Carta de Robert E. Howard a August Derleth (9 de maio de 1936)

Prezado Sr. August

Estou mesmo sentido em saber de mortes em sua família. Morte na velhice é inevitável, mas eu ainda acho que é muito mais trágico do que morrer jovem. Quando um homem morre jovem ele evita muito sofrimento, mas o velho tem apenas a vida como posse e me parece que prantear uma perda com dedos velhos e encarquilhados é mais trágico do que a retirada da vida na flor da idade. Eu não quero viver até ficar velho. Eu quero morrer no meu tempo, rápido e de repente, no auge de minha força e saúde.

Muito obrigado por "Retreat to Nature". Você colocou em palavras, vívida e fortemente, o que eu tentei dizer, do meu jeito atrapalhado, muitas vezes – para zombar de várias falsas atitudes. Vou andar com seu artigo na mão e brandi-lo na cara deles da próxima vez, ao invés de calá-los com os meus ímpetos ferozes como costumo contemplar. Sempre me deu hidrofobia ao ver algum hipócrita arrogante gracejando: “Derrotismo!” sempre que ele vê algo que ele mesmo não se importa de fazer. Eu admito que raramente comungo com a natureza; as únicas vezes que eu passeio por entre as árvores são quando estou procurando um trago mais forte de bebida. Embora eu tenha crescido no interior, minha ignorância sobre árvores, animais, etc., é irritante até mesmo para mim. Mas eu admito de coração uma certa familiaridade com coisas primitivas, e tenho apenas respeito por defensores e amantes da natureza. Ao inferno com psicólogos e psicanalistas da cidade e todas essas aberrações de nossa podre civilização. Eles têm vivido entre o concreto e cascalhos há tanto tempo que esqueceram suas origens. Eles deviam acordar cedo, antes do nascer do sol, e andar sobre a grama descalços algumas manhãs, apenas para obter uma experiência diferente. Uma vez eu escrevi um verso no qual tentei expressar meu ressentimento:

Vocês construíram um mundo de papel e madeira
Cultura e culto e mentiras;
A cobra alterou seu sibilo
Ou o fogo nos olhos do tigre?

Vocês se afastaram dos vales e colinas e enchentes
Vocês se mantiveram afastados,
Esquecendo a terra que alimenta o sangue
E a garra que encontra o coração.

Vocês se gabam de ter silenciado o apelo da luxúria
Do negro macaco ancestral,
Mas a vida, a tigresa que mora em vocês
Nunca mudou sua forma.

E uma estranha forma vem aos seus mágicos prados
Com fixa e negra carranca de símio
Mas vocês não saberão e nem se protegerão
Até que suas torres comecem a cair

Eu esqueci o resto, o que é indubitável, do mesmo modo. Fico feliz de saber de suas vendas e dos livros publicados. Eu não tenho escrito nenhuma história sobrenatural por quase um ano, embora eu tenha estado contemplando uma negociação com a expedição de Coronado no Staked Plains, em 1541. Um bom tema, se eu puder desenvolvê-lo.

Gostei um bocado de seu "Lesandro's Familiar". Foi a melhor saída na edição, embora não tão brilhante. Gostei mesmo do poema de Smith, e de Kramer. Ignore meu próximo Black Canaan. Começou de modo comovente, baseado na verdadeira Canaan, que fica entre Tulip Creek e Ouachita River no sudeste de Arkansas, a terra dos Howards, mas eu cortei tanto as suas vísceras, em resposta aos apelos do editor, que a sua forma publicada não lembra o tema original, tecido sobre a misteriosa forma de Kelly the Conjureman, que era a verdadeira personagem, de volta aos setenta – um gigante de ébano com argolas de cobre nas orelhas e poder mágico para aparecer e desaparecer do nada, numa noite escura quando as corujas piam nos galhos e o vento geme entre as negras choupanas.

Obrigado pela fotografia. Gostei. Você ostenta um tipo de sorriso, sinistro e bem humorado, como se tivesse acabado de detonar uma crítica contra uma parede. Estou revidando anexando meu último disparo.

Cordialmente,

Bob.


PS: Você pode ver o pé-de-menta logo a oeste da janela da cozinha, acredito que ela possa fazer o melhor juleps (*) do mundo. Meu método de fazer juleps não é convencional, mas ele me satisfaz, e não estou tentando agradar ninguém mais, como uma vez eu profanamente disse a um kentakiano que criticou minha técnica. Eu coloquei um pouco de menta moída no amargo uísque e, um certo tipo elevação alcoólica enriquece muito seu sabor.



Tradução: Marisa Queiroz

Fonte: "http://en.wikisource.org/wiki/May_9,_1936_to_August_Derleth"



(*) Uísque americano servido com hortelã-pimenta.
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