas das terras ao sul de Kush, fantásticos canteiros de orquídeas fulguram em meio às folhagens de um verde muito escuro, e ferozes tribos nativas mal conseguem forjar sua sobrevivência nas matas quentes, cujas trilhas sombrias têm seu silêncio quebrado apenas pelos ressoantes rugidos do leopardo, os grunhidos do porco selvagem, o estridente trombetear do elefante ou o grito repentino de um macaco.

Numa fogueira enorme, no centro de uma tribo mergulhada naquelas matas úmidas, vinte quilos de milho estão sendo cozidos com carne numa panela grande. Os idosos bebem chá como aperitivo, e leite é servido em cabaças para todos – um típico banquete bamula. Os guerreiros começam a dançar, enquanto inhame cozido é servido, ainda fumegante, para os espectadores – dentre eles, Conan, que lidera aquela tribo há meses.

Passara-se um ano desde que o bárbaro branco se tornara chefe dos bamulas. Após este longo tempo, ele havia se convencido definitivamente de que a companhia de negras no leito só o agradava a curto prazo. Em apenas três noites, o cimério já havia se cansado das duas primeiras mulheres bamulas com as quais havia tido relações sexuais. A seguir, ele escolheu outras duas – ex-escravas, compradas de uma tribo vizinha a um preço baixo – e, para não se cansar delas, apelou para atos mais excitantes durante a troca de prazeres – tais como coito anal e ejaculação facial. Conan conseguiu ficar um mês com as ex-escravas, antes de se cansar delas – a expressão de nojo que ambas faziam, quando o cimério lhes ejaculava no rosto (diferente dos sorrisos das mulheres com as quais já havia feito isso), colaborou bastante para que ele não as quisesse mais. Pouco tempo depois – logo após se cansar de ir para a cama com uma quinta negra, ainda mais bela e excitante que as duas anteriores –, Conan percebeu que, somente com mulheres de traços retilíneos e pele branca, morena ou marrom, é que ele conseguia manter um relacionamento mais duradouro – melhor dizendo, menos curto, pois a única mulher com quem ele se casaria, caso fosse viva, seria a inesquecível Bêlit.

Os chefes de guerra dos bamulas defendem suas honras pela força de suas mãos e armas, pois qualquer homem forte o bastante para matar um líder daquela tribo se torna chefe de guerra em seu lugar. Assim, Conan havia ganhado e mantido o cargo de chefe.

O hóspede daquela noite é um negro de nome Bajhikunga. Segundo o mesmo, ele havia sido alvo de intrigas por parte de falsos amigos, e expulso da própria tribo. Mas, desde a primeira vez em que o líder cimério o viu, desconfiou dele. E o que era uma vaga desconfiança acabou se tornando uma aversão. Sendo Conan o único branco ali presente, o preconceito racial era forte nele e, sem dúvida, o estranho sentimento de desconforto que Bajhikunga constantemente lhe despertava tinha grande relação com a sua antipatia por ele.

Alto, magro e forte, ele difere um pouco dos bamulas – os quais são altos, robustos e musculosos –, e dos jihijis e bakalahs, com quem eles têm certo contato de vez em quando. Naquele momento, ele negocia os poucos bens que trouxe, em troca de comida, hospedagem e uma das mulheres bamulas. De bom-grado, Conan dá a ele uma de suas ex-parceiras. Mas a conduta respeitosa e cortês do hóspede, de alguma forma que o cimério não sabe explicar, aumenta mais ainda a sua desconfiança.

Agora que ele havia se cansado das mulheres nativas, seu principal passatempo, quando os bamulas não guerreiam sob sua liderança, é caçar e cavalgar num dos magros cavalos kushitas, típicos daquela região e que ficam guardados no curral da tribo. Naquele meio tempo, Bajhikunga deixa a tribo Bamula e vai morar próximo à costa, só aparecendo na tribo que Conan lidera para fazer novas trocas comerciais. Mesmo assim, o cimério ainda se sente desconfortável quando está na presença daquele homem, e isso o incomoda. E ele não consegue fazer os outros nativos falarem sobre ele. Tudo o que o cimério obtém dos destemidos bamulas são gestos que, surpreendentemente, indicam medo e informações vagas de onde ele mora. Até mesmo o conselheiro Yemba, assim como o xamã da tribo, parecem temê-lo. A opinião geral parece ser a de que Bajhikunga é um bom homem, o qual deve ser deixado em paz. E correm boatos de que ele seria um bruxo.

Um incidente, porém, faz o mistério em torno do feiticeiro tomar, aparentemente, uma forma um pouco mais sinistra. Da maneira misteriosa como as notícias se propagam nas terras negras, Conan e seus bamulas ficam sabendo que Bajhikunga e a ex-parceira do cimério – agora casada com o bruxo – tiveram algum tipo de desentendimento. É uma informação vaga e parece não ter muita base em fatos. Mas, pouco tempo depois, a referida jovem é encontrada semi-devorada por hienas. Por si só, aquilo não é incomum, mas Conan percebe certo brilho de medo no olhar dos bamulas, ao saberem disso.

Apesar daquela jovem não o excitar mais, seu sentimento de ódio fica ainda maior, pois ele não pôde deixar de sentir alguma vaga conexão entre o medo dos bamulas, o dilaceramento da jovem pelas hienas e o feiticeiro. Ela, apesar de não pertencer mais à tribo Bamula, esteve sob sua proteção durante um ano, e mexer com qualquer membro da alcatéia de Conan é tão perigoso quanto mexer com ele próprio.

Não muito tempo depois, o líder cimério dos bamulas está caçando dentro da selva, acompanhado por dois de seus companheiros tribais. Quando eles param para descansar, vêem, numa elevação, uma enorme hiena os encarando. Os guerreiros ficam um tanto surpresos, pois os animais não têm o costume de se aproximar tão corajosamente dos homens à luz do dia. Conan sente o medo nos seus dois amigos e comandados. Não há dúvidas quanto às intenções do animal, pois seus olhos brilham como os de um demônio do inferno. Tomado de fúria, Conan arremessa sua lança no peito do animal. Com um uivo que parece ter um tom horrivelmente humano, a hiena se vira e corre de volta para a mata, cambaleando.

Eles a seguem, acompanhando seus rastros de sangue – os dois bamulas encorajados pela atitude do cimério. Então, eles vêem que a trilha leva até a cabana onde Bajhikunga foi hospedado, semanas atrás na tribo Bamula. Lanças a postos – uma lança sobressalente fora dada a Conan pelo jovem guerreiro Bamunda, após o cimério ter acertado o animal –, eles contornam a choupana e forçam a porta rústica. Não há pegadas se afastando da cabana, e nenhuma levando até ela, além das da hiena. Mas, ainda assim, eles não encontram nenhuma hiena dentro daquela cabana. No chão sujo, com uma lança enfiada no peito, jaz Bajhikunga, o feiticeiro.

Com um sorriso de satisfação, o líder cimério cospe no rosto do bruxo morto, contente por ter vingado a morte de uma das suas protegidas, ao mesmo tempo em que um brado selvagem de aclamação, às suas costas, mostra a ele que, junto com o feiticeiro, o medo dos seus bamulas por Bajhikunga também havia morrido.

Logo, o guerreiro bamula Modibo aparece ali, com a mensagem de que Bajujh, rei dos Bakalahs, havia mandado chamar Conan, para banquetear com ele e, juntos, atacarem a cidade de Jihiji.



Epílogo: Pouco tempo depois, Conan resgata uma jovem ophiriana chamada Lívia, primeiro dos bakalahs, e depois de um demônio das trevas, e a conduz em segurança até a fronteira da Stygia (O Vale das Mulheres Perdidas/ http://cronicasdacimeria.blogspot.com.br/2013/05/o-vale-das-mulheres-perdidas.html



Agradecimentos especiais: Ao grande amigo José Luis Carneiro, de Salvador (BA), e aos amigos e howardmaníacos Deuce Richardson, dos EUA, e Ricardo Medeiros, de Brasília (DF).




A Seguir: De Volta aos Reinos Hiborianos.





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