A Ilha da Perdição Pirata

(por Robert E. Howard)


1) O Primeiro Dia

A longa e baixa embarcação que seguia, longe da praia, tinha um aspecto desagradável e, quando esta se aproximou do meu esconderijo, fiquei feliz em não tê-la chamado. A precaução me levou a me esconder e observar sua tripulação, antes de revelar minha presença, e agora eu agradecia ao meu espírito guardião; pois estes eram tempos agitados, e estranhas embarcações freqüentavam o Caribe.

É certo que o cenário era bastante tranqüilo e bonito. Eu me agachava entre verdes moitas perfumadas, no alto de uma elevação, a qual descia diante de mim até a praia larga. Árvores altas se erguiam ao meu redor, suas fileiras se afastando a ambos os lados. Lá embaixo, na praia, ondas verdes se espatifavam na areia branca; e, lá em cima, o céu azul se erguia como um sonho. Mas, como uma víbora num jardim verdejante, se encontrava aquela nau sombria e negra, ancorada bem do lado de fora da água rasa.

Ela tinha um aspecto desleixado, uma aparelhagem desalinhada e descuidada, a qual não indicava uma tripulação honesta ou um dono cuidadoso. Dali a pouco, vozes rudes circulavam por todo o espaço entre a água e a praia, e por um momento, vi um grande sujeito desajeitado, o qual andava negligentemente ao longo do parapeito, erguer algo até os lábios e logo lançá-lo ao mar.

Agora, a tripulação descia um longo bote, bastante cheio de homens; e, quando puseram as mãos sobre os remos e se afastaram da embarcação, seus gritos rudes, e as respostas dos que permaneceram no convés, chegaram até a mim, embora as palavras fossem vagas e indistintas.

Agachando-me ainda mais, eu ansiava por um telescópio, a fim de saber o nome do navio; e logo a lancha chegou perto da praia. Havia oito homens nela: sete sujeitos grandes e rudes, e o outro, um magro patife de roupas afetadas, que usava um chapéu de aba erguida e não remava. Agora que se aproximavam, percebi que havia uma discussão entre eles. Sete deles rugiram e berraram para o almofadinha, o qual, se respondeu de algum modo, falou num tom tão baixo que não consegui ouvir.

O bote deslizou velozmente através da leve rebentação e, enquanto ele embarcava, um enorme patife peludo na proa se ergueu e saltou em direção ao janota, o qual pulou para enfrentá-lo. Vi aço reluzir, e ouvi o homem maior berrar. Instantaneamente, o outro saltou agilmente para fora, salpicando água através da areia molhada e correndo terra adentro tão rapidamente quanto pôde, enquanto os outros velhacos se espalhavam em perseguição, gritando e brandindo armas. Aquele que havia começado a briga parou por um momento para acelerar a lancha, e depois se juntou à perseguição, praguejando no alto de sua voz bovina, o sangue lhe escorrendo do rosto.

O almofadinha, com seu chapéu de aba erguida, estava vários passos à frente, quando eles alcançaram a primeira orla de árvores. Abruptamente, ele desapareceu folhagem adentro, enquanto os outros corriam atrás dele; e, por um instante, pude ouvir os alarmes e bramidos da perseguição, até os sons sumirem à distância.

Agora eu olhava novamente para o navio. Suas velas estavam inchando, e pude ver homens no cordame. Enquanto eu observava, a âncora foi içada a bordo – e, de seu alto, se ergueu a Jolly Roger (*). De fato, não era mais do que eu havia esperado.

Cautelosamente, recuei de quatro por entre as moitas, e logo me ergui. Uma melancolia caiu sobre mim, pois quando as velas haviam aparecido à minha vista, eu procurei por um resgate. Mas, ao invés de se mostrar uma bênção, o navio havia expelido oito bandidos na ilha, para que eu os enfrentasse.

Perplexo, peguei um caminho entre as árvores. Sem dúvida, aqueles bucaneiros haviam sido abandonados em costas desertas por seus companheiros – uma coisa comum entre os sangrentos Irmãos do Alto-Mar.

Eu nem sabia o que fazer, pois estava desarmado, e estes patifes certamente iriam me considerar um inimigo, como eu na verdade era para todos da laia deles. Deu-me náuseas a idéia de correr e me esconder deles, mas eu não via mais nada a ser feito. Não; seria uma rara felicidade, se eu fosse capaz de escapar de todos eles.

Meditando assim, percorri uma distância considerável terra adentro, embora nada ouvisse dos piratas quando alcancei uma pequena clareira. Árvores altas, coroadas com lustrosas videiras verdes e enfeitadas com pequenos pássaros de cores exóticas a voarem por entre os galhos, se erguiam ao meu redor. O almíscar de vegetações tropicais enchia o ar, assim como o fedor de sangue. Um homem jazia morto na clareira.

Estava estirado sobre as costas, sua camisa de marujo encharcada com o sangue que lhe vazava do coração. Era um dos Irmãos da Causa Vermelha, sem dúvida. Ele jamais usava sapatos, mas um grande rubi brilhava em seu dedo, e uma suntuosa faixa de seda envolvia a cintura de suas calças manchadas de alcatrão. Através desta faixa, estava enfiado um par de pistolas de pederneira, e um sabre de abordagem se encontrava próximo à sua mão.

Aqui havia armas, pelo menos. Assim, puxei as pistolas de seu cinto, notando que elas estavam carregadas, e, tendo enfiado-as em minha faixa na cintura, peguei o sabre também. Ele não precisaria novamente de armas, e tive o bom pensamento de que eu logo poderia precisar.

Então, quando eu me voltei para roubar o morto, uma suave risada zombeteira me fez girar instantaneamente. O janota da lancha estava diante de mim. Claro, era menor do que eu havia pensado, embora fosse flexível e esbelto. Ele usava botas de fino couro espanhol nas pernas adornadas, e acima delas, calças justas de pele de corça. Um fino cinto escarlate, com enfeites e brincos nas extremidades, estava amarrado à sua cintura delgada, e daquele cinto se sobressaíam as coronhas douradas de duas pistolas. Um casaco azul, com extremidades brilhantes, estava aberto para mostrar a camisa ornamentada de babados e rendas, sob ele. Novamente, percebi que o chapéu de aba erguida ainda estava sobre a testa do dono, num ângulo desembaraçado, mostrando um cabelo dourado por baixo dele.

- Trono de Satã! – disse quem usava estes adereços – Há um grande rubi, do qual você esqueceu!

Agora, eu olhava pela primeira vez para seu rosto. Era um oval delicado, com lábios vermelhos que sorriam zombeteiros e grandes olhos cinzas que dançavam; e só então, eu percebi que estava olhando para uma mulher, e não para um homem. Uma de suas mãos descansava maliciosamente no quadril, e a outra segurava uma longa espada reta, de dois gumes e com cabo enfeitado – e, com um crispar de repulsa, vi um rastro de sangue na lâmina.

- Fale, homem! – ela gritou impacientemente – Não tem vergonha de ser pego em seu trabalho?

Agora, eu duvidava que meu aspecto inspirasse respeito, com meus pés descalços e minha única roupa – calças de marinheiro –, a qual estava manchada e descolorida com água salgada. Mas, diante de seu tom debochado, minha raiva foi atiçada.

- Pelo menos – eu disse, encontrando minha voz –, se devo responder por roubar um cadáver, mais alguém deve responder por fazer o que você fez.

- Há, lhe arranquei uma faísca, então? – ela riu violentamente – Pelos Demônios de Satã, se eu tiver que responder por todos os cadáveres que fiz, será uma contagem cansativa.

Fiquei enojado com aquilo.

- Vivendo e aprendendo. – eu disse – Nunca imaginei encontrar uma mulher que se alegrasse em assassinar a sangue-frio.

- A sangue-frio, você diz! – Ela se exaltou naquele momento – Deveria eu ficar parada e ser abatida como se fosse um carneiro?

- Se você escolhesse a vida apropriada para uma mulher, não teria necessidade de matar nem de ser morta. – eu disse, arrebatado por minha súbita repulsa. E logo me arrependi do que eu disse, pois estava começando a vir ao meu pensamento quem poderia ser aquela jovem.

- Então, então, moralista – ela escarneceu, com os olhos começando a cintilar perigosamente –, então você acha que sou uma patife! E o que você deve ser, eu perguntaria; o que faz nesta ilha perdida e por que saiu furtivamente da selva para pegar os pertences de um morto?

- Meu nome é Stephen Harmer, imediato do Condessa Azul, navio mercante da Virgínia. Sete dias atrás, o navio pegou fogo até a linha de água, a partir do porão, e toda a tripulação morreu, exceto eu. Boiei num quartel de escotilha, e finalmente alcancei esta ilha, onde estou desde então.
A garota me olhava, meio pensativa, meio zombeteira, enquanto eu contava minha história, como que na expectativa de que eu mentisse.

- Quanto a pegar armas – acrescentei –, é uma bebida amarga aguardar sem armas por aqueles canalhas.

- Nem me fale deles. – ela respondeu abruptamente; e logo, mais abruptamente ainda: – Você sabe quem eu sou?

- Só poderia haver um nome que você usaria... um que combina com sua maneira peralta e de sangue frio.

- E é...

- Helen Tavrel.

- Faço uma reverência à sua intuição – ela disse, sardonicamente –, pois não me lembro de sequer termos nos encontrado.

- Nenhum homem consegue navegar pelos Sete Mares, sem ouvir o nome de Helen Tavrel e, até onde sei, ela é a única mulher pirata que agora navega pelo Caribe.

- Então, você ouviu a conversa dos marujos? E o que eles dizem de mim?

- Que você é a criatura mais audaz e sem piedade que já caminhou num tombadilho, e que trocou saia por calças. – respondi com franqueza.

Os olhos dela brilharam perigosamente, e ela abriu um corte perverso numa flor, com a ponta da espada.

- E isso é tudo o que eles dizem?

- Dizem que, embora você siga um caminho indigno e sangrento, nenhum homem pode dizer sinceramente que chegou a lhe beijar os lábios.

Isto parecia agradá-la, pois ela sorriu.

- E você acredita nisso, sir?

- Sim – respondi calmamente –, embora eu asse em Hades, se já vi um par de lábios mais dignos de ser beijado.

Para falar a verdade, a beleza rara da jovem estava subindo à minha cabeça, e eu há meses não olhava para uma mulher. Meu coração se enterneceu para ela, e logo a visão do homem morto aos meus pés me desembriagou. Mas, antes que eu pudesse dizer mais, ela virou a cabeça para o lado, como que em escuta.

- Venha! – ela exclamou – Acho que estou ouvindo Gower e seus idiotas retornando! Se houver um lugar nesta ilha maldita, onde alguém possa se esconder por um tempo, leve-me para lá, pois eles nos matarão se nos encontrarem!

Eu certamente não a deixaria para ser trucidada, e assim eu gesticulei para que ela me seguisse, e fugimos através de árvores e arbustos. Dirigi-me à extremidade sul da ilha, indo rápida, mas cautelosamente; e a garota me seguindo tão ligeiramente quanto um bravo índio. As borboletas de cores brilhantes voavam ao nosso redor; e, no alto dos galhos entrelaçados, cantavam pássaros de plumagem vívida. Mas havia uma tensão no ar, como se, com a chegada dos piratas, uma névoa de morte pairasse sobre toda a ilha.

A vegetação rasteira se escasseava, à medida que avançávamos pela terra inclinada para o alto, finalmente indo parar num grupo de ravinas e penhascos. Avançamos por entre estes, e fiquei bastante maravilhado com a vivacidade da garota, que pulava e escalava com a facilidade de um gato, e até superava a mim, que passei boa parte de minha vida equipando navios.

Finalmente nós chegamos a um penhasco baixo, que ficava de frente para o sul. Aos pés dele, corria um pequeno regato de água límpida, margeado por areia branca e sombreado por ondulantes folhas de palmeiras e vegetação alta, a qual crescia até o limite da areia. Mais além, através desta estreita extensão exuberante, se erguiam outros penhascos, mais altos, fazendo frente para o norte e completando um desfiladeiro natural.

- Temos que descer aqui. – eu disse, indicando o penhasco no qual estávamos – Deixe-me ajudá-la...

Mas ela, gesticulando desdenhosamente a cabeça, já estava sobre a beirada do penhasco e desceu, se agarrando pelas mãos e pés às longas videiras grossas, que cresciam por toda a superfície dele. Comecei a seguir, e logo hesitei quando um movimento, por entre as folhas de palmeira pelo riacho, me chamou a atenção. Eu falei uma palavra rápida de aviso, a garota olhou para cima, a fim de entender o que falei... e logo, uma videira murcha cedeu, e ela se agarrou selvagemente e caiu esparramada. Sua queda não foi alta, e a areia na qual pousou era macia; mas naquele instante, antes que ela pudesse se reerguer, a vegetação se abriu, e um pirata alto saltou sobre ela.

Vislumbrei, num único e rápido instante, o lenço amarrado na cabeça dele, o rosnante rosto barbudo, e o sabre bem erguido numa mão musculosa. Não houve tempo para ela puxar espada nem pistola – ele avultou sobre ela, como a sombra da morte, e o sabre girou para baixo. Mas, naquele momento, puxei a pistola e atirei cegamente, sem mirar. Ele se desviou do primeiro tiro, o sabre mudando ferozmente de direção, e caiu silenciosamente com o rosto na areia. E ela havia escapado por tão pouco, que o giro da lâmina dele havia arrancado o chapéu de aba erguida dos cachos da jovem. Eu me lancei penhasco abaixo e me ergui sobre o corpo do bucaneiro. O ato fora feito involuntariamente, sem pensamento consciente, mas não me arrependi. Se a garota merecia ser salva da morte – um fato do qual eu duvidava –, considerei um ato honrado, o de livrar os mares de pelo menos um desses lobos que o exploravam.

Helen limpava o pó de suas roupas, e praguejava em voz baixa para si mesma, porque seu chapéu estava torto.

- Venha – eu disse, um pouco aborrecido –; você teve sorte de escapar com o crânio intacto. Vamos embora, antes que os companheiros apareçam, seguindo o som do tiro.

- Foi uma grande façanha. – ela disse, preparando-se para me seguir – Você o perfurou de uma têmpora a outra... Duvido que eu pudesse fazer melhor.

- Foi pura sorte que guiou a bala. – respondi furiosamente, pois de todos os defeitos que detesto numa mulher, a insensibilidade é o pior – Não tive tempo para mirar... e, se eu tivesse tido tal tempo, talvez não atirasse.

Isto a silenciou, e ela não disse mais nada até alcançarmos os penhascos opostos. Aos pés destes, havia uma longa extensão de pedra sólida, e eu mandei que ela caminhasse sobre ela. Assim, seguimos ao longo da linha do penhasco, e logo chegamos a uma pequena catarata, onde um curso d’água caía sobre a beirada dos penhascos, para se juntar ao que havia no desfiladeiro.

- Há uma caverna atrás dessa queda d’água. – eu disse, falando acima do trepidar da água – Eu a descobri um dia, por acidente. Siga-me.

Dito isto, avancei pela lagoa, a qual rodopiava e remoinhava ao pé do penhasco e, enfiando minha cabeça, atravessei o lençol cadente de água, com a garota logo atrás. Estávamos numa pequena caverna escura, que recuava até sumir na escuridão; e, na frente, a luz diminuía através do anteparo prateado de água cadente. Este era o esconderijo ao qual eu me dirigia, quando encontrei a garota.

Retornei caverna adentro, até o som da queda d’água se tornar um murmúrio, e o rosto da garota luzir como uma rara flor branca na densa escuridão.

- Praga! – disse ela, sacudindo a água do casaco, com o uso do chapéu – Você me levou para malditos lugares inconvenientes, Sr. Harmer. Primeiro, caio na areia e sujo minhas roupas, e agora estamos molhados. Será que Gower e seu bando não seguirão o som do tiro da pistola, e nos encontrarão, rastreando nossas pegadas onde atravessamos os arbustos, andando de rochedo em rochedo?

- Sem dúvida, eles virão – respondi –, mas eles só conseguirão nos rastrear até o penhasco, onde andamos sobre a pedra, a qual não mostra pegadas. Eles não saberão se subimos, descemos ou para onde fomos. Não há uma chance em cem de que eles sequer descubram esta caverna. De qualquer modo, este é o local mais seguro da ilha para nós.

- Você ainda gostaria de ter deixado Dick Comrel me matar? – ela perguntou.

- Ele era um pirata sangrento, fosse qual fosse o nome. – respondi – Não, você é bela demais para morrer assim, não importa quais os seus crimes.

- Seus elogios tiram o ferrão de suas acusações, mas suas acusações roubam a doçura de seus elogios. Você realmente me odeia?

- Não; não você, mas o caminho vermelho que segue. Se você estivesse em outro caminho de vida, eu lhe olharia com contentamento.

- Diabos! – ela disse – Você é mesmo um sujeito estranho. Num momento, você fala como um cortesão, e no seguinte, como um capelão. Quais são seus verdadeiros sentimentos, para você falar de forma tão contraditória?

- Estou fascinado e repugnado. – respondi, pois o pálido oval branco do rosto dela flutuava diante de mim, e sua proximidade fazia meus sentidos darem voltas – Como mulher, você me atrai, mas como pirata, você me causa repugnância. Por Deus, você é mesmo um monstro, como aquela antiga Lilith, com o rosto de uma bela virgem e o corpo de uma serpente.

Sua risada suave soava prateada e zombeteira nas sombras.

- Então, então, camarada. Você salvou minha vida, embora me pareça que o tenha feito de má vontade, e não vou lhe atravessar o corpo, como eu teria feito em outras circunstâncias. Pois não gosto de tais palavras, como você acabou de dizer. Está se perguntando como cheguei até aqui, para estar com você?

- Os da Irmandade Vermelha são como lobos famintos e percorrem todos os lugares. – respondi – Estou para ver uma ilha no oceano, que não esteja poluída pelos malditos pés deles. Deste modo, não me admira encontrá-los aqui, ou encontrá-los abandonando uns aos outros.

- Abandonado? John Gower, abandonado por seu navio? Dificilmente, amigo. A embarcação da qual desci é o Incursor Negro, da Causa, como você sabe. Ela segue para interceptar um navio mercante espanhol, e retorna em duas semanas.

Ela franziu a testa:

- Maldita seja a lembrança do dia em que naveguei nela! Pois nunca encontrei uma tripulação de patifes mais covardes. Mas Roger O’Farrel, meu capitão anterior, está sem navio no momento, e lancei minha sorte com Gower... aquele suíno! Ontem, ele me obrigou a acompanhá-lo no desembarque e, no caminho, dei minha opinião sobre ele e seus capangas covardes. Diante disso, ficaram pouco à vontade e berraram como touros, mas não ousaram começar a brigarem no bote, com medo de cairmos entre os tubarões.

“Assim, no momento em que desembarcamos, cortei a cara de macaco de Gower com minha espada, corri do restante e me escondi. Mas foi minha má-sorte atacar sozinha a um deles. Ele voou em minha direção e brandiu a espada, mas eu a detive e quase o espetei de volta no coração. Então, você chegou, e o resto você sabe. Eles devem ter se espalhado por toda a ilha, como Comrel demonstrou.

“Talvez eu deva lhe contar por que John Gower desembarcou com sete homens. Você já ouviu falar no tesouro de Mogar?”

- Não.

- Achei que não. Diz a lenda que, quando os espanhóis navegaram pela primeira vez em alto-mar, encontraram uma ilha na qual havia um império em decadência. Os nativos moravam em cabanas de barro e madeira, na praia, mas eles tinham um grande templo de pedra... remanescente de alguma raça esquecida e antiga... no qual há um vasto tesouro de pedras preciosas. Os nobres espanhóis destruíram aqueles nativos, mas não antes que pudessem esconder sua horda tão perfeitamente, que nem mesmo um nariz espanhol pudesse farejá-la; e aqueles aos quais os nobres espanhóis torturaram, morreram sem falar.

“Deste modo, os espanhóis navegaram daqui de mãos vazias, deixando todos os traços do reino Mogar totalmente apagados, exceto o templo ao qual não conseguiram destruir.

“A ilha estava fora do caminho trilhado pelos navios e, à medida que o tempo foi passando, a história foi quase esquecida, vivendo apenas como um conto de marujo. Homens que levaram a história a sério e foram para a ilha, foram incapazes de achar o templo.

“Mas esta viagem foi feita com John Gower, um homem que jurava ter colocado o pé na ilha e visto o templo. Ele disse ter desembarcado aqui com o bucaneiro francês De Romber, e que eles encontraram o templo, exatamente como havia sido descrito na lenda.

“Mas, antes que pudessem procurar pelo tesouro, avistaram uma caravela e foram forçados a fugir. Não foram muito longe, antes de serem atacados por uma fragata, a qual os apagou do mar. Da tripulação do navio, a qual estava com De Romber quando ele encontrou o templo, só restou vivo o homem que navegou com Gower.

“Naturalmente, ele se recusou a dizer a localização dele, ou desenhar um mapa, mas se ofereceu para guiar Gower até lá, em troca de uma grande porção das gemas. Assim, ao avistar a ilha, Gower ordenou ao imediato, Frank Marker, que navegasse para buscar um navio mercante do qual fomos informados, e o próprio Gower veio à praia...”.

- O quê! Você quer dizer que...

- Sim! Nesta própria ilha, surgiu, floresceu e morreu o reino perdido de Mogar, e em algum lugar entre as árvores e videiras daqui, se encontra o templo esquecido com o resgate de doze imperadores!

- O sonho de um marujo bêbado. – eu disse, incerto – E por que me conta isto?

- Por que não? – disse ela, bastante razoável – Estamos no mesmo bote, e lhe tenho um débito de gratidão. Nós mesmos podemos achar o tesouro, quem sabe? O homem que navegou com De Romber nunca guiará John Gower para o templo, a menos que fantasmas andem, pois ele era Dick Comrel, o homem a quem você matou!

- Ouça! – Um som fraco chegou até meus ouvidos, através do gorgolejar indistinto das cascatas.

Deitando de bruços, me arrastei cautelosamente em direção à entrada coberta pela cascata e espiei através do anteparo tremeluzente. Pude distinguir obscuramente as silhuetas de quatro homens que estavam próximos à lagoa. O mais alto agitava selvagemente os braços, e sua voz áspera chegou aos meus ouvidos fracamente e como se estivesse distante.

Recuei, embora soubesse que eles não podiam ver através da cachoeira, e, enquanto o fazia, senti cachos sedosos roçarem meu ombro, e a garota, que havia se arrastado atrás de mim, pôs os lábios próximos a mim para sussurrar, abaixo do barulho da água.

- O de rosto cortado e olhos ferozes é o Capitão Gower; o magro, de pele escura, é o francês La Costa; o de barba é Tom Bellefonte, e os outros dois são Will Harbor e Mike Donler.

Há muito tempo, eu ouvira todos aqueles nomes, e percebi que estava olhando para um dos grupos mais sanguinolentos e de coração negro que já andou num convés ou praia. Após muitos gestos e conversas que não pude compreender, eles deram a volta e seguiram ao longo do penhasco, sumindo de vista.

Quando pudemos conversar em tom normal, a garota disse:

- O maldito Gower está numa fúria rara! Ele terá que achar o templo sozinho agora, já que sua pistola estourou os miolos de Dick Comrel. Aquele suíno! Ele faria melhor, se colocasse a distância dos Sete Mares entre ele e eu! Roger O’Farrel irá pagá-lo pela maneira como me tratou, eu aposto, mesmo que eu falhe em minha vingança.

- Vingança pelo quê? – perguntei curiosamente.

- Por desrespeito. Ele tentou me tratar como uma mulher, não como colega bucaneiro. Quando ameacei transpassá-lo, ele me amaldiçoou e jurou que iria me domesticar um dia... e me fez desembarcar com ele.

Seguiu-se um silêncio, e logo ela falou de repente:

- Diabos! Vamos ficar enclausurados aqui para sempre? Estou ficando faminta!

- Espere aqui – falei –; eu vou buscar algumas frutas silvestres que crescem aqui...

- Ótimo... – ela respondeu – Mas eu queria mais do que frutas. Por Zeus! Há pão, porco salgado e carne seca de boi na lancha, e estou disposta a sair a passeio e...

Naquele momento, eu, que não havia provado uma comida cristã por mais de uma semana, senti minha boca salivar diante da menção de pão e carne, mas eu disse:

- Está louca? De que vale um esconderijo, se não for usado? Você certamente cairia nas mãos daqueles canalhas.

- Não, agora é a melhor hora para tal tentativa. – ela disse, se erguendo – Não me impeça... estou decidida. Você viu que os cinco estavam juntos... portanto, não há ninguém no bote. Os outros dois estão mortos.

- A não ser que todo o bando tenha retornado à praia. – eu disse.

- Não é provável. Eles ainda estão me procurando, ou então se dedicaram a ir em busca do templo. Não, eu lhe digo, este é o melhor momento.

- Então, eu vou com você, já que está tão determinada. – respondi, e descemos juntos a saliência em frente à caverna, atravessamos as cachoeiras e saímos da lagoa.

Olhei atentamente ao redor, quase esperando um ataque, mas não havia homem algum à vista. Estava tudo silencioso, exceto pelo ocasional queixume rouco de algum pássaro da selva. Procurei por minhas armas. Uma das pistolas do bucaneiro morto estava vazia, é claro, e o cartucho da outra estava molhado.

- Os fechos da minha estão enrolados em seda. – disse Helen, notando minhas atividades – Aqui, pegue a munição sem uso e recarregue-as.

E ela me entregou um polvorinho impermeável, com compartimentos para pólvora e bala. Assim, fiz o que ela disse, secando as armas com folhas.

- Sou provavelmente a melhor atiradora de pistola do mundo – disse a garota modestamente –, mas a lâmina é a minha querida.

Ela puxou sua fina espada de dois gumes, e talhou e trespassou o ar.

- Vocês, marujos, raramente apreciam o verdadeiro valor do aço reto. – ela disse – Olhe para você, com esse sabre desajeitado. Eu poderia lhe atravessar, enquanto você ainda o estivesse erguendo para talhar. Assim!

A ponta da espada dela subitamente saltou para fora, e um cacho de meu cabelo planou até a terra.

- Cuidado com esse espeto. – eu disse, incomodado e um pouco desassossegado – Guarde suas manobras e estocadas para seus inimigos. Quanto ao sabre, é uma arma completa para um homem honesto que nada sabe de seus refinados truques franceses.

- Roger O’Farrel sabe o valor de uma espada de dois gumes. – ela disse – Seu coração se sentiria bem ao vê-la cantar na mão dele, e como ele espeta os que se opõem a ele.

- Vamos seguindo. – respondi abruptamente, pois a dureza dela me irritou novamente; e, de alguma forma, me aborrecia vê-la cantando elogios ao pirata O’Farrel.

Assim, seguimos silenciosamente através dos desfiladeiros e ravinas, subindo os penhascos setentrionais em outro lugar, e então continuamos através das árvores espessas, até chegarmos ao topo da inclinação que descia até a praia. Perscrutando para evitar uma emboscada, vimos a lancha sozinha e desprotegida.

Nenhum som quebrava o silêncio absoluto, enquanto descíamos cautelosamente a inclinação. O sol pairava sobre as águas ocidentais como um escudo de sangue, e os próprios pássaros nas árvores pareciam ter caído em silêncio. A brisa havia sumido e nenhuma folha sussurrava em galho algum.

Chegamos até a lancha e, trabalhando rapidamente, abrimos os pequenos barris e fizemos um pacote com pão e carne. Meus dedos tremiam de pressa e nervosismo, pois achei que estávamos à beira de um precipício – eu tinha certeza de que os piratas retornariam ao seu bote antes da noite cair, e o sol estava quase se pondo.

No exato momento em que pensei isto, ouvi um grito e um tiro, e uma bala zuniu pela minha bochecha. Mike Donler e Will Harbor desciam correndo a praia em nossa direção, praguejando e berrando ameaças horríveis. Caíram sobre nós, desde as rochas elevadas, mais abaixo da praia, e agora nos atacavam antes que tivéssemos tempo de respirar.

Donler se lançou sobre mim, os olhos ferozes em chamas; a fivela do cinto, os anéis e a lâmina do sabre – tudo em chamas sob o brilho do pôr-do-sol. Seu peito largo se mostrou peludo sob sua camisa aberta, e eu nivelei minha pistola e o baleei através do peito, de modo que ele cambaleou e rugiu como um búfalo ferido. Mas sua vitalidade era tão terrível, que ele avançou cambaleando, apesar deste ferimento mortal, para me cortar com seu sabre. Detive o golpe, partindo seu crânio até as sobrancelhas com minha própria lâmina, e ele caiu morto aos meus pés, com os miolos escorrendo sobre a areia.

Então, eu me voltei para a garota, a quem eu temia estar sendo violentamente atacada, e olhei bem a tempo de vê-la desarmar Harbor com uma hábil e violenta torção do próprio punho, e atravessar-lhe o coração de modo que a ponta da espada dela se sobressaiu abaixo do ombro dele.

Por um rápido instante, ele permaneceu ereto, a boca estupidamente aberta, como se sustentado pela lâmina. O sangue jorrava daquela boca aberta e, quando a jovem retirou a lâmina, numa maravilhosa demonstração de força com o punho, ele desabou para a frente, morto antes de tocar a terra.

Helen virou para mim, com uma leve risada.

- Pelo menos, Sr. Harmer – disse ela –, meu “espeto” faz um serviço mais limpo e elegante do que seu cutelo de açougueiro. Ossos e lâminas! Eu não imaginava que Mike Donler tivesse tanto miolo.

- Chega! – eu disse sombriamente, repugnado por suas palavras e maneira – É uma atividade de matança, a qual não gosto. Vamos embora; se Gower e os outros dois não estiverem atrás deles, virão em breve.

- Então, pegue o fardo de comida, imbecil. – disse ela abruptamente – Percorremos esta distância toda, e matamos dois homens, para nada?

Obedeci sem falar, embora, para falar a verdade, me sobrasse pouco apetite, pois eu não tinha alma para um trabalho como este que eu havia acabado de fazer. Enquanto o oceano bebia o sol que ia para oeste, e caía o rápido crepúsculo meridional, nos dirigíamos até a caverna sob as cachoeiras.

Quando galgamos a inclinação e perdemos a visão do mar, exceto a que reluzia entre as árvores à distância, ouvimos um grito distante, e percebemos que Gower e o restante dos seus homens haviam retornado.

- Não haverá nenhum perigo até de manhã. – disse minha camarada – Vez que sabemos que os velhacos estão na praia, não há como nos depararmos com eles na floresta. Eles dificilmente se aventuram dentro desta selva desconhecida à noite.

Depois de avançarmos um pouco mais, paramos, nos sentamos e jantamos o pão e a carne, engolindo os nacos com goles de água, de um claro riacho fresco. E me maravilhei com a graciosidade e o modo excelente como esta jovem pirata comia.

Quando ela havia acabado, e lavado as mãos no riacho, lançou para trás os cachos dourados e disse:

- Por Zeus, este foi um dia proveitoso para dois fugitivos caçados! Dos sete bucaneiros que desembarcaram de manhã cedo, só restam três vivos! O que diz? Devemos parar de fugirmos deles, atacá-los e confiar na nossa sorte em batalha? Três contra dois não é tão desigual.

- O que você diz? – perguntei rudemente a ela.

- Eu digo não. – ela respondeu com franqueza – Se fosse qualquer homem, menos Gower, eu poderia dizer diferente. Mas este Gower é mais que um homem... é astuto e feroz como qualquer besta selvagem, e há algo nele que faz meu sangue gelar. Ele é um dos homens a quem eu mais temi.

- Quem era o outro?

- Roger O’Farrel.

Agora, ela tinha um jeito de pronunciar o nome desse velhaco, como se ele fosse um santo ou um rei; e, por algum motivo, isto me irritava fortemente os nervos. Por isso, não falei nada.

- Se Roger O’Farrel estivesse aqui – ela continuou tagarelando –, não teríamos nada a temer, pois nenhum homem em todos os Sete Mares se iguala a ele, e até mesmo John Gower o evitaria. É o maior navegador que já existiu e o melhor espadachim. Ele tem os modos de um cavalheiro, o que ele realmente é.

- Quem é este Roger O’Farrel? – perguntei brutalmente – Seu amante?

Diante disso, ela me deu um tapa no rosto, de modo que eu vi estrelas. Estávamos de pé, e eu vi o rosto dela ficar rubro sob a luz da lua, a qual havia saído por sobre as árvores negras.

- Maldito! – ela gritou – O’Farrel lhe arrancaria o coração, se estivesse aqui! Dos seus próprios lábios, ouvi aquilo pelo qual nenhum homem o chamaria!

- É o que dizem, na verdade. – eu disse amargamente, pois minha bochecha ardia, e minha mente estava num estado tão caótico que é difícil de descrever.

- Dizem, hein? E o que você pensa? – havia perigo em seu tom de voz.

- Eu acho – falei, de forma imprudente – que nenhuma mulher pode ser uma saqueadora e assassina, e ao mesmo tempo casta.

Foi algo cruel e desnecessário, o que eu disse. Vi o rosto dela empalidecer, ouvi sua rápida inspiração e, no momento seguinte, sua espada estreita estava apontada contra meu peito, logo abaixo do coração.

- Já matei homens por menos. – eu a ouvi dizer, num sussurro fantasmagórico e distante.

Olhei para a fina linha prateada de morte, que havia entre nós, e meu sangue congelou, mas respondi:

- Matar-me certamente não mudaria minha opinião.

Por um instante, ela me encarou, e logo depois, para minha total perplexidade, deixou a lâmina cair, se jogou ao chão e explodiu numa torrente de soluços. Bastante envergonhado de mim mesmo, me ergui sobre ela, incerto, desejando confortá-la, mas com medo de que a pequena fera me apunhalasse, se eu tocasse nela. No momento seguinte, percebi palavras se misturando com as lágrimas dela.

- Depois de tudo o que fiz para me manter pura... – ela soluçou – Isto é demais! Eu sei que sou um monstro aos olhos dos homens, que há sangue em minhas mãos. Já pilhei, praguejei, matei, joguei dados e bebi até meu próprio coração se calejar. Meu único consolo, a única coisa que me salva de me sentir totalmente condenada, é o fato de que permaneci tão casta quanto qualquer menina. E agora, os homens acreditam no contrário. Eu gostaria... de... estar morta!

Eu também, por um instante, até que fui tomado por uma vergonha impronunciável. Certamente, as palavras que eu havia usado para ela não eram apropriadas para um homem dizer. E agora, eu estava assombrado com a retirada de sua máscara de dura indiferença, e a revelação de uma alma surpreendentemente sensível. Sua voz tinha o palpitar de sinceridade e, para falar a verdade, eu nunca realmente duvidei dela.

Agora, eu caía de joelhos ao lado da jovem que chorava e, erguendo-a, tentei enxugar seus olhos.

- Deixe suas mãos longe de mim! – ela ordenou imediatamente, se afastando num movimento brusco – Não terei nada a ver com você, que acredita que sou uma mulher má.

- Não acredito. – respondi – Humildemente, eu lhe rogo perdão. O que falei foi repugnante e covarde. Eu jamais deveria ter duvidado de sua honestidade, e eu disse aquilo só porque você me aborreceu.

Ela parecia meio acalmada.

- Quanto a Roger O’Farrel – ela disse –, ele tem o dobro da idade de qualquer um de nós dois. Ele me tirou de um navio que estava afundando, quando eu era um bebê, e me criou como se eu fosse sua própria filha. E, eu assumi a vida de pirata, não foi culpa dele, que teria me estabelecido como uma fina dama em terra firme, se eu desejasse. Mas o amor por aventuras está em meu sangue, e, embora o Destino tenha feito de mim uma mulher, tenho vivido uma vida de homem.

“Se eu sou dura, fria e sem piedade, o que mais você pode esperar de uma moça que cresceu entre cenas diárias de sangue e violência; cujas primeiras lembranças são de navios afundando, canhões atirando e os gritos estridentes dos moribundos? Conheço o valor desonesto de todos os meus companheiros... beberrões, assassinos, ladrões, gente que merece a forca... todos, menos Roger O’Farrel.

“Dizem que ele é cruel, e talvez seja. Mas comigo ele sempre foi gentil e bondoso. Além disso, é um homem refinando e honrado, de sangue altamente aristocrático, com a coragem de um leão!”

Não falei nada contra o bucaneiro, o qual eu sabia ser a deserdada ovelha negra de uma poderosa família irlandesa, mas experimentei uma estranha sensação de prazer, ao saber, através dos lábios dela, qual era o exato relacionamento entre eles.

Uma cena, há muito esquecida, lampejou subitamente em meu pensamento: pessoas num bote, saindo do porto de Tortuga e trazendo a bordo... as palavras de uma das mulheres: “E é a Helen Tavrel que devemos agradecer; Deus a abençoe! Pois ela fez o sanguinolento Hilton colocar todos nós no bote com água e comida, quando aquele demônio ia queimar a nós todos com nosso navio. Ela pode ser uma mulher-pirata, mas teve um coração bondoso, apesar de tudo”.

Afinal, a garota era um motivo de glória para seu sexo, levando-se em conta sua criação e meio, eu pensei, e me senti estranhamente alegre.

- Tente esquecer minhas palavras. – eu disse – Agora, vamos para nosso esconderijo, pois iremos precisar dele amanhã.

Eu a ajudei a ficar de pé, e coloquei sua espada em sua mão. Ela me seguiu sem uma palavra, e não houve nenhuma conversa entre nós, até alcançarmos a lagoa ao lado do penhasco. Nós paramos ali por um momento.

Era realmente uma visão estranha e fantástica. Os penhascos se erguiam duros e negros em ambos os lados, e entre eles sussurravam e farfalhavam as sombras espessas das folhas de palmeiras. O riacho, que deslizava sobre o penhasco diante de nós, reluzia como prata derretida ao luar, e a lagoa, para a qual ele deslizava, tremeluzia com longas ondulações brilhantes. A lua pairava sobre tudo isso, como um largo escudo de ouro branco.

- Durma na caverna. – eu mandei – Vou fazer um leito entre estas moitas que crescem aqui do lado.

- Vai estar seguro, desse jeito? – ela perguntou.

- Sim; nenhum homem chegará aqui antes do amanhecer, e não há animais perigosos na ilha, exceto répteis que andam às escondidas por entre os pântanos, no outro lado dela.

Sem dizer nada, ela caminhou lagoa adentro e desapareceu na bruma prateada da cascata. Separei os arbustos mais próximos e me acalmei para dormir. A última coisa da qual me lembrei, ao dormir, foi de uma massa rebelde de cachos dourados, sob a qual dançava um par de meditativos olhos cinzas.


2) O Segundo Dia

Alguém me acordava de meu sono profundo. Movi-me, e logo despertei subitamente e me sentei, tateando em busca da lâmina ou da pistola.

- Céus, senhor! Seu sono é profundo. John Gower seria capaz de se aproximar sorrateiramente de você e lhe arrancar o coração, sem que você percebesse.

Mal havia amanhecido, e Helen Tavrel estava de pé sobre mim.

- Eu havia pensado em acordar mais cedo – eu disse, bocejando –, mas estava cansado, por causa do trabalho de ontem. Você deve ter um corpo e natureza de molas de aço.

Ela parecia tão revigorada quanto se tivesse acabado de sair da penteadeira de uma dama. De fato, há poucas mulheres capazes de suportar tais esforços, dormir a noite inteira na areia descoberta de um chão de caverna, e ainda ter um aspecto elegante e encantador.

- Vamos ao desjejum. – ela disse – Parece-me que a comida é escassa, mas tem água pura para acompanhá-la, e creio que você mencionou fruta, não?

Mais tarde, enquanto comíamos, ela disse, preocupada:

- Meu sangue se agita de forma desagradável, diante do pensamento de John Gower adquirindo o tesouro de Mogar. Embora eu já tenha navegado com Roger O’Farrel, Hilton, Hansen e Le Ban nesse meio tempo, Gower é o primeiro capitão a me insultar.

- Não há como ele encontrá-lo – eu disse –, pelo simples motivo de que não há tal coisa nesta ilha.

- Você já a explorou toda?

- Toda, menos os pântanos ao leste, que são impenetráveis.

Os olhos dela se acenderam:

- Claro, homem; se o santuário fosse fácil de achar, já teria sido saqueado há muito tempo. Aposto que ele fica em algum lugar no meio daquele pântano! Agora ouça meu plano.

“Ainda falta algum tempo para o sol se erguer e, como é bastante provável que Gower e seus fanfarrões tenham bebido rum a noite toda, eles não estão em condições de ficarem de pé antes da plena luz do dia. Conheço os modos deles, e eles não os mudam, nem mesmo por um tesouro!

“Então, vamos rapidamente a este pântano, e fazer uma busca minuciosa”.

- Eu repito – eu disse –, isto é desafiar a Providência divina. Para que termos um esconderijo, se não o usamos? Já tivemos bastante sorte em escaparmos de Gower, mas, se continuarmos correndo aqui e ali pela floresta, podemos finalmente nos deparar com ele.

- Se ficarmos encolhidos em nossa caverna, como ratos, ele finalmente nos encontrará. Nós podemos, sem dúvida, explorar o pântano e retornar antes que ele vá embora daqui; ou senão... ele não tem nenhuma experiência nas florestas, ele anda às cegas feito um búfalo. Podemos ouvi-lo a uma légua de distância e escaparmos dele. Portanto, não há perigo algum em nos escondermos um pouco na floresta, se necessário, sempre com uma fuga segura assim que eles passarem. Se Roger O’Farrel estivesse aqui... – ela hesitou.

- Se você arrastaria O’Farrel para isso – eu disse, suspirando –, devo concordar com qualquer plano louco que você apresente. Vamos começar.

- Ótimo! – ela gritou, batendo palmas como uma criança – Sei que encontraremos o tesouro! Mesmo agora, sou capaz de ver aqueles diamantes, rubis, esmeraldas e safiras brilhando!

O primeiro cinza do amanhecer estava clareando, e o leste estava ficando mais brilhante e rosado, à medida que seguíamos ao longo dos penhascos, e finalmente subimos uma larga ravina, para entrar na parte mais densa das árvores que seguia para leste. Estávamos tomando a posição oposta à que havíamos seguido no dia anterior. Os piratas haviam desembarcado no lado ocidental da ilha, e o pântano ficava no oriental.

Caminhamos em silêncio por algum tempo, e então perguntei abruptamente:

- Como é Roger O’Farrel fisicamente?

- Uma figura elegante, com o porte de um rei. – ela me examinou impetuosamente, com um olho crítico – Mais alto que você, mas não tão forte. De ombros mais largos, mas com o peito menos musculoso. Um rosto frio, forte e bonito, bem barbeado. O cabelo tão negro quanto o seu, apesar da idade, e delicados olhos cinzas. Você tem olhos cinzas também, mas sua pele é morena, e a dele é bem branca.

“Mas”, ela continuou, “se você estivesse barbeado e vestido adequadamente, você não teria uma má aparência, mesmo ao lado do Capitão O’Farrel – qual a sua idade?”.

- Vinte e sete.

- Não achei que você fosse tão velho. Eu tenho 20.

- Você parece mais jovem. – respondi.

- Tenho idade suficiente em experiência. – ela disse – E agora, senhor, é melhor seguirmos mais silenciosamente, para que não haja qualquer chance de haver patifes no meio destas florestas.

Assim, deslizamos cuidadosamente por entre as árvores, andando de rastos e seguindo nosso caminho através da vegetação rasteira da floresta, vegetação que ficava mais espessa à medida que seguíamos para leste. Num momento em que uma larga serpente, com pintas escuras, atravessou sinuosamente nosso caminho, a garota se sobressaltou e recuou nervosamente. Brava como uma tigresa ao combater homens, ela tinha a autêntica antipatia feminina por répteis.

Finalmente, chegamos à beira do pântano, sem vermos qualquer inimigo humano, e parei.

- Aqui começa a vastidão, assombrada por serpentes, de brejos e montículos, que termina por descer até o mar ao leste. Você está vendo aqueles muros emaranhados com galhos manchados de musgo, e troncos cobertos por vinhas, diante de nós. Ainda quer invadir esse território repugnante?

A única resposta que ela deu foi a de me empurrar impacientemente. Dos primeiros metros daquela jornada, eu não gosto de me lembrar. Abri um caminho através daquelas vinhas pendentes e grossos bambus com meu sabre, e quanto mais avançávamos, mais se erguia ao redor de nossos pés aquela lama fedorenta e pegajosa. Então, os bambus desapareceram, as árvores ficaram esparsas, e vimos somente juncos se erguendo acima de nossas cabeças, com ocasionais espaços vazios, nos quais havia poços verdes, de água estagnada, na negra lama borbulhante. Andávamos cambaleando, afundando às vezes até a cintura na água e lodo. A garota praguejava intensamente diante do estrago que isso estava fazendo em seus adereços, enquanto eu guardava meu fôlego para o trabalho de chegar ao nosso destino. Por duas vezes, afundamos em poços estagnados que pareciam não ter fundo, e em ambas as vezes, foi difícil voltar à terra firme – terra firme, eu disse? Não, a substância traiçoeira, pouco firme e sugadora que se passava por terra, naquela repugnante abominação.

Mas avançávamos penosamente, nos agarrando a juncos frágeis e a toras podres, e fazendo uso dos montículos mais sólidos quando podíamos. Houve um momento em que Helen pôs o pé numa cobra, e guinchou como uma alma penada; nem ela estava acostumada a vê-las, embora elas se aquecessem em quase todas as toras e retorcessem pelos montículos.

Eu não via fim naquela jornada de idiota, e estava prestes a dizê-lo, quando, acima dos juncos e do repugnante pântano ao nosso redor, eu vi o que parecia ser solo firme e árvores logo após. Helen soltou uma exclamação de alegria e, ao correr para a frente, logo caiu dentro de um poço que a sugou toda para dentro, exceto pelo nariz. Tateando dentro da água suja, lhe agarrei firmemente os braços e consegui puxá-la para fora, onde ela praguejava e balbuciava. Logo depois, afundei até minha cintura na lama ao redor do poço, e foi com certo desespero que abrimos nosso caminho, à força, em direção à terra mais alta.

Finalmente, nossos pés sentiram o simulacro de fundo sob a lama, e logo saímos em terra firme. Árvores altas cresciam ali, apinhadas de vinhas, e o capim crescia alto por entre elas, mas pelo menos não havia pântano. Eu, que havia estado por todos os arredores dos limites do pântano, estava maravilhado. Evidentemente, este lugar era uma espécie de ilha, cercada de lamaçal por todos os lados. Quem nunca havia adentrado o pântano, pensaria como eu havia pensado: que não havia nada lá, exceto água e lama.

Helen estava entusiasmada, mas antes que se aventurasse mais longe, ela se abaixou e procurou limpar um pouco da lama das roupas e rosto. De fato, ambos éramos visões ridículas, emplastados com lama e lodo até as sobrancelhas.

E mais: a despeito das roupas de seda, a água havia encharcado as pistolas de Helen, e as minhas também estavam inúteis. Os canos e gatilhos estavam tão sujos de lama, que levaria algum tempo para limpá-los e secá-los, para que pudessem ser recarregados com o polvorinho dela, o qual ainda continha alguma pólvora. Eu era a favor de parar durante o tempo necessário para fazer isto, mas ela argumentou que provavelmente não precisaríamos delas no meio do pântano, e que ela não podia esperar – ela precisava explorar o lugar que havíamos encontrado, e saber se o templo, de fato, estava lá.

Então, eu cedi e continuamos, passando entre os troncos das grandes árvores, onde os galhos se entrelaçavam a ponto de quase obstruírem a luz do sol, que havia se erguido algum tempo antes. A luz filtrada através deles era estranha, cinza e sobrenatural, e a grama alta ondulava através dela como fantasmas magros. Nenhum pássaro cantava lá, nenhuma borboleta voava, embora tenhamos visto várias cobras.

Logo, percebemos sinais de pedra trabalhada. Afundados na terra e cobertos por grama exuberante, havia pavimentos e ladrilhos despedaçados. Mais adiante, chegamos a uma extensão bem aberta, a qual parecia ser uma rua. Havia grandes lajes, arrumadas uniformemente, e o capim crescia nas fendas entre elas. Ficamos em silêncio enquanto seguíamos esta antiga rua, pois fantasmas há muito esquecidos pareciam sussurrar ao nosso redor; e logo, vimos uma estranha construção reluzindo através das árvores diante de nós.

Silenciosamente, nos aproximamos dela. Não havia dúvida: era um templo retangular, construído com grandes blocos de pedra. Degraus largos levavam até o chão dele, e nós os subimos, com as espadas desembainhadas, em silêncio e pasmados. Em três lados, era murado por paredes, sem janelas nem portas; no quarto, por enormes colunas atarracadas, as quais formavam a frente do edifício. Ladrilhos planos, gastos por incontáveis pés, constituíam o chão e, no meio da grande sala, começava uma série de degraus estreitos que levavam a uma espécie de altar. Não havia ídolo algum ali; se houve, os espanhóis sem dúvida o destruíram. Nenhum entalhe decorava a parede, teto ou colunas. O traço que predominava em tudo era uma sombria simplicidade, uma espécie de terrível desprezo pelos esforços humanos de embelezamento e adorno.

Que estranho povo teria construído aquele santuário há tanto tempo? Certamente algum povo terrível e sombrio, que pereceu eras antes dos caraíbas de pele marrom erguerem seu império transitório. Ergui o olhar para o altar, que avultava rigidamente sobre nós. Estava situado numa espécie de plataforma, solidamente construída no chão. Uma coluna se erguia desta plataforma até o teto, e o altar parecia ser parte desta coluna.

Subimos os degraus. Eu não estava me sentindo totalmente à vontade, e Helen estava em silêncio e deslizou sua mão firme e pequena até a minha, olhando nervosamente ao redor. Um silêncio meditativo pairava sobre o local, como se um monstro de algum outro mundo estivesse à espreita nos cantos, pronto para saltar sobre nós. A antiguidade melancólica do templo nos oprimia, e caía sobre nós com uma sensação de nossa própria pequenez e fraqueza.

Apenas o rápido movimento nervoso dos pequenos calcanhares de Helen, nos degraus de pedra, quebrava o silêncio, mas eu era capaz de retratar, nos olhos do meu pensamento, os rituais majestosos e sombrios de adoração que haviam sido encenados aqui em anos passados. Agora, enquanto alcançávamos a plataforma e nos curvávamos sobre o altar, vi intensas manchas escuras na sua superfície e ouvi a garota estremecer involuntariamente. Mais sombras de horror do passado, e percebemos que o horror daquele relicário sombrio ainda não havia acabado.

Voltando minha atenção para a sólida coluna que se erguia ao lado do altar, meu olhar seguiu-a até o teto. Este parecia ser constituído por longas e notáveis lajes de pedra, exceto pelo espaço logo acima do altar. Lá, descansava um único e enorme bloco, uma pedra de natureza diferente daquelas do restante do templo. Era de uma cor sombria e amarelada, varada por fendas vermelhas, e de um tamanho monstruoso. Devia pesar várias toneladas, e fiquei perplexo sobre como ela era mantida naquele lugar. Por fim, decidi que a coluna que se erguia da plataforma a sustentava de algum modo, pois esta adentrava o teto ao lado do grande bloco. Do teto até a plataforma, havia, eu diria, uns quatro metros e meio, e da plataforma até o chão, três.

- Agora que estamos aqui – disse a garota, um pouco sem fôlego –, onde está o tesouro?

- É isto que precisamos descobrir. – respondi – Antes de começarmos a busca, vamos preparar nossas pistolas, pois só os santos sabem o que há diante de nós.

Descemos novamente a escada, e durante a descida, Helen parou, com um olhar inquieto.

- Ouça! Foi algum passo?

- Não ouvi nada; deve ser sua imaginação, invocando ruídos.

Ela ainda insistiu ter ouvido algo, e se apressou para fora em direção à entrada, tão rápida quanto pôde. Alcancei o chão, a mais ou menos um passo atrás dela, e comecei a falar, quando vi seus olhos se arregalarem e sua mão se precipitar à lâmina. Dei a volta e vi três formas ameaçadoras avultando entre as colunas – três homens, lambuzados de lama e lodo, com armas faiscando nas mãos.

Como num sonho, vi os ferozes olhos ardentes de John Gower, a barba do gigante Bellefonte e o semblante escuro e sombrio de La Costa. Logo, estavam sobre nós.

Como mantiveram a pólvora seca ao cruzarem aquele pântano imundo, eu não sei, mas, no exato momento em que eu desembainhava a lâmina, La Costa atirou e a bala me atingiu o braço direito, quebrando o osso. O sabre caiu de meus dedos dormentes, mas me abaixei e, pegando-o com a mão esquerda, detive o ataque de Bellefonte. O gigante avançou como um elefante selvagem, urrando, e seu sabre rodopiando como uma labareda. Mas a fúria desesperada, de um leão encurralado e ferido, era minha. E, espatifando minha lâmina em sua guarda, como um ferreiro martelando na forja, até o choque de nossos aços se tornar um estrondo incessante, eu o levei até o outro lado da sala e o bati até os joelhos. Mas ele aparou parte do golpe que o derrubou, de modo que meu sabre, resvalando de sua lâmina ao seu crânio, virou em minha mão e eu o golpeei com o lado da lâmina, ao invés do gume, atordoando sem matar. Naquele instante, La Costa deu uma coronhada com um mosquete e me abriu o couro cabeludo, de modo que caí e fiquei deitado sobre meu próprio sangue.

Sobre como Helen se saiu, em parte me contaram depois, em parte eu vi, obscuramente, enquanto eu jazia aturdido e incapaz de me levantar.

Ao primeiro alarme, ela havia atacado Gower e ele a havia enfrentado, com sua lâmina segura numa postura mais de defesa que de ataque. Este Gower era um raro espadachim, capaz de se manter por um tempo, até mesmo contra tal habilidade, como era a de Helen, embora sua arma fosse um pesado sabre de abordagem, uma lâmina imprópria para um trabalho ardiloso.

Ele não tinha desejo de matá-la, e ele tinha mais habilidade para não se deixar bem aberto para a estocada dela, ao talhar em direção a ela. Assim, ele lhe deteve os primeiros poucos golpes, recuando diante dela, enquanto La Costa procurava se aproximar furtivamente dela por trás e lhe prender os braços. Antes que o francês pudesse levar esta idéia a cabo, Helen fintou Gower num desvio feroz que o deixou com a guarda aberta. Ali, naquele momento, John Gower teria morrido, mas a sorte não estava conosco naquele dia, e o pé de Helen escorregou quando ela deu uma estocada ao coração negro dele. A ponta da espada vacilou e só lhe roçou as costelas. Antes que ela pudesse recuperar o equilíbrio, Gower gritou e lhe derrubou a espada, deixando a dele próprio cair ao chão para agarrá-la com os braços enormes.

Mesmo assim, ela lutou, lhe arranhando o rosto com as unhas, chutando-lhe as canelas e se esforçando para encurtar o caminho até sua espada, de modo a poder usá-la contra ele, mas ele apenas sorriu. E, tendo lhe tirado a espada de dois gumes, ele a tinha tão indefesa quanto um bebê enquanto a amarrava com cordas. Então, ele a carregou até uma coluna e, pondo a moça de pé contra ela, amarrou-a ali – ela rugindo e praguejando de um jeito que faz gelar o sangue.

Então, vendo que eu me esforçava para me levantar, ele ordenou a La Costa que me amarrasse. O francês respondeu que meus dois braços estavam quebrados. Gower o ordenou que me amarrasse as pernas – o que ele fez, arrastando-me, depois, para perto da garota. Como o francês cometeu esse erro, eu não sei, a não ser que, devido ao golpe em minha cabeça, eu parecesse por ora incapaz de usar meus membros, de modo que ele presumiu que meu braço esquerdo também estivesse quebrado, além do direito.

- E então, minha bela dama – disse John Gower, com sua voz profunda e ameaçadora –, terminamos onde começamos. Não sei onde você arranjou este musculoso e jovem selvagem, mas me parece que ele está em más condições. Por enquanto, temos um trabalho para fazer; depois disso, poderei aliviar as dores dele.

Apesar de atordoado, eu sabia que ele quis dizer que não pretendia me salvar, mas me matar, e ouvi a rápida inspiração de Helen.

- Sua besta! – ela gritou – Você assassinaria o rapaz?

Gower deu uma risada fria e virou para Bellefonte, que somente agora aparecia, de forma atrapalhada.

- Bellefonte, seu cérebro ainda está atordoado demais para nosso trabalho?

- Não. – rosnou o gigante – Mas que eu queime em Hades, se já senti tamanho golpe; eu ia...

- Pegue as ferramentas. – ordenou Gower, e Bellefonte se afastou, caminhando em postura desleixada, para logo depois retornar, com punções e um grande martelo de ferreiro.

- Vou despedaçar esta maldita construção, ou achar o que procuro. – disse John Gower – Como eu havia lhe dito, quando você me perguntou o motivo para colocar o martelo de ferreiro dentro da lancha, minha linda Helen. Comrel morreu antes que pudesse nos dizer onde fica este templo; mas, com base nas alusões que ele deixava escapar de tempos em tempos, imaginei que ficasse no lado leste da ilha. Quando viemos para cá e vimos o pântano, senti que nossa busca havia terminado. Era verdade, e nossa busca por você também, quando percebi ao subir furtivamente as colunas e espionar entre elas.

- Estamos perdendo tempo. – interrompeu Bellefonte – Vamos derrubar alguma coisa.

É tudo uma perda de tempo. – disse La Costa, taciturno – Gower, eu lhe digo novamente que esta é uma busca de tolos, destinada a acabar somente de forma má. Isto é um antro de demônios... Não, o próprio Satã abriu suas asas escuras sobre este templo, e aqui não é lugar para cristãos! Quanto às jóias, uma lenda diz que os antigos sacerdotes deste povo as lançaram ao mar, e eu particularmente acredito nessa lenda.

- Em breve nós veremos. – foi a resposta imperturbável de Gower – Estas paredes e pilares têm uma aparência sólida, mas a persistência e os utensílios irão despedaçar qualquer pedra. Vamos ao trabalho.

Agora, estranho dizer, eu havia me esquecido de mencionar a qualidade da luz na construção. No lado de fora, havia um espaço claro, sem árvores, a vários metros das paredes em ambos os lados. Mas, as árvores que cresciam além deste espaço eram tão altas, e seus galhos tão próximos, que o santuário ficava sempre numa sombra eterna, e a luz que se infiltrava entre as colunas era vaga e estranha. Os cantos da grande sala pareciam velados em bruma cinza, e os humanos que se moviam ao redor pareciam fantasmas – suas vozes soando cavernosas e irreais.

- Olhem ao redor, para ver se encontram portas secretas ou coisa semelhante. – disse Gower, começando a bater o martelo ao longo das paredes. Bellefonte estava ansioso, e La Costa não.

- Não teremos sorte nisto, Gower. – disse o francês, enquanto tateava na sombra de um canto distante – Esta ousadia de divindades pagãs em templos pagãos... nom de Dieu!

Todos nós nos sobressaltamos diante de seu guincho selvagem, e ele cambaleou do canto, gritando, uma coisa como um cabo negro se contorcendo ao redor de seu braço. Enquanto olhávamos, horrorizados, ele caiu no meio do chão ladrilhado e lá, despedaçou, com as mãos nuas, o horrendo réptil que o havia atacado.

- Ó céus! – ele gritou, se contorcendo e encarando os companheiros sobre ele, com olhos selvagens e transtornados – Ó, grand Dieu, estou queimando, estou morrendo! Ó, santos, me concedam alívio!

Até mesmo os nervos de aço de Bellefonte pareciam abalados diante desta terrível visão, mas John Gower permanecia imóvel. Ele puxou uma pistola e jogou-a para o homem moribundo.

- Você está condenado. – ele disse brutalmente – O veneno está correndo por suas veias, como o fogo do Inferno, mas você ainda pode viver por horas. É melhor encerrar seu tormento.

La Costa agarrou a arma, como um homem se afogando o faria com um graveto. Por um momento, ele hesitou, dividido entre dois medos terríveis. Então, quando o incendiar do veneno o sacudiu com ferozes estocadas, ele pôs a boca da arma contra a têmpora, grulhando e ganindo, e puxou o gatilho. O seu olhar torturado vai me assombrar até o Dia do Juízo, e que seus crimes na terra lhe sejam perdoados, pois, se algum homem já passou pelo Purgatório em sua morte, foi ele.

- Por Deus! – disse Bellefonte, enxugando a testa – Isto parece obra de Satã!

- Bah! – disse Gower, impaciente – Isto foi só uma cobra do pântano, que rastejou para dentro daqui. O tolo estava tão absorto em sua profetização sombria, que não conseguiu perceber que aquilo estava enrolado na escuridão, e assim, pôs a mão nela. Não deixe isto lhe abalar... vamos trabalhar, mas primeiro olhe ao redor, e veja se há outras serpentes escondidas por aqui.

- Primeiro ponha ataduras nos ferimentos do Sr. Harmer, se me permite. – disse Helen, com um tremor na voz para mostrar o quanto ela havia sido afetada – Ele parece que vai sangrar até morrer.

- Deixe-o. – respondeu Gower sem sentimento – Isto vai me poupar da tarefa de aliviá-lo.

Meus ferimentos, no entanto, haviam parado de sangrar; e, embora minha cabeça ainda estivesse atordoada e meu braço estivesse começando a latejar, eu estava longe de ser um homem morto. Quando os piratas não estavam olhando, comecei a mexer furtivamente em minhas amarras com a mão esquerda. Eu não estava em condições de lutar, é verdade, mas se eu estivesse livre, poderia fazer alguma coisa. Assim, deitado de lado, coloquei lentamente os pés atrás de mim e remexi desajeitadamente as cordas em meus tornozelos, com os dedos das mãos estranhamente dormentes, enquanto Gower e seu parceiro cutucavam ao redor, no canto, e martelavam as paredes e colunas.

- Por Zeus, acho que aquele altar ali é a chave deste mistério. – disse Gower, finalmente parando seu trabalho – Traga o malho, e vamos dar uma olhada naquela coisa.

Subiram as escadas, como dois patifes subindo os degraus da forca, e sua aparência na luz fraca era a de homens já mortos. Uma mão fria tocou minha alma, e eu parecia ouvir o bater de grandes asas de morcego. Um terror gélido se apossou de mim, não sei por que, e puxou meus olhos para a grande pedra que pendia meditativamente sobre o altar. Todo o horror deste antigo lugar de mistérios esquecidos caiu sobre mim como uma névoa, e acho que Helen sentiu o mesmo, pois ouvi sua respiração ficar rápida e áspera.

Os bucaneiros pararam na plataforma, e Gower falou; sua voz retumbando como uma zombaria cavernosa no grande salão, ressoando da parede do teto.

- Agora, Bellefonte, levante seu malho e me destrua este altar.

O gigante grunhiu, duvidoso, diante disso. O altar parecia ser apenas um sólido quadrado de pedra, tão plano e sem adornos quanto o resto do templo; uma parte integral da plataforma, como era a coluna atrás. Mas Bellefonte ergueu o pesado martelo, e os ecos estrondearam enquanto ele o descia sobre a superfície lisa.

O suor se acumulava na testa do gigante, com o esforço, e os grandes músculos se sobressaíam em seus braços e ombros nus, enquanto ele erguia o malho, e batia novamente e novamente. Gower praguejou, e Bellefonte jurou que era um desperdício de força quebrar uma rocha sólida, mas, diante da insistência de Gower, ele ergueu novamente o martelo. Estava com as pernas bem abertas, os braços acima da cabeça e curvados para trás, as mãos agarrando firmemente o cabo. Então, com toda a sua força, ele o desceu, e o cabo do grande martelo se estilhaçou com o golpe. Mas, com um estrondo despedaçador, todo o altar cedeu, e os fragmentos voaram por todas as direções.

- É oco, por Satã! – gritou John Gower, batendo com o punho na palma da própria mão – Eu não suspeitei disso! Mas quem o pensaria, com a tampa tão engenhosamente colada ao resto, a ponto de não mostrar nenhuma rachadura? Bata sílex e aço aqui, homem; o interior desta estranha arca é tão escuro quanto Hades.

Eles se curvaram sobre o local, e houve nele um clarão momentâneo; logo, ficaram de pé.

- Nenhum pavio. – rosnou Bellefonte, lançando seu sílex e aço para um lado – O que viste?

- Nada, exceto uma grande gema vermelha. – disse Gower, mal-humorado – Mas talvez haja um compartimento secreto sob o fundo onde ela se encontra.

Ele se curvou sobre o altar-cofre e enfiou a mão lá dentro.

- Por Satã! – disse – Esta maldita jóia parece estar firmemente agarrada ao fundo do cofre, como se estivesse fixa a algo... uma vara de metal... ah, agora ela cede e...

Através de suas palavras, veio um rangido abafado, como se de trancas e alavancas há muito tempo sem usar... um estrondo soou de lá do alto, e todos nós olhamos para cima. E então, os dois bucaneiros ao lado do altar soltaram um grito mortal e ergueram os braços quando, do alto do teto, a grande pedra central trovejou. Coluna, altar e escadaria se despedaçaram em ruínas vermelhas.

Assombrados pelo terrível barulho, semelhante ao de um terremoto, a garota e eu estávamos deitados, os olhos fixos com terrível fascinação na grande pilha de pedra despedaçada, no meio da qual escorria um rio de cor vermelho-escura.

Finalmente, após o que parecia um longo tempo, eu, me movendo como um homem em transe, me libertei e desamarrei a garota. Eu estava muito fraco, e ela dirigiu um dos braços para me sustentar. Saímos daquele templo de morte e, uma vez do lado de fora, nunca o ar livre e a luz me pareceram tão belos, apesar do ar estar contaminado com o vapor do pântano, e a luz fosse estranha e vaga.

Logo, uma onda de fraqueza me inundou o corpo e cérebro; caí ao chão e perdi a consciência.


3) E o Último

Alguém estava lavando minha testa, e eu finalmente abri meus olhos.

- Steve, oh, Steve, você está morto? – alguém dizia; a voz era gentil, e havia uma insinuação de lágrimas.

- Ainda não. – eu falei, me esforçando para me sentar, mas uma pequena mão me forçou gentilmente para baixo.

- Steve. – disse Helen, e eu senti um estranho prazer em ouvi-la me chamar pelo primeiro nome – Eu lhe enfaixei tão bem quanto pude, com o material que eu tinha... arrancado de minha camisa. Deveríamos sair, deste local baixo e úmido, para uma parte mais fresca da ilha. Você se acha capaz de andar?

- Tentarei. – eu disse, embora meu coração esmorecesse ao pensar no pântano.

- Encontrei uma estrada. – ela me informou – Quando fui buscar água limpa, encontrei uma pequena fonte, e também me deparei com o que outrora havia sido uma bela estrada, construída com grandes blocos de pedra, fixados no fundo do lamaçal. A lama agora a cobre por alguns centímetros de altura, e os juncos crescem sobre ela, mas é transitável; portanto, vamos.

Ela me ajudou a ficar de pé e, com um dos braços ao meu redor, guiou meus passos incertos. Desta forma, cruzamos a antiga estrada alagada, e encontrei tempo para me maravilhar novamente diante da natureza daquela raça, a qual havia construído tão vigorosamente e que havia tão terrivelmente protegido seus segredos.

A jornada através do pântano parecia não ter fim; e, novamente através da selva espessa; mas, finalmente, meus olhos, nadando em angústia e vertigem, vislumbraram o oceano brilhado através das árvores. Logo, conseguimos sentar ao lado da lancha na praia, exaustos. Mas Helen, ao invés de descansar como eu insistia, pegou uma caixa de bandagens e ungüentos do bote e me cobriu os ferimentos. Com uma adaga enfiada, ela achou e arrancou a bala do meu braço; eu pensei que ia morrer lá, e então ela colocou meu osso quebrado no lugar. Fiquei maravilhado com sua habilidade, mas ela me contou que, desde o início da infância, havia ajudado a enfaixar ferimentos e encaixar membros quebrados – que Roger O’Farrel cuidava de seus próprios feridos desta maneira, tendo comparecido a uma universidade médica na juventude, e transmitiu todo o seu conhecimento para ela.

Contudo, ela admitiu que o encaixe de meu braço foi um trabalho lamentável, com o material escasso que ela tinha, e temeu que isso me trouxesse problemas. Mas, enquanto ela conversava, caí para trás e fiquei inconsciente, pois eu havia perdido uma incrível quantidade de sangue, e recuperei totalmente os sentidos, após o inicio do amanhecer do dia seguinte.

Enquanto eu jazia inconsciente, Helen havia feito para mim uma cama de folhas macias e me coberto com seu belo manto, o qual eu temia não estar nada belo, com sangue e manchas nele. E, quando eu voltei a mim, ela se sentou ao meu lado, com os olhos arregalados e insones, o rosto contraído e macilento no início da aurora cinza.

- Steve, você vai viver? – ela perguntou, e eu fiz o melhor possível para rir.

- Você acredita pouco em minhas forças, se acha que uma bala de pistola e a estocada de um mosquete podem me matar. – respondi – Como se sente, Helen?

- Cansada... um pouco. – ela sorriu – Mas excepcionalmente pensativa. Já vi homens morrerem de muitas formas, mas nunca vi nada igual àquilo no templo. Seus guinchos de morte me assombrarão até o fim da minha vida. Como acha que o fim deles foi causado?

- Tudo agora me parece confuso e vago – eu disse –, mas acho que me lembro de ter visto muitas varas de metal torcidas e quebradas, por entre as ruínas. Pelo modo como a plataforma e escadaria foram despedaçadas, acredito que toda a estrutura era oca, como o altar e a coluna também. Um sistema engenhoso de alavancas devia estar neles até o teto, onde a grande pedra estava segura no local através de trancas ou coisa semelhante. Acredito que a gema no altar estava fixa a uma alavanca que, trabalhando através da coluna, soltou aquela pedra.

Ela estremeceu:

- É provável. E o tesouro...

- Nunca existiu. Ou, se existiu, os caraíbas o lançaram ao mar, sabendo que havia alguma maldição sobre o templo, fingindo terem-no escondido lá dentro e esperando que os espanhóis não fizessem mal a ninguém enquanto procuravam por ele. Aquela coisa certamente não foi trabalho dos caraíbas, e duvido que eles soubessem qual o tipo de destino que estava à espera ali. Mas, na verdade, qualquer homem pode olhar para aquele santuário amaldiçoado e, instintivamente, sentir que a condenação obscurece o lugar.

- Outro sonho que virou fumaça. – ela suspirou – Ah, e eu ansiosa por rubis e safiras tão grandes quanto meu punho!

Ela olhava para o mar enquanto falava, onde as ondas começavam a se avermelhar na luz incandescente. Em seguida, ela se ergueu de um pulo!

- Uma vela!

- O Incursor Negro está de volta! – exclamei.

- Não! Mesmo a esta distância, posso reconhecer o formato de uma caravela! Está se dirigindo a esta ilha.

- Em busca de água fresca, sem dúvida. – eu disse.

Helen ficou torcendo, incerta, seus dedos esguios.

- Meu destino depende de você. Se disser a eles que eu sou Helen Tavrel, ficarei pendurada entre a maré alta e baixa, na Doca de Execução!

- Helen – eu disse, erguendo o braço, lhe tomando a pequena mão e puxando-a para meu lado –, minha opinião a seu respeito mudou desde a primeira vez que lhe vi. Ainda afirmo que a Trilha Vermelha não é o caminho para uma mulher seguir, mas compreendo as circunstâncias que lhe forçaram para dentro dela. Nenhuma mulher, qualquer que seja sua maneira de viver, poderia ser mais gentil, corajosa e generosa do que você foi. Para os homens daquela embarcação, você será Helen Harmer, minha irmã, que navegava comigo.

- Há dois homens aos quais temi... – ela disse, com os olhos baixos – John Gower, porque era um animal, e Roger O’Farrel, porque ele era refinado e nobre. Um deles eu respeitei: O’Farrel. Agora, encontro um segundo homem para respeitar sem medo. Você é um rapaz corajoso e honesto, Steve, e...

- E o quê?

- Nada. – ela parecia confusa.

- Helen – eu falei, puxando-a gentilmente para mais perto de mim –, você e eu atravessamos muito sangue e fogo juntos, para haver qualquer coisa entre nós. Sua beleza me fascinou desde a primeira vez em que eu lhe vi; mais tarde, vim a entender a autêntica dignidade da alma que existe sob sua máscara de indiferença. Cada alma tem seu verdadeiro companheiro, pequena camarada, e embora eu tenha lutado contra o sentimento e me esforçado para afastá-lo de mim, a afeição por você nasceu em meu peito e cresceu firmemente. Não me importo com o que você possa ter sido, e sou apenas um marujo, agora sem navio, mas me deixe contar àqueles marinheiros, quando eles desembarcarem, que você é, não minha irmã, mas minha futura esposa.

Por um momento, ela se curvou em minha direção, e em seguida se afastou e seus olhos dançaram com o velho fogo jovial.

- Ora, sir, está se oferecendo para casar-se comigo? É realmente muito gentil de sua parte, mas...

- Helen, não zombe de mim!

- Acredite, Steve, não estou zombando. – ela disse, se suavizando – Mas eu nunca havia pensado antes numa coisa dessas. Ora, eu devo estar crescendo excessivamente! Não, senhor, ainda sou muito jovem para me casar, e ainda não vi todo o mundo que eu gostaria de ver. Lembre-se que eu ainda sou Helen Tavrel.

- Não me incomodo; case-se comigo, e eu lhe tirarei desta vida.

- Não tão rápido. – ela disse, fazendo desenhos na areia com o dedo – Preciso de tempo para pensar sobre isto. Além disso, não darei um passo sem o consentimento de Roger O’Farrel. Afinal de contas, sou apenas uma garota, Steve, e, lhe digo a verdade, nunca pensei em me casar, ou mesmo em ter um amante.

“Ah, estes homens... como pressionam uma pobre moça!”, ela riu.

- Helen! – exclamei, aborrecido e ao mesmo tempo divertido – Você, afinal, não se importa mesmo comigo?

- Ora, quanto a isso – ela evitou meu olhar –, eu realmente sinto por você uma afeição como eu nunca havia sentido por qualquer outro homem, nem mesmo por Roger O’Farrel. Mas devo ponderar sobre isto, e descobrir se é realmente amor!

Em seguida, ela riu alegremente em voz alta, e eu praguejei desesperançonsamente.

- Ei, que linguagem é esta, diante de sua amada dama? – ela disse – Agora, ouça-me, Steve: devemos procurar Roger O’Farrel, onde quer que ele esteja, pois sou como uma filha para ele, e se ele gostar de você... ora, quem sabe! Mas não fale de casamento, até que eu esteja mais velha e tenha tido muito mais aventuras. Agora, seremos verdadeiros camaradas, como temos sido até o momento.

- E um camarada deve permitir um beijo honesto. – eu disse, olhando para o mar, onde o navio se aproximava majestosamente.

E, com uma risada suave, ela ergueu seus lábios até os meus.


FIM




(*) – Jolly Roger: Nome dado às bandeiras piratas, com fundo preto e uma caveira branca com dois ossos cruzados (Nota do Tradutor).




Tradução: Fernando Neeser de Aragão.

Fonte: http://en.wikisource.org/wiki/Black_Vulmea's_Vengeance/The_Isle_of_Pirate's_Doom
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