Era Hiboriana: Para o Styx e Al�

por Dale E. Rippke
em 13/11/2005
Originalmente publicado em REHUPA # 189 e 193


Stygia e os Reinos Negros de Kush  

(pesquisado e criado por Dale E. Rippke)

Foi com grande expectativa e um entusiasmo módico, que finalmente abri minha cópia de “A Vinda de Conan, o Cimério”, de Del Rey. A longa espera acabara. Eu finalmente consegui ver os dois mapas da Hibória, desenhados pela mão de Robert E. Howard, o criador daquele mundo, em 1932.

Ambos os mapas foram desenhados à mão, e eles parecem uma projeção de mercador da Europa e Norte da África.

Os dois mapas, o esboço de 1932 e o definitivo do mesmo ano, embora largamente idênticos, contêm diferenças interessantes. Ambos os mapas são desenhados em latitudes levemente diferentes. O esboço de 1932 mostra parte da nação meridional da Stygia, enquanto relega nações ao norte (Nordheim e Hiperbórea) a meras áreas fronteiriças. O mapa final de 1932 reverte isto, mostrando a maior parte das nações do norte, enquanto tira aproximadamente toda a Stygia do mapa, com exceção de sua fronteira setentrional, o Rio Styx. Outras diferenças incluem o tamanho e a localização de Turan e do Mar Interno (Vilayet), assim como as áreas fronteiriças entre Argos, Koth e Shem, bem como entre Zingara e as Terras Pictas.

Em 1936, Howard recebeu uma carta de um fã, P. Schuyler-Miller, contendo um mapa do mundo hiboriano que ele e o Dr. John haviam criado. Howard afirmou que o mapa deles estava surpreendentemente exato, considerando os dados vagos neles incorporados. Tendo desenhado uns poucos mapas em minha vida, sinto-me à vontade para dizer que a exatidão mostrada pelos dois fãs foi, em sua maior parte, devido às relações cartográficas entre os vários países hiborianos, e não tanto com relação ao tamanho e forma de cada nação. Seria, de fato, esclarecedor examinar este mapa de fã. Infelizmente, ele parece ter desaparecido com a morte de Howard.

Howard endereçou a matéria do mapa dos fãs, e sua coleta sobre a cartografia do mundo hiboriano, em sua resposta à carta de Schuyler-Miller: “Eu tenho o mapa original – aquele que eu desenhei quando comecei a escrever Conan – (...) aqui em algum lugar, e vou tentar encontrá-lo para mostrar-lhes. Ele inclui somente os países a oeste de Vilayet e ao norte de Kush. Jamais tentei mapear os reinos do sul e do leste, embora tenha na minha imaginação um esboço razoavelmente nítido da geografia desses lugares. Entretanto, sinto uma certa liberdade em escrever sobre eles, já que os habitantes das nações hiborianas ocidentais ignoravam os povos e países do sul e do leste, assim como os povos da Europa medieval ignoravam a África e a Ásia. Ao escrever sobre as nações hiborianas do oeste, eu me sinto confinado aos limites das fronteiras inflexíveis e dos territórios conhecidos, mas ao inventar o resto do mundo, sinto-me capaz de dar asas à minha imaginação. Isto é, tendo adotado uma determinada concepção de geografia e etnologia, sinto-me compelido a me ater a isso, pelo bem da consistência. Minha concepção de leste e sul não é tão definida, nem tão arbitrária”.  

Parece que a representação cartográfica de Kush perturbou Howard, vez que ele sentiu a necessidade de explicá-los sua visão: “Tratando-se de Kush, porém, este é um dos reinos negros ao sul da Stygia, o mais setentrional na verdade, e emprestou seu nome a toda a costa meridional. Assim, quando um hiboriano fala de Kush, geralmente não está falando do próprio reino, nem de um dos muitos reinos semelhantes, mas da Costa Negra em geral. E é provável que fale de qualquer homem negro como sendo um kushita, seja ele um keshaniano, um darfariano, um puntiano ou o próprio kushita. Isto é natural, pois os kushitas foram os primeiros negros com os quais os hiborianos tiveram contato – piratas barachos que traficavam com eles e os atacavam”. Seria interessante ver o que os fãs erraram sobre a cartografia de Kush. Isto soa como se eles tivessem acabado de fazer da nação de Kush um lugar maior e mais longínquo do que Howard imaginou ser.

Howard respondeu à carta de fã, enviada por P. Schuyler-Miller, com uma versão atualizada de seu mapa do mundo hiboriano, detalhando as localizações de um número de cidades, assim como adicionando um par de países (Khauran e Khoraja). Ele também mostrou a direção de diversas cidades e países fora do mapa, usando indicadores. Este é o mapa que foi incorretamente identificado como sendo o mapa criado por P. Schuyler-Miller em “Gazeta do Mundo Hiboriano de Conan”.

O MAPA LANY  

Dois anos após a morte de Howard, em junho de 1936, a LANY Corporation publicou um livreto intitulado A ERA HIBORIANA. Seu conteúdo inclui o ensaio de Howard “A Era Hiboriana”, assim como “Um Possível Perfil da Carreira de Conan”, por P. Schuyler-Miller e o Dr. John D. Clark. O livreto também continha um mapa das terras hiborianas, desenhado por Miller e Clark, e baseado no mapa que Howard lhes enviara pelo correio. O mapa LANY foi o primeiro da Era Hiboriana visto pelo público, e desde então tornou-se a base de todos os mapas produzidos ao longo das décadas.

Então, qual a precisão dele?

Para a maioria, ele é quase um remendo. Enquanto eu não iria ao ponto de dizer que eles traçaram o mapa de Howard, as diferenças entre os dois são mínimas. O mapa LANY não mostra o mundo tão distante ao norte quanto o mapa de Howard, mas ele realmente mostra vários rios, assim como a nação da Stygia e as terras ao sul dela, algo que o mapa de Howard perde. Em essência, Miller e Clark conjuraram a seção sul do mapa fora de pistas e alusões nos textos, e enxertaram o resultado sobre seus mapas. Ao sustentarem que o mapa LANY foi baseado em um mapa preparado por Robert E. Howard, eles deram a impressão de que cada representação do mapa deles teve sua origem no mapa de Howard, uma impressão que simplesmente não é verdade.

Então, mais uma vez, a pergunta parece ser: Qual a sua exatidão?

A resposta seria: “Razoavelmente próximo, mas parece haver alguns problemas sérios com ele”.


Stygia e a disposição dos Reinos Negros

Uma porção do mapa LANY de 1938, desenhado por P. Schuyler-Miller e o Dr. John D. Clark.

O maior problema com os mapas LANY parece estar ao longo da divisa sul da Stygia. Miller e Clark mostram uma disposição de nações em fileiras, compreendida por (oeste para leste) Kush, Darfar, Keshan, Punt e Zimbabo. Uma leitura cuidadosa dos contos de Conan dissipará bastante a maneira como a relação entre as nações é exposta. Curiosamente, eles parecem mesmo ter ignorado a própria carta de Howard para eles, na qual ele estabelecera que Kush era a mais setentrional das nações negras.

Eu especularia que a razão criada por Miller e Clark era dupla. Primeiro, eles estavam escoando todo o espaço inferior do mapa, para mostrar as relações apropriadas entre as nações. Segundo, eles sentiram a necessidade de exibir, no mapa deles, todas as nações negras que Howard tinha exposto na saga de Conan. Na minha opinião, o amontoado de nações negras foi a solução óbvia para estes dois problemas, matando dois pássaros com uma só pedra (ou, em Português: matando dois coelhos com uma cajadada só – Nota da Tradutora).

Quando Howard disse a P. Schuyler-Miller que o mapa estava surpreendemente preciso, ele estava de fato se referindo às terras hiborianas, uma vez que ele notou que a versão deles de Kush tinha problemas. Na época do mapa, “Pregos Vermelhos” não tinha sido publicado; então não era fonte de informação. “O Vale das Mulheres Perdidas” e os fragmentos “Os Tambores de Tombalku” e “O Focinho nas Trevas” não estavam disponíveis para estudo. A maior parte de suas informações teria vindo de “A Rainha da Costa Negra”, “O Colosso Negro”, “A Sombra Deslizante”, “As Jóias de Gwahlur” e “Sombras em Zamboula”. Os outros contos de Conan contêm porções e pedaços de informações sobre as terras negras, mas sem dados geográficos reais. Nós sabemos que as terras negras no mapa de Miller/Clark estavam erradas, por causa dos problemas que Howard teve com a maneira como eles apresentaram Kush. Isto significa que a fileira retrabalhada de nações negras, aparecendo sobre o mapa LANY está baseada em informações incompletas, e realmente não seria jamais aprovada por Howard em nenhum sentido.

Robert E. Howard deixou para trás bastantes informações não-publicadas sobre a relação entre a Stygia e os Reinos Negros. Uma vez que Miller e Clark perderam o acesso a este material e não o incorporaram no mapa deles, vou examinar o material, visando resolver seus problemas cartográficos. Com alguma sorte, posso conseguir esta parte de seu mundo hiboriano mais próxima daquilo que Howard visualizou.

O SUBCONTINENTE MERIDIONAL  

A chave para entender as relações cartográficas entre Stygia e os Reinos Negros ao sul, pode se originar apenas de uma compreensão de como Robert E. Howard visualizou a área em sua mente. O continente moderno, conhecido como África, era muito diferente durante a Era Hiboriana de Howard. Embora, em outros aspectos, ele não seja de todo diferente.

A partir da perspectiva de placas tectônicas, durante a Era Hiboriana, a orla oeste da placa africana foi achatada, submergindo quase toda a África Ocidental. Desde que a placa continental seja razoavelmente rígida, qualquer divisa achatada resultaria em uma elevação correspondente ao longo da divisa oposta. E, de fato, nós vemos evidência de uma elevação leste no mapa de Howard: o Mar Vermelho, o Golfo de Aden e o Golfo Pérsico não existem, enquanto a área aparece acima do nível do mar. Além disso, a divisa norte da placa africana é mostrada experimentando uma elevação extrema: o Mediterrâneo e o Mar Negro estão completamente acima do nível do mar. Permite-se argumentar que a divisa sul da placa africana é comprimida a um grau correspondente. Enquanto Howard na verdade nunca visita esta área, ele faz menção a grupos de ilhas que se situam bem ao sul de Kush nesta região.

Com relação ao clima, o sub-continente ao sul das terras hiborianas não é na verdade tão diferente da África moderna. A grosso modo, a África tem um cinto de florestas chuvosas que se encontram a 10 graus em qualquer lado do equador, e duas faixas de pastagens e savanas a cerca de 10 graus de largura, situadas a norte e (a um menor grau) sul das pastagens. Há um pouco de variação, mas no geral a Stygia de Howard e os reinos de Kush refletem esta realidade.

É bastante óbvio, a partir da leitura dos contos howardianos de Conan, que a maioria das nações negras de Kush estejam localizadas em vários lugares ao longo das grandes pastagens que se situam ao sul da Stygia. É a relação entre aquelas nações que define a cartografia de Kush, e é o próximo passo em nossa jornada.

STYGIA 


A porção stígia do esboço do mapa, como desenhado por Robert E. Howard

O melhor lugar para começar é com o mapa, esboçado em 1932. Uma comparação deste mapa com o mapa LANY, mostra que a versão de Howard sobre a Stygia é mais ampla, estendendo-se desde as cidades modernas da Tunísia, a oeste, até a Faixa de Gaza, a leste; uma distância de uns 2430 km. O mapa LANY tem as divisas norte e leste da Stygia terminando dentro da planície aluvial do Rio Styx, enquanto o mapa de Howard tem a divisa oriental da Stygia estendendo-se rumo leste, cerca de 320 km passada a dobra sul do rio. O mapa LANY mostra que a Stygia é uma nação bastante retangular, medindo cerca de 640 km de norte a sul. O mapa esboçado em 1932 não mostra, de modo algum, a divisa sul da Stygia: o que ele faz é mostrar uma nação que se estende na direção sul, no mínimo 960 km, bem dentro da área ocupada pela fileira das nações negras no mapa LANY.

Isto se ajusta bem, dentro da maneira como Howard descreveu a Stygia nas histórias de Conan. “A Hora do Dragão”, “O Colosso Negro” e “A Era Hiboriana”, todas descrevem a divisão norte da Stygia (em toda a vida de Conan) como começando no Rio Styx. A única discrepância que achei entre o mapa e as histórias de Howard é que, em “A Hora do Dragão”, Howard descreve o Styx como fluindo a oeste para a grande curva por “algumas centenas de milhas”. No mapa, o rio flui na direção oeste por cerca de 1000 milhas (o equivalente a 1609 km – Nota do Revisor). Se isto é uma discrepância ou não, depende de como você interpreta o termo “algumas centenas de milhas”.

A divisa leste da Stygia é um pouco mais sombria. “Sombras em Zamboula” descreve Zamboula, a cidade comercial do deserto, a qual se situa a leste da Stygia. A cidade foi construída pelos stígios e, por um tempo, foi o mais oriental posto fronteiriço de seu império, esculpido no Deserto de Kharamun, até que a cidade fosse invadida e anexada pelos cavaleiros de Turan. Os limites stígios foram empurrados para trás, quando eles perderam Zamboula, porém Howard nunca afirma que os stígios se retiraram para além do Rio Styx. A extensão leste da Stygia ultrapassa a direção sul da dobradura do Styx, que possivelmente ainda existia na época da vida de Conan. Faz sentido que os stígios quisessem conservar ambos os bancos do Styx nesta região sob o controle deles, uma vez que seria uma estrada comercial dentro dos Reinos Negros. O mapa esboçado em 1932 mostra que a extensão leste corre grosseiramente paralela ao Styx, estreitando-se gradualmente na direção sul. Enquanto nunca soubermos com certeza absoluta, parece lógico achar que a extensão vai tão longe quanto a fronteira sul da Stygia, embora apenas uns 80 quilômetros rumo ao leste, após o Rio Styx.

Meu próximo passo seria julgar e discernir a total forma e extensão da fronteira sul da Stygia. As histórias de Conan fazem menção apenas de duas terras situadas sobre as pastagens ao sul da fronteira da Stygia; o reino de Kush e a região conhecida como Darfar. Kush situa-se ao longo da parte oeste da fronteira sul da Stygia, dividindo um limite de, no mínimo, 640 quilômetros. A parte da fronteira da Stygia que se situa adjacente a Darfar é um pedaço de um quebra-cabeça, porém uma leitura cuidadosa de “Pregos Vermelhos” fornece umas poucas pistas.

Valéria passou diversas semanas (presumivelmente menos que uma quinzena) em fuga, após deixar a fronteira da guarnição de Sukhmet, atravessando uma faixa de colinas azuis (azul sugere arborizada), para chegar à floresta primitiva próxima a Xuchotl. Compare isto com a fuga anterior para Xuchotl.

Ao sul da Stygia, situa-se o Lago Zuad, próximo à fronteira de Kush (e não dentro da mesma). Residentes do lago, uma raça de stígios mestiços, chamada de tlazitlanos, se rebelaram contra o rei stígio e foram forçados a fugir na direção sul por muitas semanas, vagando pelas primeiras pastagens, então morros desérticos, chegando finalmente a uma grande floresta; a mesma floresta de Darfar que se situa logo ao sul da cidade stígia de Sukhmet. Agora parece bastante evidente para mim que a jornada de muitas semanas pôde cobrir no mínimo algumas centenas de milhas. Também a parte sul da Stygia, ao longo da fronteira de Darfar, situa-se dentro da região de pastagens. Tudo isso serve para fazer a fronteira stígia com Darfar situar-se bem mais longe ao sul que a fronteira dela com Kush. O mapa LANY que mostra Kush e Darfar compartilhando uma fronteira está errado!

A fronteira stígia ao sul parece seguir a divisa com Kush, vira-se em direção ao sul e contorna um grande deserto que se situa acima das pastagens do oeste, e então reassume sua direção leste, até terminar nos desertos além do Rio Styx. Darfar situa-se ao sul desta seção oriental da divisa.

KUSH  

Howard descreve Kush como sendo tanto o mais setentrional quanto o mais ocidental dos reinos das pastagens. Sua capital é Shumballa, que se situa no meio das grandes planícies de pastagens da nação. Kush é a segunda nação listada dos quatro “vastos reinos negros”, situados ao sul da Stygia; então ele é provavelmente o segundo maior dos reinos negros. A Kush dos dias de Conan é, contudo, um vestígio de uma nação kushita bem maior, formada quando tribos stígias invadiram e ocuparam as pastagens ocidentais e o deserto. Finalmente, os stígios foram incapazes de exercer o constante controle que a região precisava para não cair na anarquia, e a nação se dissolveu. Kush é agora considerado um reino negro, apesar de sua aristocracia ser Chaga, de descendência stígia. Das histórias situadas na época de Conan, parece que seu limite ao norte se estende numa estreita faixa paralela à fronteira stígia de uma costa arborizada no Mar do Oeste, para leste no mínimo uns 640 km. Ao sul do segmento oriental desta faixa, situa-se um enorme deserto. A nação se estende na direção meridional, ao longo da costa, até alcançar as florestas chuvosas da região. Sua divisa leste não é de fato definida, apesar de sua fronteira sudeste situar-se nas pastagens distantes da cidade de Bakalah, na selva. Eu acredito que a fronteira oriental de Kush termine mais provavelmente na orla do grande deserto que se situa a leste dela.

KORDAFAN  

Kordafan é um reino negro independente, mencionado na sinopse “O Focinho das Trevas”. Quando L. Sprague DeCamp e Lin Carter terminaram a história para os livros Lancer, eles rebatizaram a nação de Kordafa, mesmo que Howard a tenha escrito Kordafan. A disposição cartográfica da nação não é dada, apesar de seu povo ser descrito como tendo um tom escuro de pele. Isto implica que o país tem, no mínimo, um componente stígio. Kordafan é provavelmente um vestígio da ocupação stígia original das pastagens a oeste, talvez uma parte da Kush stígia.

O DESERTO MERIDIONAL  

Este vasto e desolado deserto situa-se a leste de Kush e cobre uma grande expansão da região oeste das pastagens. Howard usou o deserto como o cenário de “Xuthal da Escuridão”, colocando a cidade perdida de Xuthal bem dentro da região oeste. O deserto foi novamente palco, no fragmento interminado que se tornaria finalmente conhecido como “Os Tambores de Tombalku”. Exilados kothianos construíram a cidade de Gazal sobre um oásis na parte leste do deserto, enquanto no distante sudoeste situa-se a cidade politicamente dividida de Tombalku. É também o lar das tribos nômades do deserto: os ghanatas, a leste, e os mascarados tibus, bem ao sul. A extensão total deste deserto é um pouco nebulosa. Howard, em seu fragmento “Os Tambores de Tombalku”, tem o guerreiro aquiloniano Amalric (que esteve perambulando pelo deserto durante meses, mas na verdade acampado a um palmo da origem fronteiriça) expressando descrédito de que houvesse uma cidade nos arredores, estabelecendo que ele pensava haver apenas um deserto por mil milhas. Esta é uma afirmação bastante incrédula, vez que parece envolver a possibilidade de que o deserto esteja em algum lugar entre mil e duas mil milhas de lado a lado (dependendo de onde ele esteja acampado). Isto parece ser evidentemente impossível, vez que faria o deserto ser duas vezes mais extenso que a nação da Stygia. Honestamente, um deserto de duas mil milhas (3218 km – Nota do Revisor) de largura se estenderia do leste de Kush até o oceano além do Iranistão, para não mencionar o completo deslocamento da região de Darfar. Enquanto acredito que Howard pretendia que este deserto parecesse enorme, minha opinião é de que Amalric está preso a uma quantidade razoável de exagero. O deserto parece ser compassado por Kush a oeste e norte, Stygia a nordeste, Darfar e Amazon a leste, e um segmento de pastagem para o sul, este habitado por várias tribos negras, membros do império de Tombalku.

TOMBALKU  

O império de Tombalku foi formado quando cavaleiros, da cidade semi-mítica de Tombalku, subjugaram as tribos da parte sudoeste do Deserto Meridional e as raças negras das estepes ao sul. Tribos subjugadas abrangiam o Império, incluindo os Tibus, Bagirmis, Mandingos, Dongalas e Bornus, tanto quanto as outras tribos ao sul do deserto. Não parece que Tombalku realmente faça fronteira com quaisquer outros reinos maiores, com exceção de possivelmente Kush.

DARFAR  

Nas pastagens ao sul da Stygia oriental, situa-se a região de Darfar. A verdadeira localização geográfica de Darfar parece estar bem distante da nação de Kush. Como Kush, ela é descrita como sendo parte de uma região de pastagem; contudo, a parte sul da Stygia oriental também situa-se sobre a parte norte daquelas pastagens (a cidade fronteiriça de Sukhmet encontra-se no meio das pastagens horizontais). A parte noroeste de Darfar parece ser parte das pastagens, seguida por uma faixa de colinas, e então a floresta segue para o sul. A floresta, no ponto onde Valéria a cruzou, não parece ser terrivelmente profunda, de norte a sul. Começa ao se deixar os morros; ela ainda podia vê-los, quando olhou para o norte. Isso significa que a floresta tinha, no máximo, 48 a 56 km de extensão, quando ela a cruzou, vez que ela terminou um pouco ao sul de seu ponto de vantagem. Em meio à parte sul da floresta, situa-se a cidade perdida de Xuchotl. A oeste da floresta, situam-se savanas abertas, onde tribos negras pastam seus gados. “Sombras em Zamboula” também descreve os habitantes de Darfar como sendo “homens negros da linhagem dos pântanos”; então, eu imagino que uma parte enorme do leste de Darfar sejam terras de pântanos e mangues. Eu também acho interessante que nem Conan nem Valéria acreditam que os darfarianos pudessem ter construído a cidade de Xuchotl (embora eu deduza que eles o fizeram sob pressão), mas esperavam ver cortiços, cabanas ou habitações nos rochedos; ou seja, povoados. Darfar meridional é também mencionada no conto como uma região inexplorada. Isto se soma à sensação de que Darfar pode não ser uma nação civilizada, mas ao contrário, uma nação habitada e dominada por um grupo cultural, como a Ciméria ou os Sertões Pictos. Eu também acho que o Rio Styx, ou flui através, ou marca a divisa leste de Darfar. O grande número de escravos de Darfar que acabaram em Zamboula, também faria sentido, pois seria uma viagem relativamente curta rio abaixo.

AMAZON  

Amazon é mencionado apenas no ensaio “A Era Hiboriana”, de Howard. É a primeira nação listada dos quatro “vastos reinos negros”, situando-se ao sul da Stygia; Amazon poderia ser muito bem o maior país das terras negras. O ensaio também estabelece que, no final da Era Hiboriana, os exércitos da Hirkânia derrotaram um exército stígio no Nilus (Styx) e “percorreram o país [Stygia] bem longe ao sul, para o reino negro de Amazon, de cuja população eles trouxeram de volta milhares de cativos”. Isto implica que a nação de Amazon está, se não adjacente à fronteira sul da Stygia, então relativamente perto! Amazon, como descrito por L. Sprague DeCamp em seu conto “Conan, O Bucaneiro”, situa-se longe demais ao sul para ser fiel a Howard, vez que os hirkanianos teriam tido que atravessar toda a distância da floresta chuvosa equatorial para invadir o país. Acho que para ser fiel a Howard, a melhor localização de Amazon seria diretamente ao sul de Darfar. Sua orla oeste seria a parte sudeste do Deserto Meridional, se estendendo pra dentro da floresta úmida. De norte a sul, sua divisa leste seria o Rio Styx. Sua divisa sul está provavelmente bem mergulhada na floresta equatorial úmida.

KESHAN

Keshan é um reino bárbaro situado nos sertões orientais do continente, onde as vastas pastagens se fundem com a floresta chuvosa. Sua cidade real é chamada de Keshia. Apesar de ter conquistado um par de nações tributárias, Keshan é um reino razoavelmente menor, e é considerado mítico para as civilizações do norte e oeste. Uma leitura cuidadosa do conto de Conan “As Jóias de Gwahlur” desmente a noção avançada sobre o mapa LANY, de que Keshan situa-se nas pastagens do norte e compartilha uma divisa com a Stygia. A nação é descrita como situando-se primariamente nas pastagens do sul; sua parte meridional contida com selvas equatoriais que vêm do sul. A única divisa que foi definida dentro dos escritos de Howard é a fronteira oriental com Punt, embora tenhamos dito que Zimbabo situa-se tanto ao leste quanto ao sul de Keshan. Parece-me que a fronteira oeste de Keshan pode muito bem terminar no Rio Styx, vez que uma localização nos “sertões orientais” implica que ela é localizada nas pastagens orientais daquele importante curso d´água. Outro ponto a ser considerado seria que o sagrado rio subterrâneo que corre abaixo de Alkmeenon, no sul de Keshan, teria que fluir “sob” o Rio Styx, se o país fosse localizado como está no mapa LANY, vez que sua origem está em Punt. Uma localização keshaniana a leste do Rio Styx alivia este problema, enquanto o rio subterrâneo torna-se meramente um outro tributário do Styx.

IRANISTÃO

O Iranistão, enquanto mostrado no mapa, é realmente parte do “Leste Azul”, de Howard, e como tal será tratado quando eu examinar aquela área em um artigo futuro.

PUNT

Punt realmente não é muito bem descrito na saga de Conan. É um reino montanhoso que situa-se na parte leste das terras negras. Os habitantes de Punt cultuam uma deusa de marfim e extraem ouro de seus rios em cestas de vime. Há um lago onde o povo das terras altas puntianas atira seus mortos. Ele desemboca num rio subterrâneo que flui ao sul de Keshan. Punt parece ser uma nação isolada, guerreando freqüentemente com Keshan e provocando Zimbabo pela quebra de suas rotas comerciais. Punt compartilha sua fronteira oeste com Keshan e as fronteiras leste e sudeste com Zimbabo. Provavelmente também divide a fronteira nordeste com a nação oriental do Iranistão.

ZIMBABO

Zimbabo é descrito nas estórias como a grande nação comercial dos Reinos Negros. É um reino “híbrido”, o que eu interpreto como sua população étnica sendo misturada racialmente: um reino negro com fortes componentes iranistaneses e shemitas. A última nação listada dos “quatro vastos reinos negros” situados ao sul da Stygia, Zimbabo é mais provavelmente o quarto maior país das terras negras. O comércio é de máxima importância e a nação constrói fortalezas comerciais ao longo das rotas de caravanas de nações estrangeiras, como Punt. Zimbabo é bem situada para o comércio marítimo com nações como Kosala e Vendhia, e possivelmente até tão longe a leste quanto Khitai. Zimbabo divide sua fronteira nordeste com o Iranistão, sua fronteira norte com Punt e possivelmente parte de sua fronteira sul com Atlaia.

ATLAIA

Atlaia é mencionada apenas no ensaio de Howard “A Era Hiboriana”. Sendo ela a terceira nação enumerada dos quatro “vastos reinos negros” situados ao sul da Stygia, existe possibilidade de que Atlaia seja o terceiro maior país das terras negras. O fato de a nação não ser mencionada na saga de Conan, me leva a crer que ela não seja acessível pelas nações marítimas hiborianas. Isto também seria um argumento contra a localização de um pasto ao norte (presumivelmente entre Darfar e o Iranistão), uma vez que deveria ser bem conhecido por stígios e outros. Contudo eu a estou colocando nas savanas e regiões lacustres a sudeste da úmida floresta equatorial de Kush, adjacente ao sul de Zimbabo. Esta área não é definida de modo algum por Howard, e é antiga, mostrando os primeiros traços do desenvolvimento do homem em Olduvai, na África. Então, parece razoável colocar Atlaia onde a região é mais antiga e a área continuamente povoada.

A COSTA NEGRA

A Costa Negra é um termo, usado pelos marinheiros hiborianos, para descrever o contorno litorâneo do Mar do Oeste ao sul da Stygia, semelhante às suas práticas de chamar todo o subcontinente meridional de Kush. Ela consiste em duas regiões: a região norte, que é a própria nação de Kush, e a meridional, o contorno litorâneo florestal sendo a verdadeira “Costa Negra”. Se haviam quaisquer nações desenvolvidas ou impérios ao longo da faixa do sul, Howard não escreveu sobre eles. Ele mencionou um par de cidades-estado situadas na Costa Negra: Abombi, uma cidade saqueada por Conan e Bêlit; e Suba, uma cidade amigável para os corsários negros. Estas cidades-estado serviram provavelmente, em sua maioria, como interface comercial entre as cidades primitivas e vilas da chuvosa floresta equatorial, e os comerciantes marítimos da Stygia, de Shem e das nações hiborianas. Porém, tomada como um todo, a Costa Negra e sua chuvosa floresta equatorial interna são apenas uma enorme área deserta.

AS ILHAS DO SUL

As Ilhas do Sul são abrigo para um número de reinos insulares, e fornecem o ímpeto e o efetivo humano por trás dos infames Corsários Negros. Os habitantes das ilhas desenvolveram-se isoladamente, e não são de linhagem negróide comum; eles são descritos como tendo traços e cabelos mais retos, assim como sendo de pernas mais longas e membros mais claros do que a média kushita. Os Corsários Negros são descritos em “As Jóias de Gwahlur” como sendo os lobos das costas do sul, o que implica que eles atacavam as costas sul e sudeste tanto quanto a infame Costa Negra, a oeste. As ilhas estão situadas, tanto em “A Rainha da Costa Negra” quanto em “A Hora do Dragão”, como bem distantes ao sul da Stygia. Eu acredito que a menção de Bêlit sobre “os fogos do extremo sul”, se refira à natureza vulcânica das ilhas. Enquanto a maioria dos mapas coloca as ilhas no Mar do Oeste, fora da Costa Negra meridional, eu creio que elas estejam verdadeiramente localizadas na parte sul de Kush continental, devido à placa tectônica meridional africana estar submersa.

Apesar de não haver nenhuma realidade histórica em relação às ilhas, elas aparecem sobre meu mapa como os topos da submersa fileira das Montanhas Drakensberg.

NEGARI

O único país que você não encontrará no mapa de Kush da Era Hiboriana é o reino de Negari. Negari é detalhado no épico howardiano de Solomon Kane “A Lua das Caveiras”. A nação foi outrora uma colônia do império da Atlântida, existindo na Idade Moderna; então, em face disto, Negari deveria ter existido durante a Era Hiboriana. Esta visão é de certo modo problemática, vez que ela contradiz muito do que é deduzido sobre aquela era. Primeiro de tudo, a Atlântida da Era Thuriana foi um reino rude e bárbaro, que nunca alcançou as alturas da civilização relatada na estória de Solomon Kane. Negari também é descrita como situada dentro da Costa dos Escravos, na África ocidental – uma área submersa no mar durante a Era Hiboriana. O único modo de resolver esta inconsistência é pelo entendimento de que há, na verdade, duas versões da Atlântida, propostas por Howard: uma sendo um continente que foi destruído no final da Era Thuriana; e a outra foi uma civilizada nação insular, que existiu durante o cataclismo que acompanhou a Era Glacial subseqüente ao fim da Era Hiboriana. Negari não era parte de Kush até bem depois de toda a vida de Conan (*).

* * *

A etapa final neste artigo é produzir um mapa das regiões meridionais, que reproduza a Stygia exatamente como ela aparece no mapa esboçado por Howard em 1932, e colocar as nações de Kush em suas posições apropriadas, como deduzidas a partir das estórias. O resultado final é o mapa que acompanha este artigo.

 

(*) - Embora respeite a opinião de Dale Rippke, não creio que o reino de Negari tenha surgido bem após a Era de Conan. Talvez, nos séculos que separam a Era de Kull do Grande Cataclismo, parte da Atlântida tenha se civilizado e fundado, após o Cataclismo, o reino de Negari numa ilha a oeste dos Reinos Negros – e não no coração destes, como nas edições 133 e 134 da ESC (Nota do Revisor).

Tradução: Gysa Antony de Aragão.

Revisão: Fernando Neeser de Aragão (fernando_arag@yahoo.com.br e fernando.neeser2@bol.com.br).

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