(por Robert E. Howard)
Outrora, eu
fui Coração de Ferro, o falcão de guerra comanche.
Isto que falo
não é fantasia, nem sofro alucinações; falo com conhecimento seguro, da memória
da medicina, a única herança que me foi deixada pela raça que conquistou meus
ancestrais.
Isto não é
sonho. Estou aqui, sentado em meu cargo eficientemente nomeado, 15 andares
acima das ruas que trovejam e rugem com o tráfego da maior civilização artificial
que o planeta já conheceu. Olhando pela janela mais próxima, vejo o céu azul somente
entre os pináculos dos edifícios que se erguem acima desta Babilônia recente.
Se eu olhar para baixo, só verei listras de concreto, sobre as quais flui um
rio de humanidade aglomerada e máquinas com rodas. Aqui não há expansões
oceânicas de campinas nuas e marrons sob um desnudo céu azul; aqui não há capim
seco, ondulando diante dos pés invisíveis do também invisível povo dos ermos;
aqui não há solidão, vastidão e mistério para velar a mente com a cegueira que
tudo vê, e para construir sonhos, visões e profecia. Aqui, tudo é matéria
reduzida à sua mais mecânica tangibilidade – poder que não pode ser visto,
tocado nem ouvido; força e energia que esmagam todos os sonhos, e transformam
homens e mulheres em autômatos chorões.
Sim, eu me
sento aqui em meio a esta nova selva, de aço, pedra e eletricidade, e repito o
inexplicável: fui Coração de Ferro, o Tirador de Escalpos, o Vingador, o Cavaleiro
do Trovão.
Não sou mais
escuro que muitos de meus fregueses e patrocinadores. Visto as roupas da
civilização com a mesma facilidade que qualquer um deles. Por que eu não deveria?
Meu pai vestia manta, touca de guerra e tanga indígena em sua juventude, mas nunca
usei quaisquer roupas que não fossem as dos homens brancos. Falo Inglês – e também
Francês, Espanhol e Alemão – sem sotaque, exceto por um leve acento do tipo que
você encontra em qualquer branco de Oklahoma ou Texas. Atrás de mim, existem
anos de vida acadêmica – Carlisle, Universidade do Texas, Princeton. Sou aceito
sem questionamento no círculo social que escolhi – uma sociedade de homens e
mulheres de pura descendência anglo-saxônica. Meus associados mal pensam em mim
como um índio. Aparentemente, eu me tornei um homem branco e, no entanto...
Uma herança
permanece. Uma lembrança. Não há nada vago ou ilusório nela. Assim como me
lembro do meu passado como John Garfield, também me lembro de dias mais
distantes, a vida e os atos de Coração de Ferro. Enquanto me sento aqui e olho
para o novo ermo de aço, concreto e rodas, tudo parece subitamente tão tênue e
irreal quanto a neblina que sobe das margens do Rio Vermelho, de manhã cedo.
Vejo através dela e além, de volta às pardacentas e marrons Montanhas Wichita,
onde nasci; vejo o capim seco ondulando sob o vento do sudoeste, e o alto cavalo
branco de Quanah Parker avultando contra o céu azul como o aço. Vejo a cabana
onde nasci, e os cavalos magros e vacas raquíticas pastando no capim ressecado
pelo sol, as filas secas e dispersas de cereal no pequeno campo próximo – mas
vejo além daquilo também. Vejo uma extensão de pradaria, marrom, seca e com uma
vastidão de tirar o fôlego, onde não há alto cavalo branco, ou cabana, ou campo
de cereal – apenas a grama marrom e ondulante, e tipis (*) de pele de búfalo; e um bronzeado guerreiro
nu, com plumas se arrastando como o rastro de um meteoro brilhante, cavalgando
como o vento na louca alegria da exultação selvagem.
Nasci na
cabana de um branco. Nunca usei pintura de guerra, nem segui a trilha da
guerra, nem dancei a dança do escalpo. Não sou capaz de empunhar uma lança ou
atirar uma flecha num enorme búfalo rosnante. Qualquer jovem fazendeiro de
Oklahoma consegue me superar em equitação. Sou, em suma, um homem civilizado, e
mesmo assim...
No início de
minha juventude, percebi uma inquietude que me atormentava, um desconforto e
uma súbita insatisfação com minha existência. Eu lia os livros, estudava, e me
aplicava nas coisas que os homens brancos estimam, com um zelo que gratificava
meus professores brancos. Eles me apontavam com orgulho. Eles me diziam – e achavam
que estavam me elogiando – que eu era um homem branco, tanto no pensamento
quanto nos hábitos.
Mas a
inquietude aumentava, embora ninguém suspeitasse disso, pois eu escondia isso
por trás da máscara do rosto de um índio, como meus ancestrais, amarrados a uma
estaca apache, escondiam sua agonia do olhar de seus inimigos exultantes.
Mas ela estava
lá. Escondia-se no fundo de minha mente na sala de aula, quando eu escutava,
ocultando meu desprezo inato pelo aprendizado que eu procurava a fim de
desenvolver minha riqueza material. Ela coloria meus sonhos. E esses sonhos,
obscuros na minha infância, ficaram mais vividos e distintos à medida que eu
ficava mais velho – sempre um bronzeado guerreiro nu, destacado contra um fundo
de tempestade, nuvem, fogo e trovão, cavalgando como um centauro, com seu
chapéu de guerra ondulando ao vento, e a luz lívida brilhando na ponta de uma
lança erguida.
Os instintos e
superstições raciais começaram a se agitar em mim, diante desta visita
repetida. Meus sonhos começaram a colorir minha vida que despertava, pois os
sonhos sempre tinham uma grande importância na vida dos índios. Minha mente
começou a se avermelhar. Comecei a perder o entendimento da existência de homem
branco que eu escolhera para mim mesmo. A sombra de um gotejante machado de
guerra indígena norte-americano começou a tomar forma, até pairar sobre mim.
Havia uma necessidade em minha mente; um impulso desenfreado e indomável para
ação violenta; uma inquietude que, eu comecei a temer, somente o sangue poderia
saciar. Eu me agitava sobre minha cama à noite, com medo de dormir, temendo ser
engolfado por esta onda inexorável dos negros reservatórios insondáveis da
subconsciência racial. Se isto acontecesse, eu sabia que eu mataria súbita e
selvagemente, e, de acordo com o entendimento do homem branco, insensatamente.
Não desejava
matar homens que nunca me fizeram mal, e ser enforcado depois. Embora eu
desprezasse – e ainda despreze – a filosofia e leis do homem branco, achava – e
acho – desejáveis as coisas materiais de sua civilização, uma vez que a vida de
meus ancestrais me é negada.
Tentei
descarregar esta ânsia primitiva e assassina nos esportes. Mas achei que futebol
americano, boxe e luta greco-romana só faziam aumentar o sentimento. Quanto
mais ferozmente eu lançava meu corpo de músculos sólidos em combate, menos
satisfação obtinha deste conflito artificial e mais eu ansiava por algo que eu
não sabia o que era.
Por fim,
procurei ajuda. Não fui a um médico ou psicólogo branco. Voltei à região onde
nasci, e busquei o velho Pena de Águia, um homem da medicina que morava sozinho
entre as colinas, e que desprezava amargamente as maneiras do homem branco. Em
minhas roupas de homem branco, sentei-me de pernas cruzadas em seu tipi de velhas peles de búfalo e,
enquanto conversava, eu mergulhava minha mão na panela de carne cozida de boi,
a qual ficava entre nós dois. Ele era velho – não sei qual a idade que tinha.
Seus mocassins eram desfiados e desgastados; sua manta, pardacenta e remendada.
Ele participara do grupo ao qual o General MacKenzie capturara em Palo Duro e,
quando o general baleou todos os cavalos deles, ele arruinara o velho Pena de
Águia, pois a riqueza do homem da medicina estava na carne do cavalo, como a de
todos da tribo.
Ele me ouviu
do começo ao fim, sem dizer uma palavra, e depois ficou um longo tempo sentado
e imóvel, a cabeça curvada sobre o peito, seu queixo enrugado quase tocando seu
bracelete pawnee (**) de
dentes. No silêncio, ouvi o vento noturno suspirar através dos pinheiros, e uma
coruja piava fantasmagoricamente nas profundezas da floresta. Finalmente, ele
levantou a cabeça e falou:
- Há uma
memória medicinal que lhe incomoda. Este guerreiro que você vê é o homem que
você outrora foi. Ele não vem para lhe incitar a enfiar um machado nas cabeças
dos homens brancos. Ele vem em resposta a uma ferocidade em sua própria alma.
Você vem de uma longa linhagem de guerreiros. Seu avô cavalgou com Lone Wolf, e
com Peta Nocona. Ele levou muitos escalpos. Os livros dos homens brancos não
conseguem lhe satisfazer. Se você não achar uma saída, sua mente ficará
vermelha e os espíritos de seus ancestrais cantarão em seus ouvidos. Então,
você matará, como um homem num sonho, sem saber o motivo, e os homens brancos
lhe enforcarão. Não é bom para um comanche ser sufocado num laço até a morte. Ele
não pode cantar sua canção de morte, sua alma não pode deixar seu corpo e
viverá para sempre sob o chão com seus ossos apodrecendo.
“Você não pode
ser um guerreiro. Esta época é passada. Mas há um meio de escapar dos maus
trabalhos de sua medicina. Se você pudesse se lembrar – um comanche, quando
morre, vai, por um tempo, para o Terreno da Caçada Feliz, para descansar e
caçar o búfalo branco. Então, cem anos depois, ele renasce numa tribo – a menos
que seu espírito seja destruído pela perda de seu escalpo. Ele não se lembra –
ou, se lembra, apenas um pouco, como figuras se movendo numa névoa. Mas há uma
medicina para fazê-lo lembrar – uma medicina poderosa e terrível, à qual nenhum
homem fraco sobrevive. Eu me lembro. Eu me lembro dos homens cujos corpos minha
alma habitou em eras passadas. Posso perambular na névoa e conversar com
grandes pessoas, cujos espíritos ainda não renasceram – com Quanah Parker e com
Peta Nocona, o pai dele, e com Camisa de Ferro, pai dele; com Satanta, o kiowa;
Touro Sentado, o ogalalla, e muitos outros grandes.
“Se você for
um bravo, poderá se lembrar, viver suas antigas vidas e ficar contente,
conhecendo seu valor e bravura no passado”.
Ele estava me
oferecendo uma solução – uma substituição para uma vida violenta em minha
existência atual –, uma válvula segura de escape para a ferocidade inata que
espreita no fundo de minha alma.
Devo lhe
contar sobre o ritual medicinal, através do qual ganhei lembrança total dos
meus passados? Sozinho nas colinas, tendo apenas o velho Pena de Águia como
testemunha, lutei meu combate solitário contra uma grande agonia, com a qual os
homens brancos só sonham em pesadelos. É uma medicina muito, muito antiga; uma
medicina secreta, inimaginada até mesmo pelos oniscientes antropólogos. Ela
sempre foi comanche; dela, os sioux tomaram emprestados os rituais de sua Dança
do Sol; e, dos sioux, os arikaras se apossaram de parte dela para sua Dança da
Chuva. Mas sempre foi um rito secreto, com apenas um homem da medicina para
assistir – sem dança, nem multidões animadas de mulheres e bravos para inspirar
um homem, para solidificar sua resolução ouvindo suas canções de guerra e
bravatas... somente a total força silenciosa de sua resistência, lá na
escuridão ventosa sob as antigas estrelas.
Pena de Águia
fez cortes profundos nos músculos de minhas costas. As cicatrizes estão lá até
hoje; um homem é capaz de pôr seus punhos fechados nos buracos. Ele cortou
profundamente os músculos e, passando tiras de couro cru pelos talhos,
amarrou-as. Então, lançou as tiras sobre um galho grosso de carvalho e, com uma
força que apenas um homem da medicina poderia explicar, ele me puxou para o
alto até meus pés ficarem pendurados bem acima do solo gramado. Amarrou as
tiras e me deixou pendurado lá. Ele se agachou diante de mim e começou a bater
um tambor, cujo alto era a pele de um chefe lipan. Ele o batia devagar e
incessantemente, de modo que seu suave ribombar sinistro tocava um meio-tom
incessante através da minha agonia, misturando-se com o vento noturno nas árvores.
A noite se
arrastou, as estrelas mudaram, o vento morreu, voltou e morreu novamente. O
tambor soou monotonamente sem parar, até o som ser mudado de vez em quando, e
não era mais um tambor, e sim o trovejar de cascos descalços de cavalos tocando
o tambor das campinas. O pio da coruja não era mais um pio, mas o grito de
morte de guerreiros esquecidos. E a chama da agonia diante de meus olhos
enevoados era um fogo que urrava, e ao redor do qual figuras negras saltavam e
cantavam. Eu não mais balançava em tiras sangrentas num galho de carvalho, mas
estava de pé contra uma estaca, com chamas envolvendo meus pés, e cantava minha
canção de morte em desafio aos meus inimigos. Passado e presente se fundiam e
combinavam fantástica e terrivelmente, e mil personalidades lutavam dentro de
mim, até não existir tempo, nem espaço, nem vulto nem forma – apenas um caos
que se torcia, enrolava e rodopiava de homens, coisas, acontecimentos e
espíritos, até tudo ser destruído triunfantemente em nada por um cavaleiro
bronzeado, pintado e exultante sobre um cavalo pintado, cujos cascos arrancavam
faíscas das campinas. Eles percorriam uma cortina acobreada de pôr-do-sol, numa
exultação bárbara, cavalo e cavaleiro, negros contra o brilho, e, com sua passagem,
meu cérebro atormentado cedeu e não tive mais consciência de nada.
Na aurora
cinza, enquanto eu pendia flácido e inconsciente, Pena de Águia amarrou
fileiras de crânios de búfalo aos meus pés, e seu peso rasgou carne e tendões,
de modo que caí até a grama do antigo carvalho. A dor daquele ferimento recente
me reviveu, mas a agonia sem nome de carne retalhada e rasgada não era nada
diante da grande percepção de poder que caiu sobre mim. Naquela hora escura
antes do amanhecer, quando o tambor fundiu passado e presente, e a consciência
natural que sempre luta com os sentidos mais obscuros havia sucumbido, o
conhecimento que eu procurava se fizera meu. A dor foi necessária – grande dor,
para conquistar a parte consciente do espírito que governa o corpo material.
Aquilo fora um despertar e uma junção de sentidos e sensibilidades, e a memória
permaneceu. Chame isso de psicologia, magia ou o que quiser. Não serei mais
atormentado pela falta de algo, nem pelo impulso de violência, que era apenas
um instinto arraigado, criado por mil anos de perambulação, caça e luta. Em
minhas lembranças, pude encontrar alívio ao reviver os dias selvagens dos meus
passados. Então...
Eu me lembro
de muitas vidas passadas, vidas que se estendem cada vez mais para trás, até uma
antiguidade que espantaria os historiadores. Isto eu verifiquei: cem anos não separavam
as vidas de um comanche. Às vezes, o renascimento era quase instantâneo... às
vezes, havia uma extensão de anos entre as vidas, por qual razão incompreensível,
eu não sei.
Sei que o ego
que agora habita o corpo de um cidadão americano, agora chamado John Garfield,
animou muitas figuras selvagens e pintadas no passado – e um passado não muito
distante, também. Por exemplo, em minha última aparição como um guerreiro no cenário
do grande Sudoeste, eu me chamava Esatema, que cavalgou com Quanah Parker e
Satanta, o kiowa, e foi morto na batalha de Adobe Walls, no verão de 1874. Houve
um interlúdio entre Esatema e John Garfield, na forma de uma criança fraca e
deformada, que nasceu durante a fuga da tribo desde a reserva em 1878 e, sendo
inapta, foi deixada para morrer em algum lugar de Llano Estacado. Fui... mas
por que procurar enumerar todas as vidas e corpos que foram meus no passado? É
uma cadeia infinita de figuras pintadas, emplumadas e nuas, se estendendo para
trás e para trás, até um passado imemorial – um passado tão distante e impensável,
que eu mesmo hesito diante de sua entrada.
Certamente,
meu leitor branco, não tentarei lhe sobrecarregar comigo. Pois minha raça é uma
raça muito antiga; ela era antiga, quando morávamos nas montanhas ao norte de
Yellowstone e viajávamos a pé, com nossos pertences escassos nas costas de
cães. As pesquisas dos brancos param aqui, e é bom, para sua paz de espírito e
suas teorias belamente ordenadas do passado da humanidade, que parem; mas posso
lhe contar coisas que lhe tiraria da tolerância divertida, com a qual você está
lendo esta narrativa de uma raça à qual seus ancestrais subjugaram. Eu poderia
lhe contar sobre longas perambulações sobre um continente ainda cheio de
terrores pré-humanos – mas chega.
Falarei-lhe de
Coração de Ferro, o Tirador de Escalpos. De todos os corpos que foram meus, o
de Coração de Ferro parece, de alguma forma, mais estreitamente ligado com o de
John Garfield, do século 20. Era Coração de Ferro a quem eu via em meus sonhos;
eram as lembranças de Coração de Ferro, obscuras e não-interpretadas, que assombravam
minha infância e adolescência. Embora eu lhe fale de Coração de Ferro, devo
falar como, e através dos lábios, de John Garfield; do contrário, a história
seria um delírio incoerente e sem sentido para você. Eu, John Garfield, sou um
homem de dois mundos, com uma mente que não é totalmente vermelha nem
totalmente branca, mas com uma compreensão confusa de cada uma. Deixe-me
interpretar para você a história de Coração de Ferro – não como o próprio
Coração de Ferro lhe contaria, mas como John Garfield contará, para que você
entenda.
Lembre-se, há
muita coisa que não contarei. Há crueldades e selvagerias que eu, John
Garfield, entendo como produtos naturais da vida que Coração de Ferro viveu,
mas que você não entenderia, não conseguiria entender e das quais você ficaria
horrorizado. Há outras coisas que passarei por alto na narrativa. O barbarismo
tem seus defeitos e sofismas, não menos que a civilização. Seus sarcasmos e
sofisticações são fracos e infantis ao lado da misantropia elementar, a
sofisticação vital que vocês chamam de selvageria. Se nossas virtudes eram
puras como um filhote recém-nascido de pantera, nossos pecados eram mais
antigos que Nínive. Se... mas basta. Eu lhe falarei de Coração de Ferro e do
Horror que ele enfrentou; um horror saído de um Tempo mais antigo que as ruínas
esquecidas que jazem ocultas nas selvas de Iucatán.
Coração de
Ferro viveu na parte final do século XVI. Os eventos que descreverei devem ter
se passado em algum lugar por volta de 1575. Já éramos uma tribo de montadores
de cavalos. Mais de um século antes, havíamos descido das Montanhas Shoshone
para nos tornarmos homens das planícies e caçadores de búfalos, seguindo os
rebanhos a pé, do Grande Lago do Escravo até o Golfo, lutando eternamente
contra os crows, os kiowas, os pawnees e os apaches. Foi uma viagem longa e
cansativa. Mas a chegada do cavalo mudou tudo aquilo – nos mudou, num curto
espaço de tempo, de uma pobre raça de aventureiros ineptos, para uma nação de
guerreiros invencíveis, percorrendo uma trilha vermelha de conquista desde as
aldeias de Blackfoot, em Bighorn, até os assentamentos espanhóis de Chihuahua.
Os historiadores
dizem que os comanches começaram a montar em 1714. Nessa época, já andávamos a
cavalo havia mais de um século. Quando Coronado chegou, em 1541, procurando as
fabulosas Cidades de Cibolo, já éramos uma raça de cavaleiros. As crianças eram
ensinadas a montar antes de aprenderem a andar. Quando eu, Coração de Ferro,
tinha quatro anos de idade, já montava meu próprio pônei e vigiava um rebanho
de cavalos.
Coração de
Ferro era um homem poderoso, de estatura média, robusto e musculoso, como
muitos de sua raça. Vou lhe contar como adquiri o nome. Eu tinha um irmão um
pouco mais velho que eu, cujo nome era Faca Vermelha. Afeição entre irmãos não
é muito comum entre os índios, mas eu sentia por ele a intensa e ardente
admiração e respeito de um jovem por um irmão mais velho.
Era uma época
de migração racial. Ainda não havíamos nos assentado no grande Cânion de Palo
Duro como terra natal de nossa raça. Nossa extensão setentrional ainda ia para
o norte de Platte, embora estivéssemos invadindo as planícies de Llano Estacado,
ao sul, empurrando os apaches à nossa frente numa série de batalhas
remoinhantes. Cento e vinte e cinco anos
depois, quebramos o poder deles para sempre, numa batalha de sete dias no Rio
Wichita, e os lançamos, quebrados e derrotados, para oeste, para dentro das
montanhas do Novo México. Mas, na época de Coração de Ferro, eles ainda
reivindicavam as Planícies do Sul como seu domínio, e a maioria de nossas
guerras eram com os siouxes, e não com os apaches.
E foram os
siouxes que mataram Faca Vermelha.
Eles nos
pegaram perto da margem do Platte, a um quilômetro e meio de uma colina
íngreme, coroada por vegetação mirrada. Corremos para aquela colina, com um
pensamento entre nós. Pois esta não era uma incursão comum; era um ataque em
massa; 300 guerreiros cavalgavam lá – tetons, brules e yanktons. Eles
pretendiam cair sobre o acampamento comanche, ao sul. Se a tribo não fosse
avisada, seria pega e esmagada pelos siouxes. Alcancei a colina, mas o cavalo
de Faca Vermelha caiu com ele, e os siouxes o pegaram. Levaram-no à base da
colina, em cujo topo, escondido das flechas, eu já estava pronto para mandar um
sinal de fumaça. Os siouxes não tentaram galgar a colina sob a mira de minha
lança e flechas, onde só poderia passar um homem de cada vez. Mas eles me gritaram
que, se eu deixasse de mandar o sinal, dariam uma morte rápida a Faca Vermelha
e continuariam sua cavalgada sem me fazerem mal.
Faca Vermelha
gritou para mim:
- Acenda a
fogueira! Avise nosso povo! Morte aos siouxes!
E assim, eles
se puseram a torturá-lo – mas não dei atenção, apesar da pradaria nadar num mar
vermelho ao meu redor. Eles a despedaçaram lentamente, membro a membro,
enquanto ele ria deles e cantava sua canção de morte até seu próprio sangue
sufocá-lo. Viveu muito mais do que seria possível um homem viver, cortado como
ele foi. Mas não dei atenção, e a fumaça rolando até o céu avisou nossa gente
distante.
Então, os
siouxes viram que haviam perdido, montaram e cavalgaram dali, antes mesmo que a
primeira nuvem de poeira ao sul indicasse a chegada de meus irmãos guerreiros. Com a vida de meu irmão, comprei a vida da
tribo, e depois disso ganhei um novo nome, e foi Coração de Ferro. E o sentido
de minha vida, depois disso, foi pagar aos siouxes o débito que eu tinha com
eles, e repetidas vezes eu o paguei, com flechas assobiantes, enfiando lanças;
sim, e com fogo e pequenas facas retalhadoras – eu era Coração de Ferro, o
Tirador de Escalpos, o Vingador, o Cavaleiro do Trovão. Pois, quando o rolar do
trovão ecoava pelas campinas, fazendo os chefes mais valentes esconderem as
cabeças, eu estava acostumado a galopar a cavalo, balançando minha lança e
cantando meus feitos, sem me importar com deuses nem homens. Pois o medo morrera
no meu coração, lá na pequena colina onde eu vira meu irmão morrer sob as facas
dos tetons, e apenas por uma vez em toda a minha vida, ele acordou por um
tempo. E é sobre esse despertar que eu lhe contarei.
No outono
daquele ano de 1575 – como eu o calculo agora –, 40 de nós cavalgavam para o
sul, para atacar os assentamentos espanhóis. Era setembro, mais tarde chamado
de Lua Mexicana, quando os guerreiros cavalgaram para o sul, em busca de
cavalos, escalpos e mulheres. Sim, era uma trilha antiga na época de Esatema, e
muitas vezes eu a percorri a cavalo, em um corpo ou outro, mas, nos dias de
Coração de Ferro, ela tinha menos de 40 anos.
Íamos atrás de
cavalos, mas esta incursão em particular nunca alcançou o Rio Grande. Viramos
para o lado, a fim de atacar os lipans no rio agora chamado de San Saba, e o
sol estava nascendo. Mas éramos guerreiros jovens, ansiosos para golpearmos
nossos antigos inimigos, e ainda não havíamos aprendido que cavalos eram mais
importantes que mulheres, e mulheres mais importantes que escalpos. Pegamos os
lipans de surpresa e fizemos uma magnífica matança entre eles, mas não sabíamos
que havia sido feita trégua entre eles e os canibais tonkewas – inimigos sempre
implacáveis para os comanches, até resolvermos aquela rixa de uma vez por todas
no inverno de 1864, quando os derrotamos em sua reserva no Rio Clear Fork do
Brazos. Esatema estava naquela luta, e ele – eu! – mergulhou suas mãos em
sangue, com um entusiasmo que tinha suas raízes num passado obscuro e
esquecido.
Mas aquele
outono de 1575 estava muito distante da matança no Brazos. Seguindo os lipans
derrotados que fugiam, corremos bem para dentro de uma horda de tonkewas e seus
aliados wichitas.
Com os lipans,
havia quase cinco mil guerreiros nos enfrentando – grande inferioridade
numérica, até mesmo para comanches. Além disso, estávamos lutando numa região
comparativamente arborizada, e lá estávamos em desvantagem, por sermos nascidos
e criados nas planícies, e preferíamos lutar em locais abertos, onde havia
espaço para nossas primitivas manobras de cavalos.
Quando nos
livramos do matagal e fugimos para o norte, só havia sobrado 15 de nós na fuga,
e os tonkewas nos acossaram por uns 150 quilômetros, mesmo depois que os lipans
desistiram da perseguição. Como eles nos odiavam! Cada um deles estava ansioso
para encher a barriga com a carne de um comanche, devidamente assada, pois
acreditavam que transferiam o espírito guerreiro de um comanche para quem o
devorasse; acreditávamos nisso também, e esta é a razão pela qual, além de
nossa aversão natural a canibalismo, odiávamos os tonkewas tão rancorosamente
quanto eles a nós.
Foi perto do
Rio Double Mountain Fork Brazos, que encontramos os apaches. Havíamos
atacado-os em nossa estrada sul e os mandado uivando para lamber suas feridas
no chaparral, e eles estavam loucos por vingança. Eles a tiveram. Foi uma luta
rápida em cavalos cansados e, dos 40 bravos que cavalgaram tão orgulhosamente
para o sul, somente cinco de nós viveram para cruzar o Caprok – aquela áspera
trincheira irregular que se assemelha a um degrau gigante de um lado a outro
das planícies, galgando para um nível mais alto.
Eu poderia lhe
dizer como os índios das planícies lutavam. Nenhuma luta como aquela fora vista
neste planeta antes, e nunca será novamente, pois as condições que a produziram
cessaram para sempre. Do Rio Milk ao Golfo, lutávamos igual – a cavalo,
girando, disparando como vespões com ferrões mortais, lançando chuvas de
flechas de corniso com pontas de sílex, atacando, cercando, recuando, ilusórios
como vespas e perigosos como najas. Mas, neste encontro sob o Caprock, não
houve luta neste sentido. Éramos 15 comanches contra 100 apaches, e fugimos,
virando para lançar flechas ou enfiar lanças somente quando não podíamos mais
evitá-los. Era quase pôr-do-sol, quando eles diminuíram a pressão – do
contrário, a saga de Coração de Ferro teria terminado ali, e seu escalpo ido
para a fumaça de um tipi apache,
junto com os outros dez que os Tigres da Pradaria tiraram naquele dia.
Mas, de alguma
forma, quando a noite caiu, nós nos dispersamos, escapamos deles e nos juntamos
novamente sobre o Caprock – cansados, famintos, com aljavas vazias e montados
em cavalos exaustos. Às vezes, caminhávamos e os guiávamos, o que mostra o
estado em que estávamos, pois um comanche nunca andava, a não ser que a necessidade
fosse a mais desesperada. Mas seguimos cambaleando, sentindo que já estávamos
condenados, tateando nosso caminho para o norte, oscilando mais para oeste do
que qualquer um de nós já tinha ido antes, na esperança de evitarmos nossos
implacáveis inimigos. Estávamos no coração da região apache, e nenhum de nós
tinha a esperança de alcançar vivo nosso acampamento no Cimarron. Mas
prosseguíamos, avançando com dificuldade através de um ermo vasto e sem água,
onde não crescia sequer cacto, e no qual nem mesmo o casco descalço de um cavalo
deixava qualquer pegada no solo duro como ferro.
Deve ter sido
perto da aurora que cruzamos a Linha. Mais do que isso, não sei dizer. Não
havia uma linha de verdade lá, mas, com uma passada, todos nós sentimos – nós
soubemos – que havíamos entrado num país diferente. Houve uma espécie de choque
vago, sentido tanto pelos cavalos quanto pelos homens. Estávamos todos andando
e guiando nossos cavalos, quando caímos de joelhos, como se derrubados pelo
abalo de um terremoto. Os cavalos bufaram, empinaram, e teriam se libertado e
disparado, se não estivessem fracos demais.
Sem fazer
comentários – havíamos ido muito longe para nos importar com qualquer coisa –,
nós nos levantamos e prosseguimos, notando que nuvens aparentemente haviam se
formado no céu, pois as estrelas estavam indistintas e quase obscuras. Além
disso, o vento, que sopra quase incessantemente por aquele planalto, havia
parado subitamente, de modo que foi num estranho silêncio que cambaleamos através
da planície, sempre na direção norte, até a aurora chegar lenta, sombria e
obscuramente, e paramos e encaramos desvairadamente uns aos outros, como
fantasmas na manhã posterior à destruição do mundo.
Sabíamos estar
num país assombrado. De alguma forma, em algum momento na noite, havíamos
cruzado uma linha que separava esta região estranha, assombrada e esquecida do
resto do mundo natural. Como o restante da planície, estendia-se lúgubre, plana
e monótona de horizonte a horizonte. Mas uma obscuridade pairava sobre ela, uma
espécie de bruma escura, que era menos bruma do que uma diminuição da luz do
sol. Quando este se ergueu, estava pálido e aquoso, mais parecendo a lua que o
sol. De fato, havíamos entrado na Terra do Anoitecer, a terrível região ainda
sussurrada na mitologia cherokee, embora eu não saiba como eles chegaram a
tomar conhecimento dela.
Não
conseguíamos ver além de seus limites, mas conseguíamos enxergar, à nossa
frente, um agrupamento de tipis
cônicos na planície. Montamos nossos cavalos cansados e cavalgamos devagar em
direção a eles. Sabíamos instintivamente que não havia nada ali. Olhávamos para
um acampamento de mortos. Silenciamos nossos cavalos, sob o céu cor de chumbo,
com o ermo monótono e escurecido se estendendo para bem longe de nós. Era como
olhar através de um vidro esfumaçado. Longe, a oeste de nós, avultava uma massa
mais sólida de bruma, à qual nossa visão não conseguia penetrar.
Cotopah
estremeceu e desviou os olhos, cobrindo a boca com a mão:
- Não é um
local de medicina – ele disse. – Não é bom ficar aqui. – E ele fez um movimento
involuntário para pôr sobre as costas a manta perdida durante a longa fuga
diante dos tonkewas.
Mas eu era
Coração de Ferro, e o medo estava morto em mim. Conduzi meu cavalo aterrorizado
para o tipi mais próximo – e eram
todos de pele de búfalo branco –, e puxei a aba para um lado. Então, embora eu
não estivesse com medo, minha pele se arrepiou, pois vi o morador daquela
tenda.
Havia uma
lenda muito, muito antiga, a qual fora esquecida por mais de 100 anos. Durante
a vida de Coração de Ferro, já era obscura, vaga e distorcida. Mas ela contava
como há muito, muito tempo atrás, antes das tribos terem tomado forma como os homens
as conhecem agora, um povo estranho e terrível veio do Norte, o qual estava
então povoado por muitas tribos selvagens e temíveis. Eles foram para o sul,
matando e destruindo tudo em seu caminho, até desaparecerem nas grandes
planícies elevadas do sul. Os velhos diziam que eles caminhavam dentro de uma
névoa e desapareceram. E aquilo havia sido há muito, muitíssimo tempo atrás,
antes mesmo que os ancestrais dos comanches adentrassem o Vale de Yellowstone.
Mas aqui, diante de meus olhos, jazia um do Povo Terrível.
Era um
gigante, deitado sobre a pele de urso dentro do tipi; ereto, deveria medir mais de 2m10 de altura, e seus ombros poderosos
e membros enormes tinham grandes músculos. Seu rosto era o de um bruto: lábios
finos, mandíbula saliente e testa inclinada, com uma grenha emaranhada de
cabelo desgrenhado. Ao lado dele, havia um machado com uma lâmina de dois
gumes, a qual eu sabia ser de jade verde, encaixado na fenda de um tronco,
feito de uma estranha madeira dura, a qual outrora crescia no norte distante, e
era polida como mogno. Ao vê-lo, desejei possuí-lo, apesar dele ser pesado e
ter cabo muito longo para ser facilmente usado a cavalo.
Enfiei minha
lança na porta da pequena casa, e puxei a coisa para fora, rindo dos protestos
de meus companheiros.
- Não cometi
nenhum sacrilégio! – afirmei. – Aqui não é uma cabana da morte, onde guerreiros
colocaram o corpo de um grande chefe. Este homem morreu dormindo, como todos
eles. Por que ele jaz aqui há tantas eras, sem ser devorado por lobos nem
gaviões, e sem sua carne apodrecer, eu não sei; mas toda esta terra é uma terra
de medicina. Entretanto, pegarei este machado.
Foi justamente
quando eu estava prestes a desmontar e segurá-lo, tendo puxado-o para fora da
cabana, que um súbito grito nos fez girar – para encararmos doze pawnees
totalmente pintados para a guerra! E um deles era uma mulher! Ela montava seu
cavalo como um guerreiro, e brandia um machado-de-guerra com lâmina de sílex.
Mulheres
guerreiras eram raras entre as tribos das planícies, mas existiam de vez em
quando. Eu a reconheci instantaneamente: Conchita, a jovem guerreira dos
pawnees do sul. Ela era realmente um pássaro de guerra, liderando um bando de
guerreiros bem-selecionados em pilhagens arrojadas por todo o Sudoeste.
Até hoje, arde
vividamente em minha memória o quadro que ela apresentava, quando girei e a vi:
uma figura esguia, flexível e arrogante, vibrante de vida e ameaça, barbaricamente
magnífica sobre seu corcel empinado e com os ferozes rostos pintados de seus
guerreiros próximos a ela. Sua única roupa era uma curta saia com contas, que
lhe chegava um pouco acima da metade das coxas. Seu cinto também tinha contas e
segurava uma faca, numa bainha com contas. Seus pés esguios calçavam mocassins,
e seu cabelo negro, arrumado em duas grossas tranças lustrosas, lhe caía sobre
as costas flexíveis. Seus olhos escuros reluziam, e seus lábios vermelhos se
abriam num grito de zombaria enquanto ela brandia seu machado em nossa direção,
guiando seu corcel sem freio nem sela com uma equitação de tirar o fôlego em
sua graça negligente. E ela era uma espanhola de sangue puro, filha de um
capitão de Cortez, raptada da terra de Rio Grande pelos apaches quando bebê, e
deles raptada por sua vez pelos pawnees do sul para ser criada como uma índia.
Tudo isso eu
sei e soube no breve vislumbre quando girei, pois, com um grito estridente, ela
se lançou contra nós, e seus bravos avançaram atrás dela. Eu digo “lançou”,
pois esta é a palavra. Cavalo e cavaleira mais pareciam saltar sobre nós do que
galoparem, de tão rápido que ela atacou.
A luta foi
rápida. Como poderia ser diferente? Eram 12 homens, em cavalos relativamente
descansados. Éramos cinco comanches cansados, em corcéis exaustos. O chefe
alto, de rosto cicatrizado, veio correndo em minha direção. Eles não tinham nos
visto na bruma, nem nós a eles, até ficarmos quase próximos. Vendo nossas
aljavas vazias, eles vieram acabar conosco com suas lanças e porretes de
guerra. O chefe alto estocou em minha direção, e girei meu cavalo, o qual
respondeu à cutucada de meu joelho com suas últimas forças. Jamais um pawnee se
igualava a um comanche numa luta aberta; nem mesmo um pawnee do sul. A lança
passou assobiando perto do meu peito e, quando cavalo e cavaleiro passaram pulando
por mim, levados pela própria velocidade, enfiei minha própria lança nas costas
do pawnee, de modo que a ponta lhe saiu pelo peito.
Enquanto fazia
isso, percebi outro guerreiro se lançando sobre mim pela esquerda, e tentei
girar meu cavalo novamente enquanto soltava minha lança. Mas o cavalo estava
totalmente exausto. Ele rolou como uma canoa afundando na rápida corrente do Missouri,
e o porrete na mão do pawnee caiu com toda a força. Eu me lancei para o lado e
salvei meu crânio de ser esmagado como um ovo, mas o porrete atingiu meu ombro,
derrubando-me do cavalo. Como um gato, eu fiquei de pé, puxando minha faca, mas
logo o quarto dianteiro de um cavalo me atingiu e derrubou estatelado. Foi
Conchita quem me derrubou, e agora, enquanto eu, meio atordoado, me esforçava
para me erguer sobre os joelhos, ela saltou levemente para baixo e ergueu seu
machado de lâmina de sílex acima de minha cabeça.
Vi o leve
brilho do gume, percebido de uma forma tão obtusa e atordoada que não pude
evitar o giro descendente – e então, ela parou, com o machado erguido, olhando
fixamente de olhos arregalados para algo além de mim. Impelido contra minha
vontade, virei minha cabeça aturdida e olhei.
Os outros
comanches estavam mortos, e cinco dos pawnees. Todos os vivos ficaram
paralisados, exatamente como Conchita. Um, que se ajoelhava sobre as costas do
cadáver de Cotopah, puxando-lhe o escalpo e com a faca entre os dentes, ficou
agachado ali, como alguém subitamente petrificado, olhando na direção para a
qual todas as cabeças estavam viradas.
Pois a névoa a
oeste estava se erguendo, e pairaram à vista as paredes e tetos planos de uma
estranha estrutura. Era semelhante, e estranhamente diferente, dos pueblos dos índios criadores de milho no
oeste distante. Como eles, era feita de adobe, e a arquitetura era algo similar
e, mesmo assim, havia nela uma estranha diferença. E dela saiu uma fileira de
figuras estranhas – homens baixos e marrons, vestidos em roupas de plumas
pintadas com cores brilhantes; homens que se pareciam um pouco com os índios pueblos. Estavam desarmados e traziam
apenas cordas de couro cru e chicotes em suas mãos. Somente o da frente – um
índio mais alto e magro – trazia um estranho disco em forma de escudo, feito de
metal brilhante, na mão esquerda, e um malho de cobre na direita.
O curioso
desfile parou diante de nós, e arregalamos os olhos – a jovem guerreira, com
seu machado ainda suspenso; os pawnees, a pé ou a cavalo, feridos ou intactos,
e eu, agachado sobre um joelho e sacudindo minha cabeça que rapidamente
clareava. Então, Conchita, sentido súbito perigo, gritou uma ordem estridente e
desesperada, e saltou, erguendo seu machado – e, quando os guerreiros se
retesaram para o ataque, o homem com as plumas de abutre no cabelo bateu o
gongo com a marreta, e um terrível som estrondoso saltou em nossa direção, como
uma pantera invisível. Aquele som terrível e estrondoso era como o impacto de
um raio, uma coisa tão terrível que era quase tangível. Conchita e os pawnees
caíram, como se derrubados por um relâmpago; e os cavalos empinaram em agonia e
correram em disparada. Conchita rolava no chão, gritando de agonia e tapando os
ouvidos. Mas eu era Coração de Ferro, o comanche, e o medo dormia em meu
coração.
Saí do chão
num pulo, faca na mão, embora meu crânio parecesse explodir por causa daquela
medonha rajada de som. Saltei diretamente para a garganta de Peito de Abutre.
Mas minha adaga nunca entrou naquela pele marrom. Mais uma vez, o terrível gongo
retiniu e mais uma vez, atingindo-me no meio de um pulo como uma força
tangível, e me lançando para trás e para trás. E várias e repetidas vezes, a
marreta se espatifou contra o gongo, de modo que a terra e o céu pareciam
separados por sua reverberação ensurdecedora. Caí como um homem derrubado ao
chão por um porrete de guerra.
Quando pude
enxergar, ouvir e pensar novamente, percebi que minhas mãos estavam amarradas
atrás de mim e que havia uma correia de couro cru ao redor do meu pescoço. Fui posto
de pé, e nossos captores começaram a nos conduzir à força em direção à cidade.
Eu a chamo assim, embora ela se parecesse mais com um castelo. Conchita e seus
pawnees foram tratados da mesma maneira, exceto um que estava mal-amarrado.
Eles o haviam matado, cortando-lhe a garganta com a própria faca dele e
deixando-o jazendo entre os outros. Um deles pegou o machado que eu arrastara
do tipi, o olhou curiosamente e então
o lançou sobre o ombro. Ele deve ter usado ambas as mãos para fazê-lo.
Assim, avançamos
cambaleando em direção ao castelo, meio estrangulados pelas cordas em nossos
pescoços e ocasionalmente encorajados pela picada de um chicote de couro cru
sobre nossas espáduas. Somente Conchita não era tratada assim, embora seu
captor lhe puxasse brutalmente a corda quando ela andava devagar. Seus
guerreiros estavam desfigurados. Eles eram os mais belicosos da nação Pawnee –
uma ramificação que vivia nas cabeceiras do Cimarron, e que diferia, em muitas
formas e costumes, dos seus irmãos ao norte. Eram mais típicos de uma cultura
de planície do que seus parentes tribais, e nunca tiveram contato com os
invasores que falam Inglês, pois a varíola os exterminou por volta de 1641. Usavam
seus cabelos em longas tranças que se arrastavam pelo chão, como os Crows e
Minetarees, e enchiam suas tranças com ornamentos de prata.
O castelo – eu
o chamo na língua de John Garfield e em sua própria língua; Coração de Ferro
teria se referido a ele como choupana – ficava no alto de uma pequena elevação,
indigna de ser chamada de colina, a qual quebrava a monotonia da planície.
Havia um muro ao seu redor, e um portão no muro. Numa das plataformas planas do
teto, vimos uma figura alta de pé, envolta num manto brilhante de plumas, o
qual brilhava mesmo na luz baixa. Um braço erguido fez um gesto imperioso, e a
figura se moveu majestosamente através de uma portada e desapareceu.
Os pilares do
portão eram de bronze, esculpidos com a serpente emplumada, e, diante daquela
visão, os pawnees estremeceram e desviaram os olhos. Como todos os índios das
planícies, eles se lembravam daquela abominação desde dias antigos, quando os
grandes e terríveis reinos do Sul distante guerrearam com os do distante Norte.
Eles nos
levaram através de um pátio, subimos um pequeno lance de escadas de bronze e
entramos num corredor; e, uma vez lá dentro, a semelhança com os pueblos acabou. Mas sabíamos que outrora
casas como esta foram erguidas em cidades poderosas, nas distantes selvas
ocupadas por serpentes do Sul obscuro, pois, em nossas almas, agitavam-se os
ecos de lendas antigas.
Adentramos uma
grande sala circular, dentro da qual a luz fluía de um domo aberto. Um altar de
pedra negra se erguia no centro da sala, com canais manchados de escuro ao
longo das bordas. Encarando-o, sobre um estrado erguido, num trono de marfim abarrotado
de peles de lontra-marinha, reclinava-se a figura que havíamos visto no teto.
Era um homem
alto, magro e forte, com uma testa alta e um, rosto estreito, agudo e aquilino.
Não havia piedade naquele rosto – apenas uma arrogância cruel e um cinismo
zombeteiro. Era o rosto de um homem que se sentia acima das paixões humanas da
ira, piedade ou amor.
Com cruel
divertimento, ele passou seus olhos sobre nós, e os pawnees baixaram o olhar.
Até Conchita, após corajosamente enfrentar seu olhar por um momento, estremeceu
e baixou os olhos. Mas eu era Coração de Ferro, o Comanche, e o medo dormia em
mim. Encarei aquele olhar penetrante sem piscar meus olhos negros. Ele me olhou
demoradamente, e logo falou na linguagem dos índios pueblos, a qual, naquela época, era a língua comercial das
pradarias e entendida pela maioria dos índios que montavam cavalos.
- Você parece
uma fera selvagem. Há fogo de matança em seus olhos. Não está com medo?
- Coração de
Ferro é um comanche – respondi desdenhosamente. – Pergunte aos siouxes se há
algo que ele tema. O machado dele ainda está enfiado em suas cabeças. Pergunte
aos apaches, kiowas, cheyennes, lipans, crows e pawnees! Se ele fosse esfolado
vivo e sua pele fosse cortada em pedaços menores que a palma da mão de um homem,
e cada pedaço usado para cobrir um guerreiro morto que ele matou, os mortos
não-cobertos ainda estariam em maior número que os cobertos!
Mesmo em seu
medo, os olhos dos pawnees arderam sanguinariamente diante desta bravata. O
homem no trono riu sem alegria.
- Ele é
resistente, é forte e é encorajado por sua vaidade – ele disse ao homem magro
com o gongo. – Ele agüentará muito, Xototl. Ponha-o na última cela.
- E a mulher,
lorde Tezcatlipoca? – disse Xototl, curvando-se profundamente, e Conchita
estremeceu e encarou com os olhos arregalados a figura fantástica sobre o
trono. Ela conhecia as lendas astecas, e aquele nome era o de uma das
encarnações do sol; usado, sem dúvida, num espírito de blasfêmia pelo
governante daquele castelo maligno.
- Coloque-a na
Sala de Ouro – disse Tezcatlipoca, a quem chamavam de Senhor da Bruma.
Curiosamente, ele deu uma olhada no machado de jade que havia sido colocado
sobre o altar.
- Ora, é o
machado de Guar, o chefe dos Nortistas! – ele disse. – Ele jurou que o machado
que usava iria, algum dia, rachar meu crânio! Mas Guar e toda a sua tribo está
morta em suas tendas de pele de caribu há mais séculos do que eu mesmo gosto de
me lembrar, e meu crânio ainda contém a magia dos antigos! Deixem o machado ali
e levem-nos! Conversarei com a garota daqui a pouco, e logo haverá diversão,
como nos dias dos Reis Dourados!
Eles nos
levaram para fora da câmara circular e através de uma série de salas grandes,
onde mulheres marrons de pés felinos, beleza sinistra e vestidas apenas com
seus ornamentos de ouro, se juntavam para olharem os prisioneiros,
especialmente a jovem guerreira dos pawnees. E riam dela – uma risada doce,
suave e maligna, peçonhenta como mel envenenado.
Adentramos um
longo corredor, com portas pesadas se abrindo para ele, e, dentro de cada cela
pela qual passávamos, havia um guerreiro. Eu era o último e, quando fui arrastado
para dentro, vi o terror latejar nos lindos olhos de Conchita, enquanto ela era
levada. Dentro da cela, fui lançado rudemente ao chão, e minhas pernas estavam
amarradas com couro cru. Não me deram comida nem água.
Logo depois, a
porta se abriu e ergui o olhar para ver o Senhor da Bruma me olhando.
- Pobre
idiota! – ele murmurou. – Eu quase poderia ter pena de você! Besta sanguinária
das pradarias, com suas fanfarronices e bazófias, e sua história de escalpos e
matanças. Tolo! Logo você uivará por morte!
- Um comanche
não grita na estaca – respondi, com meus olhos ardendo vermelhos com o desejo
de matar. Meus músculos incharam e se emaranharam, até o couro cru cortar minha
pele. Mas as cordas resistiam. Ele riu e saiu silenciosamente da minha cela,
fechando a porta atrás de si. Lá fora, uma tranca bateu ruidosamente de volta
ao seu lugar.
O que
aconteceu depois, eu não vi nem soube, após um longo tempo. Mas Xototl levou
Conchita para o alto de um lance de escadas e para dentro de uma câmara onde as
paredes, teto e chão eram de ouro. As portas eram de ouro e havia barras de
ouro nas janelas. Havia uma cama de ouro, coberta com peles de lontra marinha.
Xototl a desamarrou e ficou encarando-a por um momento, com desejo ardente nos
olhos. Logo, sombrio e de má-vontade, ele deu a volta e trancou a porta atrás
dela, deixando-a só. Então, veio até ela o Senhor da Bruma – alto, caminhando a
passos largos como um deus, com seu estranho manto de penas com cores ricas ao
seu redor e, sobre sua cabeleira negra, uma faixa em forma de serpente dourada,
cuja cabeça se erguia acima da testa dele.
Ele contou a
ela que era um mago de um reino muito antigo, o qual estava em declínio antes
mesmo que os bárbaros toltecas se aventurassem nele. Por suas próprias razões,
ele havia ido para bem longe ao norte e fundado seu reino naquela planície quebrada,
lançando sobre ela uma bruma de encantamento. Havia encontrado uma tribo de
índios pueblos sitiada pelos
invasores do Norte, e eles apelaram por sua ajuda, colocando-se totalmente em
suas mãos. Ele havia feito magia e trazido morte para os nortistas. Mas os
deixou em suas tendas, e disse ao povo pueblo
que poderia trazê-los de volta à vida quando desejasse. Sob suas mãos cruéis,
aquele povo havia diminuído até agora não ser mais do que cem pessoas, vivendo
às suas ordens. Ele viera do sul, menos de mil anos antes. Não era imortal, mas
era quase.
Então, ele a
deixou; e, enquanto saía, a grande serpente que cumpria suas ordens deslizou
silenciosa e malevolamente pelos corredores atrás dele; esta serpente havia
devorado muitos dos súditos do Senhor da Bruma.
Enquanto isso,
eu estava deitado em minha cela e os ouvi arrastarem para fora um pawnee e
puxarem-no ao longo do corredor. Após um longo tempo, ouvi um medonho e quase
animal grito de agonia, e me perguntei qual tormento poderia arrancar um grito
da garganta de um pawnee do sul. Eu já os ouvira rir sob as facas dos esfoladores.
Então, pela primeira vez, o medo acordou em mim – não medo físico, mas o medo
no qual, sob aquele tormento desconhecido, eu poderia gritar e assim trazer
vergonha à nação comanche. Fiquei ali deitado, ouvindo o fim dos pawnees. Cada
guerreiro gritava, mas só o fazia uma vez.
Nesse meio
tempo, Xototl havia deslizado para dentro do quarto de Conchita, seus olhos
vermelhos de desejo.
- Você é macia
e bonita – ele murmurou. – Estou cansado destas mulheres.
Ele a agarrou
com os braços e a forçou para trás sobre a cama dourada. Ela não ofereceu
resistência. Mas subitamente, a adaga que estivera no cinto dele estava na mão
dela. Ela a enfiou nas costas dele, rápida e mortalmente. Antes que ele pudesse
emitir o grito que lhe fluía até os lábios, ela o sufocou em sua garganta e,
caindo com ele no chão, o esfaqueou outras vezes até ele jazer imóvel. Então,
levantando-se como um gato, ele atravessou correndo a porta, pegando um arco,
uma faca e um punhado de flechas enquanto seguia.
Num instante,
ela estava em minha cela, curvada sobre mim, seus olhos grandes ardendo.
- Rápido! –
ela sibilou. – Ele está matando o último dos guerreiros! Prove que você é um
homem!
A faca era
afiada, mas a lâmina era fina e as cordas de couro cru, grossas. Ela continuou
de forma persistente, finalmente serrando-a. Logo eu estava de pé, a faca em
meu cinto, arco e flechas na mão.
Saímos
furtivamente da cela e nos movemos cautelosamente corredor abaixo, para
ficarmos cara-a-cara com um guarda surpreso. Deixando minhas armas caírem, eu o
agarrei pelo pescoço antes que ele pudesse gritar e, levando-o ao chão, quebrei
seu pescoço com minhas mãos nuas, antes que ele pudesse soltar sua lança e usar
sua faca.
Levantando-nos,
nos esgueiramos corredor abaixo, em direção à sala circular do domo aberto.
Diante dela, encontrava-se a gigantesca serpente, que se enroscou ameaçadoramente
à nossa aproximação. Rápida e silenciosamente, eu me movi para a frente e
enfiei uma única flecha no olho do réptil, e avançamos cautelosamente, passando
por suas medonhas convulsões de morte.
Entramos
furtivamente na sala abobadada, e vimos o último pawnee morrer num estranho e
hediondo tormento. Quando o Senhor da Bruma se virou para nos olhar, lancei uma
flecha diretamente em seu peito. Ela resvalou sem feri-lo. Fiquei paralisado de
surpresa, quando uma segunda flecha se comportou de forma similar.
Lançando meu
arco para o lado, saltei em direção a ele com a faca na mão, e rolamos pela
câmara, procurando um aperto mortal. Ele estava só; seus dependentes haviam
sido despachados para outra parte do castelo, enquanto ele praticava seu mal.
Minha faca não
conseguia penetrar na estranha roupa justa que ele usava sob seu manto de penas
e, apesar de todos os meus esforços, não consegui lhe alcançar o pescoço ou
rosto. Finalmente, ele me lançou para o lado e se preparou para invocar sua magia,
quando Conchita o deteve com um grito:
- Os mortos se
levantam das tendas dos Nortistas. Eles marcham em direção ao pueblo!
- Mentira! –
ele gritou, ficando pálido. – Eles estão mortos! Não podem se levantar!
- No entanto,
eles vêm! – ela gritou, com uma risada selvagem.
Ele hesitou,
voltou-se em direção a uma janela e depois girou de volta ao perceber o truque.
Ali perto, jazia o machado de Guar O Nortista, uma poderosa arma de outra era. No
instante de sua hesitação, eu a agarrei e, girando-o para o alto, saltei para a
frente. Quando ele se voltou novamente para mim, o medo lhe surgiu
repentinamente nos olhos, enquanto o machado lhe partiu o crânio, derramando
seus miolos no chão.
O trovão
estrondeou e rolou, e bolas de fogo assolaram a planície; o pueblo estremeceu. Conchita e eu
corremos em busca de segurança, os gritos dos prisioneiros ecoando em nossos
ouvidos. E, quando a aurora se ergueu sobre as planícies, nenhuma névoa
apareceu. Havia apenas uma tênue vastidão banhada de sol, na qual alguns ossos
jaziam embolorados.
- Agora iremos
até meu povo – eu disse, pegando-lhe o pulso. – Há alguns cavalos que não
fugiram.
Mas ela tentou
se desvencilhar de mim, gritando desdenhosamente:
- Cão
comanche! Você só está vivo por causa de minha ajuda! Siga seu caminho! Você só
serve para ser escravo de um pawnee!
Não houve
hesitação. Eu a peguei pelas tranças lustrosas e lancei de bruços ao chão.
Colocando um pé sobre suas espáduas que se contorciam, surrei seus desnudos
quadris e coxas, sem fúria e sem pena, até ela gritar por piedade. Então, eu a
puxei de pé e ordenei que me seguisse para capturar os cavalos. Ela o fez
chorosamente, esfregando vários hematomas doloridos o tempo todo. Logo, estávamos
cavalgando para o norte, em direção ao acampamento no Canadian, e minha bela
mulher parecia contente, agora que ela estava no lombo de um cavalo. E percebi
que eu havia encontrado uma mulher digna até mesmo de Coração de Ferro, o
Cavaleiro do Trovão.
FIM
(*) – Tipis: Cabanas cônicas, onde viviam os índios dos EUA (Nota
do Tradutor);
(**) –
Pawnee: Tribo nativa norte-americana,
que vive atualmente no estado de Nebraska e no norte do estado de Kansas (N. do
T.).
Tradução: Fernando Neeser de Aragão.
Agradecimento especial: Ao howardmaníaco e amigo Karoly Mazak, da
Hungria.