Prisioneiro na Hiperbórea

(por Fernando Neeser de Aragão)



Introdução:

Ferido em uma escaramuça, Conan acorda com uma jovem de beleza estonteante agachada ao seu lado. O cimério é atacado pelos Gigantes de Gelo, irmãos da moça, e os mata... mas cai inconsciente devido a um raio de fogo vindo do céu – enviado pelo pai deles, o deus vanir/aesir Ymir. Quando desperta, ele está com um pedaço das vestes da jovem preso em seu punho (A Filha do Gigante de Gelo – site http://cronicasdacimeria.blogspot.com/2006/05/filha-do-gigante-de-gelo.html).


O sol se põe num lívido lamaçal de nuvens escarlates e arde sobre a neve pisoteada, onde imóveis formas escuras jazem em poços mais vermelhos que o crepúsculo.

Pela planície nevada, ecoam os últimos clangores metálicos de uma batalha, onde o entrechocar de armas se mistura ao gemido de esforços hercúleos e de moribundos sobre o chão. Nesta batalha que se encerra, o velho Gorm cruza espadas com um veterano guerreiro vanir, cuja barba ruiva há muito ficara grisalha pela idade. Aparando um golpe numa finta enganadora, Gorm acerta o lado de seu adversário num giro sangrento. Ao vê-lo cair ao chão, o velho aesir termina de matar o vanir, decepando-lhe a cabeça num segundo arco vermelho, a produzir um espirro escarlate sobre a neve.

Ao girar para olhar ao redor, Gorm presencia o jovem Conan enfrentando um adversário de barba tão ruiva quanto a de qualquer vanir, e quase tão jovem quanto o aliado moreno dos aesires. Nos primeiros e vigorosos golpes, a ofensiva de ambos é sempre maior que a defensiva. Após várias colisões de espadas, o cimério derruba o ruivo ao chão com um chute de seu pé encouraçado na barriga do jovem vanir. Este, tão rápido quanto Conan, esquiva-se de um golpe descendente de espada do cimério e se ergue de um pulo, como um enorme felino, para, mais uma vez, trocar golpes de estrépito metálico com o adolescente moreno.

Após alguns instantes de colisões de armas, o ruivo cambaleia, devido a um giro sangrento da espada de Conan, o qual lhe decepa o braço da espada. No momento seguinte, antes mesmo que o jovem possa pegar sua arma com o braço esquerdo, ele tem seu colete de malha e coração atravessados por uma única estocada do cimério, cuja ponta da espada se sobressai entre as costas do último vanir daquela escaramuça.

Niord, Gorm, Horsa e todos os demais aesires ali presentes olham para Conan, com sorrisos de orgulho entre suas barbas loiras.

- Por Ymir, Conan! – exclama o velho Gorm ao cimério. – Desde que você chegou até nós, só tivemos vitórias contra os cães ruivos de Vanaheim!

De fato, com seu novo aliado da Ciméria – o qual, acostumado a rastrear lobos nas florestas escuras de sua terra natal, não tinha nenhuma dificuldade em ver tênues rastros de vanires sobre as neves ensolaradas de Asgard (além de possuir uma cota-de-malha mais longa e protetora que a de qualquer nordheimer) –, os aesires tiveram pouca dificuldade em expulsar os incursores ruivos de volta para Vanaheim – bem como em saquear algumas tribos vanires. Assim, enquanto Horsa guia seus homens – assim como a relutante Gullvia, filha caçula do velho Gorm – para protegerem a primeira tribo aesir que Conan visitara, perto da fronteira oeste, Niord lidera seus guerreiros para um ataque-surpresa à Hiperbórea, uma nação civilizada a leste de Asgard e que, de vez em quando, durante séculos, captura mulheres aesires para escravizarem.

Supersticioso como todos do seu povo, e sabendo que havia perseguido – e quase violentado – uma deusa filha de Ymir, Conan da Ciméria já havia jogado fora o véu de Atali que lhe ficara nas mãos. Agora, nenhum aesir duvidava que aquele adolescente de cabelos negros houvesse encontrado a Filha do Gigante de Gelo. Nesse meio tempo, entre uma batalha e outra contra os vanires, Conan já consertara, numa forja, o próprio elmo, que Heimdul golpeara antes do cimério matá-lo. E, durante estes mesmos intervalos, o cimério – cujo povo só bebe água e hidromel – aprendeu a gostar de cerveja, além de continuar fazendo amor com a bela Gullvia, dos cachos dourados.

* * *

Svarog é a primeira cidade em que o cimério vê na vida; semelhante ao que o avô lhe descrevera em alguns aspectos – altos muros de pedra com ameias, portões de bronze levemente oxidados e muita gente circulando dentro das muralhas e por cima das mesmas –, e diferente em outros – especialmente um –: no meio dela, uma construção, com torres cilíndricas e cúpulas espiraladas nos topos das torres. Aquilo o deixa boquiaberto e deslumbrado.

Os mercadores que saem da cidade hiperbórea de Svarog usam longas túnicas de pele e gorros cilíndricos, também de pele. Os soldados que os protegem usam roupas grossas de pano – a maioria com cotas-de-malha –, botas de couro pintado de amarelo e perneira de pele. Alguns usam gorros de pele, e a maioria usa capacetes de aço; todos estão armados com espadas, machados, escudos cônicos com emblemas de grifos, arcos e balestras. Niord chama a atenção de Conan para aquela arma – um arco-e-flecha com gatilho, cujas setas são capazes de perfurar até mesmo os elmos e cotas-de-malhas que aqueles bárbaros usam.

Além das estranhas roupas e armas, usadas por aqueles hiborianos, outro detalhe não-familiar àquele cimério – que, além dos próprios conterrâneos, já vira pictos, vanires, gunderlandeses e aesires – é a aparência física heterogênea daqueles homens. Suas estaturas variam, assim como a cor de suas peles e olhos. A maioria deles tem cabelos e barbas escuros.

Então, quando aqueles homens adentram uma construção menor, fora dos limites da cidade, Niord dá o sinal para o ataque, e todos os bárbaros saem da tocaia. Nenhum hiperbóreo ali é poupado. Os primeiros a serem mortos são os que usam balestras. Enquanto um dos mercadores de Svarog tem sua cabeça decepada por um giro da espada de Niord, Conan mata um soldado com uma estocada fatal no coração. Ao ver que somente uma viga sustenta o teto – e que boa parte do saque já está nas mãos dos aesires –, Niord grita “Corram!”, ao mesmo tempo em que dá um poderoso chute na viga, causando uma espantosa chuva de incontáveis pedras soltas, rolando e ribombando com um rugido ensurdecedor, esmagando soldados e mercadores hiperbóreos, enquanto Conan e todos os aesires fogem sorridentes dali.

* * *

Finalmente, Conan e seus aliados loiros chegam a uma clareira, do lado oeste da fronteira e dentro de uma pequena floresta, onde descansam.

-Por Ymir, cimério! – sorri o velho Gorm, elogiando Conan mais uma vez. – Tivemos um sucesso e tanto no saque àqueles hiperbóreos da cidade de Svarog. Amanhã, após o ataque a Zoran, capital da Hiperbórea, começarei a lhe ensinar o uso do arco-e-flecha!

Súbito, naquela clareira, Conan e os aesires ouvem passos na floresta ao redor. Aos ouvidos agudos daqueles bárbaros, parecem touros cegos e desconcertados afundando suas patas na neve, de modo que todo o bando de Niord fica com suas espadas de prontidão. Então, sem o menor aviso, setas voam de dentro da floresta, vindas de todos os lados. A grande quantidade de flechas, lançadas a uma enorme velocidade por balestras hiperbóreas – e capazes de perfurar à distância até mesmo as cotas-de-malhas nórdicas –, reduz significativamente o número de aesires.

Então, vários hiperbóreos, a pé e a cavalo, saem até a clareira, convergindo até os bárbaros. Enviados pelo próprio Rei da Hiperbórea em retaliação ao saque aos mercadores de Svarog, aqueles guerreiros civilizados de Zoran estão todos protegidos por armaduras de cota-de-malha com placas metálicas, escudos, capacetes e até máscaras de aço – além de estarem armados até os dentes e a cavalo. Mais flechas zunem, atingindo o corpo do velho Gorm, o qual ainda consegue matar um cavaleiro hiperbóreo antes de morrer. Niord, por sua vez, enfia a espada, até o cabo, em outro atacante montado. Uma ira berserk toma conta do adolescente de cabelos negros, ao ver a morte de um dos seus maiores amigos não-cimérios.

Em poucos minutos, os aesires, sob o comando do experiente Niord, retomam a ofensiva e conseguem fazer aqueles hiperbóreos recuarem, atingindo-lhes os desprotegidos cavalos com flechas e, em seguida, enfrentando seus montadores no corpo-a-corpo. Os poucos sobreviventes civilizados fogem floresta adentro, na direção leste – muitos deles atingidos por flechas aesires nas costas –, enquanto os bárbaros lançam seus brados ferozes de vitória.

Porém, surge repentinamente um novo contingente de soldados hiperbóreos, três vezes maior que o anterior e vindo dos mesmos lugares de onde saíram os primeiros. Dois terços daqueles guerreiros civilizados usam armaduras folheadas a ouro e estão a cavalo, e um terço usa armadura prateada e está a pé – e, desta vez, até os cavalos estão blindados! Os aesires, por serem bárbaros, foram capazes de derrotar a primeira leva, com hiperbóreos na mesma quantidade que eles. Mas aquele povo civilizado, sabendo disso, sempre atacou as fronteiras de Asgard usando a superioridade numérica para matar e capturar um povo mais habilidoso que eles na guerra, e que não conhece o significado da palavra rendição.

Um hiperbóreo a cavalo tenta atingir Conan por trás com uma enorme marreta, mas o cimério se esquiva e decepa o braço armado do cavaleiro. Outro cavaleiro mestiço, de espada em punho, tenta atingir o cimério, mas este lhe agarra as rédeas do cavalo, derrubando o animal sobre a neve e matando seu montador com um golpe preciso de sua espada na jugular do hiperbóreo.

Com movimentos rápidos e desconcertantes, os bárbaros acuados ainda conseguem desmembrar, estocar e decapitar hiperbóreos, em meio a borrifos escarlates. Já sem esperança de sobreviver, o jovem cimério luta, movido apenas pela sombria determinação que os bárbaros têm, de matarem o máximo possível de inimigos antes de morrerem. O adolescente da Ciméria está tão ocupado com o pensamento de matar seus antagonistas, que não percebe quando um hiperbóreo loiro a pé – sem dúvida, um descendente de hiborianos com aesires – lhe atinge por trás o capacete e a cabeça com uma maça, fazendo o jovem cimério cair inconsciente.

***

Nas tavernas de Zoran, a caminho do Palácio Real, homens param de comer carne e beber vodca, para assistirem ao cortejo de guerreiros daquela cidade, a arrastarem nove aesires e um cimério – todos eles totalmente acorrentados; alguns ainda inconscientes, e outros, como Conan e Niord, já despertos e com os olhos azuis ardendo de ódio – o ódio por serem cativos daquele povo de hiborianos mestiços.

Séculos de miscigenação com mulheres capturadas em Asgard, Zamora e Hirkânia fizeram dos hiperbóreos um povo de aparência heterogênea, de modo que o aspecto daquele povo civilizado, das planícies nevadas a leste de Nordheim, varia desde pessoas de estatura médio-baixa, cabelos e olhos pretos e pele morena, até indivíduos altos – alguns destes com pouco mais de 2 metros de altura –, de pele clara, olhos cinzas e cabelos loiros. Pouquíssimos hiperbóreos têm a aparência de hiborianos puros dos ancestrais que fundaram aquele país – e mesmo esta minoria tem vestígios de sangue estrangeiro nas veias, além de se miscigenarem com as loiras de sangue aesir, morenas de sangue zamoriano e/ou hirkaniano e, é claro, pessoas de aparência intermediária (pele moreno-clara, cabelos castanhos e olhos verdes).



De qualquer modo, Conan nota que, entre o povo que o escravizou, há uma classe dominante, de homens altos e magros, de ossos grandes, fala lenta, cabelos escuros e olhos cinzas. Aqueles homens têm, em média, 1m90 de altura, fazendo com que os hiperbóreos sejam a mais alta das raças hiborianas – diferente dos atarracados bossonianos aos quais ele facilmente ajudara a matar, meses atrás no forte Venarium, pouco antes dos cimérios exterminarem aqueles colonos de puro sangue hiboriano, vindos da Gunderlândia (além de serem, em média, ainda mais altos que os próprios gunderlandeses). Aquela aristocracia herdara sua estatura elevada dos hiborianos, aesires e hirkanianos – e destes últimos, os cabelos escuros e compleição esguia.

A religião daquele povo é uma mistura do Mitraísmo – introduzido em todos os reinos hiborianos, desde milênios antes (e somente substituída por outra nos reinos de Koth, Khoraja e Khauran, bem ao sul, onde se adora Ishtar ao invés de Mitra) – com as religiões dos escravos e até mesmo dos hiborianos puros que fundaram aquele reino, milênios atrás. Inicialmente, o deus Mitra era adorado na Hiperbórea como Senhor do Sol e das Amplas Pastagens, e Vitorioso da Última Batalha, e considerado filho de Bori, o deus anterior dos hiperbóreos e Lorde do Vento Setentrional.

Posteriormente, Bori passou a ser considerado um deus ainda poderoso, porém frio e distante; enquanto Mitra, o jovem e vigoroso filho – agora o deus principal –, se tornou Aquele que Venceu a Serpente, o Domador de Bois, o Lorde dos Cavalos e do Trovão. Pequenos elementos dos deuses dos escravos – as divindades Ymir, Tarim, Erlik e Bel – são incorporados ao deus supremo dos hiperbóreos, e os deuses dos escravos se tornam, para e elite local, divindades tão subordinadas a Mitra quanto seus adoradores os são às classes aristocráticas.

Svarog foi a primeira cidade à qual Conan avistou. E Zoran é a primeira à qual o cimério adentra. Qualquer deslumbramento que aquele bárbaro moreno pudesse sentir, ao ver aquelas construções sofisticadas, é superado pela indignação em estar aprisionado. Já é primavera, e ninguém mais anda de patins sobre os lagos ocupados pelo Palácio Real, os quais já estão descongelando. Entretanto, ao saírem às ruas de Zoran, a maioria dos hiperbóreos continua usando seus típicos trajes, os quais consistem em longas túnicas e cilíndricos gorros de pele. Logo, os prisioneiros bárbaros são arrastados para dentro do Palácio Real de Zoran, cuja arquitetura se assemelha bastante à da construção que o cimério vislumbrara na vizinha Svarog.

O Rei Belbog Vladinov, da Hiperbórea é, como a maioria dos nobres daquele país, um homem magro, de pele clara, cabelos escuros, olhos cinzas e ombros largos, tão alto quanto Conan e os aesires que foram capturados com o cimério. Pai de três filhos já adultos – os príncipes Boris, Nevsky e Sergei (este último, pai do recém-nascido Tomar e da pequena princesa Stanka) –, Vladinov é um homem de 40 anos e olhos frios como os de um abutre, mas ainda sem nenhum fio branco em sua barba e cabelos negros. Do alto de seu trono, no mesmo estrado onde se senta sua bela esposa Danika, Vladinov olha com desdém e arrogância para aqueles prisioneiros acorrentados.

Apesar de seu sadismo e arrogância, o rei da Hiperbórea é respeitado por seu povo como guerreiro, por sua ferocidade contra os invasores turanianos e aesires, e como governante por não tolerar o crime entre seu povo. Desde que subira ao trono, ergueu numerosos templos dedicados a Mitra, deus da maioria dos hiborianos, bem como do povo não-hiboriano de Zingara.

Aos escravos recém-capturados pelos hiperbóreos são oferecidas duas escolhas: a morte, ou uma longa e humilhante vida de servidão. Conan, assim como Niord e seus aesires, preferem optar por uma morte limpa à desonra de serem escravizados. Mas a morte que aqueles hiborianos mestiços dão aos seus cativos acorrentados não é algo rápido, como os cimérios e aesires fazem com seus inimigos. Eles costumam torturar seus prisioneiros das piores formas possíveis, até estes implorarem pela morte, para só então receberem o golpe de misericórdia.

Contudo, Conan e os aesires não costumam implorar por nada – nem pela morte nem pela vida. Assim, um por um, os bárbaros acorrentados – capazes de romperem amarras de couro, mas não de quebrarem correntes recém-forjadas de aço – vão sendo minados, primeiramente, pela fome nos calabouços. O cimério, assim como seus amigos de Asgard, não pragueja, grita, chora nem delira, como um homem civilizado faria. Mas a dor e agitação em seus peitos não são menos ferozes. Seus grandes membros musculosos tremem com a intensidade de suas emoções.

Depois de vários dias sem comida, eles são arrastados ou carregados a um enorme salão de torturas. Aquela enorme câmara é cheia de máquinas e aparelhos de tortura, ganchos e todos os implementos concebidos pela mente humana para dilacerar carne, quebrar ossos, romper e rasgar veias e ligamentos. Conan e os aesires são suspensos pelos mesmos grilhões grossos e pesados que lhes acorrentam, presos aos pulsos e tornozelos e ligando uns aos outros, e, um a um, são esfolados vivos; ou têm os ossos e articulações lenta e dolorosamente estirados e deslocados uns dos outros nas mesas e rodas de tortura, ou são queimados vivos.

Com um ódio cada vez maior em seu peito, Conan vê Niord, o último e mais bravo daqueles bárbaros loiros, ser torturado até a morte, sem que um só pedido por piedade lhe escape pelos lábios moribundos por entre as barbas douradas.

O cimério seria o próximo a morrer lenta e dolorosamente pelas mãos dos hiperbóreos, se não fosse pela interferência inesperada da jovem Gullvia de Asgard, a qual andara se esgueirando por aquela cidade, desde que fugira secretamente de sua tribo, em busca de Conan. Ao se deparar com o cadáver do pai, no campo de batalha próximo à Hiperbórea, o coração da jovem loira se enchera de ódio. Determinada a vingar o velho pai e a libertar Conan e os demais aesires – cujos corpos ela não encontrara junto com os de Gorm e de outros –, a jovem espadachim e arqueira continuou seguindo para leste.

A jovem aesir atira suas flechas com precisão mortal, nas testas e pescoços daqueles malditos torturadores civilizados. Vendo isto, o rei da Hiperbórea, apesar de guerreiro, foge para a segurança de seus aposentos, enquanto grita suas ordens. Ao desembainhar a espada – agora que as flechas acabaram –, Gullvia tira as chaves do cinto do carcereiro ao qual matara, e as lança para Conan, enquanto guerreiros hiperbóreos convergem até a jovem loira. Quando o cimério se liberta das pesadas correntes que o aprisionavam, a aesir dá cobertura a ele, decepando membros e cabeças com golpes ágeis e desconcertantes. Logo, Conan já está livre e, com a espada de um hiperbóreo morto nas mãos, abre um caminho sangrento para ele e sua bela salvadora.

Esquivando-se de um golpe dirigido ao peito, o cimério usa a própria lâmina para lançar a espada do hiperbóreo para longe e, agarrando-lhe a garganta, afunda a espada no coração de seu rival, de modo que a lâmina do adolescente se projeta pelas costas do hiboriano mestiço.

Enquanto ele e a loira saem daquele castelo, Conan lamenta não poder acertar um bom golpe de espada na garganta do maldito Rei Belbog. Golpeando sem parar, o cimério e a aesir conseguem sair daquela cidade, decepando cabeças e membros, e derramando miolos e tripas pelas ruas, até alcançarem os portões, onde, esquivando-se de uma chuva de flechas e lanças, o jovem casal de bárbaros corta ao meio o corpo dos guardas, antes que eles possam atacá-los ou fechar as enormes portas de bronze.

Conan e Gullvia fogem para o sul – pois o caminho para oeste, leste e norte está bloqueado por aquele povo civilizado das planícies nevadas. Durante uma noite e um dia, os hiperbóreos seguem-lhes os passos até que, a nado, o cimério e a aesir atravessam um rio, transbordado pelos degelos e enchentes da primavera – uma torrente que berra e espuma, a qual nem mesmo os hiperbóreos ousam atravessar. Mas, no desespero da fuga, os dois bárbaros se lançam à água e nadam, golpeados e sacudidos pela fúria das ondas, e chegam à outra margem, do lado brituniano. Mas somente Conan chega vivo ao extremo norte da Britúnia, pois sua salvadora loira havia morrido durante a travessia, abatida por duas flechas hiperbóreas nas costas encouraçadas.

Apesar de exausto e molhado, o cimério vai, aos poucos, juntando galhos e outros pedaços de pequenas árvores aos quais consegue cortar, arrancar ou simplesmente encontrar soltos, até construir uma pira funerária para a primeira jovem não-ciméria à qual possuíra. Encontrando aço e pederneira no cadáver de Gullvia, ele a põe sobre a pira que construiu e, assim como os conterrâneos da jovem fazem com seus mortos, o adolescente crema o corpo da bela aesir. O cimério nunca esquecerá as humilhações e perdas sofridas na maldita terra ao norte daquele rio caudaloso. Conan desenvolve pelos hiperbóreos um ódio que durará toda a sua vida.


FIM



Agradecimentos especiais: Aos amigos e howardmaníacos Osvaldo Magalhães e Ricardo Medeiros, de Brasília (DF), e Deuce Richardson, dos EUA.




A seguir: Interlúdio na Britúnia.


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